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SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI

REFERENCIAIS CURRICULARES DA REDE


PÚBLICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE
NITERÓI

Niterói

Dezembro/2022
FICHA TÉCNICA

Prefeitura Municipal de Niterói


Axel Schmidt Grael

Secretaria Municipal de Educação


Lincoln de Araújo Santos

Fundação Municipal de Educação


Felipe Leal Bellot

Subsecretaria de Desenvolvimento Educacional


Djenane Luisa Freire Firmino

Subsecretaria de Projetos Educacionais Transversais


Thiago Soares Risso Possas

Subsecretaria de Planejamento e Gestão


Marcio Anciães Ferreira

Subsecretaria do Programa Criança na Creche


Patrícia Gomes Pereira

Diretoria de Gestão Escolar


Jessica Fernandes

Diretoria de 1º e 2º ciclos
Andréia Mello Rangel

Diretoria de 3º e 4º ciclos
Camilla Ferreira Souza Alô
Diretoria de Ensino de Jovens e Adultos
Greyce Kelly F. de Almeida

Diretoria de Educação Infantil


Fernanda Pinheiro de Macedo

Diretoria de Articulação Pedagógica


Silvana Malheiro Gama

Casa de Avaliação e Formação - CAF


Maria Cristina Rezende de Campos

Coordenação de Educação em Direitos – CEDIR


Ronald dos Santos Quintanilha

Coordenação de Educação Especial


Lucienne de Oliveira Jesus Souza

Coordenação de Educação em Sustentabilidade, Esporte e Saúde – CESESS


Juliana Martins de Souza

Coordenação de Mídias e Novas Tecnologias


Carla Sena dos Santos Pinto

Coordenação de Educação e Cultura – CECULT


Liliane Balonecker Daluz

Coordenação de Educação na Diferença – CEDIF


Cristiane Gonçalves de Souza

Coordenação de Aceleração e Progressão Parcial


Jessé Magalhães
Coordenação de Indicadores, Dados e Programas Educacionais- CIDaPE
Carla Cristina Martins da C. Vasconcellos

Coordenação de Programas Artísticos Literários - CProAl


Samuel Barreto

Coordenação de Supervisão Educacional - COESE


Romana Camarinha Dominguez

Conselho Municipal de Educação


Cintia da Luz Rodrigues

Comissão de Acompanhamento dos Referenciais Curriculares da Rede Pública


Municipal de Educação de Niterói – PORTARIA SME Nº 018/2022

Djenane Luisa Freire Firmino (Presidente)


Alessandra da Costa Abreu
Andréia Mello Rangel
Carla Cristina Martins da Conceição Vasconcellos
Carla Sena dos Santos Pinto
Cíntia da Luz Rodrigues
Cristiane Gonçalves de Souza
Cristina Ferreira Gonçalves Padilha
Delma Marcelo dos Santos
Eloisa Fátima Figueiredo Semblano Gonçalves
Fernanda Pinheiro de Macedo
Greyce Kelly Fernandes de Almeida
Jessica Fernandes Braga
Lucienne de Oliveira Jesus Souza
Lucilaine Maria da Silva Reis
Maria Cristina Rezende de Campos
Mônica Pereira da Costa Ianov
Nathalie D'Oliveira Mendes
Patrícia Brito de Oliveira Feitosa
Robson de Souza
Romana Camarinha Dominguez
Sandra Cristina Ferreira de Sousa
Silvana Malheiro do Nascimento Gama

Revisão

Ana Julia Castanheira Campos Moraes Louzada


Fabiana Botelho dos Santos
Nadilene Nery de Melo
Roberta Viegas Noronha
Rosana Ribeiro

Capa

Tatiana Freire de Moura

Diagramação

Carla Sena dos Santos Pinto


Eloisa Fatima Figueiredo Semblano Gonçalves
Lauane Baroncelli Nunes
FICHA TÉCNICA DA MINUTA DOS REFERENCIAIS CURRICULARES DA REDE
PÚBLICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI (DEZEMBRO/2020)

Prefeitura Municipal de Niterói


Rodrigo Neves

Secretaria Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia


Flávia Monteiro de Barros Araujo

Fundação Municipal de Educação


Fernando Soares da Cruz

Subsecretaria Municipal de Educação


Patrícia Gomes Pereira

Subsecretaria de Projetos Especiais


José Henrique Antunes

Superintendência de Desenvolvimento de Ensino


Cristiane Gonçalves de Souza

Equipes SMECT/FME - Niterói


Assessoria Especial de Articulação Pedagógica – Cristiane Gonçalves de Souza
Aceleração das Aprendizagens – Márcia Ferreira Netto
Assessoria de Avaliação Institucional – Maria Cristina Rezende de Campos
Assessoria de Estudos e Pesquisas Educacionais – Nelson Ricardo da Costa Silva
Assessoria de Mídias e Novas Tecnologias – Carla Sena dos Santos Pinto
Coordenação da Educação de Jovens e Adultos – Greyce Kelly F. de Almeida
Coordenação de Educação Especial – Andrea Pierre dos Reis
Coordenação de Progressão Parcial – Carmen Déborah Dias Bragança
Coordenação de Promoção da Leitura – Liliane Balonecker Daluz
Coordenadoria Especial de Supervisão Educacional – Romana Camarinha Dominguez
Diretoria de Educação Infantil – Andreia Viana da Silva Diniz
Diretoria de Gestão Escolar – Érika Machado da Rocha
Diretoria de 1º e 2º Ciclos – Silvana Malheiro Gama
Diretoria de 3º e 4º Ciclos – Rosane Cristina Feu Santos
Núcleo de Ações Integradas – Juliana Martins de Souza
Núcleo de Assessoria Técnica – Ronald dos Santos Quintanilha

CAPA E DIAGRAMAÇÃO
Tatiana Freire de Moura

CONCEPÇÃO E ELABORAÇÃO DOS TEXTOS

Ensino Fundamental
Rosane Cristina Feu Santos
Silvana Malheiro do Nascimento Gama

Educação de Jovens e Adultos


Greyce Kelly Fernandes de Almeida
Eduardo Garritano

Educação Infantil
Andreia Viana da Silva Diniz
Cristiane Gonçalves de Souza
Delma Marcelo dos Santos
Eliza Helena Pandino Botelho Leonardo
Fernanda Macieira Bortone
Leda Marina Santos da Silva
Lílian Garcia
Lucimeire Bezerra Costa
Márcia Nico Evangelista
Rosana Ribeiro
Rosângela Motta Dias
Sandra Cristina Ferreira de Sousa
Sirlane Vieira Alves
Sonia de Oliveira Martins
Verônica da Silva Santos

Educação Ambiental
Juliana Martins de Souza

Educação em Direitos Humanos: perspectivas curriculares em construção


Márcia Ely Bazhuni Pombo Lemos
Ronald dos Santos Quintanilha

Educação e Inclusão: direitos de todos


Andréa Pierre dos Reis
Lucienne de Oliveira Jesus Souza
Robson de Souza

A leitura literária e a formação do leitor-autor na Rede Pública Municipal de Educação


de Niterói
Elana Cristiana dos Santos Costa
Jacqueline Martins da Silva
Liliane Balonecker Daluz

Tecnologias na Aprendizagem
Carla Sena dos Santos Pinto
Eloisa Fatima Figueiredo Semblano Gonçalves
Érika Francisco de Paulo David
Jaqueline Devillart de Macedo
Márcia Luzia Correia de Abreu
Rosangela Aurelia Motta de Alcantara

Avaliação: Institucional e da Aprendizagem


André Luiz Abreu de Mattos
Andréa Pierre dos Reis
Carla Cristina Martins da C. Vasconcellos
Cristina Ferreira Gonçalves Padilha
Maria Cristina Rezende de Campos
Nelson Ricardo da Costa Silva
Romana Camarinha Dominguez
Tatiana Freire de Moura

Currículo, Cultura e Diferença


Cristiane Gonçalves de Souza

Movimento para elaboração dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal


de Educação de Niterói
Sandra Cristina Ferreira de Sousa

Professores Colaboradores (Colaborações descritas no capítulo 2 da Parte I)


Prof. Dr. Adriano Freitas Vargas/UFF
Prof.ª Dra. Ana Angelita C. N. da Rocha/UFRJ
Prof.ª Dra. Ana Maria Monteiro/ UFRJ
Prof.ª Dra. Andrea Vieira Thees/UNIRIO
Prof.ª Dra. Carmen Teresa Gabriel Le Ravellec/UFRJ
Prof.ª Dra. Cecília Goulart/UFF
Prof.ª Dra. Denise Souza Destro/SME de Juiz de Fora/MG
Prof. Dr. Diego da Silva Vargas/UNIRIO
Prof. Dr. Dilton Ribeiro do Couto Junior/UERJ/FEBF
Prof.ª Dra. Dinah Vasconcellos Terra/UFF
Prof.ª Dra. Elizabeth Fernandes Macedo/UERJ
Prof. Dr. Guilherme Augusto Rezende Lemos/UERJ
Prof. Dr. Ivo da Costa do Rosário/UFF
Prof. Dr. Joel Windle/UFF
Prof.ª Dra. Lea Tiriba/UNIRIO
Prof.ª Dra. Ligia Maria Leão de Aquino/UERJ
Prof.ª Dra. Luciana Esmeralda Ostetto/UFF
Prof.ª Dra. Márcia Serra Ferreira/UFRJ
Prof.ª Dra. Maria Cristina Corais/IFRJ
Prof.ª Dra. Maria Margarida Gomes/UFRJ
Prof.ª Dra. Rita de Cássia Prazeres Frangella/UERJ
Prof. Dr. Roberto Marques/UFRJ
Prof.ª Dra. Sandra Escovedo Selles/UFF
Prof. Dr. Thiago Ranniery/UFRJ
Prof.ª Dra.Vera Vasconcelos/UERJ
Prof.ª Dra. Walcéa Barreto Alves/UFF
Prof. Dr. Wilson Cardoso Júnior/UFRJ

Grupos de Trabalho / Professores da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói

ARTE
Eires Melo da Silveira (Coordenador – 3º e 4º Ciclos)
Fernanda F. Marques Silva (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Ana Carolina Senos E Santos
Ana Catarina M. C. M. Portugal
André Luiz da Costa Valim
Andrea Santos Alves
Cristiane Rodrigues
Fábio Silva Guimarães
Isabella Ferreira Siqueira
Lisiane de Aguiar Tavares
Marcelo Inagoki Rodrigues
Máslova T. Valença
Paola Queiroz de Figueiredo
Samuel Barreto

CIÊNCIAS
Ana Regina de L. P. Peixoto (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Camilla Ferreira Souza Alô (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Camile Mizumoto
Carmen Pazoto
Cristiane M. Ferreira
Daratilde B. Santana
Deise Fernandes Santos Almeida
Felipe Carvalho de Oliveira
Geisa da Silva Capistrano
João Ricardo Assis
Kelly M. Leal
Stella Maris B. S. Kisse
Thiago Machado da Silva

EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Juliana Martins de Souza (Coordenadora do NAI)
Camilla Ferreira Souza Alô
Carmen Edith Pazoto Mauricio
Carolina da Silva Ribeiro
Cristiane Menezes Ferreira
Fernando Fortunato Faria Ferraz
Janaina Silva de Souza
João Ricardo Assis da Silva
João Carlos Moreira Tristão
Kelly Mauricio Leal
Letícia D'Amato dos Reis Grigorovski
Maíra Jansen Olinisky
Márcia Cristina Palmar de Rezende
Márcia Cristina Soares de Moura Victorino
Renato do Nascimento Moser
Silvia Mauricio Leal
Thiago Machado da Silva
EDUCAÇÃO FÍSICA
Lucia Regina Bessa Voss (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Marise S. C. Fazziola Mendel (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Alexandre Marques da Costa
Aline Fernandes Louzada
Analice Antunes da Fonseca
Andressa Brasil Barbeito de Paula
Antonio Florêncio Braga Monteiro
Cecília Silvano
Diogo Oliveira Gomes
CristovãoElba Mattos Silva Fernandes
Gustavo Oliveira dos Santos
Gutemberg Barros de Moura
Jordão Bruno Neto
Júlio César Araújo da Silva
Laertes Paixão
Luciana Dantas R. Moreira
Luciana dos Santos Aguiar Tavares
Lucineide Vieira Drolhe da Costa
Luiz Felipe Martins Valladão
Marcelo Luiz de Souza
Marlon Torquato de Souza Mattos
Michelle Rodrigues Ferraz Ramos
Paulo César Nayfeld Granja
Ramon Diego Moura Tinoco
Renata de Melo Cardoso Palmares
Renata Fernandes Ramos
Renato do Nascimento Moser
Sandra Souza dos Santos
Silvia Maria Lyrio Figueira Rodrigues
Soyane de Azevedo Vargas do Bonfim
Thiago Coqueiro Mendonça
GEOGRAFIA
Luciano Palmares de Souza (Coordenador – 3º e 4º Ciclos)
Nanaíra da Silva Ferreira (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Angélica Quintanilha J. Devillart Lemos
Aparecida Abreu Ferreira da Silva
Carlos Alexandre Turque Duarte
Helena de Oliveira Silva
João Carlos M. Tristão
Juliana Martins De Souza
Márcia Cristina Palmar
Raphael e Silva Girão
Solange Tubino
Vanderlei Silva Ferreira

HISTÓRIA
Karyne Alves Santos (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Renato Luna (Coordenador – 3º e 4º Ciclos)
Aline de Almeida Hoche
Andreia Coutinho de Andrade Fonseca
Dilma Eunice Marques Silva
Hugo M. Rosa e Silva
Lilian Germano Guimarães
Marcele Moreira de Castro
Marcelo Ramos Duarte
Maria Lucia Cunha do Carmo Lannes
Raphaela de Almeida Santos
Rosiléa Silva Faria

LÍNGUA ESTRANGEIRA
Adjomara Leitão de Souza (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Ana Paula Fernandes (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Patrícia B. de Oliveira Feitosa (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Alice Piza Reis Elizeu
Amanda A. Siqueira Moritz
Ana Carolina da Silva Pinto
Bárbara Cristina de Abreu
Carolina Ecard Barros
Cíntia de Andrade N. Miranda
Fátima Lopes do Amaral Lutfy
Gabrielle O. R. Martins
Isabella S. G. Pereira
Jessica Natarelli
Luciana C. H. Bastos
Luciano do Amaral Silva
Thábata Christina Gomes de Lima
Valéria Teixeira Leite
Vanessa de A. B. A. Pereira

LÍNGUA PORTUGUESA
Fernanda de Araújo Frambach (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Letícia Fernandes Franco (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Adriana Teixeira Lima
Alessandra dos Santos Mendes Oliveira de Souza
Alex Sandro Lins Ramos
Angela Bittencourt Machado
Angélica Araújo da S. Affonso
Daianne Ribeiro
Fabiana Botelho dos Santos
Fernanda de Souza Lima
Homero dos Santos
Janaína S. Souza
Julie Francine S. Braga
Luana Rodrigues Machado
Márcia Luzia Cardoso Carneiro
Mariana Pereira de Oliveira
Marina de M. Lima Barreto
Pamela de Andrade Lima dos Santos
Raphael Cássio de Oliveira Pereira
Renata Vale Ribeiro
Renato Bruno
Robson de Souza (Educação Especial)
Wandréia Lúcia de Souza do Nascimento

MATEMÁTICA
Anne Rocha de Almeida (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Cristiane Custódio S. Andrade (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Nice de Oliveira (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Alex Fabiano Metello Silva
Bruno de Assis Xarifa
Deiwison Sousa Machado
Diego S.M. Belay
Jessica Folly
João Marcos B. Jucá
Keyla L. Bruck Thedin
Marcia Andrade Oliveira
Maria de Fátima C. Borges
Raphaela Duarte
Rodrigo Pessanha da Cunha
Rosiney de Jesus Ferreira
Vanessa Nunes de Souza

Grupo de Trabalho da Educação de Jovens e Adultos


Adalberto de Moraes Gomes Filho
Adilene das Graças Cardoso
Adriana Teixeira Lima
Beatriz Rabello Amin
Claudia Zunino Lombardi de Carvalho
Felipe Valadão
Fernanda Gomes Ribeiro
Geyser C. Amorim
Glaice Lúcio de Oliveira
Gleice Coelho G. da Silva
Iraci da Silva Caputo
Jacqueline Monteiro Pereira
Juliana Alves S. Monteiro
Julio Cesar Araújo da Silva
Lúcio Paulo Marques Cordeiro
Luiz Claudio da Costa Ferreira
Magno Sales Coutinho
Marcelo Luiz de Souza
Maria Lúcia Xavier Cavalcante
Priscila Leal Mello
Rafael Farias de Carvalho
Rita de Cássia M. Moreira Pinto
Rita Faeda
Rodrigo da Nóbrega Fernandes
Rosiney de Lemos Ferreira
Sandra Valéria Sampaio
Sonia Maria da Luz Campanatti
Valéria Cristina Cirne Soares
Vander Macedo Caillaux
Vicentina Ribeiro Vianna
Comissão Especial para análise e pronunciamento sobre os Referenciais Curriculares da
Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói

Coordenação: Luciana Laureano Costa

I - Representantes do Conselho Municipal de Educação de Niterói:


André Antunes Martins
Lilian Azevedo da Silva
Luiz Fernando Conde Sangenis
Luiza Cristina Rangel Pinto Sassi
Maria Felisberta Baptista da Trindade (In memoriam)
Marta Nidia Varella Gomes Maia
Severine Carmem Macedo
Tatiana Ribeiro dos Santos

II - Representantes Especialistas:
Aline Javarini
Andréia Mello Rangel
Carla Sena dos Santos Pinto
Cristiane Gonçalves de Souza
Delma Marcelo dos Santos
Elana Cristiana dos Santos Costa
Juliana Martins de Souza
Lívia Moraes Ornelas
Luciana Laureano Costa
Roberta Teixeira de Souza
Rosane Cristina Feu

III - Representantes de Professores e Pedagogos da Rede Pública Municipal de Ensino de


Niterói:
Alyne Oliveira Pecly Tavares
Ana Cláudia Santana da Silva Cruz
Fernanda de Araújo Dias
Gisele Coelho de Oliveira
Juliana Cristina da Silva Ignacio
Luciana Silva dos Santos
Ludiany Tavares da Costa Carvalho
Mônica Gonçalves
Priscila Artte Rosa Nascimento
Raphael Cássio de Oliveira Pereira
Rosa Aletice
Sonia de Oliveira Martins

Pareceristas da Minuta dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de


Educação de Niterói
- Prof. Dr. Adriano Vargas Freitas/UFF

- Profª Dra. Dagmar Mello e Silva/UFF

- Profª Dra. Denise de Souza Destro/UFF

- Profª Dra. Érika Leme/UFF

- Profª Dra. Helen Ferreira/UFF

- Profª Dra. Lea Tiriba/UNIRIO

Relatoria Final dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação


de Niterói
Cristiane Gonçalves de Souza
Andréia Mello Rangel
Queli Cristina de Andrade Novaes
Sandra Cristina Ferreira de Sousa
Virginia Maria Muniz
AGRADECIMENTOS

A TODOS E A TODAS QUE COLABORARAM COM ESTE PROCESSO DE UMA


NOVA CONSTRUÇÃO CURRICULAR PARA A REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE
NITERÓI.
A experiência da construção dos Referenciais Curriculares Municipais nos últimos
dois anos faz Niterói amadurecer em sua autonomia política que, mesmo garantida na
legislação, sabemos bem, é conquista política do nosso dia a dia. Este documento que chega à
comunidade escolar é sinal de nossa capacidade de conduzirmos coletivamente nossos
próprios caminhos nas perspectivas do aprimoramento do que entendemos sobre a qualidade
social da educação.
Após dois anos de discussão com os profissionais da Rede Pública Municipal de
Educação, a Minuta dos novos Referenciais Curriculares foi apresentada ao Conselho
Municipal de Niterói (CMEN) em dezembro de 2020, para apreciação e votação. No ano de
2021, o CMEN instituiu a Comissão Especial pela Deliberação CMEN nº 045/2021, composta
por Conselheiros, Especialistas, Professores e Pedagogos da Rede, para análise e
pronunciamento sobre a Minuta dos Referenciais. Em novembro do mesmo ano, a Comissão
emitiu recomendações que foram apreciadas pelo CMEN, que emitiu o Parecer CMEN nº
011/2021, indicando a publicação da Deliberação nº 046/2021, que aprovou os Referenciais
em sua íntegra. Cabe destacar que o CMEN dedicou a conclusão desse trabalho à Conselheira
Prof.ª Maria Felisberta Baptista da Trindade, que participou ativamente das discussões, além
de ter devotado toda a sua vida na incansável luta pela Educação Pública.
Do CMEN, ao envolvimento de professores-técnicos nas discussões e até ao “chão da
escola”, do comprometimento dos professores nos debates, das disputas de concepções
filosóficas diante do ensinoaprendizagem, os Referenciais Curriculares Municipais são a
expressão do que queremos, do que vislumbramos em termos de formação cultural e cidadã
para uma cidade e um país soberanos.
Registro aqui a importância das gestões anteriores que iniciaram este processo, dos
Secretários Municipais de Educação e Presidentes do CMEN que tomaram posição diante das
expectativas deste documento, tão esperado pela comunidade escolar. A impessoalidade
exigida no desenvolvimento das Políticas Públicas Educacionais não dispensa o
reconhecimento daqueles que se empenharam para que estes Referenciais se consolidassem
para o aprimoramento da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói. Desta forma,
lembremos os esforços da Professora Dra. Flávia Monteiro de Barros Araujo e do Sr. Vinicius
Wu nas decisões e encaminhamentos para a consolidação dos Referenciais.
Concebido por várias mãos comprometidas com a educação municipal de Niterói, este
documento é o eixo orientador dos nossos fazeres escolares, é luz que desencadeará uma
atualização das práxis pedagógicas, articulando, dos gestores aos professores, a repensarem
dialeticamente seus ofícios. Este desafio é de todos nós.
Os Referenciais Curriculares Municipais são as possibilidades de avançarmos na
consolidação da Escola Pública Municipal de Niterói, democrática, popular e de qualidade
referenciada socialmente.
Dezembro de 2022.
(No ano do Centenário de nascimento de Darcy Ribeiro)

Professor Dr. Lincoln de Araújo Santos


Secretário Municipal de Educação
Presidente do Conselho Municipal de Educação
Aos colegas professores, pedagogos e a todos os profissionais da Rede Pública
Municipal de Educação de Niterói, representando toda a equipe da Subsecretaria de
Desenvolvimento Educacional, me dirijo a vocês, para apresentar os nossos tão esperados
Referenciais Curriculares Municipais.
Os Referenciais Curriculares para a Rede Pública Municipal de Educação se
materializam em um momento histórico em que a luta pela democracia ganha novo fôlego no
contexto nacional. Nas suas páginas, encontramos os princípios e diretrizes em consonância
com as legislações federais e municipais que compõem a história da Educação de Niterói. O
texto de Introdução, comum aos três volumes, possui um breve histórico da construção dos
Referenciais e outros escritos que indicam as principais perspectivas teóricas e frentes de
trabalho das áreas transversais do conhecimento.
Nos textos específicos, da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e da Educação
de Jovens e Adultos (EJA), encontramos as reflexões coletivamente construídas ao longo dos
encontros formativos e dos debates sobre as singularidades teórico-práticas de cada
segmento/modalidade de ensino.
Nosso objetivo é que os Referenciais Curriculares Municipais sejam norteadores das
Políticas Educacionais da nossa rede, que ofereçam subsídios para a revisão dos Projetos
Políticos Pedagógicos e que desse modo orientem os trabalhos das Unidades de Educação e
dos grupos de referência.
A expectativa é que este documento ganhe sentido a cada dia nas Unidades de
Educação e é isto o que mais nos dá esperança: que os objetivos propostos no documento se
concretizem nos fazeres pedagógicos para que tenhamos um currículo com centralidade nas
demandas educacionais das crianças, dos jovens e dos adultos da Rede Pública Municipal de
Educação de Niterói.
A entrega desses documentos, cuja elaboração contou com a ampla participação da
rede, terá, além do seu elemento prático, – oferecer subsídios ao trabalho pedagógico da rede
– dois elementos simbólicos: o reestabelecimento do pacto com o nosso Município da
Educação Que Queremos e a celebração da vitória da democracia, pois o diálogo, o respeito e
a coletividade estão presentes em cada canto das páginas que se seguem.

Professora Dra. Djenane Freire


Subsecretária de Desenvolvimento Educacional
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................................................. 26
PARTE I
1. CURRÍCULO E MOVIMENTOS INSTITUINTES ....................................................... 29
2. MOVIMENTO PARA ELABORAÇÃO DOS REFERENCIAIS CURRICULARES
DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI ............................. 34
3. EDUCAÇÃO E INCLUSÃO: DIREITOS DE TODOS .................................................. 44
3.1 Por que é lei .................................................................................................................. 45
3.2 Por que as vivências são as ações modeladoras do ato de aprender ....................... 47
3.3 Por que a escola continua sendo o espaço no qual se é possível viver a experiência
da aprendizagem ................................................................................................................ 48
4. EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA: PERSPECTIVAS
CURRICULARES EM CONSTRUÇÃO ............................................................................. 49
5. CURRÍCULO, CULTURA E DIFERENÇA ................................................................... 55
6. A LEITURA LITERÁRIA E A FORMAÇÃO DO LEITOR-AUTOR NA REDE
PÚBLICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI ................................................ 59
7. EDUCAÇÃO AMBIENTAL ............................................................................................. 66
7.1 Educação em riscos ambientais .................................................................................. 70
8. TECNOLOGIAS NA APRENDIZAGEM ....................................................................... 72
8.1 Sociedade contemporânea ........................................................................................... 72
8.2 Sociedade em rede ........................................................................................................ 74
8.3 Cultura digital .............................................................................................................. 75
8.4 Infância e juventude na educação contemporânea .................................................... 76
8.5 Redefinição dos espaços e tempos da escola .............................................................. 78
8.6 Metodologias Ativas da Aprendizagem ..................................................................... 79
8.7 Considerações finais .................................................................................................... 83
9. AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E DA APRENDIZAGEM ....................................... 83
10. CONSIDERAÇÕES SOBRE A TRANSIÇÃO ENTRE CICLOS ............................... 88
11. CICLOS DO ENSINO FUNDAMENTAL ..................................................................... 91
11.1 A Trajetória da Revisão Curricular no Ensino Fundamental ............................. 101
11.2 Leitura e devolutiva das Unidades de Educação................................................... 104
12. REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 105
PARTE II
EDUCAÇÃO INFANTIL .................................................................................................... 114
1. CAMINHOS TRILHADOS ............................................................................................. 115
2. PELOS FIOS DA HISTÓRIA ......................................................................................... 117
2.1 A Rede Pública Municipal de Educação Infantil de Niterói .................................. 121
3. O CICLO INFANTIL ...................................................................................................... 129
3.1 Crianças e infâncias ................................................................................................... 130
3.2 Os Ciclos infantis: da inserção à transição para o Ensino Fundamental ............. 136
4. DOCENTES DA EDUCAÇÃO INFANTIL ................................................................... 139
4.1 Bidocência: desafio de uma caminhada conjunta ................................................... 146
4.2 Docências: interlocuções essenciais .......................................................................... 148
5. DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA ............................................................................ 151
5.1 Avaliação na Educação Infantil ................................................................................ 152
5.2 Relatório avaliativo individual no ciclo infantil ...................................................... 155
6. A COMPOSIÇÃO CURRICULAR ................................................................................ 157
6.1 Eixos Orientadores das Práticas Curriculares na Educação Infantil ................... 162
6.2 Pressupostos ............................................................................................................... 168
I - Cuidar como Compromisso Ético, Estético e Político ............................................. 168
II - Espaço e Tempo para as Infâncias ........................................................................... 171
III - Autonomia e Autoria ............................................................................................... 174
IV - Sensibilidade e Afetividade ..................................................................................... 177
V - Dimensão Cidadã ....................................................................................................... 179
VI - Infâncias e Natureza ................................................................................................ 181
VII - Pesquisa e Experiência ........................................................................................... 185
VIII - Múltiplas Linguagens ........................................................................................... 190
IX - Diferença, Culturas e Singularidades..................................................................... 203
“Natureza da gente não cabe em nenhuma certeza.” ................................................... 205
7. MATRIZ ORIENTADORA ............................................................................................ 208
8. REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 216
ANEXOS ............................................................................................................................... 224
ANEXO 1 – DELIBERAÇÃO CME nº 045/2021 .............................................................. 225
ANEXO 2 – PARECER CME Nº 011/2021 ........................................................................ 227
ANEXO 3 – DELIBERAÇÃO CME Nº 046/2021 ............................................................. 232
ANEXO 4 – PORTARIAS SME Nº 018/2022 E SME Nº 019/2022.................................. 234
26

APRESENTAÇÃO1

A todos educadores, educadoras e comunidade escolar da Rede Municipal de


Educação de Niterói, orgulhosamente, apresento a minuta do novo Referencial Curricular
para esta rede de ensino. Um trabalho de muita pesquisa, estudo, conversa, escuta, troca,
realizado a inúmeras mãos pelos nossos Profissionais da Educação, ao longo dos anos de
2019 e 2020.
O caminho é pelo diálogo, pelo consenso, pelo debate e pela negociação. Não acredito
na necropolítica, mas na política que é construída nas relações. Não basta modelar belos
documentos curriculares, se estes não pulsam na vida da escola. E não há dúvidas que, ao
elaborar esse Referencial Curricular, cada escola pode contribuir trazendo caminhos trilhados
para compor a escrita desta proposta, que, com certeza, após sua homologação, passará por
muitos processos de reinterpretação no dia a dia de cada realidade escolar.
A Rede Municipal de Educação tem profissionais excelentes, pessoas que dão
continuidade a sua formação inicial, investem em sua formação e, com muito compromisso
político, constroem práticas voltadas à realidade escolar, em prol do desenvolvimento e
aprendizado de cada aluno. Penso que a pessoa do professor é central no processo educativo.
E percebo uma inoperância em processos massivos alinhados a propostas verticalizadas. Para
construir uma proposta curricular, antes de tudo, é preciso fortalecer os processos de
formação continuada e ir criando consensos possíveis, através do trabalho coletivo, da
discussão e da própria construção desses consensos. Prima-se pela consciência das escolhas
pedagógicas, dos caminhos possíveis para o desenvolvimento da docência e pelo
aprofundamento dos referenciais adotados.
Considero sincronicamente a construção do bem comum e a micropolítica, que traz
para a reinterpretação os documentos oficiais. Com isso digo que esta proposta curricular, ao
seguir para as escolas, passará por processos criativos e singulares, marcados pelo
imprevisível. Gosto desta discussão e pulsão pedagógica que urge neste movimento. Vejo,
com esperança, que possa trazer contribuições para o debate pedagógico, o aperfeiçoamento
aos processos educativos e a afirmação da democracia.

Flávia Monteiro de Barros Araujo


Secretária Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia

1
Documentos referentes à Minuta dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de
Niterói.
27

Especialmente às educadoras e aos educadores – meus colegas na Rede Municipal de


Educação de Niterói – às crianças, aos adolescentes, jovens e adultos que fazem parte dessa
querida Rede Municipal, me dirijo neste momento.
Desde 2019, reuniões internas entre os integrantes do corpo técnico-pedagógico da
Secretaria Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia de Niterói e encontros com as
Unidades de Educação dessa Rede marcam as discussões que se apresentam sintetizadas nesta
minuta do novo Referencial Curricular da Rede Municipal de Educação de Niterói. É com
alegria que apresentamos este texto! Ousamos dizer que a potência destes escritos reside nas
ressignificações que as equipes de articulação pedagógica, professoras, professores, crianças,
jovens e adultos certamente produzirão nos espaços educacionais que compõem a nossa Rede.
Nossa certeza nessa potência provém da aposta que fazemos na produção local do
currículo, na gestão democrática que buscamos mobilizar nas Unidades da Rede e, sobretudo,
no caminho que escolhemos construir para a elaboração deste novo Referencial. Esse
percurso foi marcado pela prática do diálogo, que tentou garantir a contribuição das Unidades
para esses escritos, de modo que estas reconhecessem suas vozes nesse documento, o qual
objetiva ser – como o próprio nome aponta – um referencial, e não um guia para a prática
docente.
Acreditamos que a mudança não precisa, necessariamente, ser realizada de maneira
técnica e programada, de forma que acabe por tentar abafar as diferenças sempre presentes
nas realidades educacionais. Por isso, defendemos que o foco não no “objeto final”, mas no
processo de construção destes escritos nos possibilitou viver de maneira significativa os
momentos deste caminhar.
Agradecemos às Unidades de Educação que estiveram junto com os profissionais que
atuam na sede, para que esse documento fosse construído deforma reflexiva e dialógica. É
impossível estar sozinho na produção curricular!
Esperamos que este novo Referencial colabore para o desenvolvimento e o
aprofundamento dos debates curriculares que articulam e constroem as ações educativas, de
modo que o fazer educacional dessa Rede Municipal de Educação seja sempre voltado para
uma perspectiva humana e social, acolhedora, crítico-reflexiva e democrática.

Patrícia Gomes Pereira


Subsecretária de Educação
28

PARTE I
29

1. CURRÍCULO E MOVIMENTOS INSTITUINTES

Estamos convencidos de que nós, educadores, temos


uma tarefa urgente: precisamos nos deseducar do
cânone limitador para que tenhamos condições de
ampliar os horizontes do mundo, nossos e das nossas
alunas e alunos. Educação deve gerar gente feliz,
escrevendo, batendo tambor, dando pirueta, imitando
bicho, fazendo ciência e gingando com gana de viver
(SIMAS e RUFINO, 2018, p. 19).

Quando iniciamos este processo de revisão dos Referenciais Curriculares, fomos


mobilizados por perguntar a cada um de nós, Profissionais da Educação na Rede Pública
Municipal de Educação de Niterói, quais sentidos de escola, currículo e docência produzimos
e defendemos nas Unidades em que atuamos?
Este primeiro passo de mobilização revela o entendimento e a defesa por um processo
coletivo, em que nos distanciamos dos objetivos fortemente voltados para a eficácia e os
resultados, especialmente em avaliações de larga escala, e nos aproximamos vivamente da
luta por um documento curricular que se constrói no decorrer de conversas complicadas, mas
boas conversas. Conversas que movimentam, iluminam como chamas o que o breu das
normatizações e dos dados das avaliações nacionais não revelam, que é o impulso criador
potente presente na relação dos professores e seus alunos que produzem currículo
cotidianamente em suas Unidades de Educação.
Portanto, buscamos, nesta revisão dos Referenciais Curriculares, potencializar as
conversas sobre currículo nas Unidades de Educação, com amplo diálogo com Professores,
Equipes de Articulação Pedagógica e demais Profissionais da Educação. Acreditamos que a
experiência vivida de docentes e seus alunos poderia ser ouvida e, dessa forma, fortalecer o
reconhecimento, nos Referenciais Curriculares, das experiências educacionais e promover, a
partir das conversas nas reuniões de planejamento, nas salas dos professores e nos momentos
informais, possibilidades de ressignificação destas artes do fazer docente e discente, pois
currículo é movimento, é vida, e o bonito da vida é o encontro com o outro que nos provoca
para outras formas de ser e estar no mundo.

O currículo concebido como verbo – currere – privilegia o conceito do


indivíduo nos estudos de currículo. É um conceito complicado em si. Cada
um de nós é diferente, o que significa que todos temos uma constituição
diferente, uma carga genética específica e criações, famílias, cuidadores e
companheiros diferentes e, de forma mais geral ainda, em termos de raça,
classe e sexo, eles próprios conceitos de desindividuação infletidos pelo
lugar, momento e circunstâncias. Influenciados pela cultura e por outras
30

forças frequentemente homogeneizantes, cada um de nós é, ou pode ser,


característico. De fato, podemos cultivar essa diferenciação. Podemos nos
tornar individualistas, comprometidos com efetivar qualquer independência
que vivenciemos, e podemos nos juntar para pôr em prática modos de agir
(inclusive de pensar) que escolhemos como sendo significativos. (PINAR,
2016, p. 21)

Nessa trajetória de discussão e revisão dos Referenciais Curriculares, estava claro desde
o início que não buscaríamos a univocidade teórica, ainda que fôssemos, inúmeras vezes,
questionados sem definir qual seria a teorização curricular predominante nos Referenciais
Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói. Nossa resposta sempre
apontava para o entendimento do currículo como instituinte de sentidos, e que esses sentidos
estavam em disputa na luta pela significação curricular e que qualquer tentativa de fixação
seria fadada ao fracasso, pois os processos de significação não cessam. Cabe esclarecer
também que não defendemos a ideia de que qualquer currículo é válido, mas acreditamos que
a construção do documento curricular de uma rede deve ser realizada a partir de uma agenda
política, na qual cada unidade escolar e seu coletivo tenham participação e, neste processo
relacional de construção, enfraquecermos uma única possibilidade de definição e apostarmos
na negociação de diferentes possibilidades de significação.
Partindo do conceito de um currículo sem fundamentos (LOPES, 2015), apresentamos
ao debate uma possibilidade de pensar a proposta de currículo, de modo a não garantir uma
fixação que não seja passível de desestabilizações. Se entendermos o currículo como um texto
que será lido e traduzido cotidianamente, e assim disputando as significações sobre as práticas
curriculares: como vamos ensinar? Quais conteúdos e conhecimentos serão escolhidos? Para
quais finalidades sociais o currículo deve preparar os alunos? Ainda assim, temos pontos
consensuais sobre quais conteúdos que são importantes ser ensinados (a língua materna, por
exemplo), temos uma tradição do pensamento curricular que tem traços hegemônicos, como a
importância do planejamento e dos objetivos, com base na racionalidade tyleriana e das
disciplinas escolares que determinam a organização da grade curricular.
Desse modo, práticas instituintes são incorporadas ao instituído, promovendo na
política curricular movimentos que podem reforçar os processos de fixação, mas também
outros movimentos que desestabilizam significados, produzindo novos sentidos, tornando a
política curricular e a produção de currículos espaço de criação, em constante fluxo entre
permanência e mudança.

[...] as experiências instituintes estão sempre em devir, pisando em um


terreno movediço, sem certezas e comprovações da história, mas enfrentando
e infiltrando-se nas tramas instituídas, para aproveitar frestas e contradições
31

e, assim, afirmar a outridade. Afinal, não podemos esquecer que, a despeito


de profetas agourentos, a escola pode ser outra, com outra pode ser a
sociedade, e as próprias políticas e racionalidade que nos organizam
(LINHARES, 2005, p. 9).

Apostamos na imprevisibilidade e nas ações criativas, poeticamente, defendemos uma


didática da invenção (BARROS, 1993), abrimo-nos ao encanto da incerteza, ao vir a ser como
possibilidade, como criação, como pulsação que reivindica as diferentes possibilidades de
educar.
A leitura deste documento curricular é um convite para pensarmos o currículo
apostando na sua produção contextual. Acreditamos na produção local dos currículos e
entendemos ser esta uma agenda política relevante para responder às tentativas
centralizadoras na produção curricular. No entanto, destacamos que a crítica à produção local,
argumentando que cada escola, então, pode produzir o currículo que quiser, não considera as
tradições curriculares e as demandas contextuais que também limitam a produção de sentidos.
Significar o currículo como político nos mobiliza a fazer um investimento radical no debate
sobre as políticas curriculares, envolvendo os professores na sua arte de fazer currículo com
seus alunos. Não podemos deixar de considerar que o debate sobre currículo deve também
envolver toda a comunidade escolar.
Produzir currículo torna-se um processo sem fim, no qual não há o momento de
construção de princípios e regras que nos façam supor ser possível descansar do jogo político,
estabelecer consensos que garantam a solução de todo e qualquer conflito, pois a cada novo
conflito, regras podem ser refeitas. Este jogo nos coloca o desafio da transcriação do
currículo. Se somos transcriadores, como tais, vamos esperar em vão o sétimo dia de descanso
da atividade política. (LOPES, 2014, p. 59)
Reafirmamos o nosso compromisso com o horizonte democrático e, por isso, não
estabelecemos, neste documento, uma única forma de entender o currículo e sim nos abrimos
ao diálogo com os diferentes sentidos que circulam na rede, porque também entendemos que
qualquer forma de definição à priori seria falsa, pois outros currículos e sentidos sempre
estarão emergindo nas práticas pedagógicas.
Contudo, contextualmente, podemos sinalizar alguns sentidos presentes neste
documento e que apontam para a possibilidade de uma grande articulação de demandas em
comum, quais sejam: reafirmar a importância da leitura literária enquanto experiência estética
nas práticas pedagógicas dos diferentes componentes curriculares; a defesa por uma educação
antirracista, que reconheça e promova a discussão sobre os gêneros da escola e a sexualidade;
um currículo que se posicione contra a intolerância religiosa, contra qualquer discriminação e
32

violência no espaço escolar; um currículo aberto a outras epistemologias; o fortalecimento da


educação ambiental; em defesa de uma educação inclusiva; pela ampliação da Educação
Integral e das novas tecnologias da aprendizagem e a opção por pensar os processos de
avaliação das aprendizagens e avaliação institucional, a partir de seus indicadores locais.
Este processo de revisão dos Referenciais Curriculares procurou fazer um
investimento radical, ou seja, um investimento na contingência, um investimento no
protagonismo dos Profissionais da Educação, em discutir amplamente estes Referenciais,
buscando trazer, para esta experiência de pensar o currículo da Rede, as narrativas presentes
em nossas Unidades de Educação. Um investimento que coloca, no horizonte, a possibilidade
de pensar o currículo para uma rede distante das lógicas normativas e próxima dos
movimentos instituintes que impulsionam os Projetos Políticos Pedagógicos. Pretende-se
semear, em cada espaço escolar, o reconhecimento de que professores e pedagogos não
implementam currículos, mas sim, produzem currículos em vigência. Destacamos também a
importância dos Projetos Políticos Pedagógicos como documentos de produção curricular.
Nosso compromisso, neste processo, foi mobilizar conversas em reuniões de
planejamento sobre a Base Nacional Comum Curricular, o contexto de sua produção e a
defesa de que nossas Unidades de Educação produzem currículos, ou seja, o reconhecimento
de nossos movimentos instituintes como potência para desestabilizar sentidos que se
pretendem hegemônicos.
Nessa trajetória de discussão dos Referenciais Curriculares, procuramos destacar que
sujeitos singulares vivem experiências da escolarização de formas distintas, produz em
diferentes saberes, percebem diferentes horizontes para o ato de educar e viver a experiência
de estar na escola e participar de um projeto de Educação. Mesmos e quiséssemos, jamais
teríamos um currículo igual em todas as Unidades de Educação, pois em cada espaço escolar,
o currículo será traduzido de uma certa maneira.
Docentes e discentes são sujeitos diferentes, viveram experiências singulares, portanto
carregam em si afetos e desejos que imprimem a marca da identificação em seus projetos de
educação e vida. Parece-nos que, neste ponto, temos o belo de ser da educação, como canta o
poeta Caetano Veloso, que nos faz lembrar a amorosidade de Paulo Freire: “Gente espelho de
estrelas, reflexo do esplendor, se as estrelas são tantas, só mesmo o amor. [...] Gente, espelho
da vida, doce mistério”2

2
VELOSO, Caetano. Gente. Intérprete: Caetano Veloso. In: Caetano Veloso. Bicho. Rio de Janeiro: Philips. 1
disco sonoro (LP). Lado A, faixa 3. 1977.
33

Enfim, faz-se necessário o fechamento provisório e contingente deste documento


curricular. Desde o início deste processo, a Superintendência de Desenvolvimento de
Ensino/Assessoria Especial de Articulação Pedagógica, participou de reuniões de
planejamento nas Unidades de Educação, sempre a convite da Unidade de Educação,
abríamos essa conversa com um poema do Manoel de Barros, do qual destacamos aqui um
trecho: “Quem acumula muita informação, perde o condão de adivinhar: divinare. Os sabiás
divinam”. (BARROS, 1998).
Para nós, foi uma forma poética de trazer para esta conversa a poesia presente nas
artes do fazer docente e a possibilidade de pensar sobre este fazer, sobre o imprevisto, aquilo
que ainda não foi criado, um convite para nos sabermos sabiás. Estão todos convidados a
ecoar seu canto...

Superintendência de Desenvolvimento de Ensino


34

2. MOVIMENTO PARA ELABORAÇÃO DOS REFERENCIAIS CURRICULARES


DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI

O peso da pergunta numa prática educativa mostra e


desdobra seu sentido: o de colocar em questão o
mundo e expor que, sendo como é, ele poderia ser
também de muitas maneiras (KOHAN, 2019, p. 160).

Sensibilizados por esta epígrafe de abertura, em que Walter Kohan (2019, p. 160) nos
inspira a pensar a educação rememorando Paulo Freire, voltamo-nos aos ensejos de revisão do
documento curricular da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, um convite que nos
instiga a mobilizar sentidos sobre o lugar da pergunta, da provisoriedade do conhecimento,
dos processos discursivos que redimensionam as produções curriculares, as relações escolares
que impulsionam o aprender a aprender com a ciência, a arte, a poesia, a dimensão cultural da
vida, frente ao imprevisível (inesperado) com o qual nos deparamos diariamente dentro e fora
da escola. Esses são horizontes que provocam a construção destes Referenciais Curriculares.
Ao nos debruçarmos neste intento, muitos desafios estão postos, entre eles: mobilizar
sentidos junto aos profissionais da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói e a
comunidade escolar; produzir um documento que dialogue com o documento curricular
anterior, visto que politicamente, este também passou por processos democráticos para sua
elaboração e contempla narrativas potentes quanto ao trabalho pedagógico desta Rede; e
como construir um documento curricular que, ao afirmar sentidos, mesmo que provisórios,
não congele práticas pedagógicas, nem conduza a um controle, a uma regulação que restrinja
experiências e sentidos da prática educativa.
Consideramos relevante destacar que, frente aos desafios, observamos, como potência
durante esta construção, o seu processo de elaboração, ocorrido ao longo dos anos de 2019 e
2020, com a possibilidade de favorecer encontros pedagógicos e amplas trocas para, desse
modo, fortalecermos o debate e o nosso diálogo enquanto coletivo da Rede.
A produção deste movimento de discussão curricular, desde o seu início, assumiu o
compromisso de abraçar os desafios da Educação Pública Municipal como pertinente a todo o
coletivo que o protagoniza. Contudo, sem pretender abarcar todo o movimento de corrente
desta revisão curricular, a seguir, apresentamos marcos deste processo, ações e
desdobramentos.
No final de 2018, a Assessoria Especial de Articulação Pedagógica foi mobilizada
para construir junto a Rede Pública Municipal de Educação de Niterói um movimento
coletivo para revisão do documento curricular de 2010. Identificamos como argumentos para
35

revisão dos Referenciais Curriculares para a Rede Municipal de Ensino de Niterói: uma
construção coletiva/2010, mudanças do contexto político, social e educacional após dez anos
de sua elaboração; demanda para revisão do documento, apresentada por Diretores/as e
Pedagogos/as frente à complexidade do cotidiano escolar em reunião com a Assessoria
Especial de Articulação Pedagógica, no dia 08 de outubro de 2018; necessidade de mobilizar
discussões entre os profissionais da rede e a comunidade escolar, para que através de processo
participativo e deliberativo, fosse produzido documento curricular que nos fortalecesse
enquanto Rede Pública Municipal de Educação, em consonância com as Diretrizes
Curriculares da Educação Básica, passando pelo estudo sobre a Base Nacional Comum
Curricular (BNCC). Pensamos que ao firmarmos neste documento nossas escolhas
pedagógicas, ele poderá favorecer a tomada de decisão por parte de instâncias macro para
proposição de políticas curriculares negociadas.
Podemos citar como alguns dos objetivos para realizar este movimento: fomentar o
debate sobre as produções curriculares e a possibilidade do registro destes sentidos para nos
compreendermos como Rede Pública Municipal de Educação; aprimorar o trabalho
pedagógico para Educação com crianças, adolescentes, jovens e adultos em fomento às
aprendizagens e ao desenvolvimento pelas Ciências, Artes e Tecnologias; valorizar as
produções de saberes locais, outras epistemologias, as negociações de sentidos; fortalecer
através de processos formativos, a alteridade, a diferença, culturas e meio ambiente; favorecer
a integração entre os segmentos; envolver a comunidade escolar quanto ao sentimento de
corresponsabilidade e parceria frente aos desafios da educação; incentivar o protagonismo
docente e discente pelos princípios éticos, políticos e estéticos.
Durante os anos de 2019 e 2020, podemos considerar como tônica da elaboração deste
documento sua articulação com os processos formativos e o diálogo constante entre a
Educação Básica e o Ensino Superior, com a colaboração de diferentes grupos de pesquisa.
Em 2019, o processo voltou-se para uma dinâmica de mobilização e a simultaneidade
de cursos e encontros voltados para revisão da versão anterior e para a escrita do documento
curricular. Já no início de 2020, a versão preliminar foi encaminhada para as escolas,
solicitando a participação destas através de pareceres que envolvessem toda a comunidade
escolar. Concomitantemente à elaboração destes pareceres por parte das Unidades de
Educação, as formações na Rede foram acontecendo por meio de encontros on-line (em
decorrência da situação pandêmica instaurada durante este ano) como propósito da análise da
versão preliminar.
36

Podemos indicar as ações centrais inerentes ao processo de revisão curricular que


ocorreram em 2019 quanto a participação da gestão central da Secretaria Municipal de
Educação, Ciência e Tecnologia (SEMECT)/Fundação Municipal de Educação (FME); os
encontros de cunho formativo com palestras envolvendo a articulação entre a Educação
Básica e o Ensino Superior; e os encontros por representatividade das Unidades de Educação
tendo em vista as proposições e a operacionalização coletiva para definições dos princípios e
dos pressupostos dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de
Niterói, entre outras ações.
Abaixo apresentamos quadros com as especificidades de ações referentes à revisão dos
Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói/2010 durante o
ano de 2019.

Quadro com a participação da gestão central da SEMECT/FME.

Equipe gestora da SEMECT Evento

Participação em fóruns promovidos pela Undime


Secretária Municipal de Educação e – União Nacional dos Dirigentes Municipais de
Subsecretária Municipal de Educação Educação (7° Fórum Nacional Extraordinário e
17° Fórum Nacional).

Organização de evento da SEMECT, sediando


encontro do Conselho Estadual de Educação,
Secretária Municipal de Educação
para consulta pública acerca da Base Curricular
do Estado do Rio de Janeiro.

Quadro dos seminários internos promovidos pela Superintendência de


Desenvolvimento de Ensino, envolvendo as equipes pedagógicas da SEMECT/FME, como as
Diretorias, Núcleos e suas Assessorias.

Seminário Interno FME/FSDE -


Data Pautas e temas discutidos nos Grupos de Trabalho (GTs) com equipes
pedagógicas da SEMECT/FME
GT1-“Transição da educação infantil para o ensino fundamental: escolarização da
12/07/2019 educação infantil?”
GT2-“Alfabetização nos anos iniciais: posições em debates”
GT3-“O Professor especialista e sua investigação pedagógico-didática e
12/07/2019 instituinte”
37

GT4-“Educação de Jovens e Adultos: implicações pedagógicas em diferentes


contextos”

Os quatro GTs internos se reuniram para estudo e debate em continuidade ao


processo.
A Superintendência de Desenvolvimento de Ensino sugeriu com referências de
leituras:
MACEDO, Elizabeth. Base Nacional Comum para Currículos: direitos de
29/08/2019 aprendizagem e desenvolvimento para quem? Educação e Sociedade, Campinas,
v. 36, n.133, out/dez, 2015.
_______. Currículo como espaço-tempo de fronteira cultural. Revista Brasileira
de Educação.v.11, n.32, maio/ago,2006.
_______. Currículo e Conhecimento: Aproximações entre educação e ensino.
Cadernos de Pesquisa, v.42, n.147, set/dez, 2012.

Os quatro GTs internos se reuniram para estudo e debate em continuidade ao


30/09/2019 processo para organização dos encaminhamentos a partir de dados já coletados do
processo de construção junto à Rede Pública Municipal de Educação de Niterói.

Cada GT produziu uma primeira “boneca” como estruturação dos Referenciais


11/10/2019
Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói escritos.

Houve a palestra presencial no auditório Darcy Ribeiro (Casa Amarela) do Prof.


21/10/2019 Wagner Palanch, Diretor de Currículos da Secretaria Municipal de São Paulo
tratando sobre o movimento de revisão curricular paulista.

Produção do texto da primeira versão para os Referenciais Curriculares da Rede


19/11/2019 Pública Municipal de Educação de Niterói com a compilação dos conceitos,
pressupostos, princípios e decisões que foram tomadas junto ao coletivo da Rede.3

Quadro de encontros provocativos e propositivos junto às Unidades de Educação com


foco na revisão curricular/2019.

Etapa/Modalidade/Setor Evento Datas

Encontros dos GTs por 30/08, 27/09,17/10,


Educação Infantil representatividade das Unidades de 31/10 e14/11/2019
Educação.

3
Este foi um primeiro movimento de escrita do texto para os Referenciais Curriculares, que, ao ser encaminhado
para as Unidades de Educação em 2020, passou por modificações em diálogos com a Rede, até assumir a
versão Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói entregue ao Conselho
Municipal de Educação em 14 de dezembro de 2020.
38

III Seminário da Educação Infantil: Eu


Educação Infantil fico com a pureza da resposta das 25 e 26/09/2019
crianças.
14/08, 04/09, 25/09 e
16/10/2019
(Matemática, Ciências e
Arte)

14/08, 04/09, 25/09 e


09/10/2019
Ensino Fundamental Encontros GTs com representatividade (Educação Física)
(1°e2°,3°e4°ciclos) dos docentes das Unidades de Educação.
14/08, 11/09, 09/10,
16/10 e 30/10/2019
(Língua Portuguesa,
História, Geografia,
Língua Estrangeira-
Inglês, Espanhol e
Francês)
Ensino Fundamental IV Jornada de Alfabetização do
02 e 03/10/2019
(1° e 2° ciclos) Município de Niterói.
A Relação da Educação Infantil com o
Educação Infantil e Ensino 1° ciclo do Ensino Fundamental: diálogo 19/06, 10/07, 30/10 e
Fundamental (1° e 2° ciclos) sobre/com as infâncias nos espaços 04/12/2019
educativos.
Encontros dos GTs por adesão e 14/08, 21/08,
Educação de Jovens e Adultos representatividade das Unidades de 28/08,02/10, 16/10 e
Educação. 23/10/2019
Encontros dos GTs sobre Educação
Ambiental (com 39 participantes e como
desdobramento dos encontros 21/08, 18/09 e
Núcleo de Ações Integradas
presenciais aconteceram discussões 02/10/2019
permanentes por meio de Whatsapp, e-
mail e drive).
III Fórum de Educação Ambiental –
Núcleo de Ações Integradas Meio Ambiente e Currículo (com 72 07/08/2019
participantes).
Superintendência de
Jornada de Relações Étnico-Raciais e
Desenvolvimento de Ensino e 27/08/2019
Currículo.
Núcleo de Ações Integradas

I Jornada de Avaliação (organizada em


três eixos:
Eixo 1- relatos de experiência dos
profissionais da Rede trazendo reflexões
acerca da avaliação da aprendizagem;
Assessoria de Avaliação
Eixo 2 - relatos que apresentaram 28/08/2019
Institucional
experiências relacionadas às avaliações
externas;
Eixo 3 - relatos nos quais se destacaram
indicadores construídos como
parâmetros autoavaliativos das Unidades
de Educação para reflexão de propostas
39

que articulam planejamento e avaliação


em prática participativa.

Semana Municipal de Inclusão Digital:


Mesa redonda “Currículo e Cultura
Digital: o papel da escola nesse
contexto”, com mediação da Prof.ª Dra.
Cristiane Gonçalves de Souza e palestras
do Prof. Dr. Alexandre
Farbiarz/PPGMC-UFF, da Prof.ª Dra.
Assessoria de Mídias e Novas Dagmar de Melo e Silva/PPGMC-UFF e 25 a 27/06/2019
Tecnologias do Prof. Dr. Marco Braga/CEFET-RJ;
Relatos de Experiência;
Painel digital colaborativo;
Mostra de atividades produzidas pelos
estudantes participantes do Projeto
Robótica Educacional da Rede Pública
Municipal de Educação de Niterói no
Robótica Day.

Quadro com as formações ocorridas em 2019 através da articulação entre a Educação


Básica, o Ensino Superior e o Ministério da Educação (PACTO NACIONAL DE
ALFABETIZAÇÃO NA IDADE CERTA/PNAIC).

Ciclos e
Instituição/Coordenador(es) Evento Modalidades para Datas
formação docente
22/05, 29/05,
12/06, 19/06,
PROPED/UERJ e UFRJ 03/07, 10/07,
Prof. Dr. Guilherme Augusto Educação Infantil 14/08, 28/08,
Curso de Extensão:
e Ensino 11/09,
Rezende Lemos Produção Curricular
Fundamental 25/09,09/10,
Prof. Dr. Thiago Ranniery 16/10, 13/11,
27/11, 04/12 e
11/12/2019
UNIRIO (Grupos de pesquisa
NINA e GITAKA)
03/04, 17/04,
Prof.ª Dra. Léa Tiriba Curso: Infâncias, Natureza 12/06,14/08,
Educação Infantil
e Artes 18/09, 16/10 e
13/11/2019

PROPED/UERJ As muitas faces de uma


Prof.ª Dra. Vera Maria Ramos Educação Infantil 28/11/2019
creche
de Vasconcellos
40

PNAIC (Pacto Nacional pela Alfabetização, leitura e 18/03, 15/04,


Alfabetização na Idade Certa) escrita como processo Ensino 10/06, 01/07,
discursivo e suas Fundamental
UFRJ 19/08, 09/09 e
implicações no currículo – (1º e 2º ciclos)
Diretoria de 1° e 2° ciclos em 14 polos. 21/10/2019
PNAIC (Pacto Nacional pela Formação sobre Ensino
Alfabetização na Idade Certa) 26/02 a
Alfabetização Fundamental
27/11/2019
– EAD On-line (64 horas) (1° e 2° ciclos)
PNAIC (Pacto Nacional pela Ensino 17/04, 29/05,
Alfabetização na Idade Certa) Oficinas presenciais sobre Fundamental 12/06, 07/08,
Alfabetização (1° e 2° ciclos)
UFRJ 18/09/2019
Pedagogia Social da UFF -
PIPAS/UFF
Docentes da Rede
Prof.ª Dra. Margareth Martins
Pública Municipal
Araújo
Roda de Conversa: de Educação de
Prof.ª Dra. Gelta Terezinha
Diversidade e Currículo, o Niterói e 14/05/2019
Ramos Xavier
que temos para hoje? integrantes do
Prof.ª Dra. Cristiane Gonçalves
grupo de pesquisa
de Souza
PIPAS.
Mediadora: Márcia Bazhuni
Pombo

Quadro de consultas em links e construções de drives das equipes pedagógicas da


SEMECT/FME às Unidades de Educação.

Levantamento por consultas em link se construções de textos


Diretoria / Assessoria /
coletivos através de drives das equipes pedagógicas da
Núcleo
SEMECT/FME às Unidades de Educação
Consultas em links com levantamento sobre a BNCC, atéo dia
Educação Infantil
12/08/2019.
Consultas em links acerca da Revisão dos Referenciais Curriculares e do
3° e 4° Ciclos
diálogo com a BNCC, até o dia 19/07/19.
Construção de drives no “Gmail”, organizados por cada componente
1° e 2° Ciclos e curricular, para construção coletiva de textos e matrizes curriculares do
3° e 4° Ciclos
Ensino Fundamental.

Núcleo de Ações Construção de textos coletivos em continuidade às discussões


Integradas presenciais sobre Educação Ambiental e Currículo
Construção de drive no “Gmail”, para escrita sobre Formação do Leitor,
Promoção da Leitura Leitura Literária e Currículo.

Mencionamos ainda os comunicados através de Ofícios Circulares da


Superintendência de Desenvolvimento de Ensino às Unidades de Educação da rede: envio de
Ofício Circular n.°7, de 29 de janeiro de 2019, solicitando a participação de todos os
41

profissionais das Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEIs) e Escolas Municipais


(EMs) para produção dos Novos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de
Educação de Niterói; e o envio às Unidades de Educação de textos acadêmicos, do documento
das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil/2009 e da BNCC, assim como, de
artigos científicos que fomentaram a análise crítica destes documentos nos Conselhos de
Planejamento da Unidade de Educação, CAP UE, em 1/02, 30/07 e 31/07/2019 e na
Formação Continuada, em 04/02/2019. Houve também o fomento às reflexões junto ao corpo
docente das Unidades de Educação (EMs/UMEIs e Núcleos Avançados de Educação Infantil),
através de formações continuadas, durante o horário de planejamento coletivo, sob o título
“Diálogos sobre a BNCC”, a partir do convite das Gestoras Escolares.
Em 2020, foi enviada às Unidades de Educação e para professores universitários (de
referência em suas áreas de pesquisa), a versão preliminar dos Referenciais Curriculares da
Rede Pública Municipal de Educação de Niterói/2020. A partir do documento recebido, foram
realizadas novas discussões com docentes e equipes de articulação pedagógica, com em média
80 participantes por sessão. Foram elas:

Diálogos sobre os
Referenciais Curriculares da
Professor Convidado Instituição Data
Rede Pública Municipal de
Educação de Niterói

Prof.ª Dra. Carmen Teresa


UFRJ História 25/05/2020
Gabriel Le Ravallec

Prof.ª Dra. Ana Maria


Monteiro UFRJ História 18/06/2020

Prof.ª Dra. Maria Margarida


Gomes UFRJ Ciências 19/06/2020

Prof. Dr. Adriano Freitas


UFF
Vargas Educação de Jovens e Adultos 23/06/2020
UFRJ
Prof. Dr. Thiago Ranniery
Prof.ª Dra. Ana Angelita C. N.
da Rocha UFRJ Geografia 26/06/2020

Prof.ª Dra. Márcia Serra


Ferreira UFRJ Ciências 09/07/2020

Prof. Dr. Wilson Cardoso


Júnior UFRJ Artes 04/08/2020
42

Prof.ª Dra. Sandra Selles UFF Ciências 20/08/2020

Prof. Dr. Diego Vargas UNIRIO Língua Espanhola 25/08/2020

Secretaria
Municipal de
Prof.ª Dra. Denise Souza
Educação de Educação Física 04/09/2020
Destro
Juiz de
Fora/MG
Prof.ª Dra. Cecília Goulart
UFF Alfabetização na Perspectiva
Prof.ª Dra. Maria Cristina 04/09/2020
IFRJ Discursiva
Corais
Leitura e Escrita na Educação
Prof.ª Dra. Bruna Molisani FFP/UERJ Infantil: a criança como sujeito 10/09/2020
da linguagem
Prof.ª Dra. Andrea Vieira
UNIRIO Matemática 14/09/2020
Thees

Leitura e Escrita na Educação


Prof.ª Dra. Adriana da Mata UFF 15/09/2020
Infantil: concepções e práticas
Prof.ª Dra. Anabelle Loivos
Considera
Prof.ª Dra. Andrea Serpa UFRJ A Leitura Literária e a
Prof.ª Cássia Continentino UFF Formação do Leitor-Autor na 17/09/2020
Prof.ª Maria Julião dos Reis FME Escola
Bibliotecária Jandira da Silva
de Jesus
Secretaria
Municipal de Práticas antirracistas no
Prof.ª M.ª Angela Ramos 22/09/2020
Educação do cotidiano na Educação Infantil
Rio de Janeiro
Prof. Dr. Ivo da Costa do
UFF Língua Portuguesa 25/09/2020
Rosário

Docência na Educação Infantil:


Prof.ª Dra. Ligia Aquino UERJ 30/09/2020
a formação nossa de cada dia
Docência com Bebês na
Prof.ª Dra. Nazareth Saluto UFF Educação Infantil: a construção 23/10/2020
do cotidiano nos detalhes
Concepções entre Criança e
Prof.ª Dra. Vera Maria Ramos Infâncias no RCEI de Niterói:
UERJ 28/10/2020
de Vasconcellos conversa sobre docência na
educação infantil
Poéticas Negras: inspirações
Prof.ª Mª Greice Duarte UFF para a luta antirracista na 29/10/2020
Educação Infantil
Os Desafios da
Prof.ª Dra. Heloisa Carreiro FFP/UERJ Decolonialidade da Literatura 13/11/2020
Infantil: questões para se
43

pensar a educação literária das


crianças pequenas

Leitura Literária na Educação


Prof.ª Dra. Fernanda Frambach FME 17/11/2020
Infantil
Relação entre Brinquedo,
Prof.ª Carita Portilho de Lima 01/12 e
UFPB Brincadeira e Desenvolvimento
Prof. Francisco Ribeiro Viana 08/12/2020
Humano

Em 2020, houve a continuidade na parceria com a UNIRIO (grupos de pesquisa NINA


e GITAKA), com o curso de extensão “Infâncias Brasileiras: pandemia, desemparedamento e
decolonialidade” em busca de uma pedagogia nossa (foram oferecidas 250 vagas para
profissionais de Niterói), em 02/10, 07/10 e 21/10/2020, 04/11 e 18/11/2020 e 02/12 e
16/12/2020. Assim como, Rodas de Conversa: “BNCC, Ensino de Ciências e Prática Docente:
o que temos para discutir em tempos de Covid-19?” integradas ao Projeto ABEsc – ABQ vai
à escola, em 22/10 e 27/10/2020,10/11 e 26/11/2020 e 08/12/2020.
As Equipes Pedagógicas da SEMECT/FME, através de convite das Unidades de
Educação, estiveram em formações no horário de planejamento fomentando debates, como
apresentamos no quadro a seguir.
Quadro de formações oferecidas por integrantes das Equipes Pedagógicas da
SEMECT/FME às Unidades de Educação em horário de planejamento coletivo semanal.

Setor da
Integrante da Equipe Formação
SEMECT/FME

“A Importância da Música para


Diretoria de Educação
Prof.ª M.ª Eliza Pandino elaboração do currículo na Educação
Infantil
Infantil”
Diretoria de Educação “Um tempo para poesia: Conversas
Prof.ª M.ª Fernanda Bortone
Infantil sobre artes, infância e imaginação”

Diretoria de Educação
Prof.ª M.ª Fernanda Bortone “Bidocência na Educação Infantil”
Infantil

Diretoria de Educação “A representatividade negra dentro e


Prof. ª M.ª Andréia Diniz
Infantil fora do livro: mito ou realidade?”

Diretoria de Educação Prof.ª Delma Marcelo dos “Trabalho Pedagógico da/na Educação
Infantil Santos Infantil em Niterói”
44

Diretoria de Educação
Prof.ª Lucimeire Bezerra Costa “Desenvolvimento Infantil”
Infantil

“Os Referenciais Curriculares e a


Promoção da Leitura Prof.ª Ms Elana Costa
BNCC”
Superintendência de
Prof.ª Dra. Cristiane Gonçalves “BNCC: Sentidos em disputa pela
Desenvolvimento de
de Souza significação da produção curricular”
Ensino
Superintendência de “Em foco: a BNCC e o documento
Prof.ª M.ª Sandra Cristina
Desenvolvimento de preliminar do Referencial Curricular
Ferreira de Sousa
Ensino para a educação infantil/Niterói”

Os pareceres enviados pelas Unidades de Educação para a Superintendência de


Desenvolvimento de Ensino, entre os meses de julho a outubro de 2020, foram distribuídos
entre as Diretorias, Assessorias e Núcleos da Secretaria Municipal de Educação, Ciência
e Tecnologia e da Fundação Municipal de Educação. Recebemos das Unidades de
Educação cinquenta e seis pareceres em um universo de noventa e três Unidades de Educação.
Após análise destes pareceres, em articulação com a versão preliminar do documento
curricular, houve a reescrita do texto final, como minuta dos Referenciais Curriculares da
Rede Pública Municipal de Educação de Niterói/2020, posto à submissão do Conselho
Municipal de Educação de Niterói, em dezembro de 2020.
Destacamos que para a escrita dos Referenciais Curriculares da Rede Pública
Municipal de Educação de Niterói/2020, tomamos como fio condutor as narrativas dos
profissionais das Unidades de Educação em articulação com referenciais teóricos que nos
ajudam a pensar, a sentir e a construir movimentos instituintes de sentidos nas escolas. Mais
do que instituir arbitrariamente valores, conceitos, objetos de conhecimento, objetivos de
aprendizagem para os ciclos e as metodologias, procuramos articular saberes, experiências no
âmbito do trabalho pedagógico da Rede, de modo a nos organizar enquanto coletivo e
favorecer a construção de caminhos possíveis de nossa prática educativa.
Consideramos oportuno mencionar que o registro deste processo, com desdobramento
das ações aqui indicadas, traz para o presente os acontecimentos que demandam as produções
de sentidos que emergem para além do texto escrito destes Referenciais Curriculares.

3. EDUCAÇÃO E INCLUSÃO: DIREITOS DE TODOS


45

A lógica presente no discurso positivista, que fundamenta o modelo médico, permitiu


olhar para a deficiência enfatizando as questões fisiológicas e/ou biológicas, com o objetivo
de restaurar o corpo à normalidade, tratando ou amenizando as diferenças. O ato de perceber o
diferente como alguém fora da norma traz aspectos negativos às práticas pedagógicas e
discursivas, que não contribuem para a formação crítica do professor e para a construção de
uma sociedade mais justa. O “outro”, nesse sentido, segundo Veiga-Neto (2011), pode ser
considerado como depositário de todos os males da humanidade, como sujeito pleno de uma
marca cultural ou como alguém a tolerar. Esse tipo de pensamento serviria para engessar
ainda mais as nossas proposições acerca da diferença. Para Larrosa e Perez (1998):

A alteridade do outro permanece como reabsorvida em nossa identidade e a


reforça ainda mais; torna-a, se é possível, mais arrogante, mais segura e mais
satisfeita de si mesma. A partir desse ponto de vista, o louco confirma nossa
razão; a criança, nossa maturidade; o selvagem, nossa civilização; o
marginalizado, nossa integração; o estrangeiro, nosso país; o deficiente,
nossa normalidade (LARROSA E PEREZ, 1998 apud VEIGA-NETO, 2011,
p. 124).

Apesar do caminho no fio da navalha, não é impossível a tarefa de educar na


diferença. Dizer que todos os alunos devem estar matriculados nas escolas regulares não é o
mesmo que dizer que todos devem aprender da mesma maneira. Diante disso, expor os
argumentos que fundamentam a inclusão educacional torna-se fundamental para o êxito das
políticas públicas de inclusão escolar. Vamos à discussão teórica de, pelo menos, três motivos
que fundamentam a perspectiva da inclusão educacional.

3.1 Por que é lei

O reconhecimento da escolarização para todos pode ser considerado um


acontecimento que trouxe novas percepções sobre espaços e tempos, mas que carregou
consigo um volume inestimável de propósitos de mudança, novos desafios, novos olhares,
novos sujeitos. Esse acontecimento fez-se acompanhar de políticas públicas que visam à
garantia de acesso às escolas, no sentido de garantir a presença de todas as crianças no
ambiente escolar, de permanência e de qualidade no processo de aprendizagem. Os
procedimentos implementados dirigem-se especialmente aos sujeitos com deficiência, uma
vez que eles que vêm sendo historicamente excluídos da educação escolar.
A partir da demanda social, diversos outros dispositivos e diretrizes institucionais
foram estabelecidos no sentido de garantir e promover a Educação Básica para todos os
46

alunos, sem exceção. Um desses dispositivos é o Estatuto da Criança e do Adolescente


(ECA/1990), que dispõe, em seu artigo 13, que “a criança e o adolescente gozam de todos os
direitos inerentes à pessoa humana” (BRASIL, 1990) e que as crianças e os adolescentes
“portadores de deficiência” 4 têm direito ao “atendimento educacional [...] preferencialmente
na rede regular de ensino” (BRASIL, 1990, Art. 54, inciso III). Já a Política Nacional de
Educação Especial (BRASIL, 1994, p. 7) estabeleceu objetivos gerais e específicos referentes
à “interpretação dos interesses, necessidades e aspirações de pessoas portadoras de
deficiências, condutas típicas e altas habilidades”. Alguns anos depois, foi estabelecida a
Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, Decreto n.º 3.298
(BRASIL, 1999), que estabeleceu a “matrícula compulsória de pessoas com deficiência em
escolas regulares”.
De acordo com a documentação vigente, podemos perceber que a inclusão educacional
está estreitamente implicada com a inclusão social. O Projeto Educar na Diversidade: material
de formação docente elaborado pelo MEC (BRASIL, 2005) salienta que “[...] a educação
inclusiva é um aspecto da sociedade inclusiva”. Em 2006, o Brasil promulga a Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006), por meio do Decreto n.º
6949/2009, assumindo o compromisso de assegurar o acesso das pessoas com deficiência a
um sistema educacional inclusivo em todos os níveis e de adotar medidas que garantam as
condições para sua efetiva participação. Desse modo, a inclusão educacional é um direito do
estudante e requer mudanças na concepção e nas práticas de gestão, de sala de aula e de
formação de professores para a efetivação do direito de todos à escolarização.
Fundamentada nos marcos legais e princípios pedagógicos da igualdade de condições
de acesso e à participação em um sistema educacional inclusivo, a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008) define a Educação
Especial como modalidade de ensino transversal a todos os níveis, etapas e modalidades.
Ainda disponibiliza recursos, serviços e o atendimento educacional especializado,
complementar ou suplementar, aos estudantes com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades/superdotação no ensino regular.
Mais recentemente, foi promulgada a Lei n.º13.146/2015, Lei Brasileira de Inclusão
(LBI, 2015), que promove uma grande mudança de perspectiva sobre a palavra “deficiência”.

4
A PEC 25/2017 muda na Constituição Federal. Expressões como “pessoa portadora de deficiência” ou
“portador de deficiência” serão substituídos por “pessoa com deficiência”. A PEC padroniza o termo em 10
artigos da Carta Maior. A padronização segue a Convenção Internacional sobre o Direito das Pessoas com
Deficiência, da Organização das Nações Unidas, criada em 2006.
47

Antes desta Lei, a visão que existia era de que a deficiência era uma condição das pessoas.
Hoje, ela é entendida como uma situação dos espaços (físicos ou sociais), que não estão
prontos para recebê-las. A tendência atual é enxergar, cada vez mais, a educação como
inclusiva e, cada vez menos, como especial. Isso significa que as metodologias, espaços e
materiais devem ser capazes de atender a todos, ao longo da vida e com foco na
potencialidade, segundo o art. 27 da LBI:

A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurado sistema


educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a
vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus
talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas
características, interesses e necessidades de aprendizagem (BRASIL, 2015).

3.2 Por que as vivências são as ações modeladoras do ato de aprender

As Neurociências envolvem áreas diversas, visando a agregar conhecimentos para os


estudos sobre os atos intermediados pelo cérebro. Não se trata somente de pensar no cérebro
como estrutura anatômica, mas nas conexões neurais em funções desempenhadas, em etapas
do desenvolvimento, nas relações estabelecidas. Dessa maneira, as Neurociências articulam-
se com a Educação no sentido essencial de buscar entender os processos relativos à
aprendizagem.
Aprender é um conceito amplo, diretamente ligado às oportunidades experimentadas
pelos sujeitos. Não basta ter acesso à informação, é necessário transformá-la em algo
significativo, substrato, que será consolidado como algo aprendido. Envolve o discente como
agente ativo do próprio aprendizado, o professor como mediador das experiências, as ações
pedagógicas planejadas como cenário, as famílias engajadas e atentas ao desenvolvimento de
suas crianças e adolescentes. Sendo assim, fatores cognitivos, emocionais, socioculturais,
intra e interpessoais, de maneira geral, são importantes para o processo de aprendizagem
(PEREIRA, 2010).
Diante das experiências vivenciadas rumo a serem aprendidas, o cérebro modifica-se,
modelando-se em circuitos que formam redes para o aprendizado. A Neuroplasticidade,
fenômeno complexo que ocorre devido à exposição aos mais diversos estímulos, sejam
internos ou externos, evidencia que a imersão sociolinguística é um fator determinante para
mudanças neuronais que desejamos para um cérebro em desenvolvimento.
48

Nesse sentido, as ações pedagógicas constituem o substrato em que os profissionais da


Educação medeiam a inclusão dos alunos em esferas sociais mais complexas, provendo
acesso ao conhecimento de mundo que os permitirão exercer cidadania, autonomia e
criatividade. Nesses ambientes pedagogicamente estruturados, as relações dialógicas
configuram-se em ferramentas de reconhecimento, de conhecimento e transformação.
De fato, devemos ressaltar a potência que é validar o aprendizado dos diferentes,
consolidando a ideia de diversidade como realidade. Numa rede pública de Educação, de salas
heterogêneas quanto aos seus alunos, professores, localidades e realidades, traçar um modelo
único excluiria a possibilidade da diferença. A proposta, então, aponta para a construção dos
horizontes desejados para esse processo de ensino-aprendizagem que envolve desafios
complexos e muitas incertezas, mas que se consolida em práticas cientificamente embasadas,
engajadas e afetivas.

3.3 Por que a escola continua sendo o espaço no qual se é possível viver a experiência da
aprendizagem

O par experiência/sentido apresentado por Larrosa (2016) permite-nos pensar na


inclusão sem a tentativa de revelar a verdadeira natureza da aprendizagem e focalizar maior
atenção na experiência como uma forma de ser e de estar no mundo, não como um
conhecimento científico acumulado que está fora de nós, mas assumindo um estilo, uma
postura ética, estética e política de conduzir a vida e, portanto, as interações com os outros nos
espaços de convivência, entre eles, a escola, entendendo que a experiência "é em primeiro
lugar um encontro ou uma relação com algo que se experimenta, que se prova" (Ibid ,p. 26).
A possibilidade de uma experiência tem um pouco do princípio de reflexividade, "um
movimento de ida porque a experiência supõe um movimento de exteriorização, de saída de
mim mesmo, de saída para fora, um movimento que vai ao encontro com isso que passa, ao
encontro do acontecimento." (LARROSA, 2011, p. 6). E é a partir da inserção no espaço
interativo que fazemos da experiência a "passagem da existência, a passagem de um ser que
não tem essência ou razão ou fundamento, mas que simplesmente 'existe' de uma forma
sempre singular, finita, imanente, contingente" (LARROSA, 2016, p. 27).
Segundo Larrosa (2016, p. 32), "o saber da experiência é um saber que não pode
separar-se do indivíduo concreto em quem encarna". É por meio da possibilidade de
transformação de nós mesmos e dos outros, como o território de passagem ou como lugar de
49

chegada, que a transformação acontece, ainda que as críticas aos fazeres da escola como
produtores de indivíduos para o trabalho sejam cada vez mais acirradas. É em meio às críticas
que se insere a luta por acessibilidade e inclusão.

4. EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA: PERSPECTIVAS


CURRICULARES EM CONSTRUÇÃO

A expressão “Direitos Humanos” historicamente tem sido empregada em uma


perspectiva marcada por um processo dialético e que apresenta diferentes marcadores
culturais, concebendo-a como uma das maiores conquistas da humanidade e constituindo,
assim, as identidades dos povos em suas formações ao longo do tempo.
A construção histórica do termo possui dimensões de ordem política, social e cultural,
apresentando múltiplas expressões de práticas e de linguagens, elaboradas com base nas
noções do reconhecimento da dignidade humana e dos direitos sociais em cada território.
Entretanto, devemos reconhecer que esta construção não se consolidou em alguns estados-
nações, o que nos leva a refletir a ideia de construção e de (re)elaboração histórica de direitos
humanos no mundo. A ideia de sua universalização não se consolidou em todo o mundo,
apesar de ser essa a premissa dos organismos internacionais.
Se, no âmbito das relações sociais historicamente constituídas, os direitos humanos
foram concebidos em razão das mudanças de paradigmas, expressadas pelo acúmulo de
experiências entre os diferentes povos, em busca de respostas às suas expectativas e demandas
sociais, podemos compreendê-los como um processo político e educativo. Político porque tal
processo se insere no campo simbólico das lutas travadas em busca de um novo contexto
humanizador e civilizatório, potente em seus objetivos e propostas para a implementação de
novos projetos societários de cidadania. Educativo porque possui uma dimensão ideológica de
difusão coletiva sobre a importância que todos os cidadãos possuem. Com efeito, é mister
considerar que, assim como a dimensão política pode sofrer variações nos distintos territórios,
seu caráter educativo também deve ser passível de diferentes interpretações e concepções com
base na experiência de cada país. Sendo assim, ambas as dimensões são indissociáveis.
Os parâmetros normativos que orientam tal concepção se fundamentam na Declaração
Universal de Direitos Humanos de 1948, na Convenção sobre os Direitos da Criança (1989),
ratificada por 196 países, na Constituição Federal de 1988, no Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei nº. 8069/1990), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n.º
50

9394/1996), no Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, nas Diretrizes Nacionais


Para a Educação em Direitos Humanos dentre outros instrumentos normativos similares em
vigência.
O primeiro artigo da Declaração Universal (1948) alude que “todos os seres humanos
nascem livres e iguais em dignidade e direitos, dotados de razão e consciência, devem
comportar-se fraternalmente uns com os outros”. (Declaração Universal dos Direitos
Humanos, 1948, Art. 1º)
No âmbito da Convenção dos Direitos da Criança, ficam estabelecidas as diversas
condições que garantem uma Educação em Direitos Humanos que priorize o direito da criança
a ter um desenvolvimento integral pleno, concebido como dever do Estado, da sociedade e da
família.
Nesse contexto, principalmente a partir do processo de redemocratização do Estado
brasileiro em meados da década de 1980, com as reivindicações dos diversos segmentos da
sociedade, novas concepções de direitos (civis, políticos e sociais) foram sendo
ressignificadas no âmbito das políticas públicas. Naquele momento, adquirem especial
relevância as atividades de Educação em Direitos Humanos. Uma nova consciência social e
coletiva surge pela potência que marca a luta dos movimentos sociais no Brasil pelo
reconhecimento da dignidade dos seus cidadãos.

[...] Por se apresentar como fenômeno multifacetado, exige, para sua


compreensão, não só repensá-lo no interior de um horizonte histórico, mas
que a este horizonte histórico se incorporem às noções de complexidade
manifestas na cultura político-social de uma sociedade que produz (e
reproduz) a comunidade e a sociedade de direitos (VIOLA, 2007, p. 119).

Sendo assim, a proposta da Educação em Direitos Humanos parte do princípio da


necessidade de mudanças das práticas sociais e da luta pelo movimento social e coletivo de
uma práxis dialógica, que possui por atributos a horizontalidade e a igualdade de valor na
ótica da dimensão humana em sua essência.
Nesse sentido, em que pese o caráter educativo da concepção de Educação em Direitos
Humanos, compreende-se que ele possui dimensão histórica e se fundamenta nas propostas
das diretrizes dos organismos internacionais, devidamente concebidas na perspectiva da
dignidade humana. A educação em Direitos Humanos, como elemento da história, é dialética
e precisa ser refletida e aprofundada, pois não ocorre de forma estática e assume novas
configurações no curso da história, especificamente no atual cenário da sociedade
contemporânea.
51

Destacamos que, nesse processo de luta pela redemocratização do país, o direito à


Educação Básica foi ampliando (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio)
compreendendo-se assim a importância da educação na formação dos demais direitos. Essa
ampliação decorre da Emenda Constitucional nº 59 de 2009. O avanço de nossa Constituição
para o olhar da educação em direitos humanos se apresenta no art.205, que afirma: “A
educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. (BRASIL, 1988)
Nessa sequência dos textos legais que nos dão embasamento para a concretização das
políticas educacionais, aprova-se a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB nº
9394/1996, reafirmando a educação como direito e caracterizando-a baseada em princípios de
liberdade e nos ideais da solidariedade humana, conforme seu artigo 2°, e complementa, logo
em seguida, em seu artigo 3°, que o ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;


II - Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o
pensamento, a arte e o saber;
III - Pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas;
IV- Respeito à liberdade e apreço à tolerância;
V - Coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
VI- Gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
VII - Valorização do profissional da educação escolar;
VIII - Gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da
legislação dos sistemas de ensino;
IX - Garantia de padrão de qualidade;
X - Valorização da experiência extraescolar;
XI -Vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.
(BRASIL, 1996).

Assim, historicamente, foi no curso da consolidação das políticas educacionais no


território brasileiro que se elaborou o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos –
PNDEH, cujo enfoque é dado aos grupos minoritários e com deficiência em seus processos de
formação e de educação.
No contexto das políticas públicas brasileiras, a premissa de uma Educação em
Direitos Humanos contempla os segmentos da infância e da adolescência como prioridade
absoluta. Diante de tal argumento, na atual conjuntura, a partir dessas definições, o UNICEF
ressalta o papel da escola frente ao aprendizado e à proteção de crianças e adolescentes.
Na esteira das políticas educacionais, a Educação em Direitos Humanos emerge como
um projeto societário que deve levar os cidadãos a uma consciência coletiva sobre a
52

importância da difusão das ideias e da implementação das práticas que corroborem com o
princípio de sua universalidade.
Com base nessa perspectiva de análise, concebem-se as políticas educacionais do
município de Niterói, articuladas com a proposta da Educação em Direitos Humanos. Parte-se
do princípio de que tais políticas pautam-se nas mudanças das práticas sociais oriundas da luta
do movimento social e coletivo por meio de uma práxis dialógica, e que, portanto, traz em
seus atributos os valores de relações com horizontalidade e a igualdade sob a ótica da
dimensão humana em sua essência.
Como destacado anteriormente, a dimensão de uma cultura de Direitos Humanos é
historicamente recente e tem se constituído um campo fértil para o aprofundamento de
reflexões, especificamente sobre o papel da escola, locus privilegiado para o desenvolvimento
de uma sociedade mais fraterna, justa e igualitária.
As discussões sobre o tema têm adquirido importantes direcionamentos no debate
nacional e, apesar da complexidade que ele envolve e das ideias que não se confluem, as
discussões representam um esforço assentado na racionalidade contínua para o trato devido
das questões que envolvem as pautas da educação pública.
Ressalta-se que a formação da Educação em Direitos Humanos não se limita, portanto,
ao campo cognitivo das aprendizagens, direcionando-se também aos valores de
comportamentos, das relações e respostas frente aos desafios da vida cotidiana escolar.
Estudos de Candau (2007) contribuem para o aprimoramento do debate sobre os
direitos humanos, levando-nos a compreendê-los como um processo histórico dinâmico,
contraditório e complexo. A difusão desta concepção no campo das ideias pode ser localizada
em um conjunto de outros estudos que nos fornecem elementos contundentes, sobretudo para
repensarmos, na perspectiva curricular, os caminhos teórico-metodológicos que orientam as
práticas pedagógicas.
As experiências de Educação em Direitos Humanos têm se multiplicado ao longo de
todo o continente latino-americano. A partir das informações disponíveis, constatamos que a
maior parte delas tem sido realizada em âmbitos de educação não formal, aspecto
tradicionalmente privilegiado pela educação popular (Ibid., p. 401).
Com base nesses argumentos, considera-se que, historicamente, o Brasil é um país
ainda jovem, em processo de reconhecimento e de consolidação dos direitos humanos e da
cidadania pela via das políticas públicas, buscando, gradualmente, assegurar que todos os
indivíduos sejam reconhecidos em sua dignidade e múltiplas formas de expressão da
diversidade.
53

As reflexões da autora consideram que a Educação em Direitos Humanos deve se


pautar numa consciência coletiva sobre a diversidade,

Afirmando os direitos humanos como algo universal e necessário na luta


contra todas as formas de violência presentes na manifestação do
preconceito contra os indivíduos com incapacidade na sociedade de classes
submetida a lógica do capital” (COSTA, 2018, p. 57).

Nesse sentido, os estudos apresentados reafirmam a necessidade de se considerarem os


sujeitos da diversidade em suas mais variadas singularidades e em seus contextos de vida,
representados nas questões étnico-raciais, na diversidade de gênero, de classe social, na
diversidade religiosa, no âmbito das pessoas com deficiências, altas habilidades e
superdotação e em outros aspectos que expressam as múltiplas formas das experiências
humanas exercidas no curso da história.
É no espaço da escola que eles vivem longos períodos de suas vidas, portanto, além de
espaço de aprendizagem, ela também é espaço de relações, afetos, valores, cultura e direitos,
que devem estar refletidos no projeto político pedagógico das escolas, em seus currículos,
suas práticas e seus sujeitos.
Na observância de tais argumentos, ressalta-se que o projeto político pedagógico da
escola precisa estar em consonância com a realidade local, bem como dialogar com a
realidade de vida dos alunos, apropriando-se de suas vivências e estabelecendo uma
aproximação dialógica entre suas expectativas e os objetivos propostos pela escola.
Com efeito, a proposta deve contemplar a parceria indissolúvel entre famílias e
escolas, compreendendo essa ação como um fundamento importante para o processo de
desenvolvimento do aluno, na perspectiva de seu desenvolvimento integral.
No contexto da política educacional, diferentes concepções curriculares
desenvolveram propostas teórico-metodológicas sobre o trabalho pedagógico como eixo
orientador das práticas exercidas no âmbito escolar.
Com a proposta da nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), os sistemas de
ensino estão inseridos em dez competências gerais para nortear os trabalhos de todos os anos,
bem como os componentes curriculares em cuja estrutura é mister que haja o entendimento de
que a educação deve trabalhar a favor da prevenção e da proteção contra as violências, cuja
ação pedagógica se insere na luta pelos Direitos Humanos, afirmando a igualdade entre todos
os educandos.
No entanto, é possível que, na contemporaneidade, se detecte um novo olhar sobre a
problemática dos Direitos Humanos, visto que as questões relativas à justiça, à superação das
54

desigualdades socioeconômicas, à igualdade de oportunidades e as que se referem ao


reconhecimento de diferentes grupos socioculturais se fazem cada vez mais presentes. Além
disso, as questões relativas à diversidade vêm adquirindo cada vez mais relevância.
Parafraseando Santos (2002), Candau sintetiza de maneira especialmente oportuna
esta tensão, pois “as pessoas e os grupos sociais têm o direito a ser iguais quando a diferença
os inferioriza, e o direito a ser diferentes quando a igualdade os descaracteriza”.
A partir das reflexões que se apresentam, é possível conceber a Educação em Direitos
Humanos como uma ferramenta pedagógica potente em seus objetivos e ações efetivas, pois
viabiliza ao indivíduo em formação a capacidade de autonomia, emancipação e reflexão, ao
passo que a apropriação do saber sistematizado e das experiências produzidas no campo dos
saberes e das relações justifica, de certa forma, a ideia de uma educação de qualidade. Com
base nesta premissa, Costa (2018) destaca que

[...] a sociedade brasileira tem realizado esforços a favor da afirmação de


uma cultura contrária à discriminação das minorias historicamente excluídas
e consequentemente cresce a demanda por inclusão em suas diversas
instâncias e pela afirmação da educação em direitos humanos [...] (COSTA,
2018, p. 59).

Com isso, deve-se refletir sobre as políticas públicas, especificamente as políticas


educacionais inclusivas, por meio das quais as concepções curriculares contribuam para o
acesso, permanência e direitos de aprendizagem para todos, sem quaisquer distinções. Para
tanto, conceber uma proposta curricular em que tais aspectos estejam plasmados é criar
condições para que a educação púbica escolar seja “uma instituição necessária para a
formação de indivíduos autônomos, democráticos, emancipados, sem desconsiderar os limites
dessa sociedade” (Ibid., p. 39).
É importante ressaltar que a escola possui uma função social pública relevante, o que
deve reforçar a ideia de que todos possuem direitos de cidadania, de que todos devem ser
contemplados por uma formação que fortaleça a democracia e que se materialize nas formas
de enfrentamento das exclusões.
As novas perspectivas de base curricular precisam assumir os desafios que se impõem
no cotidiano das escolas. Portanto, é preciso refletir e desenvolver novas propostas
curriculares que contribuam para outra configuração da Educação em Direitos Humanos,
contextualizada a partir de uma agenda de política pública de transformação e que possibilite
o reconhecimento da diversidade em todas as suas dimensões, como destacado anteriormente.
55

Como um exercício crítico necessário no campo das lutas educacionais, defendemos


uma proposta de políticas públicas que restabeleça a potência do estado democrático de
direitos, que integre, por meio de políticas curriculares, os indivíduos e que os inclua de fato
no contexto de uma educação emancipadora. Cabe aos sistemas de ensino, especificamente à
escola, reinventarem-se e instrumentalizarem-se dos elementos necessários, com o propósito
de promover a autonomia de seus educandos, por meio de um processo pedagógico claro e
efetivo em seus objetivos e metas. Acreditamos ser este o caminho possível para se
(re)estabelecer uma nova consciência social coletiva de largo alcance, pois, diante de um
contexto que modifica no tempo e no espaço, diante de um “novo cenário, é importante
analisar e debater as questões relativas ao sentido da educação em Direitos Humanos e os
objetivos que pretende alcançar” (CANDAU, 2007, p. 403).

5. CURRÍCULO, CULTURA E DIFERENÇA

A noção de encruzilhada emerge como


disponibilidade para novos rumos, poética, campo de
possibilidades, prática de invenção e afirmação da
vida, perspectiva transgressiva à escassez, ao
desencantamento e à monologização do mundo. A
encruza emerge como a potência que nos possibilita
estripulias (RUFINO, 2019, p. 13).
Os Outros: o melhor de mim sou Eles. (BARROS,
1998)

De acordo com os Referenciais Curriculares para a Rede Municipal de Ensino de


Niterói: uma construção coletiva/2010, podemos apontar dois sentidos que são apresentados
como norteadores da proposta curricular: diversidade e formação para a cidadania, tendo
como base teórica o multiculturalismo, na perspectiva teórica desenvolvida por Banks (2004),
Candau e Moreira (2008) e Ivenick e Santos (2009).

O multiculturalismo pode contribuir para se pensar em um currículo que


forneça respostas à diversidade cultural, de modo a interrogar discursos
hegemônicos e a dar vozes às identidades plurais. O currículo deve ser
repensado em função do diálogo com as identidades plurais que circulam nas
unidades escolares, valorizando os saberes, a diversidade de sotaques, a
multiplicidade das identidades étnicas, raciais, culturais, linguísticas,
religiosas, geracionais e outras que constituem a realidade escolar
(Referenciais Curriculares da Educação Infantil, 2010, p. 10).

A diversidade e a pluralidade cultural fazem parte das preocupações curriculares,


desde pelo menos a década de 1950. Com o processo de redemocratização, os movimentos
56

sociais, notadamente o movimento negro e os povos indígenas, iniciaram um processo de


articulação para ampliar a representação de suas culturas e suas agendas nas políticas
educacionais.
A perspectiva multicultural está presente em muitos dos discursos constantes nos
currículos da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, a qual analisamos ser relevante
no sentido de fortalecermos que os Projetos Políticos Pedagógicos tenham como princípios a
educação antirracista, anticapacitista e contra a homofobia, em que sejam reconhecidos os
gêneros e as sexualidades e o pluralismo religioso. Contudo, iniciamos esta trajetória de
revisão dos Referenciais Curriculares, trazendo para o debate a cultura como lugar de
enunciação, não como repertório de sentidos partilhados.
Uma primeira mudança que promovemos é destacar a diferença (e não a diversidade)
como pressuposto e sentido potente no currículo, ou seja, pensar a diferença cultural para
além da identidade. Compreendemos que o conceito de identidade e as políticas de identidade
manifestam demandas por reconhecimento nos currículos, envolvendo, principalmente, o
movimento negro e os povos indígenas. Dessa forma, reconhecemos ser fundamental a
implementação das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008. Juntam-se a esta agenda os temas
relacionados aos gêneros e às sexualidades.
Nesse sentido, dialogamos com Mouffe (2003), que afirma:

Ao estar consciente do fato de que a diferença é a condição da possibilidade


de constituir a unidade e a totalidade, ao mesmo tempo que ele fornece seus
limites essenciais, tal abordagem agonística poderia contribuir para subverter
a tentação sempre presente nas sociedades democráticas de naturalizar suas
fronteiras e essencializar suas identidades.[...] Graças ao reconhecimento de
que as identidades abrangem uma multiplicidade de elementos, tal
abordagem está numa posição melhor para enfrentar uma identidade que
acomoda outras, admite a porosidade das suas fronteiras e se abre ao exterior
que a torna possível (MOUFFE, 2003, p. 19).

Portanto, dialogamos em defesa do que Mouffe (2003) chama de “pluralismo


agonístico”, que tem como base a multiplicidade de cada sujeito, não consistindo
simplesmente em tolerar as diferenças, “mas em celebrá-las positivamente porque admite que,
sem alteridade e o outro, nenhuma identidade poderia se afirmar” (Ibid., p. 19).
No contexto de revisão dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de
Educação de Niterói/2020, trouxemos para a discussão a perspectiva pós-estrutural, a partir da
qual consideramos que diversidade não é o mesmo que diferença. O diverso é outra
manifestação do mesmo.
57

Abrir o currículo à diferença implica recusar a perspectiva da identidade,


rechaçaras fixações que criam as identidades como golpes de força sobre a
possibilidade de ampla significação. Um currículo marcado pela diferença é
um currículo concebido como cultura. [...] Trata-se de ver o currículo como
um processo de produção de sentidos, sempre híbridos, que nunca cessa e
que, portanto, é incapaz de construir identidades (LOPES e MACEDO,
2011, p. 227).

Manifestamos aqui a possibilidade de significar o currículo como produção cultural,


como lugar de enunciação, de potencializar os movimentos de diferir, ao investir na
desconstrução de uma identidade fixa, que impede outras possibilidades de ser dos sujeitos.
Consideramos o ato de educar como espaço de interações entre os sujeitos e, portanto, espaço
de experiências vividas, de práticas pedagógicas que potencializem a diferença em si, em que
o sujeito singular emerge por meio de atos de criação.

Em vez do silêncio produzido pela presunção autossegregadora da política


de identidade – com sua reinscrição invertida de estereótipos, o caráter dos
estudos de currículo é comunicativo, comprometido com o encontro
dialógico através da diferença (PINAR, 2016, p. 39).

O currículo é território político, no qual as disputas pela significação não cessam. É


cultura, movimento e diferença; produz novos sentidos, é ato criativo, invenção e, portanto,
provoca deslocamentos em sentidos hegemônicos, que dificultam o fluxo do diferir. A luta
política e o debate sobre as políticas curriculares que desenvolvemos neste processo de pensar
os novos Referenciais Curriculares denunciam as estratégias que tentam domesticar as
diferenças e, contra todas as tentativas de significar de tal modo, o currículo, com o que e
como devemos ensinar.

Como questionaria o caboclo Fanon (2008) ao enfrentar de forma radical os


limites existenciais impostos pelo racismo/colonialismo no mundo moderno,
o que são os seres senão um SIM vibrando com as harmonias cósmicas.
Fechamos com Fanon, Exu e Orunmilá e colocamos como alvo a ser
descadeirado o processo educativo reivindicado como modo único de
formação de seres e sustentado pelo paradigma de ensino que opera em favor
das lógicas coloniais (SIMAS e RUFINO, 2019, p. 35).

Nesta proposta dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação


de Niterói, tomamos a decisão de envolver todos os componentes curriculares na discussão
das relações étnico-raciais, das questões ambientais e dos temas que envolvem os gêneros e as
sexualidades, afirmando uma proposta curricular inspirada pelo manifesto de Chiapas, que
defende “um mundo onde todos os mundos tenham o seu lugar” (CANDAU, 2008, p. 47).
Estes Referenciais Curriculares apostam num projeto de construção de uma educação na qual
todos os mundos tenham o seu lugar.
58

Consideramos que contemplar, no currículo, o tema das relações étnico-raciais, a


presença da história e cultura dos povos indígenas e dos afro-brasileiros no Brasil, o tema da
sustentabilidade ambiental, com experiências de quilombolas e indígenas no manejo da terra,
nos estudos da botânica, na literatura e na etnomatemática, são algumas possibilidades de
produção curricular e o ato de educar em outras lógicas. Se apostarmos na produção cotidiana
de um currículo “onde todos os mundos tenham o seu lugar” (Comandante Marcos, Chiapas
apud CANDAU, 2008, p. 47), assumiremos pensar a produção curricular em diálogo amplo
com outras lógicas do educar. Educar dialogando com outras epistemologias é possibilidade
potente de produzirmos currículos na diferença.
Inserir o tema do gênero e da sexualidade no currículo não é algo novo. Com a
redemocratização dos anos 80, percebemos a inclusão dos temas relacionados à sexualidade,
ainda que significados como temas das Ciências, dos Programas de Saúde e da Biologia. Era
preciso dar o sentido da ciência e do cuidado com o corpo para que o tema fosse inserido nos
conteúdos curriculares. “Talvez, de tão higienizada, ela nem fosse reconhecida como tal pelos
corpos que passavam pelo portão” (MACEDO, 2017, p. 31). Nos últimos anos, pudemos
observar a ampliação dos temas da sexualidade e do gênero e propomos, neste documento, a
potência de vida e laços presentes na escola, não como um novo componente curricular, mas
como abertura ao impensável, aquilo que desconcerta, mas nutre de vida e plenitude as
trajetórias vividas no contexto escolar.

Noções assentes em outras experiências socioculturais nos apontam diversas


possibilidades para pensar a existência e as relações com aquilo que
convencionamos ser o humano e as suas formas de fazer no mundo.
Perspectivas do ser/saber como o sumakkwsai, noção dos povos andinos
falantes da língua quícha, otekóporã, próprio dos povos guaranis localizados
em grande extensão do território latino-americano, o ubunto, assente no
pensamento dos falantes das línguas advindas do tronco bantu e
disponibilidades conceituais como Ifá, Exu, iwáeiwápele, presente na
cosmogonia iorubá, nos apresentam outras rotas fora das coordenadas
cartesianas edificadas pela dominação moderna-ocidental (SIMAS e
RUFINO, 2019, p. 33).

Reconhecemos, na reconexão e reverência às culturas ancestrais e aos povos das


florestas, a sua significativa produção de conhecimento e cosmovisões que nos inspiram a
pensar o mundo de outras formas; de perceber, por exemplo, na árvore, nas andorinhas, nos
rios, possibilidades de estabelecer relações de alteridade com todos os seres, em um
compromisso moral como futuro planetário. Isso contribui para pensarmos que o ser humano
não é o centro da natureza, mas parte dela, resgatando a sacralidade e a dimensão subjetiva da
natureza, presente entre os povos indígenas e nas culturas ancestrais.
59

Quando despersonalizamos o rio, a montanha, quando tiramos deles os seus


sentidos, considerando que isso é atributo exclusivo dos humanos, nós
liberamos esses lugares para que se tornem resíduos da atividade industrial e
extrativista. Do nosso divórcio das integrações e interações com a nossa
mãe, a Terra, resulta que ela está nos deixando órfãos, não só aos que em
diferente graduação são chamados de índios, indígenas ou povos indígenas,
mas a todos (KRENAK, 2019, p. 49).

Nessa direção, reconhecemos, nos projetos instituintes, que potencializam o currículo


como espaço de criação, um currículo instituinte de sentidos, um currículo que aposta na luta
pela justiça social e na educação que se produz na diferença, assumindo um projeto de
educação antirracista e contra todas as discriminações, para lutar pela justiça social, que
defendemos aqui como o emergir do sujeito singular. E mesmo reconhecendo a incerteza do
horizonte e a impossibilidade plena de realização de qualquer projeto, apresentamos o melhor
de nós nesta luta.
Expressamos sentidos e possibilidades de pensar a produção curricular na Rede
Pública Municipal de Educação de Niterói, entretanto esta é uma discussão de todos nós que
se amplia a cada experiência construída e constitutiva da prática educativa. Acreditamos no
compromisso de cada um de nós, profissionais de educação, na construção de uma proposta
curricular que se insere no debate constante, comprometida com uma teoria curricular que se
produz contextualmente e que exige alteridade.

6. A LEITURA LITERÁRIA E A FORMAÇÃO DO LEITOR-AUTOR NA REDE


PÚBLICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI

A leitura pulsa em nós desde a tenra idade. Lemos o movimento das folhas das
árvores, o vai e vem das ondas do mar, as cores do céu, o olhar e os gestos daqueles que
colorem nossas vidas. Afinal, não se leem apenas letras e livros, lê-se o mundo em toda a sua
complexidade. Lemos “o verde da manga-espada verde, o verde da manga-espada inchada, o
amarelo-esverdeado da mesma manga amadurecendo, as pintas negras da manga mais além de
madura” (FREIRE, 2003, p. 13). Lemos o verde das matas ameaçadas, o verde da bandeira, o
verde-esperança pintado nos quadros. A noção ampliada de texto que aqui trazemos nos
conduz a compreender a leitura enquanto produção de sentidos. O ato de ler se descortina em
nossas experiências por meio das múltiplas linguagens que nos circundam. O clássico texto A
importância do ato de ler, de Paulo Freire (FREIRE, 2003), mobiliza-nos na defesa pela
60

leitura para além das palavras escritas. A leitura, nessa concepção, possibilita-nos uma
diferenciada relação como outro e com o mundo.
Na perspectiva da leitura como ato interativo, em que esta pode ser sentida, indagada e
refletida, encontramos o ato de ler sendo produzido por meio do diálogo entre leitor-texto-
autor. Este entrelace dialógico, em que discursos disputam espaço, pois implica valores
ideológicos, tensão e diferentes pontos de vista sobre o mundo, pode promover
desdobramentos de sentidos, além de desencadear no leitor uma “compreensão ativamente
responsiva” (BAKHTIN, 2011, p. 272).
Essa compreensão a respeito da leitura ancora-se nos estudos do filósofo Mikhail
Bakhtin (2006, 2011), para quem o indivíduo, ao ler, o faz como um participante real do ato
de ler, e não como um leitor passivo. O leitor traz significações externas para o interior do
texto e produz, explícita ou implicitamente, uma resposta, uma concordância ou objeção ao
que se lê (SILVA, 2016; MORAIS & SILVA, 2015).
Perspectivando, portanto, a leitura por esse viés, ressalta-se o processo dialógico-
interativo nas esferas de uso da linguagem e, desse modo, a categoria básica de concepção de
linguagem de Bakhtin (2006, 2011), a interação verbal, cuja realidade fundamental é seu
caráter dialógico. O sentido do enunciado se dá por meio de uma compreensão responsiva
ativa entre sujeitos, a partir da interação. O enunciado se constitui como uma unidade de
comunicação e significação, inserido em um determinado contexto, podendo ser atualizado
muitas vezes. A cada nova situação, ganha um novo sentido em função do contexto de
produção, gerando diversas possibilidades de ressignificação, pois uma enunciação sempre
pressupõe outras enunciações que a antecederam e que lhe sucederão, visto que ela constitui
apenas um elo na cadeia da interação verbal.
Assim, uma enunciação concreta, produzida de modo significativo em um dado
momento social e histórico, não deixa de atingir os muitos fios dialógicos existentes.
Qualquer campo de produção da linguagem está repleto de relações dialógicas. O dialogismo
está no cerne da linguagem, é parte integrante de todo processo de comunicação, conforme
salienta o filósofo do diálogo, que destaca que toda enunciação, mesmo na forma imobilizada
da escrita, é uma resposta, não passando de um elo da cadeia dos atos de fala, pois toda
inscrição prolonga aquelas que a precederam, travando uma polêmica com elas, pois “conta
com as reações ativas da compreensão, antecipa-as” (BAKHTIN, 2006, p. 99).
Desse modo, “para que a educação seja de fato um espaço pleno de significados e
aprendizagens, é importante não esquecer que é na interação com o outro e com o mundo que
se constrói o conhecimento e se compreende a realidade” (E. M. EULÁLIA DA SILVEIRA
61

BRAGANÇA/Parecer, 2020)5. Conforme ressalta Tezza (2003), a palavra só diz, só é capaz


de produzir sentidos se concebida “em relação”. De igual modo, o sentido só é construído
dialogicamente de forma relacional. Nessa direção, a criação estética demanda então um
processo constante de busca por sentidos, que estão sempre no encontro com o outro. Sem a
presença inexorável do outro, não há palavra, não há construção de sentidos. O movimento de
criação estética, por conseguinte, pressupõe sempre o encontro com o outro.
Como salienta Tezza (2007, p. 244): “Para Bakhtin, o homem tem uma necessidade
estética absoluta do outro. Nossa individualidade não teria existência se o outro não a
criasse”. Temos, portanto, uma dependência constitutiva da alteridade, uma vez que “há uma
limitação intransponível no meu olhar, que só o outro pode preencher”. Assim, a relação
dialógica fundamentará todo ato de criação, pois toda arte só se constitui como tal a partir da
presença de um outro que lhe atribua sentidos, por meio do dialogismo inerente à linguagem,
uma vez que o significado é construído por meio de uma relação dialógica entre sujeitos.
Nesse sentido, compreendemos a literatura em seu caráter ético e estético, a partir de seu viés
alteritário (DALUZ, 2019).
A significativa contribuição de Bakhtin e sua filosofia da alteridade nos leva a pensar
sobre a palavra que se constrói no encontro de duas consciências, na/a partir das relações
sociais. E a literatura se constitui a partir dessa perspectiva. Bakhtin nos inspira a refletir
sobre a formação de leitores-autores pelo viés da alteridade, da relação com o outro, com o
mundo e com as palavras nos entremeios dos fios e tramas discursivos, que contribuem
também para a construção da autoria.
Compreendemos a autoria a partir de uma concepção de criação, em sua dimensão
social e alteritária, dialógica, interativa, reflexiva, intertextual, em rede, destacando-se a
importância do social nesse processo de criação, que se faz e refaz coletivamente, nas
múltiplas redes de interação. Portanto, independentemente da linguagem utilizada pela
criança, devemos “reconhecê-la como autora de suas próprias histórias, compositora de seus
ritmos e criadora do belo quadro de suas artimanhas, num constante fluxo do movimento de
suas indagações e inquietações” (UMEI ANTÔNIO VIEIRA DA ROCHA/Parecer, 2020).
Kramer (1993) enfatiza a vertente humana da autoria quando afirma que

5
No decorrer deste documento, serão apresentadas citações de pareceres ou de grupos de trabalho (GTs)
realizados pelos profissionais em suas Unidades de Educação da Rede Pública Municipal de Educação de
Niterói. Ressalte-se que todos os pareceres e estudos dos GTs estão disponíveis no Conselho Municipal de
Educação para consulta.
62

[...] ser autor significa dizer a própria palavra, cunhar nela sua marca pessoal
e marcar-se a si e aos outros pela palavra dita, gritada, sonhada, grafada...
Ser autor significa resgatar a possibilidade de “ser humano”, de agir
coletivamente pelo que caracteriza e distingue os homens... Ser autor
significa produzir com e para o outro... (KRAMER, 1993, p. 83).

A função do educador é chamar os alunos para a autoria e para o desejo de


conhecer/aprender. “Acreditar e confiar que a criança pode aprender é o primeiro passo para
que ela conquiste sua autonomia e por consequência a sua autoria de pensamentos” (UMEI
PROFESSOR IGUATEMI COQUINOT DE ALCÂNTARA NUNES/Parecer, 2020). A
autoria, portanto, não constitui um ato individual, mas pressupõe a alteridade, a produção de
um enunciado que caminha para e com o outro. Criar é um ato ético e estético. Nesse sentido,
Larrosa (1996) nos convoca a pensar que a íntima relação estabelecida entre o texto e a
subjetividade resulta na leitura como formação, gerando experiência. Leitura que se tece e
(entre)tece na troca, na interação e interlocução com o outro, com o texto, em um movimento
dialógico. Trata-se de pensar a leitura como “algo que nos forma (ou nos de-forma e nos
trans-forma), como algo que nos constitui ou nos põe em questão naquilo que somos”
(LARROSA, 1996, p. 133).
Pensar a leitura e a autoria por esse viés implica concebê-las como um processo que se
relaciona com a subjetividade do leitor. Não somente com aquilo que o leitor sabe, mas,
sobretudo, com aquilo que ele é. O papel formativo da leitura representa construção de
sentido, relação de significação entre texto e leitor que o faz ser capaz de pensar, de se ver
para além de si mesmo. É relação subjetiva e profunda com o texto lido. Compreender a
leitura como processo formativo implica militância, na tentativa de desnaturalizar práticas que
podem ser esvaziadas de sentido e/ou ter o tom de controle, autoritarismo, cerceamento e
emudecimento de vozes.
Diante disso, ciente da importância da leitura como um meio de crescimento
individual e coletivo, a escola configura-se como um espaço fundamental de desenvolvimento
da leitura enquanto experiência (BENJAMIN, 1994). Afinal, coadunamos com a ideia de que
“a presença do livro e outros materiais onde a escrita está presente fará parte do repertório de
experiências” (UMEI ANTÔNIO VIEIRA DA ROCHA/Parecer, 2020). A leitura tem o poder
de transformação, apresenta mundos e realidades outrora desconhecidas, abre caminhos, olhos
e consciências, afasta as cortinas do mundo e nos faz sentir partes integrantes deste espetáculo
que é a vida.
Desse modo, faz-se imprescindível ressaltar a importância da leitura na vida dos
educandos, porquanto eles precisam, desde cedo, ter acesso aos livros e a diversos materiais
63

escritos. Esse encontro acontece, na maioria das vezes, no ambiente escolar, pois, para muitos
de nossos alunos, a escola torna-se o local privilegiado de encontro com o texto literário.
Portanto, “o livro precisa ser manuseado, lido, relido, ‘amassado’, consumido. Um livro
fechado, em cima de uma prateleira é só um monte de papel cheio de poeira e ácaros. Um
livro aberto na mão de um leitor é a entrada em um universo de possibilidades sem sair do
lugar” (UMEI PROFESSOR IGUATEMI COQUINOT DE ALCÂNTARA NUNES/Parecer,
2020).
Defendemos a presença da literatura, enquanto experiência, desde o início da
Educação Infantil até o final do Ensino Fundamental. Concordamos que os livros literários e
de diferentes gêneros precisam ser disponibilizados pelas instituições, tanto para uso no
próprio espaço escolar, quanto para empréstimo responsável para as crianças e suas famílias.
Os livros ainda se constituem como artigos de difícil acesso para uma parcela da população
brasileira. “A escola, desse modo, poderá agir como mediadora entre as crianças, as famílias e
os livros, fomentando contextos de leitura” (E. M. JOÃO BRAZIL/Parecer, 2020) em todos
os componentes curriculares, como uma leitura que gere reflexão, fruição, que exista para
além do momento em que foi realizada, que se converta em experiência.
A leitura constitui um elemento essencial na formação do aluno, pois é capaz de levá-
lo a desenvolver a reflexão e a capacidade crítica, sendo também uma prática que contribui
para o processo de reconhecimento de si mesmo e do outro. A leitura, mais do que um mero
exercício que desenvolve o nível intelectual do indivíduo, possibilita a ampliação da leitura de
mundo, o crescimento interior, a vivência de diferentes experiências que aguçarão emoções e
sentimentos. Por meio da leitura, o ser humano não só adquire conhecimento, como também
pode transformá-lo, em um processo contínuo de construção e aprimoramento. Ler é criar
uma teia de sentidos que se diferencia de leitor para leitor, é interagir com o texto e lhe
atribuir sentidos, em um contínuo processo dialógico.
A leitura, assim, está associada à criação, à interação, à multiplicidade de sentidos e,
portanto, contribui para o desenvolvimento da reflexão e da capacidade crítica do sujeito, não
podendo ser concebida como prática mecânica de decodificação. Ler não se associa à
passividade e à aquiescência, mas refere-se à partilha, à interação, à atribuição de sentidos, ao
processo de tecer argumentos e pontos de vista, à revisão de conceitos e quebra de
preconceitos. A leitura traz respostas, mas também faz nascer novas perguntas, amplia a
percepção, aguça o olhar, sensibiliza.
E o professor, também ele leitor-autor, mediador nesse processo de formação, buscará,
por meio da literatura, independentemente da etapa de ensino e do componente curricular com
64

o qual esteja trabalhando, contribuir com a formação crítica que vise à “autorização” dos
sujeitos e ao aprofundamento de suas leituras, que possibilite que esses sujeitos escrevam e se
inscrevam no mundo, ética e esteticamente.
Assim sendo, compreende-se que a leitura e seus sentidos não se encontram nem no
texto, nem fora dele, mas na relação, no processo de interação que se estabelece entre aquele
que escreve e aquele que lê, mediado pelo texto e, nesse processo, entram em cena, também,
outros mediadores, bem como outros sujeitos que podem compor as interações de leitura:
professor-educando, educando-educando, educando-bibliotecário etc. Dessa forma, é
importante destacar que o trabalho com a literatura não está restrito apenas ao planejamento
do professor de língua portuguesa, do professor da Sala de Leitura e daqueles cuja atribuição
está mais explicitamente direcionada ao texto literário. A leitura é uma responsabilidade de
todo professor. A literatura refere-se à vida e é um direito inalienável do sujeito (CANDIDO,
1989). A leitura é um ato político, ético e estético, e nossa função enquanto escola pública
direciona-se à formação de leitores-autores críticos, reflexivos e conscientes de seu papel
social no contexto em que vivemos e atuamos.
A literatura infantil precisa estar presente entre as crianças desde os primeiros anos de
vida. A criança, desde cedo, já demonstra interesse em ouvir a leitura de um poema ou uma
história bem contada, em manusear um livro bem ilustrado. A literatura tem o poder de
despertar o encantamento, trabalhar o imaginário, sensibilizar, mobilizar o mundo interior do
indivíduo. Defendemos, portanto, a presença do texto literário desde a creche. Salutto (2017)
salienta que a Educação Infantil pode ser um lugar de liberdade para se ter acesso à cultura
escrita, para vivê-la ampla e plenamente. E pensar a leitura literária na Educação Infantil
significa “compreendê-la como um lugar de relações, de brincadeiras, de produção de sentido,
de conhecimento de si e do outro, de constituição da subjetividade, de ampliação das
experiências e, também, de imersão na cultura escrita”, sem o propósito de alfabetizar. Nessa
direção, acreditamos que a literatura precisa estar presente na Educação Infantil como relação,
troca, ampliação, jogo, ludicidade, imaginação, criação (SALUTTO, 2017, p. 28).

A contação de histórias é muito apreciada por nossas crianças, nas rodas de


leituras propostas pelas professoras nas salas de atividades ou na nossa
biblioteca, os olhos brilham diante da magia dos enredos que vão se
desenrolando. E é nesse contato com o universo literário que vão sendo
instigados pelo gosto da escrita. Vão sendo apresentados ao mundo letrado.
De modo que alguns, espontaneamente, formulam suas primeiras hipóteses
sobre a escrita (UMEI ANTÔNIO VIEIRA DA ROCHA/Parecer, 2020).
65

Que os livros de literatura e as histórias estejam presentes em todas as escolas,


acessíveis a todos os alunos, desde os menores até os leitores mais experientes. Que os
professores e também as crianças contem histórias. Que as narrativas e a contação de histórias
sejam recorrentes nas diversas etapas de escolarização. A contação de história é a arte de
narração oral capaz de instigar a imaginação, a criatividade e a oralidade tanto em quem conta
quanto em quem ouve a narrativa. Além disso, pode enriquecer a leitura de mundo na
trajetória de cada indivíduo, contribuindo para a formação docente e discente.
A literatura trabalha a percepção, o aprofundamento da sensibilidade. Almejamos uma
escola que eduque para a sensibilidade, uma educação que valorize todos os sentidos, que em
todo o processo de ensino-aprendizagem, independentemente da etapa de escolarização,
evidencie-se o sentir (DALUZ, 2019). O texto literário se fará presente em qualquer
componente curricular, impregnando de figuras de linguagem, de sentidos conotativos e
metáforas a existência, promovendo um desvendamento do olhar. Cavalcanti (2002) entende
que o texto literário é constituído por uma grande metáfora e que “o sentido metafórico é
aquele que remete sempre ao sentido anterior, portanto ao significante e, então, apreendemos
a escritura como algo que gera possibilidades”. Nessa direção, afirma a autora, o sujeito que
lê “torna-se capaz de viver uma vida simbólica mais rica, fazendo da realidade concreta um
palco para vivências significantes” (CAVALCANTI, 2002, p. 25).

Já que o sujeito é autor e o ator principal no processo da experiência, é


preciso considerar, em uma sociedade, a diversidade que a constitui e as
idiossincrasias de cada indivíduo que compõe este conjunto. Além das
questões sociais, econômicas e históricas, existem outros dados importantes
no ser humano: seus sentidos, suas percepções, sua criatividade, suas
reflexões etc. Este ser não pode ser visto como uma forma simples, mas sim
como uma trama de complexidades que precisam ser observadas, analisadas
e respeitadas (E. M.VILA COSTA MONTEIRO/Parecer, 2020).

Eliana Yunes e Glória Pondé (1988) afirmam que a literatura assume um papel
político muito mais amplo, deixando de ser mero sinal de erudição para “contribuir para a
formação do pensamento crítico e atuar como instrumento de reflexão, uma vez que pode
questionar, através de sua linguagem, a hegemonia do discurso oficial e o consenso
estabelecido pela ideologia dominante” (YUNES & PONDÉ, 1988, p. 37). Desse modo,
compreendemos a “força democratizadora da leitura”, sabendo que a literatura influencia não
apenas o aprendizado linguístico, mas contribui para o desenvolvimento da criticidade, da
busca por respostas divergentes do senso comum, o que significa trabalhar o imaginário, a
criatividade sobre o uso da linguagem e também para a vida, a ampliação do olhar, a criação
de outras perspectivas, o pensamento divergente, a luta por justiça social.
66

A partir de nossas experiências, cremos que “a criança que ouve literatura se apaixona
pela leitura e pela escrita. Logo, o professor tem que ser leitor. Devemos olhar para a
literatura como um tesouro” (E. M. SEBASTIANA GONÇALVES PINHO/Parecer, 2020). A
literatura nos auxilia no processo de formação do leitor crítico, aquele que não é apenas um
decifrador de sinais, um decodificador de palavras, mas alguém capaz de decifrar a palavra
enquanto signo ideológico, ler a sua própria história, os implícitos e as entrelinhas da História.
A arte nos leva a questionar o mundo:

Questionamos em nossa prática as narrativas oficiais e a configuração


eurocêntrica no mundo da Arte, desnaturalizando esses discursos e práticas
dominantes e excludentes. Percebemos e refletimos sobre as contribuições
das Artes para a construção de nossa identidade e memória. É preciso
valorizar artistas e explorar práticas curatoriais e artísticas que questionem e
os legados coloniais na Arte. Um dos propósitos da Arte é criar a noção de
senso estético, despertar a sensibilidade e ser um meio de expressão do que
habita no mundo interior dos indivíduos, seus anseios, sonhos, medos,
percepções sobre a vida, sobre si e os demais (E. M. PROFESSOR ANDRÉ
TROUCHE/Parecer, 2020).

Sendo assim, a literatura evoca a multiplicidade de vozes que ecoam, e as narrativas


concebidas pelas crianças reafirmam que “uma única história definitivamente não pode dar
conta das nossas histórias” (UMEI HERMÓGENES REIS/Parecer, 2020). Que a escola seja
um espaço de circulação de histórias, que estas estejam sempre presentes no cotidiano escolar,
ocupando os diversos espaços-tempo de aprendizagem, e que nos sirvam para questionar as
próprias narrativas que nos são impostas, afinal:

As histórias importam. Muitas histórias importam. As histórias foram usadas


para espoliar e caluniar, mas também podem ser usadas para empoderar e
humanizar. Elas podem despedaçar a dignidade de um povo, mas também
podem reparar essa dignidade despedaçada (ADICHIE, 2019, p. 32).

7. EDUCAÇÃO AMBIENTAL

A Educação Ambiental é garantida pelo artigo 1º da Lei 9.795, de 27 de abril de 1999,


que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, devendo estar presente em todos os
níveis e modalidades do processo educativo em caráter formal e não formal. A política ainda
apresenta como princípios o enfoque humanista, holístico, democrático e participativo, o
pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, a vinculação entre a ética, a educação, o
trabalho e as práticas sociais. Determina como objetivos fundamentais, no artigo5°, o
desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e
67

complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais,


econômicos, científicos, culturais e éticos.
Vale ressaltar que educação e ambiente são conceitos completamente articulados,
podendo-se dizer que não há educação que não seja ambiental, já que, se não houver
ambiente, não há educação. Além disso, como humanos, somos também natureza, somos
também ambiente e temos um duplo nascimento: o biológico/natural e o social (PINO, 1999).
A cada dia que passa, a Educação Ambiental torna-se mais importante no contexto
mundial, haja vista a inserção das sociedades em uma dinâmica autodestrutiva, que se dá,
muitas vezes, por falta do conhecimento adequado e pela própria apropriação de um sistema
que promove o finito; um sistema socioeconômico que não dialoga com os pressupostos
básicos de um ambiente e sua qualidade. A preocupação com o meio ambiente envolve
principalmente mudança de hábitos e comportamentos, caso contrário, jamais seremos
agentes transformadores comprometidos com a melhoria consciente do espaço em que
vivemos.
A importância do debate e da temática ecológica (ação predatória, destruição
planetária x sustentabilidade), bem como a formação escolar sobre este assunto tão
imprescindível no momento, devem ser trabalhadas de forma sistemática para que seja
possível uma transformação dos olhares e práticas presentes e futuras. Nós temos que atuar
nas instituições existentes, impulsionando-as dialeticamente na direção dos novos objetivos
(SAVIANI, 2013).
Estamos inseridos em uma lógica na qual, por muito tempo, as questões ambientais
permearam discussões de cunho conservacionista, o que acabou por não gerir a humanidade
de forma crítica acerca do ambiente e este ser compreendido em sua esfera tanto dinâmica
quanto sistêmica.
Com o advento da Revolução Industrial e o vertiginoso crescimento dos processos de
produção, de tecnologias e aberturas de mercados, presenciaram-se e presenciam-se, a cada
instante, também novos modelos de sociedade, em que se organizam e se reorganizam para
atender às novas realidades e demandas. Os seres humanos, nesta perspectiva, passam, então,
a assumir um novo adjetivo que, por muitas vezes, acaba se tornando até mesmo um
substantivo. Os seres humanos, hoje, são chamados de consumidores, ou seja, são objetos de
interesse do mercado, que amplia, cada vez mais, a destruição do ambiente e cria esferas
envolventes para se acreditar que as pessoas, leia-se consumidores, precisam ter o que na
realidade não precisam, apenas para fomentar seus interesses, riquezas e promover o
desequilíbrio entre a sociedade.
68

Nesta nova fase, percebe-se um enorme desapego que, outrora, permeava as relações
entre homem e natureza: o cerne do respeito, que se concentra o direito de ser e de existir. Na
nova realidade, o dominar o ambiente ecoa sem preocupações significativas nos
desdobramentos e, com isso, os impactos são os mais devastadores possíveis, principalmente
quando se compreende que o ambiente trata devida.
A produção de resíduos aumenta substancialmente, os espaços vão sendo suprimidos,
a ocupação e o uso do solo ganham novas dimensões, o ar e a água ficam cada vez mais
poluídos, ações políticas desbravam para um ecogenocídio, não se respeitam as
individualidades, as diversidades dos povos, culturas e gerações, os seres humanos vão
caminhando sem olhar para as pegadas que estão deixando e que implicarão, cada vez mais, a
própria dinâmica do existir. Abandona-se o ouvir os outros, as tradições que, por séculos,
foram construídas e passadas para os que chegavam, em detrimento do domínio dos espaços
e, consequentemente, das naturezas presentes. O lugar do outro não importa mais, as diversas
manifestações culturais e identitárias não se aplicam se não couberem em um sistema rígido
de um desenvolvimento desigual e combinado.
Em um momento em que se privilegia a cultura das monoculturas nos campos, busca-
se formar também uma monocultura de pensamentos, na qual o que é real para todos que
promovem a mega sociodiversidade, que enriquece e enobrece as dinâmicas ambientais por
conta do enorme acervo de conhecimentos acumulados por meio das experiências, não é
respeitado. O que passa a ter respeito são os interesses individuais e as especulações, que
acabam por fomentar os abismos existentes entre as pessoas e a natureza. Quando falamos
com o outro, pensamos em toda a biodiversidade que nos cerca. Entendemos que não somos
dominadores dessa biodiversidade, mas sim parte integrante desse todo, que precisamos estar
em um constante equilíbrio. Essa falta do outro acaba promovendo o aumento dos
desequilíbrios que vivenciamos.
Ainda no século presente, emerge um conceito que, para muitos, surge como uma
possibilidade de mudança e, para outros, como mais uma forma de promover-se diante do
sistema para fomentar ainda mais os abismos da sociedade e do ambiente, o conceito de
desenvolvimento sustentável.
É fato que se deve pensar no desenvolvimento sem que se comprometam as gerações
futuras, mas o uso do discurso não pode ficar no campo das falácias. Ao tratarmos de temas
que envolvem propostas sobre as questões ambientais, quase sempre emergem discussões e
trabalhos ligados à reciclagem, porém cabe problematizarmos diversas questões assim como
esta, para além do óbvio, do que é perceptível, como nesse caso, para além do
69

reaproveitamento de materiais, pois a reciclagem e o reaproveitamento têm seu limite de


afetação como resposta ao desequilíbrio. As ações precisam ser reais e ter dimensões com
significado para os envolvidos. A gestão e a fiscalização devem existir para garantir a
aplicabilidade do conceito.
Torna-se urgente a conscientização de que o desenvolvimento não pressupõe a
degradação ambiental e de que o ser humano também é ambiente. Só assim se corrobora para
o entendimento do ambiente de forma global. Para que esse entendimento de fato permeie o
cotidiano, a abordagem crítica na Educação Ambiental se torna fundamental, pois contribui
para uma reflexão ampliada ou, como ainda nos traz Loureiro (2004), promove o
questionamento às abordagens comportamentalistas, reducionistas e dualistas no
entendimento da relação cultura-natureza, como meio de se alcançarem mudanças efetivas
para as questões socioambientais.
A Educação Ambiental Crítica é reconhecida também por uma educação ambiental
transformadora em contrapartida àquelas de caráter conservacionista ou tradicional, que já
não acompanhavam as transformações necessárias à nova sociedade do século XXI e da crise
ambiental que está posta.
Vale ressaltar que tais mudanças necessitam emergir com força, sobretudo em tempos
em que questões ambientais, além de perpassarem o cotidiano, desdobram-se em
respostas/impactos cada vez mais intensos, ocasionando inclusive perdas e danos. É
necessário que a sociedade não esteja distanciada nem das discussões, nem das pesquisas,
para que, com a compreensão efetiva, possa criar e reivindicar atitudes que minimizem efeitos
negativos e potencializem os positivos.
Assim, a Educação Ambiental corrobora para que a compreensão acerca de temáticas
que implicam direta e indiretamente o cotidiano ganhem proporções com sentido e possam ser
transformadoras. Apenas com significado, o cotidiano dos alunos passa a ser objeto de análise
e passível de transformações que gerem valor e desenvolvimento de autonomia.
Pensar nos espaços e nas relações neles estabelecidas é oportunizar uma amplitude dos
olhares. Dessa forma, o aluno começa a questionar onde está inserido e por que o lugar se
encontra de determinada forma. Assim, os espaços escolares surgem como mola propulsora
de análise a partir de suas áreas verdes ou da inexistência delas, do chão gramado ou da
inexistência dele, dos recipientes corretos para descarte de resíduos ou da falta deles, entre
outros. É importante que o aluno dialogue com o ambiente no qual está inserido, questione e
busque possibilidades de diálogo e ações para possíveis transformações.
70

Os espaços escolares que desenvolvem a educação ambiental desde a Educação


Infantil geram crianças, jovens e adultos conscientes, podendo dialogar a partir da
compreensão dos ambientes vividos e percebidos. Sendo assim, cidadãos preparados
ambientalmente para agir no mundo podem corroborar para a minimização dos desastres, pois
os riscos seriam percebidos. Isso nos leva a pensar em “mudanças de paradigmas”, temas
pertinentes, novas concepções e práticas educativas que venham dar conta do atual contexto
em que vivemos.
É preciso estar em sintonia com as mudanças, em busca de uma maior consciência do
ser humano num amplo e diverso mundo. Capacitar-nos e dialogarmos mais com senso ético,
de valores universais de preservação e complementaridade, ou até mesmo de resolução de
erros individuais e coletivos, no sentido de aprender, ensinar e conhecer a nós mesmos, o
nosso mundo e de buscar uma vida social mais sustentável e cidadã.

7.1 Educação em riscos ambientais

Os riscos exprimem toda a complexidade da sociedade contemporânea em seus


diferentes embates e natureza (MARANDOLA e HOGAN, 2003). Constituem-se em fatores
que propiciam a iminência de um possível acidente ou desastre e podem ser definidos como
objetos sociais, pois não há risco sem uma população ou indivíduo que o perceba e que possa
sofrer seus efeitos. O risco é a tradução de uma ameaça, de um perigo para aquele que está
sujeito a ele e o percebe como tal, é a combinação de frequência e consequência de eventos
indesejáveis envolvendo perdas e danos, segundo Rocha (2006).
Os riscos ainda são definidos como a possibilidade de ocorrência de acidentes, com
consequências sociais e econômicas (CERRI e AMARAL, 1998) em função da presença de
um perigo, sendo este compreendido como condição ou fenômeno de ameaça à vida humana,
saúde, propriedade ou elementos da natureza, trazendo consequências danosas (FERNANDES
e ROCHA, 2007). São definidos a partir de escalas ou hierarquias de probabilidades e de
graus/níveis de aceitabilidade de ocorrência dos eventos perigosos, na tentativa de classificar
áreas com níveis maiores ou menores.
O acidente, ao contrário do conceito de risco, é um fato já ocorrido, constitui um
evento repentino, imprevisto (LOURENÇO, 2007), não intencional, que pode causar
ferimento, perdas e danos materiais e/ou ambientais (FERNANDES e ROCHA, 2007),
71

limitados no tempo e no espaço (LOURENÇO, 2007) e representa colapso da combinação


perigo e risco.
A importância de se abordar e estudar a questão dos riscos ambientais tornou-se tão
fundamental quanto à preservação da vida, já que a existência dos seres humanos na biosfera,
em muitos casos, depende de seu entendimento para lidar com processos naturais. O número
de pessoas residindo em áreas de riscos ambientais apresenta vertiginoso aumento, sobretudo
em áreas urbanizadas, como é o caso das principais cidades brasileiras, em especial, nas
regiões metropolitanas. A BBC BRASIL (2003) aponta que o Brasil é o país do continente
americano com maior número de pessoas afetadas por eventos de ordens ambientais. Os
riscos ambientais já se subdividem em classes e subclasses, sendo: riscos sociais, riscos
tecnológicos e riscos naturais.
Os riscos sociais se apresentam colocando o homem em destaque, pois não é mais
compreensível vê-lo apenas como parte do ambiente. O homem é ambiente em constante
troca de energia, confirmando, assim, a teoria geral do sistema, trazida por Christofolleti em
1979. O risco social emerge como resultante de carências sociais que contribuem para uma
degradação das condições de vida da sociedade (CASTRO et al., 2005). Aborda guerras,
assaltos, sequestros, atentados e outros que se apresentem dentro da mesma ótica. Castro et al.
(2005) ainda apresentam outra perspectiva, onde buscam a compreensão de necessidades
coletivas essenciais que vão desde infraestrutura, condição de habilidade, saneamento básico
até a condição e a existência de emprego, entre outros.
Os riscos tecnológicos compreendem a presença de três fatores interligados: os
processos de produção (recursos, técnicas, equipamentos, maquinário); os processos de
trabalho (relações entre direções empresariais e estatais e assalariados) e a condição humana
(existência individual e coletiva, ambiente), de acordo com Sevá Filho (1988). Nessa
perspectiva, entende-se que os riscos tecnológicos resultam da ação direta ou indireta de
atividades industriais e processos produtivos associadas à condição e situação humana. De
forma a exemplificar, os riscos tecnológicos trazem à luz da reflexão os vazamentos de
produtos tóxicos, radioativos, construções de barragens, entre outros.
Os riscos naturais fazem parte da própria dinâmica da natureza, ou seja, continuarão a
ocorrer. Porém, com a intensificação de atividades antrópicas, muitos desses riscos podem ser
acelerados e/ou potencializados pelas alterações decorrentes do uso e ocupação do solo. Os
riscos naturais subdividem-se em: riscos físicos, relacionados às questões atmosféricas
(furacões, secas, tempestades, granizo etc.), questões hidrológicas (enchentes e inundações) e
questões geológicas (terremotos, atividades vulcânicas, tsunamis, movimentos de massa,
72

erosão, colapsos de solo etc.) e riscos biológicos às questões associadas à fauna e à flora. É
importante a compreensão de que um mesmo tipo de fenômeno natural pode ocasionar
impactos negativos e riscos com níveis diferentes sobre a população.
Faz-se necessário e urgente ampliar a discussão acerca da temática e, dentro desta
premissa, as escolas se tornam lócus privilegiado para tal ação. Os docentes, além de terem a
facilidade das múltiplas linguagens para atingir diferentes faixas etárias e saberem como
conduzir o processo de forma significativa para alcançar os objetivos junto aos alunos, podem
favorecer uma educação pautada nos riscos que podem surgir do ambiente e assim mitigar,
através da cultura de prevenção, tanto a degradação ambiental quanto a minimização de
perdas e danos.
Educar é um ato político, pois, ao assumir o compromisso com o outro, estamos no
processo de construção deste, para que possa ser sujeito da sua história e do seu processo de
aprendizagem, fazendo a leitura do mundo, devendo compreender ações que possibilitem a
construção de autonomia, para que a educação seja também uma forma de intervenção no
mundo (FREIRE, 1996). Nessa perspectiva, compreender a educação passa necessariamente
por entender a dimensão da vida e das relações que se estabelecem. Dessa forma,
compreende-se que a educação para riscos ambientais, além de necessária por tudo que já fora
exposto, é também parte do processo de emancipação dos sujeitos, da formação de atores
críticos e reflexivos na construção do seu existir e de onde estão inseridos.
Podemos, então, ressaltar que a Educação Ambiental atua diretamente na busca de
atitudes positivas para o cuidado com o ambiente e o próprio existir. Assim sendo, oferece
parâmetros para a busca de estratégias educativas. Pensar na Educação Ambiental e ampliar
sua discussão para uma educação para riscos ambientais junto à comunidade escolar podem se
tornar um importante agente social no trabalho de uma cultura de prevenção e transformação.
Pode ainda levar ao entendimento do ambiente em suas mais variadas complexidades,
contribuindo para a formação de um cidadão consciente da realidade que o cerca e a
possibilidade de um futuro diferenciado para as gerações futuras no que tange às questões
socioambientais.

8. TECNOLOGIAS NA APRENDIZAGEM

8.1 Sociedade contemporânea


73

Desde a transformação das formas de ser e estar no mundo propiciadas pelo


surgimento e pelo desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação, incluindo
as mídias digitais, vários termos foram cunhados na busca por identificar e compreender as
mudanças proporcionadas por essa evolução. Intitulada na Sociologia como sociedade pós-
industrial6 e em outros momentos como era da informação7, que Lévy (1999) apresenta com
o codinome de cibercultura e Castells (2000) denomina como sociedade em rede, mas que,
desde os anos 80, já se apresentava como uma grande mudança nunca antes vista: a era da
comunicação e da informação.
Castells (2000) compreende as tecnologias de informação e comunicação como uma
forma de linguagem que propicia novas percepções, trocas e identidades, considerando, assim
como Lévy (1999, p. 17), “não apenas a infraestrutura material da comunicação digital, mas
também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos
que navegam e alimentam esse universo”.
Nelson Pretto (2013) pontua que o aperfeiçoamento dos computadores foi introduzindo
novas alianças nas indústrias da comunicação. No final do século XX, dá-se início ao
consumo das multimídias com uma associação entre todas as novas tecnologias colocadas à
disposição de um número cada vez maior de pessoas, possibilitada pela diversidade de
técnicas e o uso diferenciado de cada uma delas, individual ou coletivamente. Esse novo
espaço de comunicação e informação, criado a partir da invenção de uma grande “máquina”8
como o computador, não deve ser visto como uma forma de substituição de meios já
estabelecidos como o jornal, correio, telefone, mas sim como uma nova forma de
comunicação e acesso à informação que proporciona novos meios de se relacionar com o
mundo e com o outro. As tecnologias digitais passam a marcar novas atividades dos sujeitos
sociais, de forma que:

[...] como resultado de um processo de relação simbiótica entre o homem, a


natureza e a sociedade, vivemos a era do desenvolvimento das linguagens
digitais em rede e, por consequência, estamos favorecendo, cada vez mais, a
produção de uma sociedade conectada que transforma o comportamento

6
O conceito foi introduzido pelo sociólogo e professor emérito da Universidade de Harvard Daniel Bell na sua
obra The Coming of Post Industrial Society: A Venture in Social Forecasting, de1973.
7
Também conhecida como era digital ou era tecnológica, é o nome dado ao período que vem após a era
industrial, mais especificamente após a década de 1980.
8
“a própria noção de máquina que está sendo definitivamente substituída por um agenciamento instável e
complicado de circuitos, órgãos, aparelhos diversos, camadas de programas, interfaces, cada parte podendo,
por sua vez, decompor-se em redes de interfaces” (SANTAELLA, 1997, p. 41).
74

humano, a sua forma de ver, sentir e estar no mundo (AMARAL; RIBEIRO;


WEBER, 2015, p. 141).

Esses diferentes contornos permitem aos sujeitos se engajarem nos modos como a
informação é veiculada, interferindo em sua forma e conteúdo. Como André Lemos (2007)
aponta, nos seus estudos sobre cibercultura, os sujeitos antes apenas receptores, agora são
produtores de mídias informativas e transitam entre os polos “emissão” e “recepção”. A
liberação do polo de emissão9 possibilita que pessoas comuns sejam capazes de produzir e
emitir suas próprias informações, por meio de diferentes formatos midiáticos, como
fotografias, vídeos ou podcasts. Hjarvard (2014, p. 23)10 sugere que como resultado dessa
liberação “várias formas de mídia foram integradas nas práticas da vida cotidiana, desde os
locais de trabalho até na família”, evidenciando uma estreita relação entre as mudanças
ocorridas nas esferas socioculturais. Dessa forma, torna-se fundamental a problematização,
junto aos educandos, dos usos e conteúdos produzidos e emitidos tanto nas mídias de massa
quanto nas mídias sociais, no contexto escolar.

8.2 Sociedade em rede

Na sociedade em rede, todo o potencial humano interage de modo dinâmico e criativo,


oportunizando ideias e realizando interações com as novas tecnologias da informação e
comunicação. Edméa Santos (2014, p. 25) aponta que o princípio digital traz uma diferença
como surgimento da web ao apresentar-se como sistema de interação e conectividade on-line.
Passamos da massa receptora às redes interagentes no espaço e no ciberespaço.
Segundo Don Tapscott (1996), a organização em rede não é uma característica das
novas tecnologias da informação e comunicação, mas, sobretudo, dos seres humanos:

Não se trata da organização em rede da tecnologia, mas da organização em


rede dos seres humanos através da tecnologia. Não se trata de uma era de
máquinas inteligentes, mas de seres humanos que, através das redes, podem
combinar a sua inteligência, gerando uma inteligência-em-rede, um novo
tipo de inteligência coletiva (TAPSCOTT, apud FRANCO, 2008, p. 30).

9
A liberação do polo de emissão é o princípio básico da cultura pós-massiva e a principal característica da
cibercultura (LEMOS, 2007).
10
“(internet, telefones móveis, televisão via satélite etc.)” (HJARVARD, 2014, p. 23).
75

De acordo com Lévy (2003, p. 28), a inteligência coletiva “é uma inteligência


distribuída por toda parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo real, que resulta
numa mobilização efetiva das competências”. Nesse sentido, é válido pensar nas dinâmicas de
ensinar-aprender que perpassam a produção do conhecimento, que deveriam se assemelhar à
dinâmica das redes, baseada no conceito de inteligência coletiva. A inteligência coletiva nasce
de uma visão em que se reconhece que todos os indivíduos têm potencialidades e são
detentores de conhecimentos que, a partir da colaboração e interação, criam e recriam novos
saberes, por meio de uma fusão entre liberdade de expressão e cooperação.
Associando essa questão ao conceito de ciberespaço, Lévy (1999, p. 29) aponta que o
seu crescimento “não determina automaticamente o desenvolvimento da inteligência coletiva,
apenas fornece a esta inteligência um ambiente propício” ao reunir diferentes mídias e
interfaces. A partir desses conceitos, o ciberespaço apresenta-se como o local onde a
inteligência coletiva se forma pela interação entre as pessoas, resultando na construção da
cibercultura − um movimento sociocultural que estabelece novas relações entre conhecimento
e saber, em novos espaços, mediados pelo digital em rede. Numa perspectiva freireana, aliar a
educação aos elementos de seu tempo é fundamental.
Santos (2014, p. 31) afirma que “aprendemos porque nos comunicamos, fazemos
cultura e produzimos sentidos e significados”. Assim, podemos afirmar que é dessa forma
que se faz a construção do conhecimento, tecida em rede, a partir das aprendizagens
construídas, na apropriação dos artefatos culturais, tecnologias e interações sociais.

8.3 Cultura digital

Não há como negar que a cultura digital vem sendo muito utilizada por crianças e
jovens na contemporaneidade e que esse elemento se faz presente nos seus processos
cotidianos de aprendizagem. Uma das discussões mais importantes da educação é a garantia
da construção do conhecimento. Marco Silva (2015) aponta que, para garantir uma
aprendizagem colaborativa, é essencial uma abordagem inspirada no construtivismo e no
interacionismo: “De acordo com esses referenciais, a aprendizagem acontece na interação dos
aprendizes entre si e na interação com os conteúdos, com os objetos de aprendizagem” (Ibid.,
p .46). Para garantir a construção da mediação da aprendizagem, o docente tem “a seu favor
expressão livre e plural da autoria, compartilhamento, conectividade, colaboração, autonomia,
76

diversidade, dialógica e democracia” (Ibid., p. 57), baseados na ambiência comunicacional da


cibercultura.
Pensando na construção de um referencial que reflita a realidade específica do
município de Niterói, fazemos menção à Base Nacional Comum Curricular, já que a discussão
sobre as tecnologias e a cultura digital permeia todo o texto11. Ademais, duas de suas
competências gerais12 apontam, de forma mais objetiva, a questão de interesse deste estudo:
Comunicação13 e Cultura Digital14. De acordo com essas competências, o mundo digital
insere-se nas formas de comunicação na atualidade, não podendo, portanto, ficar de fora da
formação das crianças e dos jovens contemporâneos, cabendo à escola a oferta e a
qualificação deste uso, considerando a ubiquidade propiciada pelos dispositivos móveis.
Em 2020, durante a pandemia de Covid-19, evidenciou-se a necessidade de
apropriação da cultura digital, por parte de professores e estudantes, tendo em vista que esta
cultura ainda não se fazia presente no cotidiano escolar. Como é possível observarmos na
reflexão de uma escola da Rede:

Durante a pandemia do Novo Coronavírus, ficou bem claro como a escola


está desconectada da realidade cotidiana do aluno no que se refere à inclusão
digital, criando um abismo entre realidade e a necessidade social que é
rodeada pela tecnologia. Isso evidenciou a urgência na implantação efetiva
dessas tecnologias dentro da escola como ferramentas imprescindíveis para o
processo do ensino e da aprendizagem e formação da criança como sujeito
histórico de um mundo todo conectado (E. M. Eulália da Silveira
Bragança/Parecer, 2020).

A formação do estudante articulada a essas competências passa pela compreensão de


que a cultura digital, presente no cotidiano escolar, deve se basear em uma perspectiva de
educação crítica para as mídias e tecnologias digitais de informação e comunicação,
possibilitando que os sujeitos possam protagonizar as ações de suas práticas sociais, sendo
capazes de propor soluções para seus problemas cotidianos. A proposta curricular que observa
os desafios do mundo contemporâneo oferece subsídios fundamentais para a formação dos
estudantes para a vida no século XXI.

8.4 Infância e juventude na educação contemporânea

11
Em todos os componentes curriculares, diversas habilidades fazem menção explícita à tecnologia.
12
As Competências Gerais da BNCC “articulam-se na construção de conhecimentos, no desenvolvimento de
habilidades e na formação de atitudes e valores, nos termos da LDB” (BRASIL, 2019, p. 9).
13
Competência 4.
14
Competência 5.
77

É importante pontuar alguns pressupostos relacionados à temática da infância e da


juventude na sociedade contemporânea, compreendendo que os usos que fazem das
tecnologias digitais e a relação desses sujeitos com a cultura digital trazem implicações para
as dinâmicas educacionais no espaço escolar. Refletir, (re)pensar e (re)configurar novos
modelos relacionais com os estudantes, novas estratégias pedagógicas e novos modelos de
avaliação que incluam a cultura digital, sem desconsiderar os modos existentes, permitirá a
ampliação das formas de fazer educação n contemporaneidade.
De acordo com Fernandes (2019, p. 44), “o convívio com as novas tecnologias
modificou a maneira como as crianças aprendem”, apontando uma nova forma de apreender a
realidade e transitar no mundo. As crianças imersas na cultura digital vão considerar a
construção do conhecimento como processo que se dá de forma não linear. Nesse sentido,
significando diferentes pontos de vista, diferentes realidades que perpassam a história
registrada nos livros até a história pessoal/familiar dos indivíduos envolvidos no processo de
ensinar e aprender.
Fernandes (2019, p.44) aponta que a relação das crianças com as mídias “forja uma
nova concepção de infância” e, portanto, não pode ser desconsiderada. O convívio com as
novas tecnologias nos apresenta uma criança que aprende diferente, de uma forma não linear,
a lógica da linearidade não existe mais para essa criança, já que "com a Internet, os assuntos
nunca são isolados e sempre estão ligados a outros em temas relacionados" (Ibid., p. 44). A
criança desta nova infância compreende a construção do conhecimento pautada neste
movimento, portanto temos uma concepção de "infância como um ser em desenvolvimento"
(Ibid., p. 47), para quem os espaços da mídia tornam-se lugares de formação tanto quanto a
escola.

Na atualidade, a cultura da mídia assume, ao lado das instituições


tradicionais, importante papel na socialização das crianças e jovens e estes,
muitas vezes, recebem da mídia os papéis e elementos mais decisivos para a
formação de sua identidade através de dispositivos pedagógicos da mídia
(Ibid., p. 48).

A autora entende a cultura como um processo inacabado e como produção coletiva,


afirmando que os sujeitos a produzem nas relações com o outro e em sociedade. As crianças
são também produtoras de cultura, já que a forma como elas lidam com o conhecimento é
cultural.
78

Para pensar o jovem contemporâneo e as suas relações na cibercultura, os autores


Ferreira, Oswald e Chaves (2015) apontam que as juventudes, que se encontram imersas nos
contextos informacionais, vivem suas experiências na cultura pós-massiva, por meio dos
dispositivos tecnológicos, o que as leva a uma nova compreensão de suas formas de ser e estar
no mundo. Os usos que os jovens, praticantes culturais, fazem das tecnologias digitais em
rede são fundamentalmente parte integrante da formação de suas subjetividades e também
contribuem para que possamos compreender melhor o jovem deste século. Para Santos,
Carvalho e Pimentel:

[...] e vêm provocando transformações em todos os setores da vida


contemporânea. As novas práticas, modos de comunicação, organização e
mobilização social, maneiras de viver e compartilhar o que se passa em
nosso cotidiano com os usos das tecnologias digitais em rede dão forma à
cibercultura (CARVALHO; SANTOS; PIMENTEL, 2016, p. 24).

O jovem imerso nesta era digital já não apenas se comporta de forma diferente, mas
também pensa diferente. A dinâmica das redes potencializa esse jovem no sentido de criar,
simular, emitir sua opinião, criticar, construir e desconstruir o mundo em tempo real.
Ao considerarmos a imersão das crianças e jovens na cultura digital na sociedade
contemporânea, é válido consultar as orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e
da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) com referência ao tempo de exposição a telas por
parte desses sujeitos.

8.5 Redefinição dos espaços e tempos da escola

Outro aspecto que pode ser pontuado é a definição de espaço e tempo. A escola tem a
delimitação de tempos e espaços com normas específicas. Redefinir os tempos e os espaços na
escola é fundamental na atual sociedade contemporânea. Para se comunicar com o outro, não
é necessariamente mais preciso estar ao mesmo lado fisicamente. A lógica de crianças
sentadas, enfileiradas, quietas umas atrás das outras, de frente para o quadro, é colocada em
xeque no momento atual, assim como abordam Ferreira e Mattos (2015) se reportando a uma
reflexão de Bauman:

A cultura escolar continua organizada para atender um sujeito adaptado a


uma sociedade que valoriza a ordem, estabilidade, padronização, rotina,
previsibilidade, determinação, ou seja, tudo o que vem sendo liquefeito na
modernidade líquida (BAUMAN, 2001). Imprevisibilidades, diferenças e
79

liberdades variadas ainda são, comumente, interpretadas como ameaças à


ordem escolar (FERREIRA; MATTOS, 2015, p. 282).

Dessa forma, a compreensão dos modos de ser e pensar de crianças e, principalmente,


de jovens torna-se imprescindível para aproximá-los cada vez mais da escola, da sua cultura.
Se não refletirmos sobre quem são as crianças e jovens das escolas de hoje, se não tivermos
uma escuta sensível e qualificada para o que eles têm a dizer, como repensar a escola e o
sistema educacional, no sentido de possibilitar a formação de professores para atuar neste
novo cenário? Cenário esse que remete a outros tempos, em múltiplos espaços, diferenciados,
principalmente, no tocante à relação de crianças e jovens com as mídias e tecnologias digitais
móveis.
Pode-se perceber a importância dos espaços e tempos pelos quais os jovens transitam
na cidade e que esses se configuram como territórios culturais, nos quais o protagonismo é
uma das principais características vivenciadas por eles; são “espaços próprios de socialização
que se transformam em territórios culturalmente expressivos e nos quais diferentes
identidades são elaboradas” (CARRANO; MARTINS, 2011, p. 44). Tal protagonismo
permite a reconfiguração dos espaços e tempos vividos e a escola não pode estar distante
disto.
A cultura digital vigente traz inovações às práticas pedagógicas, uma vez que amplia
os espaços/tempos de ensino-aprendizagem para além das salas de aula, colaborando para
uma educação comprometida com a formação de sujeitos que relacionem criticamente os
conteúdos curriculares com suas práticas culturais e suas experiências cotidianas, o que
propicia “uma atualização reflexiva e transformadora da escola contemporânea” (FERREIRA;
MATTOS, 2015, p. 275).
Assim, as mídias e tecnologias digitais, integradas aos processos de ensino e
aprendizagem, podem propiciar a compreensão e a produção do conhecimento de forma
ampla e global. No entanto, vale ressaltar que as tecnologias, por si sós, não são capazes de
revolucionar as práticas pedagógicas. É preciso mediação, formação e experimentação.

8.6 Metodologias Ativas da Aprendizagem

Tendo em vista a construção de um currículo que se utiliza dos instrumentos culturais


da prática social contemporânea e se propõe como uma construção social, que considera
tempo, lugar e contexto, desenvolvendo-se na ação (ALMEIDA; SILVA, 2011), deseja-se
80

romper com um modelo tradicional de ensino, no qual não são consideradas as experiências e
a cultura dos estudantes como parte significativa do eixo da aprendizagem, articulando os
fazeres e saberes em sala de aula de forma dialógica e reflexiva. Para Valente (2014), o
desenvolvimento de abordagens educacionais baseadas na aprendizagem ativa implica

[...] transformações conceituais, como repensar o currículo, entender o que


significa aprender e como a escola pode ser geradora e não só consumidora
de conhecimento, espaço de diálogo, solidariedade, articulação entre o
conhecimento local e o global, e convivência com a diferença (p. 162).

Na perspectiva de um currículo flexível e construído de forma participativa por toda a


comunidade escolar, mais centrado nos alunos e nos seus processos formativos, encontram-se
as Metodologias Ativas (Moran, 2013), predominantemente com um trabalho interdisciplinar.
As Metodologias Ativas acabam por ser uma crítica ao modelo de “Educação Bancária”, tal
qual afirma Paulo Freire (1970).
Uma das formas de se trabalhar nesta perspectiva é por meio do STEAM (Science,
Technology, Engineering, Arts and Mathematics), que mais do que uma metodologia é uma
abordagem pedagógica que se constitui em uma forma de ensino. De acordo com Bacich e
Holanda,

[...] a educação STEAM pode contribuir para lidar com os desafios


contemporâneos, ajudando a pensar uma educação que, sem abandonar a
excelência acadêmica, também desenvolva competências importantes, como
a criatividade, o pensamento crítico, a comunicação e a colaboração
(BACICH; HOLANDA, 2020, p. 2).

Este tipo de abordagem possibilita ao estudante não só a integração das áreas do


conhecimento, mas seu uso para estabelecimento de conexões na hora de resolução de
problemas diários. O aprendizado é amplamente beneficiado com a interdisciplinaridade e se
apresenta como um processo que oferece uma forma de valorizar as experiências vividas
pelos alunos, em especial as experiências práticas, em que os estudantes aprendem a colaborar
uns com os outros e a se preparar para desafios que enfrentarão enquanto cidadãos.
É papel importante do professor ser o mediador dessa nova proposta pedagógica. Ele
deve levar os estudantes a entenderem como aprender fazendo:

Existe uma mudança no papel dos professores quando tratamos de projetos


STEAM. A primeira delas acontece na concepção e no planejamento do
projeto. Para desenhar um projeto, é necessário, para além de escolher um
contexto autêntico, ter conhecimento dos objetivos de aprendizagem das
demais áreas e de recursos que possam contribuir com o protagonismo dos
estudantes, como um conhecimento sobre metodologias, práticas inovadoras
ou recursos digitais (BACICH; HOLANDA, 2020, p. 8).
81

É nesta perspectiva que Moran (2018, p.3) nos ensina que “ ensinar e aprender
tornam-se fascinantes quando se convertem em processos de pesquisa constantes, de
questionamento, de criação, de experimentação, de reflexão e de compartilhamento crescentes
[...]” A educação, dessa forma, fica mais desafiadora e atrativa.
No contexto das metodologias ativas, temos, ainda, a aprendizagem baseada em
projetos, cuja abordagem permite a integração de diversos saberes com o protagonismo dos
alunos na construção de seu conhecimento. O trabalho baseia-se na elucidação de problemas,
desenvolvendo a criatividade e o pensamento crítico de forma cooperativa.
Segundo Campos (2013), a Aprendizagem Baseada em Projetos (PBL) tem sido um
dos principais focos da discussão, não apenas como abordagem de aprendizagem ativa, mas
também como alternativa para elaborarem-se currículos e adotarem-se práticas inovadoras na
educação. Exige que o professor reflita sobre a atividade docente e mude a sua postura
tradicional de especialista em conteúdo para mediador e que os estudantes assumam maior
responsabilidade em sua própria aprendizagem.
Hernández e Ventura (1998) tratam da pedagogia de projetos como um percurso
metodológico que envolve professores e alunos em uma dinâmica busca pelo conhecimento.
Movimento esse que tem como forte característica “evitar o perigo da estandardização e
homogeneização das fontes de informação” (Ibid., p. 64), garantindo espaço para a troca entre
as diferentes fontes de saberes elencadas pelo grupo envolvido no estudo. A prática
pedagógica que tem a pedagogia de projetos como forma estruturante do seu caminhar prevê a
elaboração de “um dossiê de síntese dos aspectos tratados no projeto” desenvolvido, como
podemos observar:

O projeto permite aos estudantes, a partir do índice final (síntese), organizar


uma observação das atividades que se realizaram durante o seu
desenvolvimento […] a recapitulação final tem razão de ser não só como
agrupamento do estudado, mas sim como percurso ordenado […] em função
dos diferentes aspectos da informação trabalhados e dos procedimentos que
se tenham utilizado para isso (Ibid., p. 80).

O trabalho por projetos colabora com a produção do conhecimento à medida que, a


partir de um determinado tema, problema ou questão de seu interesse, os alunos são levados a
desenvolver suas estratégias de pesquisa, a buscar diferentes fontes de informação,
mobilizando, assim, tanto saberes produzidos na escola quanto aqueles que emergem de suas
vivências e experiências em seus contextos sociais e culturais. Por meio de atividades
práticas, em grupos ou individualmente, diferentes conteúdos são trabalhados, abrangendo
ainda os conteúdos atitudinais, conceituais e procedimentais.
82

Ainda sobre o trabalho por projetos, Corsino (2009, p. 106) afirma que esses
“valorizam o trabalho e a função do professor que, em vez de ser alguém que reproduz ou
adapta o que está nos livros didáticos e nos seus manuais, passa a ser pesquisador do seu
próprio trabalho”. Com isso, destaca que, em um trabalho baseado na pedagogia de projetos, a
função do professor passa a ser de pesquisador de sua prática e que este professor-pesquisador
compreende que os alunos são sujeitos que possuem uma história, da qual participam de
forma ativa, e produtores de cultura no mundo em que vivem. Corsino (Ibid., p. 105) ressalta
ainda que “trabalhar com projetos na escola desde a Educação Infantil é uma forma de
vincular o aprendizado escolar aos interesses e preocupações das crianças, aos problemas
emergentes na sociedade em que vivemos, à realidade fora da escola e às questões culturais
do grupo”.
Diante do cenário de pandemia imposto à toda a sociedade no ano de 2020, fez-se
urgente repensar as estratégias e percursos metodológicos a serem adotados pelos professores
da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, com o intuito de manter o vínculo com os
alunos e, de forma emergencial, ampará-los no que diz respeito ao acesso à educação.
Com esse pensamento, fez-se necessário apontar formas para uma abordagem
pedagógica que, num primeiro momento, se valesse de encontros assíncronos e síncronos
mediados por AVAs. O atual cenário nos aponta a necessidade de pensar formas e estratégias
que vislumbrem uma educação mediada pelo ensino híbrido, perspectiva que compreende
combinar o ensino presencial com propostas de ensino remoto. Tais abordagens podem estar
amparadas na perspectiva da sala de aula invertida, método que inverte a lógica convencional
de organização do fazer pedagógico. Essa abordagem compreende que os alunos tenham um
primeiro contato com os conteúdos em suas próprias casas, por meio de diferentes mídias e
recursos digitais, como videoaulas, games e podcasts, indicados pelos professores. A aula
presencial seria o momento de problematizar esses conteúdos, um espaço para a realização de
exercícios, de atividades em grupo e privilegiado espaço para a construção de projetos.

O referencial curricular está sendo construído para um mundo que não existe
mais como o conhecíamos e é necessário que reflitamos sobre os modos de
ensinar e aprender com base nos novos comportamentos de segurança, saúde
e tecnologia necessários.[...] É urgente pensar novos espaços educacionais
com estratégias híbridas, atraentes para as crianças das várias faixas etárias e
a criação de estratégias de “alfabetização” digital para docentes e discentes
(E. M. Eulália da Silveira Bragança/Parecer, 2020).

Pensar a escola a partir das perspectivas metodológicas apresentadas aponta para a


multiplicidade cultural e para as múltiplas formas de comunicação atuais. Para tanto, Rojo
83

(2012) avalia serem necessárias novas práticas escolares que contemplem desde a “produção
de conteúdos” até a “análise crítica como receptor” (Ibid., p. 21), isto é, tornam-se necessárias
novas abordagens para além dos registros de escrita manual e impressa, contemplando
também o áudio, o vídeo, o tratamento da imagem, a edição e a diagramação. O acesso às
novas formas de comunicação e informação “acarretam novos letramentos, de caráter
multimodal ou multissemiótico” (Ibid., p. 13), emergindo uma necessidade por uma
pedagogia dos multiletramentos15.

8.7 Considerações finais

Dessa forma, trazemos questões que possam refletir sobre todo o trabalho já realizado
com mídias e tecnologias digitais na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, iniciado
em 1996, com a implementação dos laboratórios de informática nas Unidades de Ensino
Fundamental, passando pelo uso de recursos digitais diversos desde a Educação Infantil até o
trabalho com diferentes metodologias no momento atual. Tais propostas priorizam o fazer
pedagógico mediado pelas mídias e tecnologias digitais de forma crítica e reflexiva,
potencializando a produção do conhecimento entre professores e alunos, nas mais variadas
formas: uso de aplicativos, softwares, projetos com robótica educacional, atividades maker,
filmes de animação digital, produção midiática, atividades gamificadas, realidade aumentada,
plataformas digitais, aproximando a escola da cultura digital.

9. AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E DA APRENDIZAGEM

Diante do papel que a avaliação tem assumido enquanto política pública no Brasil e no
mundo, provocando questionamentos e tensões, torna-se imprescindível o estabelecimento de
diálogo e parceria com a comunidade educativa, compreendendo o movimento de
participação como manifestação indispensável para o avanço das discussões no campo da
avaliação.

15
Termo cunhado pelo Grupo de Nova Londres para abranger a multiculturalidade característica das sociedades
globalizadas e a multimodalidade dos textos por meio dos quais a multiculturalidade se comunica e informa
(Rojo, 2012, p. 13).
84

Na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, busca-se construir uma cultura


avaliativa fundamentada em princípios democráticos e de responsabilização participativa,
promovendo reflexões acerca da aprendizagem, do fazer pedagógico e dos processos de
gestão que influenciam as ações desenvolvidas.
A perspectiva participativa da avaliação busca implementar os processos de
autoavaliação, que podem estar combinados com os procedimentos de avaliação externa, e
“nisto diferem das avaliações objetivistas, quase exclusivamente externas e para uso de
pessoas que não fazem parte do cotidiano das instituições avaliadas” (SOBRINHO, 2003, p.
125). Busca, portanto, envolver os agentes internos de todos os níveis e categorias e
representantes da comunidade externa com uma intencionalidade educativa e fundamentos
assentados em princípios democráticos. “Neste caso, a relação entre os participantes não é de
autoridade, mas de intersubjetividade, ou seja, entre sujeitos que, baseados na
responsabilidade, se expressam livremente sobre os dados e processos que devem ser
interpretados e avaliados” (Ibid., p. 125).
A avaliação que se deseja participativa e democrática valoriza a participação social na
construção e execução de seus próprios processos. Distinguem-se dos enfoques tecnológicos,
de corte empirista-objetivista que, em geral, valorizam sobremaneira o aparato técnico e seus
produtos predeterminados e que, pretensamente, dariam legitimidade aos resultados
avaliativos que produzem. Trata-se, portanto, de uma outra perspectiva ética e epistemológica
distinta das avaliações que adotam modelos tecnocráticos.
Para Sordi e Freitas (2013, p. 91), “a busca de outra ética e epistemologia para os
processos de regulação da qualidade da escola pública tem desafiado as redes de ensino a
conceber e implementar modelos alternativos”, a partir de uma concepção de
“responsabilização participativa”. Sob o viés da participação e da negociação com os atores
implicados no processo avaliativo, a Rede aposta em objetivos e compromissos amplos de
qualidade da educação, que acarretem o exercício coletivo de apropriação das situações do
cotidiano e da reflexão sobre o futuro, principal função dos processos avaliativos.
Desse modo, propõem-se movimentos de articulação e interação, tendo em vista a
construção de perspectivas que considerem diferentes sentidos de qualidade da educação.
Avaliar, nessa visão, tem a ver com o modo como os atores se relacionam nos espaços intra e
extraescolares e se reconhecem no processo educativo, caracterizando-se como ato político-
pedagógico.
Nesse sentido, procura-se desenvolver um trabalho de avaliação mais abrangente, na
perspectiva da avaliação institucional participativa, cujo objetivo é criar instrumentos
85

avaliativos, visando à produção de informações que viabilizem um maior conhecimento do


contexto socioeducativo, com a finalidade de redimensionar ações para a qualificação do
processo de ensino-aprendizagem.
Cabe destacar a importância de se avaliar cada aspecto que afeta direta ou
indiretamente o desenvolvimento escolar de cada discente, compreendendo a necessidade de
uma avaliação que considere suas múltiplas dimensões – as relações interpessoais, as relações
com a comunidade, as condições de trabalho dos profissionais, o envolvimento dos estudantes
com a aprendizagem, a participação dos responsáveis pelos estudantes na vida escolar deles, a
gestão do trabalho pedagógico, entre outras –, realizada em diferentes âmbitos, por todos os
atores envolvidos.
Freitas et al.(2014) destacam que

[...] pensar em avaliação institucional implica repensar o significado da


participação dos diferentes atores na vida e no destino das escolas. Implica
recuperar a dimensão coletiva do projeto político pedagógico e,
responsavelmente, refletir suas potencialidades, vulnerabilidades e
repercussões em nível de sala de aula, junto aos estudantes (FREITAS ET
AL., 2014, p. 35).

Neste cenário, a avaliação institucional colabora para o reconhecimento das


expectativas e propostas pedagógicas, propiciando momentos de discussão e reflexão quanto
aos planos de ação e aos entraves detectados no percurso de realização destes. Deve servir,
também, como incentivo à participação da comunidade educativa, no processo de
planejamento e tomada de decisões para a proposição de mudanças necessárias à
aprendizagem dos alunos.
Assim, trabalhar com a perspectiva de responsabilização participativa permite à Rede
Pública Municipal de Educação de Niterói construir e analisar indicadores locais de
qualidade, possibilitando a sinalização da situação das dimensões avaliadas, a partir da
identificação dos pontos favoráveis e daqueles que necessitam de atenção em cada contexto.
As situações do cotidiano escolar, traduzidas em indicadores, apenas
quantitativamente, não representam tudo o que significam para os que vivenciam o processo
pedagógico. Torna-se necessário interpretar e qualificar as informações que as avaliações,
sejam elas internas ou externas, expressam por meio de seus resultados. Além disso,
considera-se importante estabelecer e discutir indicadores processuais, que não são
necessariamente expressos em números. A articulação entre indicadores numéricos e
processuais, em contexto participativo, contribui para o entendimento amplo de avaliação, que
integra, aproxima e contextualiza o fazer pedagógico.
86

Dessa maneira, avaliar implica outros modos de pensar o ser humano, não mais como
sujeito pronto, determinado, mas sim em permanente construção e transformação. Uma
proposta pedagógica que busca a formação integral dos sujeitos compreende o conhecimento
em sua complexidade, concebendo a avaliação a partir de uma perspectiva que considere o
ensino e a aprendizagem como fenômenos sociais construídos na relação dialógica entre
sujeitos e saberes. Tal concepção aponta a existência de múltiplos modos, tempos, estratégias,
estilos e jeitos de ensinar e aprender16.
Nessa ótica, ensinar e aprender são frutos da interação entre os sujeitos e as diferentes
formas de comunicação, expressão e construção social, sendo, então, a avaliação assumida
como parte do processo pedagógico. Para isso, ela deve ser contínua, realizada em diferentes
momentos, oportunizando um acompanhamento sistematizado do ensino e da aprendizagem.
Gatti (2003) ressalta

[...] que a avaliação não seja apenas finalista, mas, sim, incluída no processo
de ensino e aprendizagem como meio para o autodesenvolvimento, tanto dos
alunos em suas aprendizagens, quanto dos professores, como profissionais,
em face das suas formas de ensinar (GATTI, 2003, p.102).

Não é possível considerar apenas os produtos da aprendizagem demonstrados em


habilidades e inabilidades expostas pelos alunos, mas a compreensão de novas formas de
ensinar e aprender, que fazem parte do processo contínuo e individualizado do aprendizado,
reconhecendo diferentes condições, tempos, ritmos e trajetórias de vida. Ao considerar que a
avaliação não é um fato isolado, atende-se às necessidades de todos os envolvidos neste
processo, principalmente alunos, com ou sem deficiência, e professores, desencadeando a
construção do conhecimento e redirecionando as práticas pedagógicas, fornecendo subsídios
que permitam garantir direitos fundamentais e humanos.
Como diz Luckesi (2011, p. 263): “[...] o ato de avaliar a aprendizagem na escola é um
meio de tornar os atos de ensinar e aprender produtivos e satisfatórios”. Dessa forma, não se
pode desvincular a avaliação do aluno do processo de ensino do professor. Não se quer dizer
com isso, por exemplo, que, se o aluno não aprendeu, o professor não ensinou
adequadamente. O processo de ensino-aprendizagem é de uma complexidade maior do que
isso. A avaliação, como instrumento a serviço da aprendizagem do aluno, deve contribuir para
a análise e para a decisão de quais ações pedagógicas podem ser tomadas durante o processo
de ensino.

16
Parágrafo adaptado do texto apresentado pelo grupo de trabalho que discutiu a Proposta Pedagógica em 2015.
87

Ainda presente em muitas escolas, a avaliação feita apenas no fim do processo e como
mera constatação não contribui para o avanço da aprendizagem do aluno. A constatação é o
início de um processo, é o ponto em que atribuímos uma qualidade (positiva ou negativa) ao
que está sendo avaliado. A partir daí, entra a análise e a tomada de decisão sobre “o que
fazer”, por isso a avaliação deve ser contínua, e não feita tão somente no fim do processo.
É o mesmo Luckesi (2011) quem nos diz que

[…] para qualificar a aprendizagem de nossos educandos, importa, de um


lado, ter clara a teoria que utilizamos como suporte de nossa prática
pedagógica, e, de outro, o planejamento de ensino, que estabelecemos como
guia para nossa prática de ensinar [...] (LUCKESI, 2011, p. 265).

Caso seja percebido, durante o processo de ensino, que alguns alunos não conseguiram
atingir os objetivos propostos, é hora de redirecionar as ações para que as metas de
aprendizagem sejam atingidas. Por outro lado, também é importante que se desenvolva nos
alunos a habilidade de se autoavaliar, para que assim possam apropriar-se dos recursos
internos que utilizam (metacognição) e, dessa forma, sejam capazes de estabelecer ações que
favoreçam a autorregulação da própria aprendizagem.
Tudo isso reforça a ideia de que a prática da avaliação da aprendizagem deve apontar
para a busca do melhor (potencial) de todos os educandos, por isso é diagnóstica e não se
interrompe na simples constatação.
Acrescenta-se a esse ponto de vista o entendimento de que se faz necessária a
participação e a responsabilidade de todos os atores da comunidade educativa neste processo.
Cabe destacar que, no espaço educativo, todos ensinam e aprendem, mútua e continuamente,
portanto, todos devem avaliar seus fazeres.

Esta aprendizagem de viver, colaborativamente, um projeto implica entender


e usar a avaliação como uma estratégia organizadora dos múltiplos olhares e
ações sobre a realidade, na perspectiva de produzir melhorias (SORDI;
LUDKE, 2009, p. 316).

É essa cultura avaliativa que este documento pretende disseminar, uma cultura
entendida como prática articulatória em constante negociação, engendrada em diferentes
tempos e espaços, ou seja, que não é dada a priori nem é estanque, mas se constitui pelos
diferentes sentidos, pelas diferentes leituras produzidas pelos diferentes atores e situações de
aprendizagem e de ensino.
88

10. CONSIDERAÇÕES SOBRE A TRANSIÇÃO ENTRE CICLOS

A infância não é aqui concebida como um mero período da vida, com limites impostos
para o seu início e fim. Pelo contrário, compreendemos a infância como construção social que
se constitui na relação com o outro e com o contexto sócio-histórico-cultural, como parte
essencial dos aspectos que nos tornam humanos.
Nesse sentido, reafirmamos o compromisso de pensar a infância em sua dimensão
plural, pois caminhamos na direção contrária à ideia de concebê-la a partir de um conceito
único, abstrato e fixo, para além de sua raiz etimológica. Além disso, perspectivando pensar
sobre as crianças e suas infâncias com amorosidade, afetos e legitimação do outro como
sujeito singular/plural, concebemos a infância enquanto experiência humana, permeada por
sentidos, brincadeiras, imaginação, criação e ruptura com as tentativas de fragmentação e
engessamento da sociedade.
Assim, lançamos um olhar atento para essas questões, pois elas nos convocam a
refletir sobre a passagem da criança da Educação Infantil para o Ensino Fundamental, assim
como para os processos de ensino-aprendizagem, na perspectiva da humanidade em
transformação.
Nesse sentido, dedicamos as linhas que se seguem a trazer à cena reflexões em torno
da questão da transição de alunos de uma etapa para outra, com o propósito de suscitar olhares
outros, mais sensíveis, para esse movimento inerente ao processo de escolarização.
As crianças ingressam no universo escolar com expectativas e curiosidades. Na escola,
elas interagem, estabelecem relações, vivem experiências variadas, aguçam percepções, fazem
descobertas, afloram sensibilidades e afetos, falam e agem com desenvoltura e
espontaneidade. O reconhecimento dessa infância com base em uma concepção que rompa
com uma dimensão didatizadora adultocêntrica evidencia a necessidade de uma escuta
sensível às questões apresentadas pelas crianças. Estudos do campo do currículo articulados
com estudos da infância nos ajudam a conclamar por práticas educacionais com as crianças no
contexto escolar e não apenas sobre e para elas, o que revela a compreensão de que o
protagonismo da criança esteja em cena na produção curricular desde a mais tenra idade.
Afinal, precisamos superar, na prática, a ideia da criança como infante, pois sabemos que “a
fala é um instrumento de direito, uma proclamação: negação daquilo que o silêncio é –
submissão, complacência, desigualdade, menoridade” (MARTINS, 1993, p. 54).
89

Assim, inspirados em Benjamim (2002), dizemos que é preciso ser colecionador do


que as crianças trazem consigo. Segundo esse autor, a criança estabelece entre os mais
diferentes materiais, através daquilo que cria em suas brincadeiras, uma relação nova. A
criança cria, inova, faz do universo dos adultos o seu grande canteiro de obras, criando para si
um mundo imaginário baseado na criatividade, na brincadeira e na fantasia (SANCHES e
SILVA, 2018).
A fantasia do brincar, o lúdico, não são novidades teórico-práticas nos/para os espaços
de Educação Infantil, no entanto o modo de organização da sociedade letrada conduz a
criança à passagem para um novo ciclo de escolarização. E, se estar na escola desde os
primeiros anos de vida é desafiador, essa mudança de etapa escolar pode trazer à baila
angústias, medos e dúvidas. Sentimentos muitas vezes gerados na própria dinâmica escolar
quando o reforço de lógicas prefixadas e predefinidas para a transição dominam um processo
que deveria estar alicerçado na continuidade do trabalho pedagógico desenvolvido com foco
em aprendizagens significativas e ressignificação dessas aprendizagens para as crianças e
adultos envolvidos no processo.
Nesse contexto, um olhar mais panorâmico, processual e mais próximo da criança
subjaz essa relação que não se encerra ao fim da Educação Infantil. O fosso que se estabelece
nessa transição, relegando o lúdico a segundo plano, em prol de um aprender fixado no
“conteúdo”, é o que buscamos confrontar. Acreditamos que é possível subverter a lógica
escolar da previsibilidade e incorporar a essa transição o reconhecimento da(s) infância(s) em
curso, de tal forma que a experiência da infância continue dando contorno e sentidos às
práticas cotidianas na escola.
Essas reflexões também se estendem ao processo de transição dos alunos do Ensino
Fundamental, sobretudo aqueles que saem do quinto ano de escolaridade (2º ciclo do Ensino
Fundamental) e são recebidos no sexto ano de escolaridade (3º ciclo do Ensino Fundamental).
Guimarães Rosa, em Grande Sertão: Veredas, diz: “O real não está no início nem no fim, ele
se mostra pra gente é no meio da travessia” (ROSA, 1994, p. 85). É preciso ter em conta o
caráter “processual” da aprendizagem, sem perder de vista a beleza do trajeto. Por isso,
destacamos a importância do acolhimento, da escuta sensível em relação à chegada da criança
em seu novo espaço-tempo de aprendizagem.
Somos seres relacionais, singulares, sociais, portanto a conversa, a troca e o vínculo
afetivo tanto nos dizem respeito. Daí a importância de se proporem situações e práticas que
busquem aproximações reais com a etapa escolar vivida. Fazemos esse destaque, pois, por
vezes, a ludicidade e o brincar até são incorporados ao fazer pedagógico, mas a maneira como
90

são concebidos e desenvolvidos acabam por burocratizar as relações. Eles são mediados de
modo diferente, às vezes com tom prescritivo e nesse momento tornam-se pretexto para o
encaminhamento de atividades pedagógicas, estratégias para deixar um determinado momento
do dia menos cansativo. Contudo, tais práticas não são reconhecidas como linguagem e força
potencial para o desenvolvimento e aprendizagem dos sujeitos.
Salientamos, portanto, a importância de se construir um fazer pedagógico dialógico,
interacional e contínuo. Por esse viés, a produção de conhecimento, o processo de ensino-
aprendizagem é concebido com/a partir de estratégias que valorizem e legitimem as
aprendizagens já vivenciadas na etapa anterior de estudos. Há, nesse sentido, a preocupação
em se promoverem ações que buscam favorecer a continuidade de experiências próprias do
universo infantil. Desse modo, a possível ruptura no processo do “rito de passagem” pode, em
certa medida, ser suavizada, e tal movimento constitutivo da vida moderna pode ser
vivenciado com menos ansiedade e insegurança.
Nesse sentido, destacamos a importância das interações. Ao abordar a disponibilidade
ao diálogo no processo educativo, Freire (2019) aponta que “[...] o sujeito que se abre ao
mundo e aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica em que se confirma como
inquietação e curiosidade, como inconclusão em permanente movimento na história”
(FREIRE, 2019, p. 133).
Nós somos seres singulares e sociais, inconclusos. Constituímo-nos na relação com o
outro. É também nesse movimento alteritário que ampliamos nossa percepção sobre nós
mesmos e sobre o mundo, despontamos processos criativos, autorais, tomamos consciência
no/do mundo e de nós mesmos. Portanto, na interação uns com os outros produzimos
conhecimentos. Dessa forma, almejamos que os espaços escolares de todas as etapas de
ensino sejam repletos de ludicidade, vivacidade, imaginação, criação e encontros com o outro.
Em vez de focar na (re)produção, a escola precisa investir na criação, no
desenvolvimento da sensibilidade, no aguçamento dos sentidos, deslocando o conceito de
criatividade de um viés produtivo para um viés mais sensível, caminhando na contramão da
concepção utilitária do pensamento (DALUZ, 2019). Para estimular o pensamento criativo na
escola, torna-se fundamental desviar o foco das atividades intrinsecamente pragmáticas,
literais, que visem a uma suposta unicidade, que busquem a resposta certa, caminhando para
uma atitude estética e filosófica que indague os fenômenos por meio do olhar e da escuta
sensível. É preciso, portanto, que caminhemos para uma abertura do olhar, dos sentidos, da
metaforização, da multiplicidade de leituras, da sensibilidade, para “a liberdade de
imaginação e o desenvolvimento da sensibilidade estética” (SILVA, 2013, p. 31).
91

Em uma sociedade capitalista que não cansa de impor uma educação marcada pelo
viés econômico utilitário, a arte e o brincar cumprem o importante papel de contraexistir
como uma forma de resistência. Assim, que haja continuidade e ampliação das narrativas
discentes, dos afetos, das brincadeiras, conversas, jogos, repertórios de histórias, faz de conta,
rodas de interesses, da experiência estética com a literatura e as artes. Que ao chegar ao
Ensino Fundamental, as experiências que as crianças trazem da Educação Infantil e as suas
vivências fora da escola não tenham uma escuta limitada e regulada. Que assim também seja
em qualquer momento de transição. Que saibamos valorizar as histórias e as bagagens da
viagem. Que a importância do que sabem e pensam sejam reveladoras de caminhos para
novas "leituras" que estejam além da decodificação das palavras. Que a espontaneidade e
sabedoria infantis sejam motrizes para um processo de ensino-aprendizagem significativo em
todos os anos do Ensino Fundamental da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói. E
que a viagem seja bonita, incrível e leve para todos.

11. CICLOS DO ENSINO FUNDAMENTAL

O Ensino Fundamental atende aos sujeitos que, em seus diferentes ciclos de


desenvolvimento (infâncias e adolescências17), são ativos social e culturalmente, porque
aprendem e interagem. Tais crianças e jovens

[...] são cidadãos de direitos e deveres em construção; copartícipes do


processo de produção de cultura, ciência, esporte e arte, compartilhando
saberes, ao longo de seu desenvolvimento físico, cognitivo, socioafetivo,
emocional, tanto do ponto de vista ético, quanto político e estético, na sua
relação com a escola, com a família e com a sociedade em movimento
(BRASIL, 2010, p. 35).

Os ciclos de desenvolvimento são marcados por profundas e extensas transformações


físicas, afetivo-emocionais, socioemocionais, psicológicas e cognitivas. Reconhecendo que
tais transformações não acontecem em tempos iguais para todos os sujeitos, enfatizamos a
necessidade do reconhecimento da diferença como inerente ao humano e da assunção de que
as crianças e os adolescentes são atores sociais, sujeitos de direito e de cultura (GADOTI,

17
Como sujeitos históricos que são, as características de desenvolvimento dos educandos estão muito
relacionadas com seus modos próprios de vida e suas múltiplas experiências culturais e sociais, de sorte que
mais adequado seria falar de infâncias e adolescências no plural (BRASIL, 2010, p. 110).
92

2006; SARMENTO, 2018). “É preciso levar em conta a pluralidade cultural na qual nos
inserimos e o respeito às diferenças que dela provém e caracterizam cada educando como um
ser único com suas especificidades” (E. M. PROFESSOR ANDRÉ TROUCHE/GTs, 2019).
O Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) considera a infância como o
período que vai do nascimento até os 12 anos incompletos, e a adolescência como a etapa da
vida compreendida entre os 12 e os 18 anos de idade. A Constituição de 1988, no artigo 227,
declara que

[...] é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao


adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).

Embora considerando a importância destas legislações, destaca-se a necessidade de se


esclarecer quais concepções de criança e de adolescente baseiam esta proposta curricular.
Não podemos conceber como sinônimos “infância” e “criança”, tendo em vista que
são diversas as infâncias que as crianças vivem. Por um lado, infância é uma construção
sócio-histórica, ou seja, é produzida pelo conjunto da sociedade a partir de ideias, práticas e
valores, que se referem, sobretudo, às crianças, o que implica afirmar que esta não é natural,
mas um fato social, ou seja, é uma construção coletiva que assume uma forma, tem um
sentido e um conteúdo, estabelecidos a partir das formas de agir, pensar e/ou sentir de uma
coletividade.
A esse respeito, Kramer (2006, p. 15) nos acrescenta que “a infância, mais que estágio,
é categoria da história: existe uma história humana, porque o homem tem infância”. Por outro
lado, há uma representação social de criança, pautada em fases apropriadas de
desenvolvimento infantil e formas de socialização que a caracterizam pela imaturidade e
dependência, orientando práticas para que desenvolvam a autonomia.
Neste documento, concebemos a criança “como um ser que permanentemente reflete
sobre as pessoas, objetos e relações do mundo a que tem acesso e que simultaneamente vai
constituindo e atribuindo-lhe significados” (NIA, 1992, p. 18). Assumimos como pressuposto
que toda criança é um sujeito histórico, produtor de cultura, capaz de aprender, sem deixar de
destacar a importância das práticas pedagógicas que respeitem seu processo de
desenvolvimento e sua subjetividade. “São cidadãs, pessoas detentoras de direitos, que
produzem cultura e são nela produzidas” (KRAMER, 2006, p. 15). Também advogamos que
“A linguagem da criança é impregnada de conteúdos e valores sociais adquiridos pela
93

inserção e participação nos grupos que frequenta, consequentemente na trama dos valores
culturais daqueles grupos” (NIA, 1992, p. 22).
Destacamos também que a criança, desde a mais tenra idade, apresenta capacidade de
criar, reelaborando impressões vivenciadas em seu cotidiano. Nesse sentido, “a criação é
condição necessária da existência” (VIGOTSKI, 2009, p. 16). Junto a essa capacidade de
criação, ressaltamos a imaginação ou fantasia, “base de toda atividade criadora [...]”
(VIGOTSKI, 2009, p. 14). Assim, é fundamental que a escola leve isso em consideração,
buscando caminhos para que a criança se reconheça como sujeito crítico e atuante, “capaz de
pensar, refletir e analisar o mundo em que vive, construindo sua própria leitura ao participar
ativamente do processo histórico coletivo, mantendo sua autonomia” (NIA, 1992, p.21).
A respeito da adolescência, destacamos que o senso comum aponta essa fase como
uma transição entre as infâncias e a fase adulta, devido às intensas transformações vividas
pelo ser humano. No entanto, sabemos que o ser humano está sempre mudando, aprendendo
e, logo, em transição. Entendemos que as colocações que concebem a adolescência apenas
como transição tendem a fortalecer a concepção de um não-lugar, que tira dessa fase da vida
humana o caráter “de ser”, em contraposição a nossa defesa do adolescente como sujeito.
O amadurecimento psicológico, as mudanças biológicas, corporais e emocionais
colocam o sujeito em novas posições ainda não experimentadas, tanto no que diz respeito a
sua própria constituição, quanto a novas possibilidades de tornar-se. Da mesma forma,
estabelecem-se novas relações com os outros e com o mundo, o que pode ocasionar conflitos.
Tudo isso torna a adolescência uma fase em que grandes desafios se apresentam para a família
e para a escola, em que a adolescência é vivida em grande parte do tempo.
No entanto, essa fase do desenvolvimento também agrupa grandes possibilidades na
expansão da autonomia do sujeito, que poderá ser incentivado a pensar não apenas o seu papel
no mundo, mas sua possibilidade/responsabilidade de intervenção, permeada por relações de
solidariedade; a ultrapassar limites que a sociedade lhe impõe, ou que ele próprio estabelece; a
aprofundar conhecimentos, relacionando-os com os saberes que já possui; a desenvolver a
capacidade de tomar decisões mais assertivas e de se expressar.
Apesar de algumas características serem similares na adolescência, como foi dito
anteriormente, não há homogeneidade entre sujeitos. Concordamos com Gadoti (2006, p. 139)
ao afirmar que “a nossa pedagogia dirige-se a um aluno médio, que é uma abstração. O nosso
aluno real, contudo, o aluno concreto, é único. Cada um deles é diferente e precisa ser tratado
em sua individualidade [...]”. Por isso, é preciso avançar no reconhecimento de que seres
94

humanos têm construções culturais diferentes, influenciadas por classe, gênero, etnia e
religião, que os constituem como sujeitos.
Além das diferentes fases de desenvolvimento, é preciso atentar para os diferentes
contextos geográficos em que crianças e adolescentes vivem no município de Niterói. Esses
contextos constituem histórias e trajetórias plurais que nossos estudantes possuem e com as
quais serão feitas conexões para possibilitar a construção de novos conhecimentos.
Dessa forma, é preciso considerar diferentes formas de aprender na relação com os
distintos contextos de vida. Se os objetos de conhecimento18 permanecem os mesmos, as
práticas, estratégias e recursos podem ser diversos, a fim de aumentar as oportunidades de
aprendizagem e construção de sentidos.
A maioria das crianças e adolescentes no mundo, atualmente, vive em cidades19, onde
estabelecem seus universos culturais, dentro de realidades socioeconômicas distintas e
desiguais, configurando uma enorme complexidade, que condiciona, em grande medida, a
vida daqueles que vivem as (nas) cidades.
A dualidade na produção do espaço condiciona possibilidades diferentes de
apropriação do espaço urbano e de convivência dos diferentes, a exemplo dos espaços
públicos e patrimônios materiais e imateriais da cidade. Nesse sentido, a escola pública
aparece como uma grande porta de acesso dos nossos estudantes a essa vivência, de inúmeras
questões atuais, a exemplo da questão ambiental, tratada em capítulo anterior neste
documento20. Não é mais possível ignorar que o modelo de desenvolvimento baseado apenas
em crescimento econômico levou o planeta a um esgotamento de recursos e às mudanças nos
sistemas climáticos.
Reafirmamos o princípio de que o estudante é um sujeito de direito; reconhecemos que
ele pode e deve participar ativamente da tomada de decisões (visto que é na ação política que
se constitui sujeito) e contribuir para uma reflexão e um fazer democráticos. Apesar de muitas
vezes essa visão ser aceita no campo das ideias (respaldada tanto por documentos oficiais
quanto na literatura educacional), ainda há dificuldades para colocá-la em prática no cotidiano
da escola, em que as vozes dos estudantes muitas vezes são silenciadas ou ignoradas nas mais
diferentes situações do ambiente escolar.

18
Esses “objetos de conhecimento” a que nos referimos são temas diversos que constam nas matrizes
curriculares e serão trabalhados em sala de aula por professores e alunos para a construção do conhecimento.
19
ONU News. Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2019/02/1660701.
20
Capítulo que trata sobre Educação Ambiental.
95

No mesmo sentido, é preciso desmistificar “os conflitos” como a normalidade da


convivência humana. O dissenso é parte de relações humanas democráticas e o conflito não é
necessariamente o confronto, ele está presente nas relações entre indivíduos que são diferentes
(apesar de iguais em direitos e deveres) e que, portanto, possuem visões de mundo distintas. É
importante a preparação de todos que atuam na escola para a mediação e resolução de
conflitos nas relações interpessoais. Defendemos a opção política de que os conflitos não
sejam invisibilizados e de que práticas de não violência sejam desenvolvidas na resolução
deles, a partir do diálogo como escolha consciente, sempre incentivado em estratégias que em
sua natureza devem abrir espaço para o contraditório, como assembleias, rodas de conversa,
mesas de debate e grêmios estudantis.
Uma proposta curricular não pode se esquivar dessas e de outras questões que se
colocam à formação do ser humano. Dessa forma, apontamos aqui na direção de uma
educação para o desenvolvimento integral do ser humano, considerando as dimensões
intelectual, social, emocional, física e cultural, em uma proposta que borre as fronteiras entre
essas dimensões e entre outras possíveis que não foram citadas aqui.
Podemos acrescentar ainda a formação cidadã como a formação de um sujeito que
exerce seus direitos e responsabilidades com o coletivo. Acerca do que seria mais relevante
para atingir esses objetivos, temos: “As proposições que buscam desenvolver nos alunos uma
visão ampla diante das questões contextuais da vida cotidiana em sociedade, bem como o
desenvolvimento de uma postura cidadã ativa, sustentável e transformadora” (professora da E.
M. LEVI CARNEIRO/GTs, 2019).
A formação integral tem sido pensada no conjunto de possíveis soluções para a
melhoria da qualidade educacional no Brasil por diversas áreas do conhecimento, como a
Sociologia, a Filosofia e a Pedagogia. Uma proposta de educação integral ultrapassa os fatores
cognitivos e afetivos, relacionando-se às múltiplas dimensões do estudante e às relações
dentro e fora da escola, definidas com intencionalidade. Dentre as relações intraescolares,
ganha destaque a articulação dos componentes curriculares, trabalhado sem práticas
interdisciplinares, no sentido de superar o caráter fragmentário existente entre as diferentes
áreas de conhecimento, buscando uma integração que possibilite tornar os conhecimentos
mais significativos para os alunos. Também é importante a conciliação com os interesses dos
estudantes, valorizando ações criativas e o prazer na construção do conhecimento.
Não se pode esperar que o currículo apenas se infle de conhecimentos sem que haja
uma constante e recorrente reflexão sobre a seleção do que é fundamental a ser abordado. O
96

currículo escolar atualmente é inflado de conteúdos, muitos dos quais apresentados sem real
articulação com o contexto do estudante (professora da E. M. JOÃO BRAZIL/GTs, 2019).
Conceituamos, assim, a educação integral como aquela que promove o
desenvolvimento do estudante em todas as suas dimensões (intelectual, física, social,
emocional e cultural) e que explicita a fluidez das fronteiras entre essas dimensões.
Acreditamos na educação integral como potente para a formação de um sujeito de direito e de
deveres, “não entendendo o sujeito como um ser pronto e acabado, mas como aquele que se
constitui em decisões políticas, em processos de subjetivação” (UMEI DARCY
RIBEIRO/Parecer, 2019). Ressaltamos uma abordagem pedagógica voltada a desenvolver
todo o potencial dos estudantes e prepará-los para se realizarem como pessoas, profissionais e
cidadãos comprometidos com o seu próprio bem-estar, com a humanidade e com o planeta.
Maia e Fagundes (2021) propõem que a educação integral seja

[...] uma proposta que se volta à formação ampliada dos alunos, que
enriquece o relacionamento humano e que vislumbra um panorama mais
comunitário. Para isso, sem dúvidas, a extensão da jornada diária é uma
estratégia facilitadora, mas que precisa ser acompanhada de outras formas de
organização social da escola. Essas outras formas irão fomentar novas
possibilidades e novos desafios a todos os envolvidos nos processos
educativos em seu interior e, consequentemente, às relações tecidas no
ambiente escolar (MAIA e FAGUNDES, 2021, p. 165).

Entendemos que o fato de a Rede Pública Municipal de Educação de Niterói organizar


sua proposta educacional em ciclos21, desde 1999, relaciona-se intimamente a várias razões
que justificam a defesa de uma educação integral. A proposta em ciclos justifica-se pela busca
de formas para se assegurar uma maior continuidade do processo educativo e uma diminuição
das rupturas da trajetória escolar, que não configura um processo linear e progressivo de
aquisição de conhecimento. A opção está diretamente relacionada a um novo paradigma para
a educação, baseado no reconhecimento das diferentes necessidades dos educandos, no
reconhecimento de diferentes e desiguais realidades socioeconômicas e na possibilidade de
construir estratégias mais includentes que abarquem ritmos diversos, com trajetórias distintas
e outros tempos e espaços no cotidiano escolar, associados a um processo de planejamento e
de avaliação continuada e formativa.

21
A organização curricular em ciclos na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói foi regulamentada pela
Portaria 132/2008, discutida e legitimada nos Referenciais Curriculares da Rede de 2010 e, após a
implementação destes últimos, a proposta em ciclos foi novamente regulamentada pela Portaria 085/2011, que
instituiu as Diretrizes e os Referenciais Curriculares e Didáticos da Rede.
97

A partir, sobretudo, das contribuições dadas pela Prof.ª Dra. Érika Virgílio da Cunha
(Universidade Federal do Mato Grosso), em uma das Conversas Pedagógicas promovidas em
setembro/2020 para fomentar discussões no processo de construção destes Referenciais
Curriculares, entendemos que a política de ciclo não tem uma essência dada a priori, mas
pode se constituir como um compromisso democrático na medida em que considere múltiplas
formas de educar e que seja pensada como uma possibilidade de se abrir ao outro em seu
fluxo da diferença e em sua complexa experiência educacional.
Para isso, defendemos a importância de um constante e atento investimento nas
Unidades de Educação da Rede, sobretudo no que diz respeito aos aspectos infraestruturais,
para que a organização escolar por ciclos, anunciada em documentos da Rede de Educação de
Niterói, seja facilitada.
Também partindo principalmente das contribuições de Cunha (2020), compreendemos
que há uma dimensão da política relacionada ao que precisa ser previamente definido como
condição de realização (como os aspectos infraestruturais mencionados acima). Entendemos a
importância de ressaltar essa dimensão da política como investimento nas escolas, para que a
experiência educativa construída por professores, educandos e demais profissionais das
Unidades de Educação − que por ser incontrolável, complexa e imponderável não pode ser
definida antecipadamente − tenham condições de construir uma política de ciclos fora da
norma da aplicabilidade, pensando a política como negociações contextuais e contingentes.
Antes de passarmos à apresentação dos quatro ciclos que organizam o Ensino
Fundamental na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, precisamos expressar mais
algumas considerações a respeito do processo de avaliação das aprendizagens que
defendemos. A avaliação deve ser “contínua e cumulativa no percurso educativo, com
prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do
período sobre os de eventuais provas finais”22. Considerando as diferentes formas de
mediação para a aprendizagem, em termos práticos, é preciso que o docente utilize múltiplos
instrumentos de avaliação, sem que haja um peso maior para avaliações que encerram
períodos. A avaliação compõe o processo de ensino e aprendizagem em um contexto amplo,
ou seja, ela deve ser considerada em seus aspectos formativos e precisa ser adotada na
recondução do planejamento do trabalho pedagógico, sempre que necessário. Sendo assim, os
estudos de recuperação das aprendizagens são obrigatórios e precisam ser realizados

22
Acompanhamos as indicações da LDBEN 9394/1996.
98

paralelamente ao período letivo, não devendo ser alvo de um momento específico ao final do
período.
Os nove anos do Ensino Fundamental, portanto, são organizados em quatro ciclos.
O Primeiro Ciclo compreende a trajetória de crianças ao longo de três anos de
escolaridade (1º ao 3º ano de escolaridade) que não deixaram de viver as infâncias pelo
simples fato de ingressarem no Ensino Fundamental. Neste ciclo, priorizam-se os tempos e
espaços escolares e as propostas pedagógicas que possibilitam o aprendizado da leitura, da
escrita e da alfabetização matemática e científica, bem como a ampliação de relações sociais e
afetivas nos diferentes espaços vivenciados. Nesse sentido, confirmamos as premissas
indicadas pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (BRASIL, 2015) e pelo
Núcleo Integrado de Alfabetização − NIA (NITERÓI, 1992), defendendo que

● as infâncias são diversas, pois as crianças atuam e participam de diferentes espaços


socioculturais e de seus tempos;

● crianças são detentoras de direitos e deveres. Elas têm suas necessidades, seus
processos físicos, cognitivos, emocionais e características individuais – sexo, idade,
etnia, raça e classe social – e, portanto, têm seus direitos e deveres. Destacamos, nessa
direção, a premissa de que as propostas pedagógicas devem privilegiar a participação
infantil pautada no diálogo e no compromisso ético-político com a educação pública
de qualidade socialmente referenciada;

● crianças têm direito a acessar múltiplas linguagens, inclusive a escrita. Nessa fase,
a escola deve promover a integração entre a aprendizagem da leitura e a produção
textual de forma articulada às aprendizagens dos diferentes Componentes
Curriculares, em plena sintonia e convivência com a brincadeira, com o lúdico e com
o tecnológico. “O trabalho de alfabetização não deve se restringir ao campo da Língua
Portuguesa, pois lemos e escrevemos em qualquer área do conhecimento” (UMEI
JACY PACHECO/GTs, 2019). Acreditamos que esse trabalho não deve obrigar as
crianças a aprender a ler, a escrever e a operar matematicamente por meio de
exercícios enfadonhos e inadequados para a sua faixa etária, mas o conhecimento deve
ser construído de modo reflexivo, instigante e prazeroso para que os alunos possam
desenvolver o pensamento e a compreensão d emundo. Além disso, a criança deve se
expressar nas várias linguagens (oral, corporal, cênica, plástica, literária, musical etc.),
por meio de propostas de atividades criativas que lhe possibilitam externar seus
conhecimentos, sentimentos, emoções e valores. Deve-se, ainda, considerar o desenho
99

como uma outra forma de linguagem, de representação da realidade e que, portanto,


assume um papel fundamental no processo de alfabetização;
● a brincadeira é um direito fundamental da criança. O brincar constitui-se em
oportunidade de interação com os outros, de interação com a cultura e seus processos
de tomada de decisões são capazes de tornar a aprendizagem mais significativa. Não
pode ser visto como uma atividade complementar, supérflua ou até mesmo
dispensável, pois faz parte do processo de desenvolvimento infantil, cognitivo e
afetivo-emocional, sendo considerado um instrumento de aprendizado e de
compreensão do mundo;
● atividades lúdicas e desafiadoras facilitam e mobilizam a aprendizagem escolar.
Jogos, brinquedos e brincadeiras contribuem de forma preponderante para o
desenvolvimento das crianças e são importantes recursos pedagógicos na relação
ensino-aprendizagem. O uso de jogos e brincadeiras como recurso pedagógico pode
contribuir para a formação de conceitos e estruturação do pensamento.

● espaços escolares diversificados são potencialmente lúdicos e adequados ao


desenvolvimento das ações pedagógicas. No entanto, a sala de aula não pode perder
a importância do desenvolvimento dessas ações, mesmo considerando todos os
espaços escolares como educativos;

● a alfabetização é um processo discursivo. O processo de aprendizagem pode se


iniciar antes e fora dos muros da escola, tendo em vista que as crianças são seres
sociais que estão permanentemente pensando e interagindo. Contudo, os anos iniciais
do Ensino Fundamental constituem o momento apropriado para a alfabetização,
entendida como

[...] um processo de produção de significados sociais, que acontece de forma


coletiva e individual, numa dinâmica de troca, com relevância para a
aquisição da leitura e da escrita, de modo que amplie a participação da
criança na sociedade, através do desenvolvimento dos seus conhecimentos,
da sua autonomia e da sua subjetividade (NIA, 1992, p. 20).

Esta forma de compreender a alfabetização redimensiona o processo pedagógico,


tendo em vista que os modos de ensinar dos professores e os modos de aprender das crianças
estão intrinsecamente relacionados e encontram-se entretecidos às práticas historicamente
construídas.
O Primeiro Ciclo demanda um trabalho docente coletivo, sistemático e coordenado.
Professores precisam atuar de forma conjunta para assegurar a continuidade e
100

complementaridade do processo pedagógico ao longo dos três anos, “entendendo o aluno


como um ser global” (E. M. VERA LÚCIA MACHADO/GTs, 2019). As reuniões
pedagógicas semanais, “destinadas ao estudo e à formação continuada” (E. M. EULÁLIA DA
SILVEIRA BRAGANÇA/GTs, 2019), constituem-se como momentos privilegiados para a
discussão e planejamento coletivo das ações. Os registros das crianças articulados aos
registros de práticas dos professores também são fundamentais para que se possa consolidar
as experiências vivenciadas e acompanhar o progresso das crianças.
O Segundo Ciclo, que abrange a trajetória das crianças por dois anos (4º e 5º anos de
escolaridade), tem a finalidade de integrar os saberes básicos construídos no Primeiro Ciclo,
aprofundando-os e ampliando-os, de modo a possibilitar um diálogo mais estreito entre as
diferentes áreas do conhecimento, mas sem nunca perder de vista o caráter integrador do
trabalho pedagógico. Nesse sentido, é preciso enfatizar a necessidade de se levar em
consideração as premissas indicadas para o trabalho no Primeiro Ciclo como necessárias ao
Segundo Ciclo, tendo em vista que grande parte do seu público constituir-se-á por crianças.
No entanto, atentos ao fato de que ao final do Segundo Ciclo parte dos educandos podem
encontrar-se em transição para a adolescência, não podemos deixar de considerar a
necessidade ainda maior de os projetos pedagógicos e de os planos de trabalho do ciclo
contextualizarem práticas e metodologias que incentivem o protagonismo juvenil, a ampliação
de canais de diálogo e a produção de sentidos pelos educandos.
O Terceiro Ciclo compreende mais dois anos do tempo escolar (6º e 7ºanos de
escolaridade), em um período no qual os estudantes estão na fase final da transição da
adolescência. Esse ciclo acompanha a mesma transição da infância para a adolescência, que se
inicia no segundo ciclo. Nele há uma grande mudança na organização do trabalho pedagógico
que, até o ciclo anterior, era realizado com auxílio de quatro professores e, no terceiro ciclo,
passa a contar com a colaboração de nove professores, um para cada componente curricular.
Há mudanças consideráveis na divisão do tempo escolar, na organização e no volume do
material de uso pessoal do estudante.
Por ser a escola o espaço que privilegia a aprendizagem em um processo de interação
constante com o outro, esse período de transição, que concentra tantas novidades para o
estudante, deveria ser alvo de atenção e ações de acolhimento de toda a comunidade escolar,
no entanto, muitas vezes, percebemos educandos e familiares sem a devida orientação para
vivenciar um momento tão marcante.
Reconhecemos aqui a experiência de algumas Unidades de Educação nas quais os
primeiros dias de aula são dedicados ao acolhimento dos estudantes que chegam ao 6º ano de
101

escolaridade. Nesses dias, professores e estudantes do 3º ciclo recebem os novos alunos e


apresentam os espaços escolares e as novidades dessa etapa do Ensino Fundamental.
É preciso um grande cuidado dos educadores em auxiliar os estudantes nessa fase, a
fim de não fortalecer barreiras na construção do conhecimento, as quais podem enfraquecer os
sentidos da escola e as relações com o que é vivido pelos alunos. A busca por práticas
interdisciplinares deve ser constante. A interdisciplinaridade não anula as especificidades das
áreas de conhecimento, mas reconhece a necessidade de articulação de saberes dos
componentes curriculares entre si e com o contexto de vida dos estudantes, a fim de propiciar
maior significado às aprendizagens. A palavra de destaque é diálogo.
A prática dialógica se faz necessária diante das diferenças. Nessa busca, o uso do
espaço-tempo das reuniões de planejamento para o diálogo entre os profissionais da educação
é essencial, permitindo a construção de planos de ação integradores. Outros espaços-tempos
para a promoção e estabelecimento do diálogo com e entre os discentes, a exemplo de
assembleias e grêmios estudantis, já citados anteriormente, precisam ser potencializados.
O Quarto Ciclo abrange a trajetória de adolescentes nos últimos dois anos do Ensino
Fundamental (8º e 9º anos de escolaridade). Nessa fase, busca-se a complexificação dos
pensamentos acerca da realidade e os estudantes devem ser incentivados a questionar e a
solucionar problemas reais que se colocam para o coletivo. Propõe-se expandir e qualificar a
capacidade de analisar, relacionar, argumentar e sistematizar diferentes questões sociais,
culturais, históricas e ambientais.
Reconhecendo toda a complexidade da prática dialógica, nossos estudantes devem ser
incentivados a expressar seus sentimentos e convicções, em um movimento marcadamente
democrático de respeito a si mesmo e ao outro.

11.1 A Trajetória da Revisão Curricular no Ensino Fundamental

A revisão dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de


Niterói se desenhou como uma construção coletiva, com o objetivo duplo de refletir sobre o
trabalho pedagógico que acontece nas Unidades de Educação e de ser ampla e continuamente
significada pelos educadores da Rede. Um processo dialógico e colaborativo uniu a Diretoria
de 1º e 2º ciclos e a Diretoria de 3º e 4º ciclos para reunir os professores que atuam no Ensino
Fundamental, com o propósito comum de pensar as concepções e práticas pedagógicas dos
quatro ciclos e diminuir a fragmentação entre os eles.
102

Os ofícios n.º 07/2019, n.º 18/2019 e n.º 21/2019 foram encaminhados às Unidades de
Educação, solicitando discussões curriculares e que as contribuições fossem registradas e
encaminhadas à Fundação Municipal de Educação. Depois do desenvolvimento dessas
primeiras discussões nas escolas, os ofícios n.º113/2019 e nº.127/2019, da Diretoria de 3º e 4º
ciclos e da Diretoria de 1º e 2º ciclos, respectivamente, foram enviados às escolas convidando
docentes do Ensino Fundamental para representarem suas Unidades de Educação na Revisão
dos Referenciais Curriculares da Rede, por meio da formação de Grupos de Trabalho (GTs)
reunidos de acordo com os nove componentes curriculares que compõem a grade curricular
do município de Niterói.
Em 14 de agosto de 2019, cerca de 200 docentes, indicados por suas Unidades de
Educação, reuniram-se para discutirem bases conceituais e metodológicas a fim de pensar o
currículo da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói. Houve formação de oito GTs,
que se reuniram em diferentes datas e dedicaram-se a atualizar o pensamento sobre a
Educação em Niterói e sobre as matrizes curriculares, esforçando-se no diálogo com a Base
Nacional Comum Curricular (BNCC)23, mas, acima de tudo, dando voz ao que acontece nas
escolas, colocando nosso educando no centro do processo e mantendo um compromisso com
a educação de qualidade que defendemos e na qual acreditamos.
Adotamos nesta revisão as áreas do conhecimento, com agrupamento dos
componentes curriculares da seguinte forma: Linguagens − Língua Portuguesa, Língua
Estrangeira (Inglês, Espanhol e Francês), Arte e Educação Física; Matemática − Matemática;
Ciências da Natureza − Ciências; Ciências Humanas − Geografia e História.
A apresentação de cada componente curricular se faz por meio de textos introdutórios
com pressupostos de importância para a educação defendida na Rede, seguidos das matrizes
curriculares. Os textos e matrizes apresentados neste documento foram elaborados e
discutidos de forma coletiva, a partir das reflexões dos professores que formaram os GTs.
Atendemos à BNCC, mas optamos por ir além do que é proposto por ela, atendendo ao direito
de aprendizagem dos nossos estudantes no que diz respeito a conhecimentos não previstos
pela Base, mas considerados de importância pelos docentes.

23
Homologada em 20 de dezembro de 2017, tem o ano de 2019 como de sua implantação em todo o território
nacional, por meio da construção de currículos locais, de responsabilidade das redes de ensino e escolas, que
têm autonomia para organizar seus percursos formativos a partir da sua própria realidade.
103

O que se apresenta nos textos introdutórios e nas matrizes não tem a intenção de servir
como determinações para o trabalho pedagógico das escolas, e sim como uma orientação do
que se defende na Rede como direito de aprendizagem e se reconhece como uma educação de
qualidade socialmente referenciada, objetivando, como colocado anteriormente, uma
formação integral do ser humano. A prática pedagógica nas Unidades de Educação qualificará
as orientações aqui apresentadas.
As matrizes buscam a praticidade para o planejamento no cotidiano escolar,
possibilitam fácil compreensão e apropriação das informações, com a visualização de
objetivos cognitivos e de desenvolvimento. Para garantir que a mesma concepção de educação
de cada componente permeasse todo o Ensino Fundamental, optamos por apresentar, na
primeira coluna, os Núcleos Temáticos, que agrupam Objetos de Conhecimento que se
comunicam entre si. Cabe destacar que os Núcleos Temáticos também foram pauta de
discussão nos GTs e traduzem o movimento de cada componente curricular em direção ao
trabalho interdisciplinar no Ensino Fundamental.
A interdisciplinaridade é, portanto, entendida aqui como abordagem teórico-
metodológica em que a ênfase incide sobre o trabalho de integração das diferentes áreas do
conhecimento, um real trabalho de cooperação e troca, aberto ao diálogo e ao planejamento
(NOGUEIRA, 2001). Pela abordagem interdisciplinar, ocorre a transversalidade do
conhecimento constitutivo de diferentes disciplinas e cabe destacar, neste propósito, o papel
fundamental da ação didático-pedagógica mediada pela pedagogia dos projetos temáticos
(BRASIL, 2010).
Os Objetos de Conhecimento especificam, de forma ampla, temas trabalhados em sala
de aula. Na coluna ao lado dos Objetos de Conhecimento, estão os Objetivos de
Aprendizagem e Desenvolvimento, que dizem respeito ao conjunto de saberes que serão
desenvolvidos no processo de ensino e aprendizagem, em múltiplas experiências. Finalmente,
na última coluna, são apresentadas as propostas e sugestões de estratégias e possíveis
metodologias para o trabalho pedagógico.
Tanto a proposta de ciclos quanto a proposta de formação integral requerem que a
abordagem feita dos conhecimentos historicamente construídos, se tratados como
componentes curriculares, siga uma lógica de problematização dos Objetos de Conhecimento.
Seguimos a orientação dos Referenciais de 2010, que sugerem:

[os] conhecimentos deixam de ser vistos como informações recebidas pelos


alunos para serem objetos de reflexão, indagação e construção, tendo, como
meio para tal, o estabelecimento de métodos e técnicas pedagógicas mais
104

significativas que possibilitem o trabalho com conteúdos, de forma que estes


se relacionem entre si e como cotidiano dos alunos (NITERÓI, 2010, p. 19).

No mesmo sentido, busca-se a interdisciplinaridade por meio de um diálogo constante


entre os componentes. Deixamos claro que, para alcançar esses objetivos, conta-se com a
articulação dos professores da mesma área de conhecimento e de diferentes áreas, do mesmo
ciclo e dos diferentes ciclos, nas discussões e na organização dos planejamentos e planos de
ação das escolas. A integração será buscada por meio da permeabilidade dos saberes e de uma
vinculação com os saberes dos nossos estudantes.

11.2 Leitura e devolutiva das Unidades de Educação

Quando planejamos o envio dos documentos preliminares dos novos Referenciais


Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói às Unidades de Educação,
pensamos em momentos conjuntos de formação com os professores do Ensino Fundamental,
reunindo os diferentes ciclos e privilegiando a ênfase nas propostas interdisciplinares.
Tencionamos também possibilitar a continuidade dessas discussões, mesmo após o término da
revisão do documento, tendo em vista que tal ação proporcionará a contínua reelaboração de
conhecimentos e garantirá Referenciais Curriculares que atendam ao contexto das escolas
municipais de Niterói.
Nesse sentido, não podemos deixar de considerar que o texto preliminar foi lido e
discutido pelas escolas em um momento excepcional, de mudanças nas relações interpessoais
em todas as sociedades do mundo, sendo necessário mencionar neste documento os impactos
da pandemia de Covid-19 sobre a feitura destes Referenciais Curriculares. Isso se deve não
apenas ao planejamento da continuidade das discussões, que precisou ser reconsiderado, mas
também às necessidades que afloraram na educação suscitadas pelo ensino remoto e pela
necessidade de adoção das estratégias e instrumentos que exigiram, em caráter excepcional, o
ensino híbrido.
Nesse contexto, recebemos, em setembro de 2020, pareceres de inúmeras Unidades do
Ensino Fundamental acerca da leitura dos documentos preliminares para revisão dos
Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, os quais
consideramos à luz das discussões legitimadas pelos Grupos de Trabalho de 2019.
Consideramos de grande importância o destaque dado pelas Unidades de Educação à
necessidade de incluir, no calendário de formação continuada em serviço dos profissionais da
105

Rede, temas de um currículo pós-pandemia, chamando a atenção para a utilização de


Metodologias Ativas, Salas de Aula Invertidas, Uso de Novas Mídias e Tecnologias, com o
uso de aplicativos e Softwares Educacionais.
Não pode ser ignorado o destaque dado pelas Unidades de Educação à infraestrutura e
aos equipamentos necessários para a oferta e construção de uma educação de qualidade, como
a atualização e manutenção de equipamentos de tecnologia da informação, ambientes virtuais,
laboratórios de ciências, salas de arte, salas ambiente, auditórios, quadras poliesportivas
cobertas e refeitórios.

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http://www.revista.unifeso.edu.br/index.php/revistaunifesohumanasesociais/article/view/17/24
Acesso em: 10 dez. 2019.

VIOLA, S. E. A. Direitos Humanos no Brasil: abrindo portas sobre neblina. In: Educação
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VYGOTSKY, L. S. Imaginação e criação na infância. São Paulo: Ática, 2009.

YUNES, E. & PONDÉ, G. Leitura e Leituras da Literatura Infantil. São Paulo: FTD,
1988.
114

PARTE II

EDUCAÇÃO INFANTIL
115

1. CAMINHOS TRILHADOS

Qualquer caminho leva a toda a parte


Qualquer caminho
Em qualquer ponto seu em dois se parte
E um leva aonde indica a estrada
Outro é sozinho.
(Fernando Pessoa)

Falar dos caminhos percorridos para reelaboração dos Referenciais Curriculares da


Educação Infantil da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói é contextualizar-se em
meio a grandes desafios. Nenhum documento, por mais que se abra à escuta atenta de muitas
vozes e práticas possíveis, ganhará completude; haverá sempre a percepção da falta. Segundo
Lopes:

[...] o currículo é, ele mesmo, uma prática discursiva. Isso significa que ele é
uma prática de poder, mas também a prática de significação, de atribuição de
sentidos. Ele constrói a realidade, nos governa, constrange nosso
comportamento, projeta nossa identidade, tudo isso produzindo sentidos.
Trata-se, portanto, de um discurso produzido na interseção entre diferentes
discursos sociais e culturais, que, ao mesmo tempo, reitera sentidos postos
por tais discursos e os recria. Claro que, como essa recriação está envolta em
relações de poder, na interseção em que ela se torna possível, nem tudo pode
ser dito. O entendimento do currículo como prática de significação, como
criação ou enunciação de sentidos, torna inócua distinções como currículo
formal, vivido, oculto. Qualquer manifestação do currículo, qualquer
episódio curricular, é a mesma coisa: a produção de sentidos. Seja escrito,
falado, velado, o currículo é um texto que tenta direcionar o “leitor”, mas
que apenas o faz parcialmente (LOPES, 2011, p. 41).

Pautados nessa concepção de currículo, entendemos que somente a construção coletiva


e democrática dos Referenciais Curriculares da Educação Infantil revelaria um documento
que servisse de inspiração às nossas práticas e refletisse a identidade, as singularidades e os
anseios da nossa rede.
No ano de 2018, enquanto integrantes da Diretoria de Educação Infantil, percebemos o
desejo de algumas instituições de dialogar mais sobre os referenciais e revisitar alguns temas,
buscando aprofundá-los à luz de nossa realidade. A chegada de novos profissionais, a criação
de novas unidades e as mudanças que ocorrem diante da dinâmica social fizeram com que a
necessidade dessa discussão se intensificasse.
No início de 2019, a Secretaria Municipal de Educação/Fundação Municipal de
Educação (SEMECT/FME), por meio da Diretoria de Educação Infantil, iniciou movimento
116

interno de reformulação dos Referenciais Curriculares de 2010. Para tanto, foram criados
grupos de trabalho que buscavam potencializar tal discussão. Percebemos, então, uma
crescente necessidade de mobilização dos profissionais, de forma que, em um processo
participativo e deliberativo, fosse produzido um documento curricular que fomentasse ações
pedagógicas coerentes com a legislação da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói.
Nesse movimento, as unidades de Educação Infantil foram convidadas, por meio de
link, para socializarem os diversos movimentos de leituras e reflexões sobre os referenciais,
suas percepções sobre a BNCC, a pertinência de potencializar temas já presentes no
documento de 2010 e a possibilidade de abordagem de novas questões que hoje perpassam a
Educação Infantil.
No dia 30 de agosto de 2019, após recebermos as respostas do link, reunimo-nos a fim
de tecermos os caminhos que seguiríamos para intensificar as discussões e os registros
escritos que comporiam o documento preliminar. A partir daí, encaminhamos nove textos às
unidades para fomentar discussões que posteriormente geraram registros escritos e materiais
para construção do texto. As discussões foram organizadas a partir de dois eixos − Currículo
e Infâncias na Contemporaneidade e Formação Docente e Práxis na Educação Infantil − que
seriam dinamizados em dois encontros nos sete polos. Esses polos, também compreendidos
como GTs, buscavam potencializar alguns pressupostos já existentes nos referenciais de 2010,
bem como acrescentar outros de acordo com as reflexões e proposições dos participantes.
Outra frente importante foi a realização do III Seminário de Educação Infantil 2019,
em que, enquanto um espaço de formação continuada, deflagraram-se outras discussões. No
Seminário, ficou evidenciado o protagonismo da criança nos trabalhos apresentados pelos
docentes da rede, apontando-se possibilidades de pensar uma proposta curricular tomada
como referência.
Concomitantemente a esse processo, destacamos as parcerias realizadas com as
universidades públicas que viabilizaram momentos de formação continuada. Estiveram
conosco a professora Luciana Ostetto (UFF) − A Formação do Professor Brincante, a
professora Lea Tiriba (UNIRIO) − Infâncias e Natureza / Infâncias Niteroienses, a professora
Vera Vasconcellos (PROPED/UERJ) − As muitas faces de uma creche e as professoras Zoia
Prestes (UFF), Heloísa Carreiro (UERJ/FFP), Leda Marina (PUC-MG) e Lilian Garcia
(UFRJ) − Transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental, constituindo, assim, um
movimento polifônico de construção de saberes.
Esse documento preliminar retornou à Rede tendo em seu bojo as intencionalidades
não findas, indo ao encontro das apreciações dos nossos pares participantes que se colocaram
117

à disposição desse trabalho conjunto. A partir da leitura desse documento preliminar, as


unidades foram convidadas a elaborar pareceres. Cada parecer recebido trouxe importantes
contribuições para a constituição destes Referenciais no que tange à busca incessante pela
elaboração de sentidos nos diferentes cotidianos de cada unidade de Educação Infantil.

2. PELOS FIOS DA HISTÓRIA

Antes de apresentar a nova proposta curricular da Educação Infantil de Niterói, torna-


se importante resgatar a perspectiva histórico-social dos acontecimentos, reconhecendo que
“articular historicamente o passado não significa conhecê-lo ‘como ele de fato foi’. Significa
apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo”
(BENJAMIN, 1994, p. 224). Ao conceber que a história está para além do que conhecemos,
Walter Benjamin ainda destaca que, para recuperá-la, precisamos escová-la a contrapelo, e
“quem tem em mente esse fato poderá ter uma ideia de como o tempo passado é vivido na
rememoração: nem como vazio, nem como homogêneo” (BENJAMIN, 1994, p. 232).
A preocupação com um passado que tenha sentido não se constitui tarefa limitada às
dimensões historiográficas; é preciso considerar perspectivas que possibilitem enxergar a
cidade em sua totalidade, viva e pulsante. Assim, a compreensão do município de Niterói e de
sua realidade educacional requer um olhar entrelaçado a imagens, sentimentos e políticas
públicas que articulam local e global de maneira singular, lidando com contradições e
construindo possibilidades.
Niterói ainda guarda características provenientes da condição de capital da província e
depois do estado do Rio de Janeiro. Foi capital estadual em dois períodos distintos, de 1834 a
1893 e de 1903 a 1975, quando houve implantação de serviços públicos federais e estaduais.
Com o fim do estado da Guanabara (1975), o município passou a integrar a região
metropolitana do estado, o que ocasionou reformas na administração da rede de serviços
públicos. Até aquele momento, havia forte presença da Rede Estadual de Ensino em Niterói.
De acordo com Maria Felisberta24 (TRINDADE, 2004), havia, até então, no Brasil, um
processo fragmentado em que a educação primária era obrigação das províncias e,
posteriormente, dos estados. A trajetória educativa de caráter público da cidade de Niterói

24
Texto produzido por Maria Felisberta Baptista da Trindade, Secretária Municipal de Educação/Presidente da
Fundação Municipal de Educação de Niterói, nos Registros das Conferências do Plano Municipal de
Educação: Rumo à Cidade Educadora, em 2004.
118

teve início no final da década de 1960, por meio de “bolsas de estudos” que garantiam a
matrícula dos alunos em escolas particulares.
A cartografia educacional da cidade ganhou novos contornos devido ao processo de
descentralização de suas ações, impulsionado, principalmente a partir da década de 1980, pela
homologação da Constituição Federal de 1988. Este foi um marco regulador dos direitos da
criança à Educação Infantil, uma vez que garante que “os municípios atuarão prioritariamente
no ensino fundamental e na educação infantil” (BRASIL, 1988). Seguindo a trajetória traçada
pela Constituição, o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) e a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) alicerçaram a reestruturação da
Educação, pautando-a como direito social fundamental à promoção e consolidação de direitos
humanos. Dessa forma, a Educação firma-se como valor de cidadania e dignidade da pessoa
humana e torna-se meio de construção de uma sociedade livre, justa e solidária,
nacionalmente desenvolvida, que busca a erradicação da pobreza, da marginalização e das
desigualdades sociais.
A consolidação da importância social e o caráter educativo das instituições que atuam
com a primeira infância reverberaram nas políticas públicas de Niterói. Até o ano de 1992, o
atendimento da criança de 0 a 6 anos ocorria em instituições filantrópicas, comunitárias,
Casas da Criança e Jardins de Infância vinculados à Secretaria de Educação do Estado, sob
responsabilidade da Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social. Com a criação da Fundação
Municipal de Educação de Niterói (FME), esse atendimento tornou-se responsabilidade da
FME, dando início ao processo de construção da Rede Pública Municipal de Educação
Infantil, que teve como principais características a municipalização de instituições estaduais, a
criação de creches comunitárias e a construção de novas unidades voltadas exclusivamente à
criança nessa faixa etária.
Ainda nesse mesmo período, com o objetivo de cumprir o disposto na Carta Magna, o
município de Niterói criou, sob o Decreto Legislativo n.º 287/1994, o Programa Criança na
Creche (PROCC), que regulamenta a relação entre FME e Creches Comunitárias por meio de
convênios anuais. Dentre as contrapartidas exigidas da instituição conveniada, ter o currículo
orientado pelos Referenciais Curriculares da Educação Infantil e fomentar a participação de
seus profissionais nos processos de formação continuada oferecidos pela FME são requisitos
que colaboram para a construção de equidade no atendimento à infância niteroiense.
No ano de 1996, a FME produziu um documento intitulado Construindo a Educação
Infantil do Município de Niterói em parceria com a antiga Divisão Materno-Infantil, as
equipes técnicas das unidades de Educação Infantil e o Núcleo Multidisciplinar de Pesquisa,
119

Extensão e Estudo da Criança de 0 a 6 anos (NMPEEC-UFF). A importância desse


documento encontra-se nos pressupostos que orientam o trabalho na Educação Infantil por
meio de textos sobre acolhimento e inserção, rotina, brincadeiras e atividades pedagógicas a
serem desenvolvidas nas unidades.
No ano de 1998, a Rede Pública Municipal de Educação de Niterói dedicou-se à
discussão da organização em ciclos para o Ensino Fundamental, incluída no ano de 1999 à
proposta pedagógica Construindo a Escola do Nosso Tempo25. O documento contém um
capítulo que se refere à Educação Infantil baseado nos Referenciais Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil de 1998 (RCNEI) e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil de 1999 (DCNEI). As reflexões sobre o atendimento em creches e pré-
escolas foram contempladas na Portaria no. 134/2000, que estabeleceu o Ciclo Infantil em
instituições públicas de Educação Infantil de Niterói para crianças de 4 meses a 6 anos. A
partir de então, as nomenclaturas Jardim de Infância e Casa da Criança foram substituídas por
Unidade Municipal de Educação Infantil (UMEI).
Com a exigência de construção dos Planos de Educação Municipais em consonância
com o Plano Nacional da Educação (PNE), no ano de 2003, teve início o processo de
elaboração do Plano Municipal de Educação (PME) de Niterói com o I Encontro Municipal
de Educação Infantil − Niterói Pensando a Educação dos Pequenos. A reflexão foi pautada
em torno da garantia de qualidade no atendimento, estabelecendo-se propostas como a de
efetivar ação integrada entre as Secretarias do Município de Niterói. Segundo a Professora
Maria Felisberta26, houve, no Plano Municipal de Educação, o intuito de se estabelecer uma
relação intersetorial com as demais áreas de vida e gestão pública, ou seja, com a cultura, a
assistência social, a saúde, o meio ambiente, a ciência, a tecnologia e o urbanismo, numa
abrangência de objetivos e práticas, visando à garantia de vivências saudáveis, numa visão
concreta da cidade educadora.
A construção do PME de Niterói demonstra uma intencionalidade histórica de compor
uma política pública intersetorial. Os encontros tiveram como estratégia a aproximação de
pessoas responsáveis pelos diferentes espaços de atendimento à Educação Infantil, com o
objetivo de refletir e avaliar coletivamente o trabalho desenvolvido pelo município e, ainda,
elaborar novos rumos para a educação da infância niteroiense. Esse processo reflexivo
propiciou à FME publicar o Caderno Niterói Pensando a Educação dos Pequenos: Subsídios

25
Registros das Conferências do Plano Municipal de Educação: Rumo à Cidade Educadora. Dezembro de 2004.
26
Registros das Conferências do Plano Municipal de Educação: Rumo à Cidade Educadora. Dezembro de 2004.
120

para o Plano Municipal de Educação de Niterói. Tal publicação sintetizou as discussões e


reivindicações dos educadores e demonstrou a luta coletiva pelo compromisso público com
uma educação de qualidade, como descrito no documento:

Para ter garantia de uma educação infantil de qualidade, é necessário o


estabelecimento de uma ação integrada entre as diversas secretarias do
município de Niterói como garantia de uma política pública intersetorial
(Saúde; Projeto de aleitamento materno; atendimento prioritário às crianças
da rede no Médico de Família e Posto de Saúde; Assistência Social;
transporte para que os pais de crianças de 0 a 6 anos possam levar seus filhos
à creche sem pagar passagem; Conselho Tutelar) (NITERÓI, 2003, p. 20).

Nesse registro, ficam demarcadas as militâncias e intencionalidades de ações


conjuntas que, nos dias atuais, colocam-se diante de nós como conquistas já adquiridas e
outras que permanecem como grandes desafios.
No decorrer dos anos de 2004 e 2005, a Superintendência de Ensino da FME
promoveu debates sobre a elaboração da proposta pedagógica da Rede Pública Municipal de
Educação de Niterói. A Coordenação de Educação Infantil participou desse processo
construindo canais de interlocução entre FME e UMEIs por meio de reuniões mensais com
profissionais deste segmento, visando a um trabalho democrático pautado na troca de ideias e
experiências que contribuíssem para a elaboração da proposta. Houve, no ano de 2006,
experimento da proposta, com participação de 14 unidades, entre UMEIs e Unidades
Escolares de Ensino Fundamental que possuíam Educação Infantil e aceitaram tornar-se
unidades-polo por meio do compromisso registrado em Termo de Adesão. Como resultado, a
proposta Escola de Cidadania foi publicada em 2008 e, no mesmo ano, as Diretrizes
Curriculares do município.
No ano de 2010, em diálogo com as DCNEI, a Coordenação de Educação Infantil e os
profissionais dessa etapa elaboraram, por meio de uma construção coletiva, os Referenciais
Curriculares para Educação Infantil. O documento foi contextualizado por uma série de
discussões com participação efetiva da rede, das coordenações e das equipes da Fundação
Municipal de Educação. O diálogo se deu por meio de comissões compostas por
representantes da FME, professores, pedagogos e demais profissionais da Educação Infantil
lotados nas UMEIs, nas Unidades Escolares do Ensino Fundamental com Educação Infantil e
nas unidades do PROCC.
Observamos, dessa forma, que o município acompanha os movimentos históricos e
legais da Educação Infantil. Várias pesquisas vêm sendo realizadas de forma coletiva, com a
participação efetiva dos profissionais da Educação Infantil em um processo crítico e
121

democrático sobre pontos nevrálgicos como, por exemplo, a ampliação do número de vagas e
espaços físicos próprios que respeitem os parâmetros orientados pelo MEC. Além disso, são
frequentes os debates para construção de documentos municipais voltados à Educação.
Conforme estabelecido na Constituição Federal de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB), cabe a cada município instituir seu Sistema Municipal de
Educação, por meio do qual delimita e explicita seu espaço de autonomia e responsabilidade
educacional. A Prefeitura Municipal de Niterói é uma entidade jurídica de Direito Público,
mantenedora de uma rede escolar, que integra o Sistema Municipal de Educação, instituído
pelo Decreto n.º 9820/2006, cuja finalidade primordial é oferecer a Educação Básica nos
níveis de Educação Infantil e Ensino Fundamental, nas modalidades de Educação de Jovens e
Adultos e Educação Especial.
Após cinco décadas de atuação na Educação pública, Niterói consolidou sua Rede
Pública Municipal de Educação, ampliando o atendimento, principalmente, na etapa da
Educação Infantil. Nesse percurso, além do investimento em construção e municipalização de
instituições, houve atenção à valorização e formação docente. As conquistas da Educação
Infantil foram possíveis por meio da construção de políticas públicas fomentadas, em sua
maioria, pela mobilização dos profissionais da Educação e legislações pertinentes no âmbito
federal. Rever parte desse processo, portanto, auxilia-nos a olhar para o futuro não com a
tranquilidade do dever cumprido, mas com a certeza de que devemos rever nossa história e
currículo com o objetivo de revisitar concepções, ampliar possibilidades e fomentar
permanentes avanços na Educação de nossas crianças.

2.1 A Rede Pública Municipal de Educação Infantil de Niterói

Ao longo da construção de políticas públicas municipais de atendimento à primeira


infância, houve incontáveis desafios. A partir da promulgação da Constituição Federal, em
1988, o Brasil acumulou leis, referenciais, diretrizes e bases como forma de organização e
implementação de um currículo para as infâncias.
Nesse processo histórico, a faixa etária de 0 a 3 anos de idade tornou-se objeto de
pesquisas e estudos. A inserção dos bebês (crianças de até 3 anos) como categoria de estudo e
como sujeitos de políticas públicas da Educação Infantil é recente, ocorreu após a
Constituição de 1988. As pesquisas em Educação (KRAMER, 2007; BARBOSA, 2010;
VASCONCELLOS, 2015; FOCHI, 2015; GUIMARÃES, 2018) apontam para estudos e
122

reflexões importantes para o trabalho com esse grupo de sujeitos que recém-chegaram a este
mundo.
As crianças guardam na sua pequenez física a potência do ser humano que assim se
torna na interação com outros humanos. Durante muito tempo, a Educação Infantil foi campo
de aplicação de um Ensino Fundamental diminuto. Tais pesquisas nos evidenciam que essa
etapa exige um olhar próprio e uma forma também própria de realizar o trabalho pedagógico.
Durante muitos anos, bebês e crianças foram vistos pela política educacional, pela Saúde e
pela Assistência Social sob a ótica da fragilidade, incapacidade e imaturidade. Nos últimos
anos, essa mentalidade, pelo menos no campo educacional, vem sendo alterada graças a essas
pesquisas que deslocam o olhar da falta para o da potência.
A Educação Infantil, ao tornar-se direito público, apresenta novas demandas por
espaços, profissionais habilitados, currículo específico, entre outras. Nesse sentido, aliar
qualidade à ampliação do atendimento tem sido um desafio nas construções dessas políticas,
principalmente em planos municipais de educação. A discussão curricular caminha junto a
essas construções embasadas em pesquisas e lutas, com avanços e retrocessos. As várias
ações, construídas e implementadas no diálogo entre poder público, profissionais da
educação, responsáveis das crianças e demais representantes da sociedade civil organizada,
expressam o esforço de garantir a essa faixa etária ampliação do atendimento com qualidade.
A Meta 1 do Plano Nacional de Educação propõe

[...] universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para as


crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliar a oferta de
Educação Infantil em creches de forma a atender, no mínimo, 50%
(cinquenta por cento) das crianças de até 3 (três) anos até o final da vigência
deste PNE (BRASIL/PNE, 2014).

Nesse sentido, atingir a Meta 1 do PNE/14 pressupõe percorrer um caminho


desafiador. Uma ação que demonstra a busca efetiva de sua consolidação é o Programa Mais
Infância (NITERÓI, 2013)27. Inicialmente previsto para ocorrer entre os anos de 2013 e 2018
− período em que ampliou o atendimento a crianças de 0 a 5 anos, inaugurando 20 novas
UMEIs, até dezembro de 2020 −, o programa seguiu promovendo construção de novas
unidades, municipalização de instituições estaduais e creches comunitárias, além de reformas
de unidades que atendem à Educação Infantil.

27
O Programa Mais Infância foi uma política pública importante para ampliação de vagas (2013-2020) na
Educação Infantil no município de Niterói.
123

A Rede Pública Municipal de Educação de Niterói inicia sua oferta educacional


recebendo os bebês a partir dos 4 meses de idade. Ao ingressar na Educação Infantil, essa
criança fará parte de um grupo de referência que a acompanhará durante todo seu percurso
nessa etapa da Educação. A Rede Municipal fez uma opção epistemológica de permanecer
com a Educação Infantil organizada em um ciclo único. Nessa organização, as crianças,
sujeitos centrais de todo o planejamento pedagógico, são vistas como um todo em seu
desenvolvimento motor, social, afetivo e cognitivo. Entretanto, reconhecemos a importância
de pensarmos as nuances e peculiaridades das crianças atendidas em cada momento desse
ciclo, que é único/contínuo, mas particular em cada fase de desenvolvimento. Para muitas
crianças, a creche e/ou a pré-escola serão os primeiros espaços nos quais terão convivência
com adultos diferentes dos quais convivem cotidianamente e de ampliação da cultura
construída historicamente, apropriando-se das qualidades humanas que não herdamos
biologicamente de nossos pais, mas construímos na relação com os da nossa espécie.
Sobre esse modo particular, Barbosa (2010) apresenta uma nova visão de bebê em que
nos chama atenção para as suas potencialidades:

Os bebês possuem um corpo onde afeto, intelecto e motricidade estão


profundamente conectados e é a forma particular como estes elementos se
articulam que vão definindo as singularidades de cada indivíduo ao longo de
sua história. Cada bebê possui um ritmo pessoal, uma forma de ser e de se
comunicar (BARBOSA, 2010, p. 2).

Não há como não considerar que balbucios, gestos, choros e ecolalias são
manifestações dos bebês na interação com o mundo, com os adultos e com outras crianças que
os cercam. Cada movimento corporal realizado é a expressão de que sua aprendizagem está
em pleno desenvolvimento, pois ela se dá de corpo inteiro na interação ininterrupta com
pessoas, objetos e com a própria cultura que os envolve desde antes do nascimento.
Na Educação Infantil, compreendem-se os processos de educar de forma integral, na
inteireza dos sujeitos, contemplando os aspectos cognitivo, afetivo e corporal/físico. Durante
uma troca de fralda, por exemplo, muitas aprendizagens são construídas pela professora e pela
criança. Isso se dará na troca de olhares, no toque da pele, na diferenciação que, pouco a
pouco, o bebê vai fazendo do que é estar limpo e do que é necessitar ser limpo, bem como na
narrativa afetuosa de todo o processo que ora vivenciam. Tudo o que acontece nesse
movimento aqui descrito como em tantos outros ao longo da jornada diária numa Unidade
Municipal de Educação Infantil é mediação, interação e aprendizagem. Entretanto, para que
uma interação assim aconteça, os adultos educadores necessitam colocar-se na relação com a
124

criança e estarem abertos a compreender como princípios do trabalho docente o afeto, a


observação das sutilezas, a escuta sensível e a compreensão de que comunicação não é apenas
fala verbal, mas também olhares, gestos, balbucios e silêncios. Nesse sentido, a UMEI Odete
Rosa nos traz uma importante reflexão:

Pensando em nossa prática educativa, observamos o quanto é importante


para as crianças que vão à escola pela primeira vez o acolhimento com
bastante afeto para que possam sentir-se seguras no ambiente escolar onde
irão passar a maior parte do dia interagindo, explorando, vencendo várias
situações emocionais, ampliando suas experiências e aos poucos construindo
sua autonomia e independência junto ao coletivo, através da rotina diária de
cuidados e diversas oportunidades de aprendizagens, dentro de um espaço
organizado e propício para tal, longe de suas famílias que, por sua vez, são
parceiras fundamentais para o pleno desenvolvimento das mesma (UMEI
Odete Rosa, 2019).

A fala da UMEI Odete Rosa mostra-nos a importância do acolhimento às crianças e do


olhar atento para suas diversas possibilidades de comunicação. Esse olhar atento de
acolhimento também precisa ser extensivo às famílias, pois compartilhamos a educação da
criança, o que não é tarefa simples. Assim, pouco a pouco, o trabalho pedagógico com os
bebês vai saindo da invisibilidade e ocupando seu espaço de encontros potentes e produção de
conhecimento. Nesse sentido, o trabalho com as crianças, com especial atenção às mais novas,
pressupõe um planejamento que considere seu movimento motor, o desenvolvimento de uma
segurança emocional, o contato visual com os objetos, com os demais bebês e com os adultos
que as cercam, como manifestações de desenvolvimento e aprendizagem. Sendo assim, a
reorganização de tempos, espaços, materiais e relações deve considerar tais peculiaridades dos
bebês. Boa parte das experiências vividas pelas crianças, particularmente as de 0 a 3 anos e 11
meses, não caberá numa folha de papel. É preciso construir um espaço físico e emocional
onde as crianças, desde bebês, sejam protagonistas. Para tal, é preciso que os docentes, a
partir do processo de formação continuada, tenham como objetivo a pesquisa investigativa de
seu próprio fazer.
A compreensão das crianças, desde bebês, como sujeitos da história e de direitos traz
uma mudança de paradigma, pois afirma o compromisso com a oferta de um serviço
educacional qualificado. Sobre isso, Barbosa (2010) nos diz que

[...] essa é uma mudança paradigmática na compreensão da educação dos


bebês, pois se afirma o compromisso com a oferta de um serviço educacional
para todas as crianças, a possibilidade de viver uma experiência de infância
comprometida com a aprendizagem gerada pela ludicidade, brincadeira,
imaginação e fantasia. Nesse espaço, os bebês aprendem observando,
tocando, experimentando, narrando, perguntando e construindo ações e
125

sentidos sobre a natureza e a sociedade, recriando, desse modo, a cultura.


(BARBOSA, 2010, p. 3).

Para que essas práticas se efetivem nas Unidades de Educação Infantil, devem ser
superados muitos desafios, dentre eles a necessidade imperiosa de romper definitivamente
com algumas práticas escolarizantes que ainda resistem no cotidiano. Sabe-se que a criança
descobre pela observação, pela experimentação, pela interação com seus pares e os adultos. O
que caracteriza esse trabalho é a sutileza, o contato interpessoal entre as crianças,
principalmente os bebês, entre elas e os adultos e a relação estabelecida entre as crianças e os
materiais disponibilizados a elas.
Quanto à organização e as formas de atendimento na/da Educação Infantil, a Rede
Pública Municipal de Educação Infantil de Niterói chega ao ano de 2020 com um total de 78
instituições. Das 69 unidades que funcionam em horário integral, 12 atendem crianças a partir
de 4 meses de idade. A Rede está distribuída da seguinte forma:

 42 Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEIs);


 3 Núcleos Avançados de Educação Infantil (NAEIs);
 20 Creches Comunitárias conveniadas pelo PROCC;
 13 Escolas de Ensino Fundamental com Educação Infantil.

UMEIs, Escolas de Ensino Fundamental com Educação Infantil e Creches Comunitárias


conveniadas, com indicativo de turnos e as unidades que atendem crianças a partir de 4
meses (berçário)

POLO NOME DA ESCOLA BERÇÁRIO TURNO

1 1 C.C. NOSSA SENHORA APARECIDA Integral

2 1 C.C. PROF. GERALDO C. DE ALBUQUERQUE * Integral

3 1 UMEI ALBERTO DE OLIVEIRA Integral

4 1 UMEI ANTÔNIO VIEIRA DA ROCHA * Integral

5 1 UMEI HILKA DE ARAÚJO PEÇANHA Integral

6 1 UMEI MARIA VITÓRIA AYRES NEVES Integral

7 1 UMEI PORTUGAL PEQUENO Parcial

8 1 UMEI PROF. ÍRIO MOLINARI Integral


126

9 1 UMEI PROF.a DENISE MENDES CARDIA Integral

10 1 UMEI ROSALDA PAIM Integral

11 2 C.C. INSTITUTO DR. MARCH Integral

12 2 C.C. MADRE MARY MARCELLINE Integral

13 2 E.M. ERNANI MOREIRA FRANCO Parcial

14 2 E.M. NORONHA SANTOS Integral

15 2 NAEI VILA IPIRANGA * Integral

16 2 UMEI HERMÓGENES REIS Integral

17 2 UMEI JULIETA BOTELHO Parcial

UMEI MARILZA DA CONCEIÇÃO DA ROSA


18 2 * Integral
MEDINA

19 2 UMEI MARLY SARNEY * Integral

20 2 UMEI PROF.a REGINA LEITE GARCIA Integral

21 2 UMEI RENATA GONÇALVES MAGALDI Integral

22 3 C.C. MINHA QUERÊNCIA Integral

23 3 E.M. DEMENCIANO ANTÔNIO DE MOURA Integral

24 3 E.M. SEBASTIANA GONÇALVES PINHO Parcial

25 3 E.M. VILA COSTA MONTEIRO Parcial

26 3 NAEI SEBASTIÃO LUIZ TATAGIBA Integral

27 3 UMEI ALBERTO BRANDÃO Integral

28 3 UMEI LUIZ EDUARDO TRAVASSOS * Integral

29 3 UMEI MARIA JOSÉ MANSUR BARBOSA Integral

30 3 UMEI PROF. NILO NEVES Integral

31 3 UMEI ZILDA ARNS NEUMANN * Integral

32 4 C.C. EULINA FÉLIX Integral

33 4 C.C. KAIRÓS Integral

34 4 C.C. PROF.a CLÉLIA ROCHA Integral

35 4 E.M. FELISBERTO DE CARVALHO Parcial


127

36 4 UMEI ALMIR GARCIA DA SILVA Integral

37 4 UMEI ELENIR RAMOS MEIRELLES Integral

38 4 UMEI GABRIELA MISTRAL Integral

39 4 UMEI GOVERNADOR EDUARDO CAMPOS Integral

40 4 UMEI PROF.a LISAURA MACHADO RUAS * Integral

41 4 UMEI VINÍCIUS DE MORAES Integral

42 5 C.C. ALARICO DE SOUZA Integral

43 5 C.C. ANÁLIA FRANCO * Integral

44 5 C.C. CIDADE DOS MENORES Integral

45 5 E.M. ADELINO MAGALHÃES Integral

46 5 E.M. GOVERNADOR ROBERTO SILVEIRA Parcial

47 5 E.M. INFANTE DOM HENRIQUE Parcial

48 5 E.M. TIRADENTES Parcial

49 5 UMEI JACY PACHECO Integral

50 5 UMEI NEUSA BRIZOLA Integral

UMEI PROF. IGUATEMI COQUINOT DE A.


51 5 * Integral
NUNES

52 5 UMEI ROSALINA DE ARAÚJO Parcial

53 6 C.C. BETÂNIA Integral

54 6 C.C. DOM ORIONE Integral

55 6 C.C. IRMÃ CATARINA Integral

56 6 C.C. JURUJUBA Integral

57 6 C.C. MEDALHA MILAGROSA Integral

58 6 C.C. SÃO VICENTE DE PAULO Integral

59 6 E.M. PROF.a LUCIA MARIA SILVEIRA ROCHA Parcial

60 6 UMEI DARCY RIBEIRO Integral

UMEI GERALDO MONTEDÔNIO B. DE


61 6 Integral
MENEZES

62 6 UMEI MARIA LUIZA DA CUNHA SAMPAIO Integral


128

63 6 UMEI PROF.a MARGARETH FLORES * Integral

64 6 UMEI SENADOR VASCONCELOS TORRES Integral

65 7 C.C. AMIGOS DO JACARÉ Integral

66 7 C.C. ESPERANÇA EM CRISTO Integral

67 7 E.M. HELONEIDA STUDART Parcial

68 7 NAEI ANGELA FERNANDES Integral

69 7 UMEI LIZETE FERNANDES MACIEL Integral

70 7 UMEI PROF.a NINA RITA TORRES Integral

71 7 UMEI OLGA BENÁRIO PRESTES Integral

72 7 UMEI PAULO CÉSAR PIMENTEL Integral

73 7 UMEI PROF.a ODETE ROSA DA MOTA * Integral

UMEI PROF.a ÁUREA TRINDADE P. DE


74 7 Integral
MENEZES

75 7 UMEI VALE FELIZ Parcial

76 3 UMEI JORGE NAJJAR Integral

77 4 E. M. DIÓGENES R. DE MENDONÇA Parcial

78 7 C.C. MEIMEI Integral

Unidades inauguradas pelo Programa Mais Infância.


129

3. O CICLO INFANTIL

És um senhor tão bonito


Quanto a cara do meu filho
Tempo, tempo, tempo, tempo
Vou te fazer um pedido
Tempo, tempo, tempo, tempo
Compositor de destinos
Tambor de todos os ritmos
Tempo, tempo, tempo, tempo
Ouve bem o que te digo
Tempo, tempo, tempo, tempo
(Oração ao tempo – Caetano Veloso)

O Ciclo Infantil compreende a inserção das crianças na Educação Infantil do Grupo de


Referência28 (GREI 0) ao Grupo de Referência 5 (GREI 5), com a duração de seis períodos
letivos em regime de funcionamento em horário parcial ou integral. O critério para formação
dos grupos de referência na Educação Infantil é etário, contudo essa organização não é
impeditiva de múltiplas interações entre os grupos nos cotidianos das Unidades Escolares.
Conforme preconiza a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), o ciclo
constitui uma das formas possíveis de organização escolar. Essa maneira de organizar os
tempos e espaços da Educação Infantil pública de Niterói visa a contribuir com o
desenvolvimento integral das crianças, como prevê a LDB em seu artigo 29:

A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade


o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus
aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da
família e da comunidade (BRASIL, 1996)29.

Nessa perspectiva, o desenvolvimento integral preconizado pela LDB é potencializado


na organização por ciclos, pois é possível que haja interlocução entre os grupos de referência
(GREIs), nos quais reagrupamentos variados podem existir. Essa organização escolar não
pressupõe retenção entre as etapas e/ou anos de escolaridade, conforme estabelecem as
Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil, a saber:

28
No município de Niterói, as crianças ingressam na Educação Infantil com quatro meses. A esse agrupamento
etário dá-se o nome de Grupe de Referência 0 (GREI 0). Os demais vão recebendo a numeração de acordo
com a idade das crianças.
29
Artigo alterado pela Lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, que dispõe sobre o Ensino Fundamental de nove
anos.
130

Art. 10. As instituições de Educação Infantil devem criar procedimentos para


acompanhamento do trabalho pedagógico e para avaliação do
desenvolvimento das crianças, sem objetivo de seleção, promoção ou
classificação, garantindo: [...]
V - a não retenção das crianças na Educação Infantil (BRASIL, 2009).

Assim, o Ciclo Infantil pressupõe um trabalho pedagógico processual no qual as


crianças possam experimentar e vivenciar contextos pedagógicos diversificados que permitam
perpassar por diferentes áreas do conhecimento, sem que haja uma ordem que obedeça do
simples ao complexo, do menor ao maior e assim por diante.
A pertinência do que será trabalhado, experienciado nas diferentes faixas etárias,
contextualiza-se e segue o tempo das singularidades, tecidas nas intencionalidades
pedagógicas, feitas pelos docentes, pelas crianças e por outros atores nas suas múltiplas
interações.
Nesse sentido, “a escola é propulsora da interlocução entre o que as crianças recebem
dos adultos para viver e pensar e o que com isso podem edificar para sustentar seus sonhos e
esperanças.” (BARBOSA et al., 2015, p. 109). A escolarização não pautará as ações
pedagógicas, mas sim a oportunização de experiências30 organizadas intencionalmente ou que
no convívio possam surgir, compondo novos percursos a serem descortinados e conhecidos.

3.1 Crianças e infâncias

Toda criança é criança de um lugar. Do mesmo modo,


toda criança é criança em algum lugar. Ou seja, existe
na produção das culturas infantis uma ancoragem
territorial que não apenas emoldura o contexto no qual
se edifica a infância, mas, para além disso, oferece o
próprio substrato material à produção da existência.
Esse processo faz emergir junto à ideia de culturas
infantis a existência de territorialidades infantis que
são a base da produção dessa cultura (LOPES;
VASCONCELLOS, 2006, p. 110-111).

Nessa perspectiva, reformular os Referenciais Curriculares para a Educação Infantil de


Niterói leva-nos à seguinte reflexão: o que é ser criança no momento histórico em que a
“barbárie” se instala e nos impõe “o paradoxo de ter um conhecimento teórico avançado sobre
a infância, enquanto assistimos com horror à incapacidade da nossa geração de lidar com as

30
O termo aqui empregado é entendido conforme nos estabelece Jorge Larrosa. "Experiência" é, segundo este
autor, “o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se passa, não o que acontece, ou o que
toca. A cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece”.
131

populações infantis e juvenis” (KRAMER, 2000, p. 2)? Assim, compreender o significado de


ser criança e de vivenciar as infâncias ante os desafios da sociedade contemporânea compõe o
pensamento sobre que currículo desejamos construir.
Há inúmeras pesquisas e reflexões sobre infância e criança; teóricos de diferentes
campos se dedicam a pensar sobre as crianças a partir do despertar da sociedade para a
presença delas nas ruas das grandes cidades (MOURA, 2007), fato que não é recente, mas que
ainda exige novos paradigmas para seu entendimento. Embora a grande preocupação fosse
somente com o abandono e o envolvimento com a delinquência, os estudos apontaram e
colocaram a infância no centro dos debates “como questão que não isentava de ônus nem de
responsabilidades a sociedade brasileira” (MOURA, 2007, p. 19). Esse novo olhar sobre a
criança estabelece novas concepções de infâncias.
Os estudos no campo da Sociologia da Infância nos alertam para a necessidade de
entendimento da criança como autor e ator social. Porém, pouco se considera sobre as culturas
infantis − ou porque pouco se pergunta ou por não se ouvirem as crianças. Por vezes, as falas
apreendidas nas pesquisas não problematizam os dados e não descrevem “os elementos
constitutivos do processo de recolha da voz da criança” (QUINTEIRO, 2002, p. 21). Mesmo
quando perguntamos e, de fato, ouvimos o que dizem, somos surpreendidos pela fala de um
ser humano que, apesar da pouca idade, impõe-nos uma reflexão sobre que sociedade
construímos. É o que faz uma menina de 4 anos ao nos responder o que é a vida: “[...] também
não é só amor, mas também é ódio e violência. Tem algumas pessoas que matam outras [...]”
(criança da UMEI Rosalda Paim, 2019).
Outro aspecto que caracteriza a história da infância é que ela não se distingue da
história dos adultos. A voz do adulto registrou a existência das crianças; foram médicos,
professores, padres, legisladores que deram informações sobre a infância do passado.
Contudo, esses discursos obrigam os pesquisadores a interpretar a forma como o adulto retrata
o estereótipo da criança ideal, saudável, obediente, em contraponto à “delinquente”.
Nesse sentido, estes Referenciais Curriculares pretendem ir além de falar sobre
crianças, infâncias e profissionais com quem elas convivem. Eles se propõem nortear sua
permanente reformulação por esses que são protagonistas da Educação Infantil. Dessa forma,
incorporam ao planejamento de ações pedagógicas e à prática cotidiana as vozes infantis e de
adultos, percebidas no diálogo intergeracional. O primordial é o que nossas crianças dizem
sobre si, a cidade, a escola e os problemas do mundo. Da resposta transcrita acima,
depreende-se que a criança se percebe como sujeito, pertencente ao seu tempo histórico e em
diálogo com as interações entre os demais sujeitos.
132

Diante dessa percepção, é possível delimitar o que é infância? É ela tempo cronológico
ou uma dimensão humana marcada por uma multiplicidade de fatores? Pensar na infância em
sua característica plural nos leva a mensurar a ideia de infâncias. A criança como sujeito traz
em si não somente uma diversidade de aspectos físicos e de personalidade, mas também uma
gama de vivências, ainda que em tenra idade cronológica. No que diz respeito ao fazer
pedagógico, é nítida a demonstração dessa pluralidade mesmo no trabalho com bebês.
A época contemporânea carrega em si, nos mais diversificados aspectos, traços
históricos − alguns remodelados, outros com características bem semelhantes às suas origens.
A Modernidade trouxe consigo um “sentimento de infância” (ARIÈS, 1978) que não era visto
na Idade Média. É inegável que esse “sentimento de infância” trouxe novo olhar, voltado aos
interesses da criança. No entanto, os profissionais da Educação Infantil devem ter atenção
quando o que está em questão é a criança na centralidade do processo pedagógico, pois o fato
de ela ter se tornado objeto de estudo ao longo do tempo não obrigatoriamente faz com que
ocupe seu espaço de sujeito na narrativa.
Outra questão que não pode ser posta à margem das reflexões diz respeito à crescente
urbanização da sociedade contemporânea, que faz com que a maioria das crianças do mundo
viva em cidades em contextos considerados de “risco” sob os mais diversos aspectos
(UNICEF, 2012). Segundo dados do IBGE (2010), o estado do Rio de Janeiro, por exemplo,
registra a maior taxa de urbanização do Brasil.
Nesse sentido, como a cidade acolhe as infâncias e se apresenta a elas? Como os
espaços urbanos contemplam as infâncias e as fazem pertencentes à cidade? Como as
Unidades Escolares se apropriam dessas reflexões e possibilitam essa inserção? Niterói, uma
cidade cujo potencial artístico, cultural, natural e histórico convive com os desafios impostos
pelas desigualdades sociais e resiste a eles, também exprime na sua organização a
“estratificação” dos espaços, que é também a estratificação social.
Diante do desafio da urbanização da metrópole que se expande, invisibiliza e
empareda as infâncias, Gobbi (2019) rememora a pessoa de Mário de Andrade, quando este
pensa uma cidade mais acessível às infâncias, trazendo a reflexão de lugares/espaços para se
brincar livremente e salvaguardar o ser criança. O conceito dos Parques Infantis extrapola o
contexto local para o qual foi pensado e alcança as reflexões sobre a Educação Infantil, sendo
usado por diferentes autores, por fazer referência ao direito de ser criança, de se brincar
livremente, da ruptura dos muros que cerceiam as infâncias, da proteção e plenitude ao seu
desenvolvimento e principalmente da instituição de políticas públicas que considerem de fato
esse direito.
133

Parques Infantis [...] como documentos e patrimônios culturais da infância


[...] que apresentam vasta contribuição para a composição e o conhecimento
concernente às crianças, à educação, à arquitetura e a culturas brasileiras [...]
o legado dos Parques Infantis pode ser avaliado como rica oportunidade para
incluirmos a infância no debate sobre questões patrimoniais e de cultura para
e das crianças. Tais questões estão, cada vez mais, voltadas para disputas
mercadológicas, visando a conveniências de alguns grupos em detrimento de
outros. Há que se buscar pontos em que tais interesses possam convergir
também para grupos historicamente desconsiderados, tais como aqueles
formados por crianças (GOBBI, 2019, p. 48).

Estendendo as palavras da autora, relembrar Mário de Andrade visa a

[...] dar relevância a algumas das propostas políticas concernentes à infância,


não se tratando de modo algum da busca por conservá-las acriticamente, mas
sim de trilhar caminhos renovadores a partir da inspiração respeitosa relativa
às crianças e já presentes décadas atrás (GOBBI, 2019, p. 48).

As crianças que vivem em contextos urbanos de violência social e econômica são


sujeitos que possuem relevância política nessas realidades. Por casos assim, a concepção de
infância, mais uma vez, torna-se discutível, não simplesmente por uma necessidade
protecionista, mas sim por pensar a criança como sendo sujeito histórico e político que atua
sobre essa realidade. De acordo com Aquino e Gonçalves (2018),

[...] essas crianças que têm suas infâncias marcadas pela dura realidade que
as cerca também apresentam firme determinação e resistência das mais
diferentes formas, desde as brincadeiras no quintal, onde se permitem
fantasiar uma outra realidade, até se tornarem os heróis dessa tão desejada
transformação, até sua participação efetiva nos movimentos que buscam essa
mudança (AQUINO e GONÇALVES, 2018, p. 34).

Nesse contexto, a vulnerabilidade social e econômica, por vezes, impele famílias ao


recurso extremo da imigração. São crianças acolhidas em nossas escolas que provêm de
diversas regiões e de outros países, o que impõe a elas e à escola a superação de barreira de
culturas e idiomas diversos, que passam a conviver nesse espaço. Apartadas física e
culturalmente de suas origens, encontram na escola a oportunidade de acolhimento e
integração à nova realidade que a vida lhes apresenta. Para a UMEI Maria Vitória Ayres
Neves, são essas crianças

[...] que constroem o colorido da nossa escola. São crianças advindas de


lugares os mais distantes e diversos, que contribuem para a construção de
uma educação multifacetada, rica em cultura e pluralidade, composta por
brasileiros, chineses, africanos, nordestinos, nortistas e fluminenses. Elas,
que nos chegam cheias de esperança, com suas peculiaridades e riquezas
culturais, além de trazerem um colorido diferente, nos ensinam, a cada dia,
que educar também é acolher, de braços abertos, toda a diversidade que
134

comporá, a cada ano, cada cantinho e espaço vazio da nossa escola e da


nossa cidade (UMEI Maria Vitória Ayres Neves).

Segundo Kramer (2003), se já estamos na “barbárie”, logo não corremos o risco de


chegar a ela. Então, como educar crianças? Uma aposta da própria autora seria a
humanização. Oferecer a esse sujeito a oportunidade de resgatar sua experiência, dando
sentido aos “pertencimentos”, lendo o mundo e transformando tudo isso em novas
experiências. A criação de laços de solidariedade entre os pares também é essencial nessa
perspectiva. “Que retomemos e aprofundemos a dimensão cidadã da ação educativa e cultural.
Pela emancipação da solidariedade, contra a barbárie” (KRAMER, 2003, p. 96).
Fomentar a cultura do respeito à diferença, da humanidade e do afeto entre nossas
crianças é movimento que contribui para que as infâncias niteroienses sejam a base de uma
sociedade que acolha, valorize e respeite a diversidade. Nesse sentido, as narrativas31 das
crianças matriculadas na Educação Infantil da Rede Pública Municipal de Educação de
Niterói no ano de 2019 são fontes de esperança nas falas que representam esses pequenos
cidadãos:

• Paz
Ser amigo é não brigar com as pessoas, ajudar os pais e ficar quietinho. (5 anos)
Não bater e não dar socos. (5 anos)

• Cidadania
Nossos direitos e deveres. (6 anos)
Não jogar lixo no chão, lixo é no lixo. Eu sou uma cidadã. (5 anos)

• Família
Grupo de pessoas unidas, juntas na mesma casa. (6 anos)

• Escola
Aprender. A gente lê livros, a gente brinca no pátio, a gente brinca com os amigos, a gente
faz atividades, escuta historinhas... muitas coisas legais. (6 anos)

31
Registros em vídeo enviados pelas UMEIs e Creches Comunitárias por ocasião do III Seminário de Educação
Infantil Infância, Arte e Imaginação: Eu Fico com a Pureza da Resposta das Crianças.
135

• Educação
Ser amigo de todo mundo. Ser feliz. É ser respeitável para os amigos. (6 anos)
• Amizade
Para brincar, dividir os brinquedos, ser amigo, dar amor, dar carinho, é... ajudar os amigos.
(6 anos)
É aprender, dizer e não é só isso, é violência, amor e tudo mais. (5 anos)
A vida é brincar e ser feliz. (5 anos)
A vida é brincar na pracinha, na rua, porque assim fica mais legal. (5anos)
A vida é natureza, cheio de plantas e pessoas. (5 anos)
A gente é criança para poder brincar! (5 anos)
Ser criança, encontrar com os amigos e brincar. (5 anos)
A vida é viver, não ficar triste e não ter medo de andar de bicicleta sem rodinha. (5 anos)
O amor é só dar um abraço e não ficar triste. (5 anos)
Alegria é a gente brincar, correr e ir para a escola. (5 anos)

Na aparente simplicidade das respostas, identificamos a essência de questões


complexas que, no contar de uma história ou na rodinha de conversa, trazemos para o diálogo
com nossas crianças. Construir currículos na Educação Infantil não é isolar nossas crianças
por algumas horas da “vida real”; é, fundamentalmente, ter consciência da realidade em que
se vive, por mais complexa que se apresente. A realidade dura que, às vezes, irrompe o
cotidiano da Educação Infantil por meio do que é presenciado e das imagens divulgadas nas
mídias sociais, nas falas dos adultos, nos acontecimentos no portão da unidade, nos conduz à
reflexão sobre o que é de fato cidadania. Essa construção pode ser capaz de modificar o que
nos amedronta ou nos afasta do sensível que há em nós, adultos ou crianças. Nesse sentido, é
preciso acreditar

[...] na importância de ser leve em meio a tanta dor, a tanta coisa negativa
que nos cerca. Para a gente conseguir viver, sobreviver. Então eu acredito
muito no poder da arte, no poder da educação como potenciais de
transformação [...] o caminho é pela arte, é pela música, é pela dança, é pela
expressão corporal, é pela união das pessoas que acreditam numa educação
diferente. Não pelo consumismo, não pelo dinheiro, não por nada disso, não
pelo mostrar-se, exibir-se, mas por fazer enquanto ser humano, enquanto
autores das suas vidas. [...] Enfim, a gente pensa muito nesse encontro, que
cada dia seja um encontro e não só um simples trabalho burocrático [...] o
que nos motiva é acreditar no outro, no potencial do outro, em quem ele é,
pelo humano que é e não só pelo lugar que ele está (UMEI Margareth Flores,
2019).
136

A forma como as crianças niteroienses se apropriam, desfrutam da cidade está de


várias maneiras entrelaçada ao fazer pedagógico das Unidades de Educação Infantil. Por meio
dos variados projetos, crianças e profissionais da Educação Infantil rompem os muros das
unidades e se fazem presentes em diferentes lugares da cidade, espaços de lazer, museus,
cinemas, bibliotecas, teatros, estabelecimentos comerciais etc. Nessas “andarilhagens”
contextualizadas de intencionalidade pedagógica, pequenos cidadãos processualmente se
apropriam dos espaços da cidade, da sua história, do patrimônio cultural, como nos inspira a
UMEI Bezerra de Menezes:

Quando cheguei à UMEI Geraldo Montedônio Bezerra de Menezes como


pedagogo, sempre me ressenti de não ter tido ainda a oportunidade de
vivenciar na escola projetos pedagógicos onde pudéssemos estar para além
dos seus muros. Conhecer o mundo que nos cerca, o intercâmbio entre
escola e cultura. As professoras estavam temerosas de experimentar novas
formas em seu fazer. Reconheço que a violência urbana, tão comum no
nosso dia a dia, nos traz muitas dúvidas quanto à segurança das crianças,
mas percebo também o peso da tradição de uma escolarização posta.
Célestin Freinet32 nos inspirou teoricamente na condução de nossas ações.
Nesse processo ganhamos o entendimento que poderíamos sair da escola e
ser mais “ousados” em nossas práticas. Assim começamos a caminhar: uma
volta no quarteirão, observação do bairro, contato com a natureza, praias,
parques, museus, teatros e tantos lugares... Em um consenso [...] da
comunidade escolar, como numa espécie de “documento de identidade” da
UMEI, nos consideramos a “Escola do Aluno Caminhador”.

Como se pôde perceber, a narrativa do pedagogo da UMEI Bezerra de Menezes


ressalta que a aprendizagem não se dá apenas na escola, mas em diversos espaços da cidade.
São experiências ricas para as crianças quando elas circulam com seus professores pelos
espaços culturais e urbanos e começam a ver os locais com olhos diferentes, produzindo assim
outros sentidos e significados para o espaço vivido.
Dessa forma, professores e crianças ganham muitíssimo em riqueza de vivências
quando se aventuram a desbravar tudo que Niterói tem a oferecer em belezas naturais e
patrimônios materiais e imateriais.

3.2 Os Ciclos infantis: da inserção à transição para o Ensino Fundamental

32
Célestin Freinet, (1896-1966), pedagogo francês, importante referência da Pedagogia de sua época, cujas
propostas continuam a ter grande repercussão na atualidade.
137

Pensar a criança que chega às Unidades de Educação Infantil do município de Niterói


é refletir sobre o tempo, a renovação da vida e os diferentes períodos e ciclos que ela nos
apresenta em novidade, colocando diante de nós um ato a ser visto e encenado. O olhar das
crianças contempla os diferentes tempos. Elas alteram por completo o mundo existente e nos
convidam a percebê-lo de modo inaugural. Dessa forma, assumimos, nestes referenciais e em
nossas práticas cotidianas, a concepção de criança apresentada por Kramer (2007, p. 15):

A criança não se resume a ser alguém que não é, mas que se tornará (adulto,
no dia em que deixar de ser criança). Reconhecemos o que é específico da
infância: seu poder de imaginação, a fantasia, a criação, a brincadeira
entendida como experiência de cultura. Crianças são cidadãs, pessoas
detentoras de direitos, que produzem cultura e são nela produzidas
(KRAMER, 2007, p. 15).

Esse modo de compreender a criança nos permite perceber sua capacidade criadora,
seu potencial enquanto sujeito inserido em contextos distintos cujas vivências e experiências
interferirão em suas ações e no processo de elaboração de sentidos.
Muitos são os desafios ao recebermos as crianças nos espaços de Educação Infantil e
ajudá-las a conhecer e apropriar-se desse vasto mundo, do qual todos fazemos parte. Nesse
sentido, a primeira transição por qual passam as crianças e seus familiares/responsáveis, que
se dá a partir da decisão de matriculá-las nas instituições educacionais, constitui-se em algo
complexo, uma vez que há uma sequência de novidades, experiências, expectativas e desafios
que afetam os sujeitos envolvidos nesse processo.
Na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, a Educação Infantil é constituída
por um ciclo único composto por seis anos, no qual as crianças têm o direito de ingressar a
partir dos 4 meses. A esse momento de chegada das crianças e de seus familiares/responsáveis
a nossas instituições chamamos de inserção. Esse é o início de uma relação que perdurará por
um longo tempo, devendo considerar-se a criança como sujeito de autoria, de direitos, oriunda
de diferentes contextos sociais e culturais, que chegam ao espaço institucional inaugurando
um novo ciclo de interações, o qual deve ser contextualizado por afetos, escutas e percepções
sensíveis, alcançando toda a comunidade escolar.
Antes de seu ingresso na Unidade de Educação, as crianças convivem com rotinas
estabelecidas no contexto familiar. Sua chegada a esse novo espaço trará mudanças que
implicam rupturas, uma educação compartilhada entre duas instituições (famílias/responsáveis
e unidade de educação), possibilidades de ser e estar em outros grupos a partir de novos
encontros e experiências. Por isso, o momento de inserção é extremamente importante,
138

devendo ser considerado espaço de acolhimento, gerador de confiança, credibilidade, vínculos


potentes e afetos.
A Educação Infantil tem o compromisso de oportunizar às crianças uma
multiplicidade de experiências que favoreçam e colaborem com seu desenvolvimento integral
(físico, cognitivo, emocional, motor, cultural e social). Esse ciclo deve oportunizar-lhes
vivências de novas interações e livres expressões de curiosidades, percepções, sentidos,
sentimentos e descobertas sobre si, sobre os outros e sobre o mundo que as cerca,
possibilitando a conexão com a natureza, bem como a tomada de decisões coletivas, o uso de
múltiplas linguagens, a observação da diversidade de formas, objetos e diferentes pessoas por
meio das interações e da brincadeira.
Ao final do ciclo infantil, as crianças e seus familiares/responsáveis passarão por uma
nova transição e, consequentemente, por um novo período de inserção com o ingresso ao
Ensino Fundamental. Contudo, cabe ressaltar que, apesar da passagem de uma etapa para
outra, as crianças, que agora passam a ser chamadas de alunos, continuam sendo crianças.
Dessa forma, ainda precisam ter garantidos os tempos e espaços propícios a brincadeiras e à
ludicidade como caminhos potentes para continuidade de suas aprendizagens.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil (DCNEI) estabelecem
que a Educação Infantil não constitui etapa preparatória para o Ensino Fundamental, portanto
não cabe a sistematização e hierarquizações de conhecimentos inerentes à próxima etapa da
Educação Básica. O ciclo infantil possui currículo próprio, com intencionalidades educativas
específicas e naturezas de aprendizagens diferenciadas e pautadas na vivência/experiência das
crianças.
Esse documento traz consigo uma concepção de criança que reconhece e legitima sua
condição de cidadã portadora de direitos e de sujeito que “não virá a ser”, mas que já é. Nesse
sentido, é imprescindível que os docentes que apresentarão às crianças e seus
familiares/responsáveis uma rotina escolar, inerente ao novo ciclo de aprendizagem,
compartilhem dessa concepção e a considerem como princípio para o trabalho pedagógico a
ser desenvolvido. A esse respeito, Kramer (2009, p. 18) afirma que “na produção dos
discursos, das práticas e interações, os lugares que as pessoas ocupam e os significados que
circulam interferem no significado produzido”. Dessa forma, acolher uma criança no Ensino
Fundamental é diferente de adaptá-la à nova rotina, é compreender o modo de ser, aprender e
estar no mundo.
Outro aspecto importante a ser considerado no movimento de transição entre essas
etapas da Educação Básica é o fato de ele se dar de maneira abrupta, sem que
139

familiares/responsáveis e crianças tenham clareza de como elas serão acolhidas e como a


continuidade das aprendizagens se dará. Podemos observar o mesmo sentimento de
expectativa já vivenciado no início do ciclo infantil.
Assim, apoiados em Corsaro e Molinari (2005, p. 18 apud MOTTA, 2011, p.
139), compreendemos ser importante a criação de situações nas quais possam ser antecipadas
as informações e/ou ações do que está por vir na etapa seguinte. Além disso, é fundamental a
garantia de algumas continuidades pedagógicas baseadas na manutenção de um trabalho
focado nas múltiplas linguagens e na organização dos conhecimentos por meio de projetos
cuja centralidade está na criança como sujeito potente que tem muito a nos dizer.
Baseados em Moss (2008, p. 229 apud MOTTA, 2011, p. 146), propomos, nestes
referenciais, um constante diálogo, um trabalho compartilhado e permeado por encontros
entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental a partir do reconhecimento das experiências
de cada etapa em torno do objetivo principal: o desenvolvimento integral de nossas crianças.

4. DOCENTES DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Sei ter o pasmo essencial


Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do
Mundo...
(Alberto Caeiro)
A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é o de saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.
(Alberto Caeiro)

Pensar a docência na Educação Infantil, hoje, convoca-nos a olhar para o cotidiano de


nossas ações, a partir da compreensão das infâncias e da criança como um ser social, cultural,
histórico, parte da natureza. Ademais, pensar, repensar, sentir nossa condição enquanto
adultos num contexto de Educação Infantil suscita questões:
140

Como docentes, temos acolhido e valorizado as demandas, expressões e interrogações


trazidas pelas crianças e suas infâncias? Colocamo-nos como aprendizes na relação com elas?
Esse modo de olhar as crianças pequenas, em suas singularidades, exige de nós a reinvenção
de outros sentidos para a práxis docente? Em que medida as crianças têm participado da
construção do currículo das UMEIs? Como elas têm participado do planejamento das ações
pedagógicas, da avaliação, dos registros diários, da documentação pedagógica, das escolhas
de temas de projetos, da organização dos tempos-espaços, das rotinas e cotidianos, da
elaboração do Projeto Político Pedagógico e das instâncias de decisão coletiva?
Encontramos pistas para responder a algumas dessas questões por meio de
observações referentes à prática docente, narrativas orais e escritas e relatos de algumas
professoras da Rede e nas interlocuções com autores e pesquisadores da área:

É uma aprendizagem intensa, aprendizagem bonita. Com as crianças eu


aprendo a ser educadora, com as crianças eu aprendo a olhar o mundo, eu
aprendo a me conhecer, eu aprendo sobre simplicidade, sobre delicadezas.
As crianças têm o poder de encantamento, de nos encantar, de nos encantar
pela vida, de nos trazer esperança (Ana Mattos – Docente da Rede Pública
Municipal de Educação Infantil).

A fala acima nos aponta indícios para a construção de uma práxis docente que se
constitua no diálogo com as infâncias. A professora, ao se colocar como aprendiz, desvela os
afetos produzidos no encontro com as crianças e a intensidade dessa relação como parte
fundante de seu fazer e do processo de constituir-se professora. Como no texto da epígrafe, a
professora dispõe-se a seguir os passos, olhares e gestos das crianças, a caminhar de mãos
dadas, a ser levada a conhecer o mundo por elas e com elas e a se (re)encantar.

Então, essa eterna novidade do mundo, da poesia de Pessoa, eu vejo,


aprendo com as crianças. É um processo que acontece ali, nesse espaço da
Educação Infantil, no meu espaço de trabalho. Isso é muito bonito. Então, eu
aprendo também o belo com as crianças (Ana Mattos – Docente da Rede
Pública Municipal de Educação Infantil).

A expressão de amorosidade presente no relato acima nos convida ao diálogo com


Freire (2005), quando o autor afirma que o amor não é um gesto, mas sim um ato de
libertação, vivido entre sujeitos que amam e se amam. Assim, Freire (2005) nos ensina que o
amor é um ato de comunhão que exige a superação da contradição entre dominadores e
dominados. Compreendemos que uma educação bancária e conservadora do status quo, que
em um contexto da Educação Infantil se dá por uma relação vertical, que toma a criança como
faltosa e passiva, pode ser superada quando os profissionais da Educação Infantil também se
afirmam dentro de uma concepção dialógica, onde eles ensinam, mas também aprendem. Uma
141

relação baseada na solidariedade, na sensibilidade, no respeito, na valorização da autoria e da


autonomia. Sendo assim, a prática pedagógica da/na Educação Infantil precisa estar
comprometida com o que estabelece o Parecer CNE/CEB n.º 20 (2009) quanto aos princípios
norteadores:

Éticos: de justiça, solidariedade, liberdade e autonomia; de respeito à


dignidade da pessoa humana e de compromisso com a promoção do bem de
todos, contribuindo para combater e eliminar quaisquer manifestações de
preconceito e discriminação.

Políticos: de reconhecimento dos direitos e deveres da cidadania, de respeito


ao bem comum, à preservação do regime democrático e dos recursos
ambientais; busca de equidade no acesso à educação, à saúde, ao trabalho,
aos bens culturais e outros benefícios; de exigência de diversidade
tratamento para assegurar a igualdade de direitos entre os alunos que
apresentam diferentes necessidades; de redução da pobreza e das
desigualdades sociais e regionais.

Estéticos: de cultivo da sensibilidade juntamente com o da racionalidade; de


enriquecimento das formas de expressão e do exercício da criatividade; de
valorização das diferentes manifestações culturais, especialmente as da
cultura brasileira; de construção de identidades plurais e solidárias (Parecer
CNE/CEB n.º 20, 2009, p. 107-108).

Tais princípios do fazer docente evidenciam o quanto de pesquisador deve ser o


professor. Nessa perspectiva, a UMEI Alberto de Oliveira, em referência ao poeta Manuel de
Barros, afirma que os docentes atuam como caçadores e achadouros de infância. Instigam as
crianças a observar, a problematizar, a desenvolver o desejo pela pesquisa. Dessa forma, o
fazer docente constitui-se um fazer pesquisador; ocorre com a criança e a partir dela na
organização dos espaços e tempos, no planejamento, em seus registros diários, na mediação
de conhecimentos e de experiências. Escutar, registrar e refletir são ações docentes nesse
caminhar compartilhado, nesse projetar de possibilidades e de aprendizagens.
Cabe ressaltar que, quando nos referimos ao professor pesquisador, estamos indo além
de uma visão de pesquisa, na qual geralmente predomina a produção de conhecimento
acadêmico, em alguns casos marcada por hierarquização e assujeitamento. No entanto,
compreendemos esse profissional como aquele que se forma e se constitui também a partir de
reflexões dialeticamente singulares e plurais, ou seja, a partir de seus percursos pessoais e
profissionais na relação com os outros pares e consigo mesmo, possibilitando, assim, rever
suas práticas e seus fazeres.
A esse respeito, Paulo Freire diz que a pesquisa é parte fundamental da docência,
posto que não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Isso também nos revela um
outro olhar sobre os processos formativos e de constituição desse profissional, os quais devem
142

ser compreendidos, segundo Nóvoa, enquanto “trabalho de reflexividade crítica sobre as


práticas e de reconstrução permanente de uma identidade pessoal que confere à pessoa o
estatuto do saber da experiência” (NÓVOA, 1992, p. 25). São essas experiências que servirão
de base para uma formação que desloca o professor do papel de coadjuvante, de mero
espectador, para autor, sujeito participativo e com voz, que produz conhecimento mais
aproximado das realidades educativas.
Não queremos com essa discussão desconsiderar a inegável importância das
formações acadêmicas, as contribuições de inúmeras pesquisas que chegam ao âmbito da
escola, tampouco o papel do pesquisador. Apenas destacamos a importância de compreender
que, embora muitos profissionais da Educação Infantil não se reconheçam na condição de
pesquisadores, defendemos a ideia de que estes se formam, constituem-se por meio de suas
experiências, dos contextos em que vivem, da ação educativa que sofrem, dos múltiplos
acontecimentos que acompanham suas trajetórias, das interações com outros grupos, da
tomada de consciência, da compreensão de si e também da reflexão teórica que em momento
algum deve se desvencilhar de todo esse processo.
Pensando o cotidiano do trabalho docente, constatamos que este implica um fazer
contextualizado por práticas compromissadas e, acima de tudo, carregadas de
intencionalidades pedagógicas. Em algo que possa parecer despretensioso, há rigorosidade
metódica, há planejamento. Como nos diz Paulo Freire (2001):

Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco,


porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar,
constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para
conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade
(FREIRE, 2001, p. 32).

Nessa perspectiva, na ação de ser conduzido a partir da escuta das vozes infantis, da
observação dos caminhos e gestos das crianças, manifestam-se experiências, o encontro de
sentidos e a riqueza do acolhimento na construção do conhecimento, como encontramos na
narrativa abaixo:

Algo que nós, educadores das infâncias, precisamos nos habituar a fazer é a
observação e a escuta atenta das crianças, principalmente nos momentos de
brincadeiras. Elas são nutridas de um potencial ímpar e, ao mesmo tempo,
repletas de expectativas e cheias de curiosidade sobre o mundo, a vida, o
Universo. Costumo ouvir as crianças com quem trabalho e elas planejam
comigo os projetos e as atividades que desenvolvemos. Assim elas se tornam
coautoras de seus conhecimentos (Eliete Marcelino − Docente da Rede
Pública Municipal de Educação Infantil).
143

A fala dessa professora nos traz muitas pistas sobre a importância de escutar as
crianças, de estar disponível e atento aos gestos, aos sorrisos, ao choro, aos desenhos, às
produções, aos caminhos que elas percorrem, ao uso dos espaços-tempos, às escolhas de
brinquedos e brincadeiras, ao modo como se relacionam com outras crianças e com adultos da
UMEI. Além disso, é preciso observar o modo como elas usam e organizam os materiais
artísticos, quais alimentos preferem, como gostam e se gostam de descansar após o almoço,
como se expressam por meio das linguagens artísticas, como narram suas histórias, suas falas,
seus ritmos, seus silêncios... Para escutar, é preciso estar totalmente disponível às histórias do
outro, às singularidades, ao entendimento das diferenças como potências e estar sensível à
vida do outro. Nesse sentido, nas UMEIs não só as crianças precisam ser escutadas, mas
também suas famílias, os professores e os funcionários, uma vez que a escuta é um princípio
da convivência cuidadosa, amorosa e democrática.

Educar crianças pequenas pressupõe o afeto, o afetar e o afetar-se. Afeto


como sentimento, como ética e como motivador do desejo do ser e estar
juntos. Do ser intencional, intermediador de aprendizagens, do estar
presente, de corpo, alma e coração. Existindo realmente com e por elas. Da
prática de provocar o desejo de retornar para escola, para estar sendo e
aprendendo com os outros (Joana Gonçalves − Docente da Rede Pública
Municipal de Educação Infantil).

O relato da professora afirma a dimensão do afeto como manifestação da amorosidade


freireana, como disponibilidade que se coloca de forma integral corpo-alma-coração. Afirma,
ainda, o sujeito não fragmentado, não cindido entre sentir e aprender, entre emoção e razão.
Como nos explica Walter Kohan, versando sobre Freire, o amor é uma condição
essencial, sem a qual não há educação possível: se não houver como amar, não há como
educar, ensinar e aprender. Nesse sentido, amar não tem apenas o valor de uma paixão ou
afeto pelo outro. Amar significa amar a posição que ocupam, a relação educativa, a própria
posição de quem ensina, amar o mundo comum que pode ser construído a partir da relação
pedagógica (KOHAN, 2019, p. 130). De acordo com Verônica Santos, docente da Rede
Pública Municipal de Educação Infantil:

Atuar como professora de crianças pequenas é ter o privilégio de


acompanhar o desenvolvimento humano de forma plena. Observar o olhar
curioso a cada descoberta, os gestos de carinho e afetividade em um grupo
de Educação Infantil é para a professora uma oportunidade única de
conhecer, pesquisar e vivenciar as infâncias. A criança possui uma
percepção aguçada que capta tudo o que ocorre ao seu redor. Quando o
professor é atento à fala da criança, aos seus desejos de aprendizado, o
trabalho com esse grupo passa a ser mais significativo e motivador. Em
meus registros diários, reflito e percebo que ser professora da Educação
144

Infantil é ter a possibilidade de me reinventar profissionalmente, diante de


cada novo contexto (Verônica Santos − Docente da Rede Pública Municipal
de Educação Infantil).

Tal relato aponta que ser professora da Educação Infantil é ter a possibilidade de se
reinventar profissionalmente a cada dia, diante de cada novo contexto; é refletir sobre o fazer-
se professora também como efeito dos encontros com as crianças. Nesse cenário, os registros
são fontes potentes de reflexão, avaliação de si e das crianças e de propulsão de mudança da
prática pedagógica, pois, a partir deles, não só se registram de forma sistemática observações
e dados objetivos, mas também sentimentos, venturas e desventuras.
Como explicitado por Ostetto (2018), os registros pedagógicos ou a “documentação
pedagógica”, como sugere a pedagogia italiana, surgem da observação como um ato que não
apenas descreve a realidade, mas a interpreta, traduzindo intenções, concepções, valores,
expectativas e representações daquele que observa. O modo como registramos o que
selecionamos para registrar e a forma como apresentamos os registros revelam o nosso olhar,
o modo como compreendemos as infâncias e sua passagem pela educação infantil:

Documentar é contar histórias, testemunhar narrativamente a cultura, as


ideias, as diversas formas de pensar das crianças; é inventar tramas, poetizar
os acontecimentos, dar sentido à existência, construir canais de ruptura com
a linguagem “escolarizada”, tradicionalmente cinzenta, rígida, enquadrada,
que tantas vezes silencia adultos e crianças. Documentação é autoria, é
criação (OSTETTO, 2018, p. 26).

Assim, o modo como as professoras documentam seus cotidianos de trabalho, as


experiências infantis, seus encontros com as infâncias, seus incômodos, seus encantamentos e
suas inquietudes revela também os processos de formação docente. Esses processos de
formação precisam incluir a escuta de si mesmos, uma escuta atenta que permita aos docentes
perceberem-se como sujeitos que, assim como as crianças, são potentes, criativos e sensíveis.

Para que professoras e professores vejam e ouçam a criança − suas


brincadeiras, suas perguntas e descobertas sobre o mundo, suas
aprendizagens e expressões que dizem do mundo descoberto e apropriado −,
é imprescindível que vejam e ouçam a si mesmos. É fundamental que
estejam alimentados por uma estética cotidiana que provoque a imaginação,
que mobilize razão e sensibilidade, pensamento e intuição, num convite à
criação (OSTETTO, 2018, p. 27).

Isso exige o reconhecimento da criança em sua alteridade e a percepção de que estar


com ela significa experimentar a possibilidade de (re)olhar o mundo, rever práticas e criar,
muitas vezes, movimentos instituintes que sejam inspirados nesse encontro. Estar na
companhia das crianças provoca nos docentes uma atitude de pesquisa frente aos desafios da
145

convivência com essa alteridade, numa prática pautada na curiosidade epistemológica, na


inconformidade frente ao naturalizado e na disponibilidade de ser indagado pelas crianças. É
o que nos aponta Freire quando nos diz que

[...] a curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao


desvelamento de algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de
esclarecimento, como sinal de atenção que sugere alerta, faz parte integrante
do fenômeno vital. Não haveria criatividade sem a curiosidade que nos move
e que nos põe pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos,
acrescentando a ele algo que fazemos (FREIRE, 2001, p. 35).

No tocante à curiosidade das crianças, a professora Ana Mattos, docente da Rede


Pública Municipal de Educação de Niterói, compartilha a seguinte reflexão:

Elas me lembram, diariamente, que é parte essencial da espécie humana a


paixão de conhecer o mundo, a curiosidade. O fascínio pelo novo, o espanto,
e isso me contagia. É muito interessante também observar que a criança pode
de fato fazer uma coisa que o adulto é completamente incapaz. Que é
descobrir o novo, de novo (Ana Mattos − Docente da Rede Pública
Municipal de Educação).

Essa experiência de entrega, de disponibilidade afetiva, também é política na medida


em que nos revela a necessidade de pensarmos os lugares ocupados pelas crianças nas
relações tradicionalmente vividas nas escolas e também fora delas. Podemos aprender com as
crianças, em sua curiosidade e vivacidade, a viver um tempo mais lento, tempo não
cronológico, mas também intensivo, no qual podemos ouvir atentamente as necessidades,
ritmos e movimentos do corpo, podemos aprender de corpo inteiro. Observar e valorizar as
experiências de criação e não apenas os resultados. Elas nos convocam à reconexão com a
natureza, as experiências da imaginação e da criação e a força e potência da brincadeira.
Os relatos nos revelam que a docência se faz quando temos um compromisso ético e
político com a esperança, o sonho e a utopia. Dessa forma, compreendemos que os modos de
ser professor (a) são pautados por esse compromisso e que “a práxis desse professor deve ser
de alguém que irá incentivar as crianças a lutarem por seus direitos, a serem ouvidas pela
sociedade e desenvolver nelas o processo de reflexão” (UMEI Irio Molinari).
Como se vê, a UMEI Irio Molinari destaca acima como é relevante construir um
ambiente onde as crianças possam ser ouvidas e possam participar da tomada de decisões
pedagógicas pertinentes a elas. Nessa relação, as crianças e seus docentes vão se fortalecendo
como sujeitos que pensam, ponderam e decidem sobre seu cotidiano.
É importante afirmar, portanto, que a prática docente precisa ser alimentada também
com possibilidades de formação docente que considerem não só conhecimentos específicos,
146

como também saberes da ordem do sensível, que possibilitem experiências estéticas, artísticas
e culturais. Segundo Leite e Ostetto (2012),

[...] sensibilizar o movimento, o olhar e a escuta do professor contribuirá,


sobretudo, para torná-lo um sujeito mais aberto e plural, mais atento ao
outro; ampliará seu repertório e, consequentemente, seu acervo para a
criação, uma vez que só se cria a partir da combinação de elementos diversos
que se tenha, tornando sua prática mais significativa, autoral e criativa
(LEITE; OSTETTO, 2012, p. 23).

Assim, a inclusão de experiências multissensoriais, artísticas e culturais na formação


de professores também é importante, uma vez que pode encorajar a busca de outros sentidos e
provocar a consciência crítica acerca da relevância de perceber-se para perceber o outro,
mover-se para viabilizar o movimento, encantar-se para encantar. Reiteramos que, ao
redescobrir suas linguagens e seus modos de expressar o mundo, ao cultivar o espaço lúdico
dentro de si, colocando-se disponível à busca-resgate de seu próprio eu-criador-autor, o
professor amplia possibilidades de reconhecer e apoiar o eu-criador-autor das crianças.
Dessa forma, compreendemos que a formação docente se faz na caminhada, formando
e formando-se. Tornamo-nos, assim, constantemente, objeto de estudo, precisando adquirir
saberes, conhecimentos específicos para a prática docente que nos coloca diante de uma
reflexão crítica sobre o nosso fazer. Devemos considerar também os fundamentos humanos
adormecidos, que nos encaminham ao sensível, promovendo encontros sublimes e potentes de
transformação. Há de se estar pronto, à procura, como nos inspira o poeta das infâncias,
Manoel de Barros: “vou meio dementado e enxada às costas cavar no meu quintal vestígios
dos meninos que fomos” (BARROS, 2003, p. 14).

4.1 Bidocência: desafio de uma caminhada conjunta

Abordar a trajetória do percurso realizado pelo município de Niterói na Educação


Infantil é desafiador. Não há como abordar as trilhas percorridas sem considerar a importância
de sua inserção na Educação Básica a partir da LDB. Esse marco precisa ser sempre
relembrado, pois a Educação Infantil foi reconhecida e valorizada legalmente por meio do seu
fortalecimento como política pública.
Dessa forma e juntamente com esse processo, outras mudanças nas políticas públicas
foram sendo implementadas, como a inclusão de crianças de seis anos no Ensino Fundamental
e a ampliação da escolaridade obrigatória e gratuita dos quatro aos 17 anos de idade. Com
147

esse marco, a Educação Infantil passou a ter um caráter pedagógico e institucional, rompendo
com as amarras históricas do ambiente doméstico e do assistencialismo.
Niterói vem caminhando, juntamente com o movimento nacional, para o oferecimento
de escolas para essa faixa etária da população infantil. Nos últimos anos, Unidades de
Educação Infantil foram inauguradas com o objetivo de contemplar a demanda crescente.
Concomitante com o crescimento de sua rede física, o aspecto pedagógico também vem se
transformando, e investimentos são propiciados para que esse atendimento guarde a qualidade
ideal e necessária.
A experiência da bidocência é vivida como uma aposta intencional na melhoria do
atendimento à criança pequena. Essa escolha é um dos diferenciais da nossa Rede no que
tange ao trabalho pedagógico na Educação Infantil. Profissionais com formação pedagógica
desenvolvem olhares e escutas sensíveis, sobretudo na compreensão das múltiplas linguagens
que perpassam o universo infantil: o corpo e seus movimentos, as tensões e as apreensões, os
sentidos do choro, do riso, as demonstrações de carinho, raiva, partilha.
As crianças pequenas estão desenvolvendo sua oralidade, a capacidade de expressão,
portanto necessitam ser ouvidas com atenção e cuidado. Tais manifestações devem ser
organizadoras da rotina, do espaço e do currículo na Educação Infantil. Por meio do
acompanhamento às Unidades Escolares realizado pela Diretoria de Educação Infantil,
observamos que, quanto maior o número de crianças para um professor, a tendência da prática
pedagógica é homogeneizar as ações de cuidar-educar. Assim, estabelecem horários fixos,
planejamentos rígidos e estratégias didáticas padronizadas.
Além disso, as crianças pequenas precisam de atenção bastante individualizada em
muitas circunstâncias e requerem amplos cuidados dos adultos. Elas estão aprendendo a
cuidar de si, ganhando autonomia, necessitando da intervenção constante do adulto para
atividades de cuidados, higiene, uso dos espaços, em suas descobertas e experiências. As
crianças estão aprendendo a lidar com o mundo que as cerca, desbravando e contemplando o
seu entorno e precisam da presença de profissionais da Educação Infantil que possam com
elas dialogar pedagogicamente sobre os processos de socialização, ampliação de repertórios
culturais, seu caminhar com segurança pelos espaços-tempos da escola.
Várias experiências em nossa rede, bem como avanços na legislação, estão
frequentemente se modificando à procura de caminhos que busquem o melhor atendimento à
Educação Infantil. Essa opção se caracteriza pelo oferecimento de dois professores como
responsáveis por uma turma e, ainda, pelo planejamento, pela avaliação e pela atuação
pedagógica com as crianças. Essa organização do trabalho pressupõe a integralidade da ação
148

pedagógica com as crianças e seu direito a uma atenção singular. Ações relacionadas à
higiene, alimentação, proteção, escolha de livros literários e informativos, organização dos
espaços e dos materiais, seleção de repertório musical, entre outros, são atividades que cabem
aos dois professores de igual modo. Além dessa perspectiva, a presença de dois professores
contribui e enriquece o trabalho pedagógico, realizado a partir da análise e do diálogo entre
eles, com as crianças e a Equipe de Articulação Pedagógica em ação integrada.
Há ainda a complexa teia que envolve a Educação Infantil nos últimos anos, em
específico nesta última década, em relação à legislação e sua valorização no contexto
educacional. Primeiro se deu a promulgação da LDB, em 1996, depois a criação da Emenda
Constitucional n.o 59/2009, que prevê a obrigatoriedade do ensino para a população dos
quatro aos 17 anos de idade, depois a Lei n.o 12.796/2013, que altera a Lei n.o 9394/1996 e
estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, elucidando, em seu artigo 62, a
formação de docentes para atuar na educação básica, até que vieram os Planos de Educação.
A política de planos é outro dispositivo legal que orienta caminhos e ilumina as várias esferas
do poder público para a constituição de suas políticas de governo com o objetivo de alcançar
metas estabelecidas.
Partindo desse pressuposto, o Plano Nacional de Educação (PNE), Lei n.o
13.005/2014, em suas Metas 15, 16, 17 e 18, dispõe sobre os profissionais da educação e, em
específico, na Meta 15, sobre os professores da Educação Básica. Dessa forma, a bidocência
no município de Niterói se apresenta como uma conquista e um indicador de qualidade no que
se refere ao atendimento infantil e ao trabalho pedagógico de seus docentes.

4.2 Docências: interlocuções essenciais

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n.º 9.394/1996,
em seu artigo 26, a Educação Física é componente curricular obrigatório na Educação Básica
e tem trazido inúmeras contribuições para o desenvolvimento das funções psicomotoras,
afetivas, políticas e sociais das crianças. Para isso, o professor de Educação Física vem, ao
longo do tempo, legitimando suas ações pedagógicas, na Educação Infantil, por meio de seu
conhecimento científico, pesquisas e aportes teóricos que evidenciam a importância do
movimento humano na sua complexidade, buscando, em seus conteúdos, elementos da cultura
corporal.
149

Nesse sentido, Santoro (2012) realiza uma crítica às instituições escolares de um modo
geral que buscam construir seus conhecimentos muitas vezes negando a participação corporal.
Na maior parte do tempo escolar, o corpo se encontra estático, obediente, em fila e calado. A
educação precisa ter movimento, ser lúdica e criativa, para que o conhecimento seja
construído por completo, por inteiro, e não apenas com a cabeça.
Ademais, Tiriba (2018, p. 239) aprofunda a crítica a esse modelo ao afirmar que “a
escola assume a tarefa de higienizar o corpo, isto é, formá-lo, corrigi-lo, qualificá-lo, fazendo
dele um ente capaz de trabalhar”. Segundo a mesma autora, é o corpo que nos faz vivo,
materializa nossa existência. “A partir das referências corporais, os seres humanos fazem
cultura. Da mesma maneira que os conhecimentos e valores, as expressões corporais são
constituídas também na cultura” (TIRIBA, 2018, p. 243).
Destacamos, então, algumas áreas do conhecimento que podem ser trabalhadas pelo
profissional da Educação Física: a cultura corporal do movimento, que abarcará jogos,
brincadeiras populares, danças e todo gestual pertencente a um grupo socialmente construído;
a psicomotricidade, na qual o corpo é compreendido em seus aspectos cognitivo, socioafetivo
e psicomotor; e o desenvolvimento motor, que, de acordo com Gallahue (2013, p. 67), são
“mudanças do comportamento dos movimentos ao longo do tempo”. Essas grandes áreas do
conhecimento não devem ser trabalhadas separadamente nem de maneira hierarquizada, uma
vez que o trabalho pedagógico deve valer-se de uma integração entre elas, não seguindo um
tempo predefinido.
Dessa forma, a Educação Física escolar, inserida no âmbito da Educação Infantil, pode
dialogar com os saberes presentes nas escolas e potencializá-los, assentando-se em uma
perspectiva dialógica na qual o corpo é acolhido, assim como as culturas infantis, as
brincadeiras inventadas ou (re)criadas pelas crianças ou mesmo aquelas do repertório popular.
As brincadeiras populares surgidas no entrecruzamento de diversas culturas que nos
constituíram, tais como cirandas, piques, brincadeiras cantadas, danças, podem ser
inspiradoras de projetos e atividades elaboradas pelo profissional de Educação Física, em
companhia das crianças e de seus demais professores. Nesse diálogo, percebemos e
referendamos que “os corpos infantis se movimentam em todo e qualquer espaço, e não só nas
aulas de Educação Física” (UMEI Vinícius de Moraes).
O profissional de Educação Física, na Educação Infantil, contribui para o pleno
desenvolvimento das crianças por meio de interações que valorizam o aprendizado, as
experiências diversas do fazer e refazer, aliadas às brincadeiras na perspectiva da autonomia e
autoria. Ele atuará diretamente no desenvolvimento do processo da apropriação e das
150

vivências das múltiplas linguagens, enfatizando a potência do corpo, do gesto, da expressão,


da imaginação e agindo como um grande facilitador no trabalho pedagógico.
Para tanto, compreendemos que suas ações na Unidade Escolar não são estanques nem
se restringem somente aos momentos em que estão em contato com as crianças ou no
preenchimento de horários. É necessário haver uma verdadeira interação com a EAP da escola
e os demais profissionais, conhecer o projeto político pedagógico da unidade, os projetos que
estão sendo trabalhados, atuando em parceria com os outros docentes, com olhar sensível e
escuta atenta para as crianças, sendo, portanto, autor, fomentador e fortalecedor de práticas
pedagógicas significativas.
Além dos docentes, existem outros profissionais que colaboram com esse movimento.
Referendamos aqui um provérbio africano que diz que “para educar as crianças, é preciso uma
aldeia”. Nesse sentido, no cotidiano das unidades, há um grupo enorme e com funções
diversas que dá as mãos para que tudo concorra para o objetivo maior, que é o pleno
desenvolvimento das crianças. Referimo-nos aos funcionários da limpeza, da cozinha, da
portaria, da secretaria e da Equipe de Articulação Pedagógica, que somam esforços e afetos
para que tudo corra a contento.
Também há uma outra parceria que é de suma importância para o trabalho pedagógico,
que é a relação entre a família e a escola. Quando a criança chega às Unidades de Educação
Infantil, acolhemos a família como um todo. Há uma ampliação de experiências sociais e
culturais não só para a criança, como também para seus familiares. Nesse sentido, conforme
nos aponta a professora Michelli Mendonça, da UMEI Lizete Fernandes Maciel,

[...] é necessário que a escola como instituição educativa promova a abertura


da mesma para as famílias, propondo atividades culturais, envolvendo-as nos
projetos educacionais, apresentando a proposta pedagógica da escola, a fim
de que conheçam e entendam o fazer dentro deste espaço escolar. Realizar
encontros periódicos, na busca de levar estas famílias a conhecerem os seus
direitos e deveres como integrantes da comunidade escolar.

Nesse movimento, a família é chamada não apenas para tomar ciência do caminhar
pedagógico e administrativo das unidades, por meio do Conselho Escola-Comunidade (CEC),
das reuniões de planejamento e demais fóruns de discussão, mas também para atuar de
maneira integrada, tomando decisões e realizando escolhas em colaboração com profissionais
docentes e não docentes, uma vez que a ação educativa cabe a ambos. Essa integração deverá
estar referendada no Projeto Político Pedagógico.
151

5. DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA

Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.


Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado
[...]
(Antonio Cicero)

Inspirados pela experiência de Reggio Emilia33, entendemos por documentação


pedagógica a problematização sobre os registros que a escola produz a partir dos instrumentos
(portfólios, blocão, registros fotográficos, vídeos, diário de bordo, produções infantis, livro da
vida etc.) selecionados para esse fim. Estes servirão como reflexão coletiva, possibilitando
que docentes, crianças, demais profissionais e os familiares possam refletir sobre o projeto
político pedagógico, os processos de aprendizagem, o (re)planejamento e a recondução das
ações pedagógicas.
Nesse bojo de reflexão, cabe ressaltar a importância de documentos outros como o
Plano de Ação da Unidade Escolar, além dos Indicadores de Qualidade construídos pela
escola como fonte também de pistas para a construção do trabalho pedagógico.
A documentação pedagógica torna-se, portanto, caminho de observações das próprias
crianças, uma vez que, a partir de seus registros cotidianos, é possível observar suas trajetórias
de descobertas, hipóteses e experiências vividas. É ela fonte de comunicação aos
responsáveis, sendo uma forma de se conhecer o trabalho pedagógico desenvolvido pela
Unidade Escolar, socializadora de boas práticas e geradora de confiabilidade.
Além disso, a documentação pedagógica deve fazer parte de um processo cooperativo
e participativo que não busca apenas o levantamento de dados, mas, principalmente, a
reflexão coletiva sobre o observado. Ela oportuniza de forma significativa a autoria e o
protagonismo de todos os envolvidos, fornecendo subsídios para o acompanhamento do
desenvolvimento infantil pelos profissionais da educação e pelos responsáveis.
A criança deve ser incluída nesse processo como protagonista, autora e sujeito
participativo. Seus registros e narrativas são essenciais, pois nos apresentam suas

33
Região da Itália na qual há uma rede de escolas da infância que desenvolve uma proposta teórico-prática
reconhecida e que inspira educadores e estudiosos de diversos países, inclusive o Brasil, tendo Loris
Malaguzzi como seu mentor e principal teórico.
152

singularidades, interesses e formas de ser e de estar no mundo, além de possibilitarem a


avaliação e reorganização do fazer pedagógico, do tempo e do espaço nos cotidianos.
Nesse sentido, é preciso questionar:

[…] de que as crianças brincam? Como elas brincam? Que experiências de


vida e repertórios culturais elas trazem em suas brincadeiras? Como os
adultos brincam com as crianças? Estão disponíveis e ao alcance das
crianças brinquedos, objetos e materiais diversos que favorecem a
experiência do brincar de faz de conta? (RCEI, 2010, p. 26).

Os registros pedagógicos precisam, portanto, revelar a centralidade do brincar no


planejamento das atividades, projetos e organização dos espaços/tempos, permitindo um
encontro significativo com as singularidades infantis e suas manifestações, que são a
centralidade do currículo na Educação Infantil. Sendo assim, não só os educadores produzem
documentação, mas também as crianças o fazem, como forma de construir memória de suas
vivências e de se apropriar do próprio processo percorrido ou em andamento.

5.1 Avaliação na Educação Infantil

Vocês já repararam no olhar de uma criança quando


interroga?
A vida, a irriquieta inteligência que ela tem?
Pois bem, você lhe dá uma resposta instantânea,
definitiva, única
e verá pelos olhos dela que baixou vários risquinhos
na sua consideração.
(Mário Quintana)

Ao iniciarmos a conversa sobre avaliação, devemos considerar o disposto na


legislação vigente, notadamente na Constituição de 1988, na Lei n.o 12.796, de 4 de abril de
2013, que altera a Lei n.o 9.394/1996, nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil (MEC/SEB, 2010) pela Resolução n.° 5, de 17 de dezembro de 2009, nos Referenciais
Curriculares da Educação Infantil para a Rede Pública Municipal de Educação de Niterói
(2010) e na Portaria 087/2011 (Fundação Municipal de Educação de Niterói), levando em
consideração também nossa trajetória como Rede e o diálogo construído com nossos
profissionais nesse percurso. Nessa caminhada, alguns princípios foram se constituindo,
visando a aprimorar os processos de avaliação na Educação Infantil, assim como a
organização dos registros pedagógicos indispensáveis a essa etapa da Educação Básica.
153

Tanto nos documentos normativos, quanto nas interlocuções realizadas como Rede,
encontraremos parâmetros que servirão para orientar as diferentes Unidades Escolares,
considerando os contextos regionais/locais, além de delinear um caminho articulado para dar
sentido e significado aos processos educativos em curso. De acordo com os Referenciais
Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói,

[...] a avaliação na Educação Infantil será realizada mediante


acompanhamento e registro do desenvolvimento da criança, tomando como
referência os objetivos estabelecidos para essa etapa da educação sem
objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao Ensino Fundamental
(NITERÓI, 2010, p. 58).

O documento supracitado ainda ressalta que, ao se discutir avaliação, deve-se levar em


consideração a “importância do registro e a ruptura com os modelos conservadores de
avaliação” (NITERÓI, 2010, p. 58), visto que o processo avaliativo deve permear toda a
prática pedagógica. Além disso, deve estar focado nos processos de construção de
conhecimentos de mundo, nas interações, nas brincadeiras e nas expressões infantis. No
entanto, os saberes em construção e aqueles ainda não construídos devem servir de indícios
para orientar o planejamento das ações a serem pensadas pelos profissionais da Educação
Infantil e desenvolvidas gradativamente, tomando como referência o plano de trabalho do
ciclo, bem como as orientações previstas no Projeto Político Pedagógico da Unidade Escolar.
Embora registros diários como anotações soltas, fotografias, gravações de áudios,
vídeos possam parecer algo sem sentido, são eles que possibilitarão a percepção de questões
importantes sobre as crianças, provocando-nos a pensar a respeito e trazendo sentido para o
processo de avaliação (HOFFMANN, 2001).
Assim, o registro diário reafirma a ideia de avaliação como movimento permanente de
ação/reflexão/ação, conforme estabelece a Lei n.o 12.796, de 4 de abril de 2013. Devem ser
criados e adotados procedimentos para o registro e acompanhamento do trabalho pedagógico
e para a avaliação do desenvolvimento das crianças, levando-se em conta:

● a observação crítica e criativa das atividades, brincadeiras e interações das crianças


no cotidiano;
● a utilização de múltiplos registros, diferentes formatações, realizadas por adultos e
crianças (relatórios, fotografias, desenhos, álbuns, registros de autoavaliação das
crianças etc.);
154

● a continuidade dos processos de aprendizagem por meio da criação de estratégias


adequadas aos diferentes momentos de transição vividos pela criança (transição
casa/instituição de Educação Infantil, transições no interior da instituição, transição
creche/pré-escola e transição pré-escola/Ensino Fundamental);
● a consonância com o Projeto Político Pedagógico;
● a documentação específica que permita às famílias conhecerem o trabalho realizado
com as crianças na instituição e os processos de desenvolvimento e aprendizagem
das crianças na Educação Infantil;
● a não retenção das crianças na Educação Infantil, independentemente de qualquer
fator que possa surgir no percurso escolar (DCNEI, 2009).

Nessa perspectiva, não há como pensar avaliação na Educação Infantil, sem trazer para
a centralidade a criança. Como percebê-la sem ouvi-la? Como compreender suas intenções
sem de fato conhecê-la? Como determinado nas DCNEI (2009), as práticas pedagógicas,
incluindo as práticas de avaliação, devem afirmar as crianças como

[...] sujeitos históricos e de direitos que nas interações, relações e práticas


cotidianas vivenciam, constroem suas identidades pessoal e coletiva,
brincam, imaginam, fantasiam, aprendem, observam, experimentam, narram,
questionam e constroem sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo
cultura (DCNEI, 2009).

Ademais, como nos relembram os Referenciais Curriculares para a Educação Infantil,


“é imprescindível que nossos olhares contemplem as crianças como sujeitos múltiplos e
diversos, reconhecendo a infância como tempo de direitos e deveres” (NITERÓI, 2010, p.
15), o que nos impulsiona ao “redimensionamento do trabalho pedagógico e de posturas
profissionais” (NITERÓI, 2010, p. 15) que devem considerar a “constituição de sujeitos
ativos, formuladores de hipóteses, criativos, reflexivos e transformadores” (NITERÓI, 2010,
p. 15).
Percebemos, assim, que é imprescindível que a avaliação seja uma prática contínua
norteadora do fazer pedagógico dos professores e demais profissionais da Unidade, em um
movimento permanente de ação/reflexão/ação. As práticas precisam ser inspiradas a partir de
olhares atentos, sensíveis, sérios e reflexivos sobre a criança e o grupo em suas interações e
experiências. Essas percepções do processo avaliativo nos conduzem a caminhos de
possibilidades de (re)planejar a ação educativa na busca de (re)significá-la. Mesmo devendo
155

ser considerada um procedimento sistemático, há nela flexibilidade para as surpreendentes


ações dos cotidianos.

5.2 Relatório avaliativo individual no ciclo infantil

A vista daqui é linda. Ainda. Que não seja. Linda para


outra. Vista que a. Avista. Daqui é linda. Se não for a
vista. Daqui ainda é. Linda. Ainda que não seja. Vista
ainda. Que não se veja. Talvez assim seja. Mais linda.
Ainda.
(Arnaldo Antunes)

O Relatório Avaliativo no Ciclo Infantil é um importante instrumento de registro,


sendo um documento oficial que representa a trajetória escolar da criança no ciclo. Deve
conter os processos de construção dos conhecimentos sobre o mundo, as interações, as
brincadeiras, os jogos, as experiências artísticas, culturais e sociais, as expressões infantis, os
usos das linguagens, os movimentos e a expressão corporal, os modos de descoberta dos
materiais, a relação com a natureza e as hipóteses das crianças. A composição do registro
deve revelar as experiências vividas pelas crianças, conhecimentos partilhados, interações e
brincadeiras, suas narrativas a partir da observação e da escuta atenta e sensível, considerando
os objetivos propostos e também aqueles que não estavam previstos, sem parâmetros
predeterminados e comparações com outras crianças.
Além disso, é importante levar em consideração as transformações da criança no
espaço/tempo, seus percursos, considerando-a como ser integral que se expressa por meio de
múltiplas linguagens, de modo singular, potente, pertencente a uma coletividade e que possui
necessidades específicas, bem como seu processo de inserção no ambiente escolar, possíveis
dificuldades no processo, práticas de acolhimento com a criança e com as suas famílias.
Assim, esse relato deve ser cauteloso, perpassado por amorosidade, respeito, sem juízo
de valor ou estereótipos estabelecidos, não devendo conter afirmações taxativas, conclusivas,
preconceituosas e estigmatizantes sobre as crianças, suas famílias e seu contexto
sociocultural. Ali devem ser descritas suas conquistas e, quando for necessário relatar
dificuldades encontradas no caminhar, estas devem ser acompanhadas de estratégias utilizadas
pelos professores e demais profissionais de educação para superação das questões. O relatório
deve ainda deixar transparecer o quanto essa criança é conhecida pelo docente e, mesmo
156

diante das situações mais desafiadoras, é possível um redirecionamento do trabalho


pedagógico.
No Ciclo Infantil, a avaliação será organizada ao longo do processo, devendo haver
registro por meio de instrumentos cumulativos de informações que subsidiem a elaboração do
Relatório Avaliativo, tais como portfólios, registros reflexivos dos professores, produções e
narrativas infantis, registros coletivos e individuais dos projetos e das experiências etc. Além
disso, haverá também um registro na forma de Relatório Avaliativo da criança, a ser
construído semestralmente em documento disponibilizado no Sistema de Gestão da FME.
Os relatórios devem explicitar ainda as formas de mediação pedagógica que
favoreçam a construção de conhecimentos, os modos de convivência com o outro e as práticas
sociais, em consonância com o Plano de Trabalho do Ciclo, o Plano Educacional
Individualizado, o Plano de Ação Anual, o Projeto Político Pedagógico, os Referenciais
Curriculares e a Proposta Pedagógica da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói.
Conforme estabelecido na Portaria 087/2011 (Fundação Municipal de Educação de
Niterói), o Relatório Avaliativo tem caráter semestral e deve registrar aprendizagens
relacionadas aos campos intelectual, interativo, motor, lúdico, afetivo e social,
compreendendo o caráter indissociável dessas dimensões.
A semestralidade é um período considerado suficiente para o registro da observação
atenta e a escuta sensível das crianças, suas interações, aprendizagens, experiências,
brincadeiras, interesses, demandas e potencialidades. Nos Conselhos de Avaliação e
Planejamento do Ciclo (CAP-CI), esses registros serão retomados, dando subsídios para a
construção do Relatório Avaliativo de cada criança.
Considerando que o Relatório de Registro Avaliativo é parte da documentação
pedagógica, torna-se necessário consultar outros aportes para a escrita, tais como: portfólios,
diários de bordo, livros da vida, planos com objetivos pedagógicos, fotografias, gravações,
atas de conselhos de avaliação e planejamento, produções infantis, narrativas infantis,
anotações e Plano Educacional Individualizado (PEI).
Ademais, a construção do relatório deve trazer à tona princípios de coletividade,
democracia e fazeres partilhados, que compõem os cotidianos escolares. Outros sujeitos nos
darão pistas para essa composição coletiva. Mesmo a escrita sendo de responsabilidade dos
professores de referência do grupo, deve haver a colaboração de outros profissionais, tais
como professores articuladores, de apoio, de sala de recursos, de Educação Física, pedagogos
que atuam com as crianças.
157

Portanto, é fundamental que a escola socialize com os responsáveis os relatórios das


crianças ao final dos semestres, garantindo-lhes acesso a uma cópia dessa documentação. Isso
traz confiabilidade e reconhecimento do trabalho pedagógico realizado e sua essencial
importância. Esse compartilhar também pode ser traduzido em engajamento das famílias e
responsáveis com as aprendizagens das crianças, fazendo-os identificar mais claramente os
saberes consolidados nas suas interações e interlocuções com seus pares.

6. A COMPOSIÇÃO CURRICULAR

Há uma trajetória histórica de autoria do trabalho pedagógico que pulsa no segmento


da Educação Infantil do Município de Niterói. As práticas de significação e as produções de
sentidos fazem do currículo criação que se realiza nos contextos singulares em que são
produzidos. Para além de ser confundido com plano de ensino ou com conteúdos
predefinidos, produzir currículo nos remete às produções de sentidos, à prática de poder por
meio de sistemas simbólicos e linguísticos em momentos e espaços singulares. Nessa
perspectiva, permanece o entendimento de que “o redimensionamento do trabalho pedagógico
e de posturas profissionais devem levar à construção de sujeitos ativos, formuladores de
hipóteses, criativos, reflexivos e transformadores” (RCEI-NITERÓI, 2010, p. 22).
Ao entendermos que “toda proposta pedagógica para a infância será política por ser
uma disputa por direito” (ARROYO, 2019, p. 211), o desafio que se apresenta frente às
representações que emergem no campo da discussão curricular para o segmento da Educação
Infantil de Niterói envolve aposta na autoria docente e discente, considerando que diferentes
vozes compõem a construção do currículo. São vozes que ecoam do contexto social, das
famílias e das mais diversas demandas que surgem nos cotidianos institucionais. A UMEI
Olga Benário nos traz a seguinte reflexão:

Consideramos necessária a valorização das relações e vivências entre a


UMEI, a comunidade e as famílias das crianças. Essas reflexões externas são
trazidas, pelas crianças, para o ambiente escolar e precisam ser consideradas
no currículo.

O relato acima nos evoca a pensar a família e as crianças como partes


importantíssimas da construção pedagógica na escola no movimento de alimentar um fluxo de
discussão curricular que favoreça amplas possibilidades de produzir currículo para além de
sentidos aprisionados e regulados de modo único. Apostamos que a potência das nossas
158

Unidades de Educação Infantil é o lócus para construção de caminhos como referências


curriculares voltadas às singularidades e ao diálogo, como compartilham as professoras da
UMEI Rosalda Paim, por ocasião do III Seminário de Educação Infantil − Infâncias, Artes e
Imaginação:

O misto de diversidade e curiosidade trouxe experiências muito


significativas para o grupo, que foi se revelando e buscando respostas para
questionamentos que surgiram no dia a dia, nas brincadeiras, nos conflitos e
nas rodas de conversa.

A narrativa trazida acima pelas professoras reforça a importância das interações entre
crianças e docentes e da escuta das crianças. Nesse sentido, Barbosa (2009, p. 8) defende que
“as crianças pequenas solicitam aos educadores uma pedagogia sustentada nas relações, nas
interações e em práticas educativas intencionalmente voltadas para suas experiências
cotidianas e seus processos de aprendizagem no espaço coletivo” (BARBOSA, 2009, p. 8).
Nessa perspectiva, as Diretrizes Curriculares da Educação Infantil, Resolução n.° 5, de
17 de dezembro de 2009, normatizam que as práticas pedagógicas devem se pautar pelas
interações e brincadeiras, reafirmam os Princípios Éticos da Autonomia, da Responsabilidade,
da Solidariedade e do Respeito ao bem comum, os Princípios Políticos dos Direitos e Deveres
de Cidadania, do Exercício da Criticidade e do Respeito à Ordem Democrática e os Princípios
Estéticos da Sensibilidade, da Criatividade, da Ludicidade, da Qualidade e da Diversidade de
manifestações Artísticas e Culturais, entendendo como indissociável e intrínseco o cuidar e o
educar das crianças até cinco anos de idade. A dimensão curricular neste documento está
formalizada como um

[...] conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes


das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural,
artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o
desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 anos de idade (DCNEI, 2009).

Nesse sentido, o trabalho orientado por projetos, que considera a interação entre os
sujeitos envolvidos elemento central da aprendizagem, entende que o “saber” da criança é
fonte para pesquisas e, sendo assim, o conhecimento se constrói nas interações entre saberes
da criança/criança, criança/adulto, adulto/adulto (Vygotsky, 1989). A ação de identificar, no
universo de questionamentos trazidos pelas crianças, o tema do projeto requer ao educador
sensibilidade para ouvir e vivenciar a docência como ato de partilhar não saberes e saberes.
Assim nos inspiram as docentes da UMEI Regina Leite Garcia:
159

[...] projetos pedagógicos possibilitam, tanto às crianças quantos aos


educadores, traçarem, projetarem, criarem juntos um roteiro de trabalho que
favoreça a apropriação do conhecimento, através da interação e de
experiências múltiplas e significativas.

Concordando com esta prática e com a narrativa acima, a UMEI Alberto de Oliveira
também destaca que

[...] no trabalho com projetos, há um desafio coletivo de olhar atento, de


escuta sensível e de ação perscrutadora. Não se trata, portanto, de
reprodução ou emparedamento de saberes, mas de propostas que se
estabeleçam nas inter-relações. Adulto e crianças, crianças e crianças, na
convivência escolar, tornam-se agentes de partilha, de questionamentos, de
curiosidade, de criatividade, de inclusão e de mobilização de diferentes
linguagens.

A UMEI Lizaura Ruas Machado fala do currículo como promotor de encontros


quando nos explica que a construção do conhecimento se realiza

[...] por todos da comunidade escolar, crianças, pais (responsáveis),


professores, entre outros sujeitos que fazem parte dessa comunidade. Desse
modo, a escola pode organizar espaços/tempos que favoreçam o encontro
desses sujeitos que poderão dialogar, trocar experiências e ampliar os
‘modos de ver’ e pensar uma determinada temática.

Nesse sentido, o trabalho com projetos pode proporcionar a troca de experiências,


interlocuções e ampliação dos modos de ver e pensar de variadas temáticas. Os assuntos
trazidos pelo grupo consideram a realidade social de crianças e familiares, promovendo
aprendizagem enquanto desvenda as inter-relações entre o micro e o macro contexto social
(HERNADEZ; VENTURA, 1998). Seguir este percurso é compreender que “pensar não se dá
fora dos homens, nem num homem só, nem no vazio, mas nos homens e entre os homens, e
sempre referido à realidade” (FREIRE, 2005, p. 117).
Sob esse viés, a UMEI Governador Eduardo Campos relata, por ocasião do III
Seminário da Educação Infantil − Infâncias, Artes e Imaginação, uma ação pedagógica junto à
comunidade escolar que se configura pela articulação de experiências e saberes:

Estar ao lado da comunidade escolar em atividades que todos puderam se


integrar de maneira significativa, por meio de proposições como pesquisas
científicas e de campo, relatos de experiências e construção de brinquedos e
brincadeiras, fez com que os laços de afeto e admiração fossem estreitados
ainda mais. E, como resultado desse trabalho, tivemos a construção coletiva
de brinquedos sustentáveis que vieram integrar àqueles disponíveis no
parquinho de nossa UMEI.

A experiência da UMEI Eduardo Campos traz as crianças em potente ação,


produzindo cultura ao mesmo tempo em que se inserem socialmente às formas culturais das
160

quais fazem parte. Em continuidade a essa discussão, a UMEI Vinícius de Moraes evidencia a
busca pela construção de uma gestão que busca trazer o protagonismo das crianças para a
condução de seu cotidiano. Vemos o trabalho pautado por práticas pedagógicas respaldadas
em processos de investigação e pesquisas acadêmicas, como segue:

Pensamos na gestão da escola com um movimento provocador e promotor da


participação efetiva das crianças nas propostas e decisões da UMEI, através
da ausculta (ROCHA, 2008) de suas pequenas vozes. Um dos principais
aprendizados do nosso percurso na direção dessa escola tem sido o exercício
da escuta. Como ouvir as vozes infantis no cotidiano da UMEI? O trabalho
na escola é fundamentado a partir do referencial teórico da Sociologia da
Infância; referencial este que nos ajuda na compreensão da infância como
construção histórica, cultural e geograficamente contextualizada e a pensar
na gestão participativa democrática a partir das perspectivas das crianças.
Compreendemos, assim como Finco (2015), que precisamos enxergar as
crianças pequenas como “possuidoras de muitas possibilidades” (Fabiane
Florido de Souza Lima e Fernanda de Oliveira Gomes).

Ainda ao nos referirmos à UMEI Vinícius de Moraes, vemos no relato abaixo marcas
de espaços-tempos que são organizadas de modo a possibilitar singularidades e ampliação das
experiências das crianças:

[...] nas rodas de leitura com turmas de Educação Infantil, o intuito é


evidenciar uma experiência didática, pedagógica e escolar que tem sido um
deslocamento ao saber-poder que compreende as infâncias como fase de
cuidado à custa da padronização do comportamento e silenciamento. Nos
momentos experenciados de leitura literária, as crianças são os sujeitos
protagonistas na escolha do que será lido, sem que haja a legitimação dos
adultos sobre suas preferências, pois são capazes de pensar sobre a própria
existência, sobre o mundo em que estão inseridas e se constituem como
produtoras de demandas e desejos singulares, na vida e no coletivo da sala
de aula.

Na narrativa acima, as ações propostas na prática docente reconhecem a importância


da mediação e negociações entre crianças e docentes ainda no berçário quando o “[...]
primeiro contato entre a criança pequena e o adulto é fundamentalmente um encontro, um
diálogo não verbal, um diálogo corporal, prelúdio da linguagem verbal” (CHOKLER, 2019,
p. 190). Nesse sentido, aproximam-se de estratégias que valorizem os “centros de interesses”
e se afastam do fazer pedagógico pautado em “unidade didática”, em que o professor é o
detentor do saber a ser transmitido ao aluno (HERNANDEZ; VENTURA, 1998, p. 64-65).
Ao pensarmos em uma Proposta Curricular pautada nos interesses das crianças, em
seu protagonismo e ativa participação, ouvindo e dialogando com os profissionais da Rede, na
composição destes Referenciais Curriculares, percebemos ser necessário trazer à tona
conversas sobre a organização pedagógica das diferentes Unidades Escolares, em contraponto
161

a uma organização pedagógica que prioriza as efemérides. Essa é uma questão bastante
desafiadora, que nos exige reflexões e abertura ao diálogo.
Nesse contexto, é relevante considerar que datas comemorativas, na maioria das vezes,
seguem um calendário preestabelecido, entrecortado pela religiosidade e contextualizado pela
cultura da fé cristã. A laicidade da escola pública é um importante tema que traz consigo a
necessidade de estudos e interlocuções no seio das Unidades Escolares.
Vale destacar também que, embora algumas datas comemorativas tenham um
significado em determinados contextos sociais, em outros lugares e circunstâncias em nada
contemplariam as crianças ou a comunidade escolar. Como nos alerta Maia (2016), “a data é
utilizada para reforçar um estereótipo [...] (imagem e papel social) que vai sendo incutido nas
crianças desde cedo” (MAIA, 2016, s.p.).
Outra face não menos importante que chega junto com essas datas são os pontuais
equívocos sobre nossa identidade como brasileiros, mascarando nossa cultura e criando
estereótipos sobre o ser brasileiro e a nossa verdadeira história. Acerca desse tema, Ostetto
define bem o planejamento pedagógico referenciado pelas datas comemorativas:

Nessa perspectiva, o planejamento da prática cotidiana é direcionado pelo


calendário. A programação é organizada considerando algumas datas, tidas
como importantes do ponto de vista do adulto. Também aqui são listadas
várias atividades, só que as mesmas se referem a uma data específica, a uma
comemoração escolhida pelo calendário (OSTETTO, 2000, p. 3).

Nesse contexto, Maia nos ajuda a pensar sobre as tensões curriculares causadas por
uma organização pautada nas efemérides:

A escola e todo seu aparato e instrumentos organizacionais são culturais, são


criação humana, sujeita às condições histórico-culturais. Para além do
aparente consenso sobre a organização curricular que se orienta por datas
comemorativas na Educação infantil, há uma infância sujeita aos seus
constrangimentos e formação ideológica (MAIA, 2016, p. 1).

Outro ponto a ser considerado, quando conversamos sobre as efemérides, é o forte


apelo midiático, comercial, conduzido pela lógica do consumo que sustenta esse calendário.
Uma proposta pedagógica conduzida por datas comemorativas também pode engessar e
conduzir mecanicamente os fazeres docentes, sendo cerceadora da criatividade e do
protagonismo dos sujeitos. Conforme nos inspira Malaguzzi (1999):

[...]
A criança tem cem linguagens (e depois cem, cem, cem)
mas roubaram-lhe noventa e nove.
A escola e a cultura lhe separam a cabeça e o corpo.
162

Dizem-lhe:
de pensar sem as mãos
de fazer sem a cabeça
de escutar e de não falar
de compreender sem alegrias
de amar e maravilhar-se
só na Páscoa e no Natal.
[...]

Dessa forma, entendemos que “somente quando uma criança é considerada, quando se
sente reconhecida em suas iniciativas, pode desenvolver uma atividade livre e rica,
espontânea, sem necessidade de intervenção” (CHOKLER, 2019, p. 193). Esse
reconhecimento acontece também no ato de ver suas questões valorizadas dentro dos projetos
das UMEIs. As narrativas sobre os currículos nas Unidades com Educação Infantil aqui
presentes nos informam sobre diferentes dimensões acerca da criação do currículo e de como
as Diretrizes Curriculares da Educação Infantil são ressignificadas nesses cotidianos.
Nesse contexto, sobre a organização curricular por projetos, a UMEI Jacy Pacheco
destaca que

[...] cada percurso é singular e se tem a oportunidade de se trabalhar com


diferentes fontes de informação. O docente ensina e aprende a escutar. Do
que os outros dizem também podemos aprender. O professor abre-se para o
imprevisível, o imponderável e neste percurso aprende a fazer uso
pedagógico das situações cotidianas. O que está invisível aos olhos docentes,
o que é “desimportante” ganha relevância e status de saber pelos olhos e
interesses das crianças. Não há como mensurar os ganhos de se trabalhar
dessa maneira.

Assim, dar centralidade às singularidades nos faz pensar sobre as políticas curriculares
e nos remete a contemplar ampla discussão posta de disputas em torno de sentidos e interesses
isentos de neutralidade. A elaboração destes Referenciais Curriculares busca, portanto,
afirmar caminhos e escolhas em movimentos instituintes fortalecidos pela experiência dos
autores que protagonizam a história da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói ao
longo das últimas décadas. Experiências que se realizam pela história (construída em
produção de sentidos, em meio a memórias, narrativas, linguagens), para além do acúmulo de
informações que não se articulam em saberes produzidos.

6.1 Eixos Orientadores das Práticas Curriculares na Educação Infantil

Para saber onde as coisas vão dar, só tem um


jeito: começar!
163

(Silvana Tavano)

INTERAÇÕES BRINCADEIRA

Estes Referenciais Curriculares consideram os eixos Interações e Brincadeira como


principais embasadores do trabalho pedagógico da Educação Infantil, atendendo, dessa forma,
ao que diz o Parecer n.º 20/2009, no que se refere aos princípios básicos que contextualizarão
as práticas pedagógicas da Educação Infantil, a saber:

Princípios éticos: valorização da autonomia, da responsabilidade, da


solidariedade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes
culturas, identidades e singularidades. [...]
Princípios políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e
do respeito à ordem democrática. [...]
Princípios estéticos: valorização da sensibilidade, da criatividade, da
ludicidade e da diversidade de manifestações artísticas e culturais (BRASIL,
2009, p. 87-88).

Assim, a Educação Infantil apresenta à criança diversidade de experiências éticas,


estéticas, políticas e culturais no primeiro espaço formal de Educação ao qual tem acesso.
Esse propósito é firmado pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil
(DCNEI), que prioriza o currículo constituído com base em matrizes não conteudistas,
estabelecendo que este seja sedimentado em práticas educativas que tenham como eixo as
Interações e Brincadeira. Nestes Referenciais Curriculares, o brincar é entendido como

[...] uma atividade fundamental no ser humano, a começar porque funda o


humano em nós: aquilo que o define – inteligência, criatividade, simbolismo,
emoção e imaginação, para listar apenas alguns de seus atributos – constitui-
se pelo jogo e por ele se expressa (FORTUNA, 2017, p. 15).

Nesse sentido, reafirmamos o conceito presente no RCEI (2010, p. 26): “o brincar


atravessa diferentes tempos e lugares, passados, presentes e futuros, sendo marcado ao mesmo
tempo pela continuidade e pela mudança”. Pode-se afirmar que é um conceito basilar ao
atendimento às infâncias presentes na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói,
procurando garantir seu pleno desenvolvimento, como ratifica a Resolução nº 5:

Art. 4º As propostas pedagógicas da Educação Infantil deverão considerar


que a criança, centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de
direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia,
constrói sua identidade pessoal e coletiva [...] (BRASIL, 2009).
164

Assumir Interações e Brincadeira como eixos desta proposta curricular é, portanto,


apostar em uma política que afirme uma oposição à escolarização e ao caráter preparatório da
Educação Infantil. É afirmar que o currículo construído com/para as crianças deve considerá-
las em suas especificidades, logo é primordial fomentar e respeitar situações de interação
criança/criança e criança/adulto, bem como os momentos de brincadeira. Tais oportunidades
são meios que a criança utiliza para exercitar representações sociais, expressar sentimentos e
pensamentos, desenvolver sua cognição e afetividade etc.
Segundo Kishimoto (2010), ao brincar, a criança toma decisões e expõe sentimentos e
valores. É neste momento, também, que ela conhece a si e aos outros. A brincadeira é para a
criança espaço fértil de criação e recriação do mundo que a cerca. É na brincadeira que ela
expande, acomoda, se apropria e redimensiona as experiências que atravessa e pelas quais é
atravessada, transformando-as em vivências ricas de sentidos e significados.
Por conseguinte, as crianças vivenciam infâncias distintas ao interagirem com o
mundo que as cerca. Segundo Kramer (2007, p. 16), elas “reconstroem das ruínas; refazem os
pedaços. [...] As crianças [...] são produzidas na cultura em que se inserem (em seu espaço) e
que lhes é contemporânea (em seu tempo)”. Dessa forma, mantemos o entendimento de “[...]
crianças como cidadãs, criadoras de e criadas na cultura, produtoras da, produzidas na
História, reconhecendo a brincadeira como experiência de cultura” (NITERÓI, 2010, p.26).
Por meio do brincar, revela-se a beleza do jogo simbólico, quando é possível perceber
novas nomeações e utilidades para objetos que convencionalmente não possuem aquele
sentido. Nesse jogo de “faz de conta”, pela imaginação, um mundo de possibilidades pode ser
incorporado. Um lápis vira um avião, uma colega será a professora, outro poderá dirigir o
ônibus segurando uma tampa de panela e, assim, independentemente daquilo que vê em seu
cotidiano, dá a essas vivências de cultura novos sentidos, faz reelaborações, constituindo-se
também produtora de cultura. Como destaca Smolka,

[...] Vigotski ressalta o caráter ativo e criativo da brincadeira no


desenvolvimento infantil. Em suas análises, mostra como a percepção
imediata da criança e suas ações sobre os objetos vão se transformando pela
mediação do outro e do signo, particularmente pela apropriação da forma
verbal de linguagem. É na brincadeira que a criança “começa a agir
independentemente daquilo que vê” (A formação social da mente, p. 110).
Palavras e gestos possibilitam transformar uma coisa em outra. É a
linguagem que torna possível o faz de conta, a criação da situação
imaginária. A criação não emerge do nada, mas requer um trabalho de
construção histórica e participação da criança na cultura. A brincadeira
infantil é, assim, um lugar por excelência de incorporação das práticas de
exercício de papéis e posições sociais (SMOLKA, 2009, p. 16).
165

Ao pensarmos nas culturas infantis, a experiência que singulariza a infância em suas


diferentes manifestações é a brincadeira. Nesse sentido, Borba nos convida a refletir e
valorizar a brincadeira nos espaços de Educação Infantil:

Ao observarmos as crianças [...] de nossas escolas brincando, podemos


conhecê-las melhor, ultrapassando os muros da escola, pois uma parte de
seus mundos e experiências revela-se nas ações e significados que constroem
nas suas brincadeiras. Isso porque o processo do brincar referencia-se
naquilo que os sujeitos conhecem e vivenciam (BORBA, 2007, p. 35).

Ainda segundo a autora, “a brincadeira não é algo dado na vida do ser humano, ou
seja, aprende-se a brincar, desde cedo, nas relações que os sujeitos estabelecem com os outros
e com a cultura” (BORBA, 2007, p. 36). Como afirma a UMEI Olga Benário Prestes, “a
brincadeira [...] é uma forma de expressão e desenvolvimento da identidade da criança.
Através dela, existe a possibilidade de socialização em que diversos papéis são vivenciados, o
que oportuniza a construção e reconstrução cultural” (NITERÓI, 2010, p.26).
No que se refere às interações, faz-se necessário pensá-las nas relações não somente
entre as crianças e seus pares etários, mas também com os adultos da escola e fora dela, com
os materiais escolares e não escolares, brinquedos estruturados e não estruturados, com os
espaços a elas oferecidos nas Unidades de Educação Infantil. Portanto, nas interações e
brincadeira, o diálogo entre a criança de hoje e de outrora (adulto) é potencializado,
reproduzindo e reconstruindo o brincar e os sujeitos sociais.
Pensando nas interações com bebês, em particular, um exemplo de material que
estimula sobremaneira a aprendizagem pelos sentidos são os cestos de tesouros, material
desenvolvido pela educadora Elionor Goldschmied, que consolidou suas experiências
educacionais trabalhando em instituições estatais italianas para crianças abandonadas.
O cesto de tesouros consiste numa atividade sensorial manipulativa e autônoma de
origem montessoriana que utiliza cestos que podem ser de tamanhos e profundidades
diferentes, onde são colocados objetos do cotidiano com texturas, cores, formas e tamanhos
diversos. Os bebês exploram esses objetos variados, principalmente por meio do tato,
favorecendo, sobremaneira, o desenvolvimento psicomotor e a coordenação mão-olho-boca.
As crianças poderão explorar, mexer e observar utensílios que fazem parte do espaço
doméstico ou não. Essa atividade se contextualiza em uma abordagem que contempla o
brincar livre e autônomo com objetos não estruturados de diferentes procedências e materiais.
Também chamado de brincar heurístico, que equivale a um processo investigativo, de procura
e descobertas.
166

Nesse contexto, Kramer (2007, p. 21) afirma que “sem conhecer as interações, não há
como educar crianças e jovens numa perspectiva de humanização necessária para subsidiar
políticas públicas e práticas educativas solidárias”. Com base nessa fala e ainda considerando
a importância das interações, cabe retornar a Smolka (2009) e suas apreciações dos estudos de
Vigotski, quando afirma que “o homem é agregado de relações sociais” no que se refere à
sociogênese34 do desenvolvimento humano e ao conhecimento. Ela ainda destaca a
importância de se considerar o desenvolvimento ontogenético no âmbito individual articulado
à história e à cultura, quando há internalização das práticas sociais, e as funções mentais
superiores são relações sociais internalizadas.
Assim, o desenvolvimento da criança encontra-se intrinsecamente relacionado à
apropriação da cultura. Essa apropriação implica uma participação ativa da criança na cultura,
tornando próprios dela mesma os modos sociais de perceber, sentir, falar, pensar e relacionar-
se com os outros.
Ainda segundo a autora, Vigotski apontava para a importância do trabalho pedagógico
na criação de condições e na abertura de novas formas de participação das crianças na cultura
e afirmava ser na trama social, com base no trabalho e ideias de outros, nomeados ou
anônimos, que se pode criar e produzir o novo. Não se cria do nada.
Nesse processo de apropriação da cultura, não só a criança assimila a produção de
cultura e se enriquece com ela; como a própria cultura, reelabora em profundidade a
composição natural de sua conduta e dá uma orientação nova ao curso do desenvolvimento. O
desenvolvimento cultural da criança apresenta-se, assim, em seu caráter dialético, como um
autêntico drama. Nesse sentido, “o desenvolvimento da criança não é simplesmente um
desenvolvimento espontâneo, linear e natural: é um trabalho de construção do homem sobre o
homem” (SMOLKA, 2009, p. 10).
Ainda reforçando a importância das interações, evidenciamos uma outra contribuição
teórica relevante para a prática pedagógica com e para bebês, que surgiu logo após a Segunda
Guerra Mundial (1946), quando a pediatra húngara Emmi Pikler desenvolve seu trabalho com
bebês e crianças em situação de abrigamento, órfãs da guerra ou separadas de suas famílias.
Sua concepção de trabalho com bebês está amparada nos seguintes pilares: a
motricidade livre, a autonomia e a segurança afetiva que envolve o vínculo adulto/criança.

34
A ontogênese refere-se à evolução humana, iniciada na concepção, seguida de transformações sequenciadas
até a morte, de tal forma que cada estágio apresenta um determinado nível de maturidade. A sociogênese
estuda as interações sociais como sendo as raízes das funções mentais superiores, que só passam a existir no
indivíduo na relação mediada com o mundo externo (Moura, E. A).
167

Nessa relação adulto/criança, o bebê é visto como metade de um par interativo e só precisa de
estabilidade, confiança e autonomia para que então torne sua subjetivação estruturante. Nesse
contexto, a narrativa pedagógica trazida pela NAEI Vila Ipiranga (2019) compartilha conosco
uma experiência proporcionada aos bebês do GREI 0, que referenda o exposto acima:

[...] os bebês, que começaram na turma com idade a partir dos 4 meses e, até
o presente, estão na faixa de 1 ano e 8 meses, tiveram a possibilidade do
autoconhecimento e percepção do outro, além do contato com a diversidade
existente ao nosso redor e se compreenderem como seres neste mundo, com
suas especificidades e particularidades, que os tornam diferentes uns dos
outros, porém iguais em direitos e deveres. Puderam mergulhar no mundo
das sensações e percepções por meio do(a): • Contato visual − cores e seus
tons (leitura de livros e revistas, desenhos, objetos, natureza etc.); • Tato −
tocar diferentes tipos de texturas, como tapete sensorial (EVA, folhas,
tampas de garrafa, algodão, pena, plástico bolha); • Olfato − puderam sentir
o cheiro de uma flor, por exemplo e • Audição − tocaram diversos tipos de
instrumentos com a bandinha da escola, onde puderam perceber a distinção
do som.

No relato acima, fica clara a intencionalidade de que a motricidade livre é tratada


como propulsora de todos os outros conhecimentos, considerando o ser humano um ser total.
Com base nesses estudos, destacamos que os espaços e os materiais oferecidos aos bebês
precisam permitir movimentos livres para seus corpos, o que os favorecerá na tomada de
decisões. Martins Filho e Schmit (2017) nos lembram que:

[...] as crianças aprendem brincando e os bebês não são diferentes, eles


brincam com seu próprio corpo, levam a mão próxima aos olhos, colocam os
pés na boca, tocam as pessoas ao seu redor, sentem curiosidade em mexer
nos dedos, cabelos, olhos e boca. (...) Os professores devem considerar que
os bebês aprendem brincando e interagindo com tudo que está a sua volta
(MARTINS FILHO; SCHMIT, 2017, p. 137).

Diante do exposto, ratificamos o art. 9º da Resolução nº 5 (BRASIL, 2009), que afirma


que “as práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem
ter como eixos norteadores as interações e a brincadeira”, constituindo um todo indissociável.
Desse modo, os espaços de Educação Infantil de Niterói deverão organizar seu trabalho
pedagógico de tal modo que haja articulação entre o Eixo Interações e Brincadeira e os
Pressupostos Educativos apresentados nestes Referenciais Curriculares.
Para tal, o Projeto Político Pedagógico (PPP), o Plano de Ação (PA), os Indicadores de
Qualidade (IQ), o Planejamento Educacional Individualizado (PEI) e os demais
procedimentos de planejamento educativo desenvolvidos pelas Unidades deverão ter como
constructo basilar o entendimento de que, por meio da brincadeira, as interações ocorrem
entre as crianças e entre elas e os profissionais da Educação Infantil e demais adultos. Por
168

isso, é preciso oferecer espaços/tempos intencionalmente organizados em ambientes


diversificados, planejados e pensados para estimular o desenvolvimento de diferentes
experiências locais e para além dos muros da instituição.
É fundamental considerar, ainda, que a criança aprende, sente, cria e recria de corpo
inteiro, e cada uma irá se apropriar das experiências às quais tiver acesso de maneira única.
Sobre este ponto, o Manual de Orientação Pedagógica (Brinquedos e Brincadeiras nas
Creches) afirma:

As crianças brincam de forma espontânea, em qualquer lugar e com qualquer


coisa, mas há uma diferença entre uma postura espontaneísta e outra
reveladora da qualidade. A alta qualidade é resultado da intencionalidade do
adulto que, ao implementar o eixo das interações e brincadeira, procura
oferecer autonomia às crianças, para a exploração dos brinquedos e a
recreação da cultura lúdica. É essa intenção que resulta na intervenção que se
faz no ambiente, na organização do espaço físico, na disposição de
mobiliário, na seleção e organização dos brinquedos e materiais e nas
interações com as crianças. Para que isso ocorra, faz-se necessária a
observação das crianças, a definição de intenções educativas, o planejamento
do ambiente educativo, o envolvimento das crianças, das famílias e das suas
comunidades e, especialmente, a ação interativa das professoras e da equipe
das creches (MEC, 2012, p. 12).

Partindo dos princípios acima descritos, os profissionais da Educação Infantil podem


organizar espaços de vivências, ofertando variados materiais como livros com tamanhos e
texturas diferentes, elementos da natureza, brinquedos estruturados e não estruturados,
música, painéis sensoriais para mãos, pés e o corpo todo, instalações com fitas e/ou tecidos,
projeções de imagens reais ou de suas sombras/silhuetas, tintas naturais e o que mais a
imaginação docente permitir, com o objetivo de propiciar interações significativas para
criança/criança, criança/adulto.
Portanto, ter como eixo estruturante destes Referenciais Curriculares as Interações e
Brincadeira é convidar os profissionais da Educação Infantil a (re)conectar os Pressupostos
Educativos, aqui defendidos, às práticas pedagógicas vivenciadas no cotidiano de nossas
instituições, revendo, reformulando, reconstruindo os currículos já tecidos até aqui.

6.2 Pressupostos

I - Cuidar como Compromisso Ético, Estético e Político


169

Acolhemos aqui a concepção de cuidar como ética expressa por Boff (1999, p. 92). O
autor considera o cuidado como uma atitude e um modo de ser: “a forma como a pessoa
humana se estrutura e se realiza no mundo com os outros [...] é um modo de ser-no-mundo
que funda as relações que se estabelecem com todas as coisas. Não temos cuidado, mas somos
cuidado. As relações dos homens entre si e deles com a natureza, mediada pelo cuidado,
implicam não em dominação, mas comunhão, pertencimento, convivência. [...] Cuidar
significa atender, considerar.” (BOFF, 199, p. 92). O autor ainda afirma que, em tudo o que
fazemos, há o cuidado: cuidamos do que amamos; amamos o que cuidamos.
Diante dessas provocações de Boff (1999), torna-se importante nos perguntarmos
sobre como o cuidar enquanto ética se traduz nas ações cotidianas das UMEIs. Temos
buscado nos relacionar de forma amorosa, suave, amigável uns com os outros, com as
crianças e com a natureza? Estamos disponíveis e atentos aos gestos e expressões, às falas e
aos olhares uns dos outros e das crianças? Ensinamos as crianças a cuidarem umas das outras,
de nós, da escola, da cidade e do ambiente? Os espaços-tempos da escola são organizados de
forma cuidadosa, numa perspectiva da ética que pressupõe cuidados como atenção, escuta,
disponibilidade ao outro e a sua história de vida? Os espaços-tempos da escola são
organizados de forma cuidadosa, numa perspectiva da ética que pressupõe cuidado com a
natureza? Observamos os ritmos próprios das crianças, suas vivências fora da UMEI e a
constituição de suas famílias, quando planejamos ações de trocas de fraldas, alimentação,
banho, circulação nos espaços e períodos de inserção? No planejamento de nossas ações
pedagógicas, projetos e projetos políticos pedagógicos temos o cuidado como fundamento?
Nesse contexto, Tiriba (2018) afirma que quem cuida não pode estar voltado para si
mesmo, mas receptivo, atento e sensível para poder perceber o que o outro pode precisar. Para
cuidar, é necessário um conhecimento daquele que necessita de cuidados, o que exige
proximidade, tempo, entrega. Cuidar implica responsabilidade e compromisso contínuos. Por
isso, é necessariamente uma atividade relacional. Se o objeto de minhas ações são pessoas e
não coisas, cuidar envolve “responder às necessidades particulares, concretas, físicas,
espirituais, intelectuais, psíquicas e emocionais de outros” (TIRIBA, 2018, p. 178).
Em uma Educação Infantil que entende a criança como um ser integral, educar e
cuidar devem ser vividos de modo interligado, gerando uma relação estreita entre crianças e
adultos, religando, assim, o que foi historicamente separado: razão e emoção, corpo e mente,
cuidado e educação.
Ainda neste sentido, Guimarães (2015) nos indaga: “Seria possível acompanhar o
outro, educar, sem estar atento a ele, sem cuidar cuidando?” (GUIMARÃES, 2015, p. 35-36).
170

A autora defende também que o cuidado é uma dimensão que está presente no cotidiano, nas
interações, nas atividades, na organização e no planejamento dos espaços e das rotinas:

[...] quando dialogamos com choro das crianças, buscando seus sentidos;
quando respondemos aos seus gestos comunicativos com os nossos gestos e
palavras; quando damos visibilidade às suas brincadeiras, nomeamos suas
iniciativas, observamos atentamente o que produzem com seus movimentos
e palavras; quando festejamos suas conquistas; quando reconhecemos as
exigências e limites nas suas relações com o mundo. Essas situações
ocorrem no banho, no sono, na roda, na narrativa de uma história, na
construção de um jogo em diversos momentos nos quais se concretiza a
educação na creche ou escola de educação infantil, momentos de interação
das crianças entre si e com os adultos (GUIMARÃES, 2015, p. 37).

Nessa perspectiva, as Diretrizes Curriculares para Educação Infantil (2009, p. 10)


afirmam o educar como forma de cuidar, como atitude de acolhimento e garantia de
segurança e como ação docente que envolve o alimento constante da curiosidade, da
ludicidade e da expressividade infantis. Além disso, veem o educar como respeito, como
escuta sensível e atenta às histórias pessoais, aos movimentos do coletivo, às inquietações e às
perguntas feitas pelas crianças.
Sendo assim, educar entendido como cuidar é dar condições para que as crianças
conheçam e modifiquem o ambiente de diferentes maneiras (manipulando materiais da
natureza ou objetos, observando, nomeando objetos, pessoas ou situações, criando, fazendo
perguntas etc.). É possibilitar a construção de sentidos pessoais e significados coletivos, à
medida que vão se constituindo como sujeitos e se apropriando de um modo singular das
formas culturais de agir, sentir e pensar. Isso requer dos adultos sensibilidade e delicadeza nas
relações com as crianças, assegurando atenção especial e ações pedagógicas conforme as
necessidades, interesses, demandas infantis.
Desse modo, educar como forma de cuidar estará presente em todas as ações
cotidianas em nossos espaços escolares e em todas as ações, superando, assim, a ideia de que
“cuidar” restringe-se apenas aos atos de alimentação, higiene e prevenção de acidentes.
Estes Referenciais Curriculares trazem mais uma contribuição para o entendimento do
pressuposto educar como forma de cuidar, na Educação Infantil, destacando o cuidado com a
organização do ambiente escolar e com a escolha dos materiais aos quais as crianças terão
acesso. A respeito desse assunto, a UMEI Jacy Pacheco destaca a atuação docente como ação
primordial:

O professor como mediador pode proporcionar às crianças experiências


diversas através da escolha cuidadosa e atenta dos materiais, bem como da
171

organização do espaço onde as experiências pedagógicas serão vivenciadas


perpassando por diferentes modalidades artísticas.

O relato trazido pela UMEI Jacy Pacheco nos dá uma dimensão ampliada do cuidado
na Educação Infantil. Sendo assim, cuidar não se restringe mais a alimentar, evitar perigos,
dar banho, mas também a preparar o espaço para receber as crianças e escolher os materiais a
serem disponibilizados.

II - Espaço e Tempo para as Infâncias

Rememorando os RCEI de 2010, ao pensarmos espaço e tempo na Educação Infantil,


devemos levar em conta as lógicas infantis, o modo como a criança percebe, cria e se apropria
do espaço-tempo. Cabe, então, ao adulto um olhar atento e sensível às especificidades da
criança, seus percursos dentro e fora da escola, suas expectativas e interesses, as relações
estabelecidas com outras crianças e adultos.
É importante ressaltar que a criança, ao chegar à Unidade de Educação Infantil,
provavelmente está vivendo sua primeira experiência fora do ambiente familiar. Há
naturalmente um estranhamento na percepção da criança em relação a essa nova realidade, às
pessoas (adultos e crianças), às rotinas que se colocam em tempos diferentes dos já
experienciados por ela.
Os ambientes vivenciados pelo ser humano desde a mais tenra idade possuem uma
variedade de características que, ao serem observadas e sentidas, promovem diferentes
impressões. Cada indivíduo é um ser único, com suas particularidades e individualidades ao
mesmo tempo em que é parte de um grupo social. Os ambientes ganham humanidade e
significado com a intervenção e interação humana.
Assim, ao pensarmos sobre a inserção da criança no ambiente escolar, o planejamento
desses espaços deverá ser um dos primeiros objetivos a serem desenvolvidos pelos
profissionais. No planejamento desses tempos e espaços, a rotina está inserida e representada
em momentos de cuidar e educar. Momentos de cuidados físicos (alimentação, higiene,
descanso) que devem estar integrados e alinhados à proposta pedagógica. As intervenções
feitas nesses espaços e tempos pelos adultos, levando em conta as singularidades das crianças,
farão desse espaço um lugar de aconchego e prazer.
Embora reconheçamos a importância do ambiente, algumas vezes seu valor é
negligenciado e seu planejamento é pautado em nossa lógica adulta, e não nas necessidades e
172

características infantis. As concepções de infância, seus objetivos, marcas históricas da


organização escolar, crenças de como se desenvolve o processo de aprendizagem, formas de
controle podem guiar essa organização espacial, sem muitas vezes levar em conta as
necessidades e as especificidades dos sujeitos da infância.
Sendo assim, como o espaço seria aliado da imaginação, lugar de aconchego e afeto,
cúmplice do brincar e promotor de alegria? Tiriba (2005) nos conduz a uma reflexão sobre a
necessidade de desemparedar as infâncias, afirmando a importância de não negligenciarmos
os espaços físicos oferecidos às crianças; de pensarmos os ambientes externos, nos quais elas
não sejam furtadas dos momentos ao ar livre, do contato com água, areia, barro, vento, sol,
chuva, árvores, grama, formigas, canto dos pássaros entre outros elementos da natureza. “E as
áreas ao ar livre? O que há aí: terra, árvores, água, areia, o quê? Raramente, de pés descalços,
as crianças brincam sobre o chão predominantemente coberto por cimento ou brita,
revestimentos que predominam nas áreas externas” (TIRIBA, 2005, p. 8).
Contudo, compreendemos os inúmeros desafios que fazem parte dos mais variados
contextos que envolvem nossas Unidades de Educação Infantil. Eles estão diretamente
relacionados à estrutura, entornos de vulnerabilidades, acesso restrito às áreas verdes e
ambientes naturais, dentre outros oferecidos pela cidade.
A partir das discussões nos grupos de trabalho para a composição deste texto,
destacamos a seguinte contribuição das unidades UMEI Nina Rita Torres e Creche
Conveniada Esperança em Cristo:

Para que a criança seja protagonista no espaço-tempo escolar, devemos


incluir o ponto de vista dela. Nós, adultos e profissionais da educação
infantil, podemos aprender com as crianças novas formas de nos
relacionarmos com o tempo e o espaço. A rotina é importante na educação
infantil, mas ela não pode nos engessar. O espaço deve ser entendido como
um educador, viabilizando aprendizagens, prazer, interações, brincadeiras,
experiências e vivências. O espaço precisa ser adequado às necessidades da
criança, favorecendo o contato com a natureza, a exploração de ambientes,
conhecimento de si e do outro (...) respeitando a história de cada criança,
evitando padronizações e o emparedamento. As unidades de educação
infantil devem ser construídas pensando na valorização das infâncias, devem
ter uma área verde, solário, salas arejadas, diversificadas, de uso comum.

Ao se organizar o espaço-tempo, devemos levar em conta brincadeiras, atividades e


projetos que estão sendo desenvolvidos com as crianças, colocando à sua disposição materiais
que promovam suas escolhas e o contato com diferentes linguagens, respeitando o tempo do
coletivo, sem abrir mão do tempo de cada uma, das suas necessidades e dos seus desejos.
Pensar e organizar espaço-tempo requer ainda planejamento e olhar cuidadoso dos professores
173

quanto às especificidades de cada faixa etária, considerando a efetiva participação das


crianças.
Nessa perspectiva, a UMEI Alberto Brandão nos inspira, ao adequar seus espaços para
o brincar das crianças, propiciando tempos férteis de interações:

O primeiro passo, antes de estabelecermos o referencial teórico-


metodológico da ação curricular na UMEI, foi ratificar que a Educação
Infantil não se constitui em uma preparação para o Ensino Fundamental. De
acordo com o Referencial Curricular Nacional, essa fase tem importância em
si e, entre outros aspectos, deve levar a criança a criar uma imagem positiva
de si, fortalecer sua autoestima, desenvolver a comunicação e interação
social, se perceber como integrante e agente transformador do meio em que
vive, através das relações que estabelece com o outro, em um espaço
privilegiado de inserção nas relações com a sociedade e o mundo. Coerentes
com essa visão, criamos espaços (casa de bonecas, local para os super-
heróis, outro para os dinossauros, as pistas com carrinhos e sinais de trânsito
e o camarim maluco), destinados às brincadeiras, nos quais as crianças
tivessem livre escolha, na hora de brincar. Segundo Vygotsky, as crianças
que brincam em ambientes ricos de informações e demonstram interesse por
estar ali brincando, adquirem conhecimentos e são produtoras de cultura,
através da interação com seus pares, sendo eles próprios construtores do seu
conhecimento com a mediação de alguém mais experiente. Conscientes da
importância da ação do adulto nessa fase da vida da criança, procuramos
estimular um olhar atento e sensível e uma participação efetiva dos docentes
nesses novos espaços e nas atividades cotidianas em nossa UMEI. Esses
espaços vêm provocando a criatividade e o interesse das crianças,
proporcionando momentos do brincar livre, interação entre os Grupos de
Referência, além de despertar a imaginação e criatividade das crianças.

Outra questão relevante referente ao espaços-tempos na Educação Infantil é que esses


espaços e tempos sejam promotores de situações, nas quais, desde muito cedo, a autonomia
das crianças seja construída. Diferentes arranjos espaciais e variações do ambiente físico que
dizem respeito à maneira como móveis e equipamentos estão posicionados podem contribuir
para potencializar as interações e a construção do conhecimento. Nesse sentido, Campos-de-
Carvalho e Padovani (2000), inspiradas em Legendre35 (1986, 1989, 1999), arquiteto francês
que usa o termo "zona circunscrita" e descreve as diferentes formas de arranjos espaciais e
suas interdependências com as interações de crianças, fazem o seguinte destaque:

O "arranjo semiaberto" é caracterizado pela presença de zonas circunscritas,


proporcionando à criança uma visão de todo o local. Zonas circunscritas são
áreas delimitadas pelo menos em três lados por barreiras formadas por
mobiliários, parede, desnível do solo. A característica primordial destas
zonas é a sua circunscrição ou fechamento, independentemente do tipo de

35
Termo cunhado pelo arquiteto francês Alain Legendre, em 1983 (LEGENDRE, 1983), para referir-se aos
aspectos quantitativos e qualitativos de um determinado espaço físico. Campos-de-Carvalho e Rubiano (1994)
destacaram a relação entre esses dois aspectos, ou seja, a maneira como eles estão posicionados entre si.
174

material colocado para as crianças manipularem, o que, então, as


diferenciam dos chamados cantos de atividades. Neste arranjo, as crianças
ocupam preferencialmente as zonas circunscritas (...). No "arranjo aberto",
há ausência de zonas circunscritas, geralmente havendo um espaço central
vazio (...). No "arranjo fechado", há a presença de barreiras físicas, por
exemplo um móvel alto, que dividem o local em duas ou mais áreas,
impedindo uma visão total do local pelas crianças (CAMPOS-DE-
CARVALHO; PADOVANI, 2000, p. 443).

Assim, é importante que a criança visualize seus professores e as demais crianças e


com eles estabeleça interações, nas mais diferentes mediações e possibilidades de
experiências. É preciso haver áreas abertas ou semiabertas, que auxiliam na locomoção e
visualização dos objetos, brinquedos, materiais e livros. Além disso, móveis baixos, onde
objetos, brinquedos, livros do seu interesse possam ser facilmente manuseados, rearranjados e
usados criativamente. Também são possibilidades que se apresentam zonas circunscritas,
cantinhos diferenciados criados pelas crianças ou efeitos de projetos de trabalho, delimitados
por mesas, cadeiras, caixotes, cortinas etc.

III - Autonomia e Autoria

O desenvolvimento da identidade e da autonomia


estão intimamente relacionados com os processos de
socialização (RCNEI, 2008).

A palavra autonomia vem do grego e significa autogoverno, governar-se a si próprio.


Dentro dessa perspectiva, podemos entender que o ser humano decide de acordo com sua
vontade e princípios, logo é autor de sua história. Porém, a autonomia não está
preestabelecida ou definida, ela é resultado de uma conjuntura histórica e, portanto, um
conceito que se reformula de acordo com a sociedade. Consequentemente, resulta da
possibilidade de agir dentro de um conjunto de regras morais preestabelecidas socialmente e
inscritas na legislação vigente.
A Educação está relacionada à possibilidade de manutenção ou reformulação desse
conceito, na medida em que é corresponsável, junto com a família e a sociedade, pela
formação dos cidadãos. Sendo assim, considerando que o Brasil é um “Estado Democrático
de Direito” (BRASIL, 1988, Art. 1º), entende-se que educar implica formar seres humanos
críticos, autônomos, participativos socialmente.
Nesse sentido, os Referenciais Curriculares construídos pela Rede Pública Municipal
de Educação de Niterói são perpassados por essa concepção de autonomia e autoria. Cada
175

pressuposto apresentado aponta para importância da participação de todos os envolvidos na


construção do currículo escolar (Estado, comunidade escolar e sociedade).
Dessa forma, propõe que a Educação Infantil seja espaço no qual a criança deva ter
respeitada sua condição de autora da própria infância. Assim, as práticas pedagógicas têm
papel importante na construção da autonomia e respeito à autoria da criança, quando se
preocupa em promover momentos de interação criança/criança e criança/adulto. “Para que
isso aconteça, é preciso que o educador esteja sensível às demandas infantis, que tenha uma
escuta arguta e um olhar atento” (RCEI, 2010, p. 40), colocando-se na condição de mediador
das ações das crianças.
Durante as discussões nos polos de troca para elaboração destes Referenciais
Curriculares, a UMEI Prof.ª Maria José Mansur Barbosa e a C.C. Instituto Dr. March nos
apontaram a importância da observação atenta dos professores:

O ouvir sensível precisa ser exercitado pelos profissionais da Educação


Infantil. As crianças são capazes de perceber quando estão realmente sendo
consideradas. As ideias para os trabalhos surgem quando estimulamos as
crianças a se aprofundarem em suas observações, o erro costuma existir com
hipótese, possibilidade de resposta, entendendo que aprendizado é processo
que nunca se encerra. Acreditar que a criança é capaz de executar atividades
de cuidado com o próprio corpo e do ambiente é parte importante do
processo de desenvolvimento. A autonomia é um caminho que vai sendo
conquistado através da confiança em si e tentativa de execução de tarefas.
Sob o olhar cuidadoso do professor, a criança vai conquistando passo a passo
sua autonomia e a cada conquista firmando sua confiança em suas
capacidades e possibilidades.

Nesse movimento de construção de autonomia e autoria, os adultos precisam estar


disponíveis para ouvir atentamente o que as crianças têm a dizer. É importante que elas sejam
inseridas e consideradas, principalmente no Planejamento da Unidade Escolar, desde o
Projeto Político Pedagógico, passando pelo Plano de Ação e chegando ao planejamento do
professor. Embora isso seja evidente, aceitamos a recomendação de Paulo Freire quando diz
que “o óbvio precisa ser dito”. A construção da autonomia ocorre enquanto a criança adquire
consciência de si, de seus limites e capacidades. Assim,

[...] a passagem da heteronomia para a autonomia supõe recursos internos


(afetivos e cognitivos) e externos (sociais e culturais). Para que as crianças
possam aprender a gerenciar suas ações e julgamentos conforme princípios
outros que não o da simples obediência, e para que possam ter noção da
importância da reciprocidade e da cooperação numa sociedade que se propõe
a atender o bem comum, é preciso que exercitem o autogoverno, usufruindo
de gradativa independência para agir, tendo condições de escolher e tomar
decisões, participando do estabelecimento de regras e sanções (RCNEI,
2008, p. 15).
176

Isso deverá acontecer no cotidiano da Educação Infantil, em contextos de valorização


dos jogos de emancipação (Adorno, 2011), nos quais as crianças juntamente com os adultos
tomem decisões em situações planejadas ou não. Autonomia e autoria ocorrem durante a
escolha das atividades, avaliação e autoavaliação, escolha dos assuntos a serem pesquisados
no projeto, das brincadeiras, do melhor momento para a água, descanso, ida ao banheiro,
realização de rodas de conversas e assembleias, entre outros. Vale destacar que a autonomia e
a autoria só se constituem em ambientes nos quais as relações democráticas se estabeleçam de
tal forma que as vozes dos sujeitos sejam igualmente ouvidas e valorizadas.
Freire (2001, p. 22) salienta ainda que “[...] ensinar não é transferir conhecimento, mas
criar as potencialidades para a sua própria produção ou a sua construção”. Assim, nessa
perspectiva, ensinar abre e potencializa caminhos para o sujeito de autoria, autônomo, que é
capaz de criar suas próprias produções. Isso se torna um enorme desafio para os docentes,
pois trata-se de abrir mão do controle total do que será ensinado e colocar-se disponível a
fazer-se aprendiz.
Corsino (2009, p. 146), aponta que “o discurso autoritário, engessado e sem
possibilidade de réplica é interiorizado como dogma, destituindo o sujeito de autoria, o que
leva a um agir tutelado por prescrições, sem efetivas transformações do sujeito”. Ela pontua e
reitera uma nova função de ser docente, como alguém que vai descobrir, construir novas
aprendizagens com suas crianças. Saber-se inacabado é um sentir que deve estar relacionado
primeiro ao ser docente. Ao seu respeito, às suas práticas. Essa consciência nos torna éticos.
Freire nos conduz a pensarmos o respeito que deve ser estabelecido para com o outro, respeito
a sua autonomia, a sua dignidade. A ética e o respeito para com os discentes não são um mero
favor, pelo contrário, eles fazem composição do fazer docente. Ainda segundo o autor:

O professor que desrespeita a curiosidade do educando, seu gosto estético,


sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente e sua prosódia; o
professor que ironiza o aluno, que o minimiza, que manda “que ele se ponha
em seu lugar” ao mais tênue sinal de sua rebeldia legítima, tanto quanto o
professor que se exime do cumprimento de seu dever de propor limites a
liberdade do aluno, que se furta ao dever de ensinar, de estar respeitosamente
presente à experiência formadora do educando, transgride os princípios
fundamentais éticos de nossa existência (FREIRE, 2001, p. 66).

Sendo assim, há um convite posto nestes Referenciais Curriculares, no qual uma


dialogicidade verdadeira entretece as relações entre professor e criança e esses sujeitos
dialógicos crescem e aprendem nas diferenças. A belezura dessa relação está na força de sua
coerência, em sua equidade.
177

IV - Sensibilidade e Afetividade

Para refletir sobre o pressuposto sensibilidade e afetividade, convidamos o educador


Paulo Freire, que nos traz o conceito de amorosidade não apenas como uma expressão de um
sentimento, mas como um compromisso ético e político que toma o diálogo como condição
para as interações entre os sujeitos, compreendendo o outro, sua origem, o modo de ser e estar
no mundo. Freire considera o amor uma afirmação corajosa e comprometida com os outros
seres que habitam o mundo. Sendo assim:

A tarefa de ensinar é uma tarefa profissional que, no entanto, exige


amorosidade, criatividade, competência científica, mas recusa a estreiteza
cientificista, que exige a capacidade de brigar pela liberdade sem a qual a
própria tarefa fenece. (FREIRE, 2010, p. 10).

Todavia, os processos de formação docente comumente dispensam reflexões sobre a


práxis amorosa do professor, valorizando a técnica e a cientificidade apenas. A negação da
amorosidade compromete a convivência entre os sujeitos, os processos de ensinar-aprender-
ensinar, enfim a vida. Ainda de acordo com Freire (2001),

Na verdade, preciso descartar como falsa a separação radical entre seriedade


docente e afetividade. Não é certo, sobretudo do ponto de vista democrático,
que serei tão melhor professor quanto mais severo, mais frio, mais distante e
“cinzento” me ponha nas minhas relações com os alunos, no trato dos
objetos cognoscíveis que devo ensinar. A afetividade não se acha excluída
da cognoscibilidade (FREIRE, 2001, p. 162).

Nessa perspectiva, segundo o RCEI (2010, p. 41), “o sensitivo e o intelectivo


caminham de mãos dadas para a formação de sujeitos que compartilham vivências, o que
sinaliza a importância de valorizá-los e considerá-los nas ações pedagógicas”. Essa relação
leva a uma educação de fato integral, na qual os sujeitos envolvidos não são vistos de forma
cindida. É preciso fortalecer o enfrentamento de uma hierarquização que elege a dimensão
intelectual como sendo a mais importante e orientadora do currículo.
Como nós enquanto educadores poderemos resistir aos automatismos que levam à
invisibilidade das diferentes histórias de vida, às formas de se relacionar com o mundo, aos
ritmos próprios? Como praticar a escuta sensível e o olhar atento às crianças em meio às
adversidades? Como cultivar a sensibilidade e a capacidade de nos afetarmos com as dores,
angústias, raivas, medos, alegrias e conquistas?
Longe de pretendermos darmos respostas únicas e definitivas, compreendemos que as
crianças e suas infâncias nos dão indícios de como podemos subverter essa lógica,
178

inaugurando um tempo de possibilidades a partir dos seus olhares curiosos, simples e atentos,
das suas leituras próprias de mundo e dos seus percursos fora e dentro da escola.
Ao nos relacionarmos com as crianças, devemos levar em conta suas manifestações,
bem como suas emoções, instrumentos preciosos e genuínos de expressão. É preciso trazer
para o centro do trabalho docente as sutilezas impressas corporal e afetivamente, em um
movimento de sensibilidade que envolva intencionalidade e disponibilidade. Segundo Dantas,

[...] quando Wallon coloca a afetividade em primeiro lugar, é porque é ela,


através da emoção que é uma impressão corporal de um estado interno, que
faz a comunicação, o intercâmbio entre os indivíduos, e provoca as primeiras
representações, figurações e que adquirem consistências nos movimentos.
(...) Este pensador da emoção alerta também que, se o professor tiver
conhecimento do conflito eu-outro na construção da personalidade, onde
costuma surgir por vezes hostilidade da criança em relação ao professor;
tanto pela falta de êxito da criança, pela severidade do professor, por
motivos pessoais oriundos da família, quando por problemas afetivos de
origem psíquica, então nós professores poderemos receber essas atitudes
com mais tolerância e não as tomar como afrontas pessoais (DANTAS,
1992, p. 70).

Ao se referir às crianças das classes populares, Freire destaca a amorosidade como


uma competência profissional do professor que atravessa o trabalho com a vida afetiva de
todas as crianças independentemente de classes. Nesse sentido, o educador pernambucano
afirma que “é preciso ousar no sentido pleno desta palavra para falar de amor, sem temer ser
chamado de piegas, de meloso, de acientífico, senão de anticientífico” (FREIRE, 2010, p. 12).
Assim, provocar as crianças, no que diz respeito aos sentimentos e emoções, é parte do
trabalho pedagógico em nossa Rede, como podemos observar nos seguintes relatos:

[...] investindo na busca pela identificação dos sentimentos e como lidar com
eles, com vias à resolução de conflitos e respeito mútuo [...] surge o projeto
“Museu das Emoções” (UMEI Regina Leite Garcia).

Certas provocações surgiram a partir de rodas de conversas realizadas com


as crianças, com a finalidade de instigá-las a refletir a respeito de seus
sentimentos e emoções, ponderando como importância vital a compreensão
do que sentimos, o que fazemos o outro sentir, o reconhecimento das
impressões e ainda as consequências a partir das sensações em determinadas
situações (UMEI Julieta Botelho).

Assim como as crianças, suas famílias também devem ser acolhidas com amorosidade
e cuidado. Devem ainda ser entendidas como protagonistas no processo educativo e não
meros coadjuvantes. Mais do que convidados para reuniões e festividades, precisam encontrar
nas escolas espaços de participação e de tomada de decisão.
179

Ademais, os profissionais da escola também precisam ser acolhidos em suas


singularidades, tendo como possibilidade constante a escuta de suas histórias e trajetórias de
formação e trabalho, encontrando espaços-tempos de bem-estar, de partilha entre pares e
possibilidades de narrativas próprias e autorais, engajamento político e afirmação da pesquisa
sistemática como condução e condição da sua prática diária.
As dimensões sensível, afetiva, ética, poética, estética e política das artes precisam ser
vividas como experiências potencialmente importantes e transformadoras na formação de
professores, crianças e seus familiares, pois elas podem ampliar o modo como sentimos,
percebemos o mundo, compreendemos outras culturas e histórias. Além disso, as artes
possibilitam não apenas ver com outros olhos, mas ver por meio da imaginação e da produção
de outros mundos possíveis.

V - Dimensão Cidadã

No Brasil, a criança foi reconhecida como sujeito de direitos com a promulgação da


Constituição Federal (1988) e, como forma de regulamentar os diversos aspectos de sua vida
civil, no ano de 1990, foi aprovado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A partir
desses marcos legais, direitos reservados aos adultos são ampliados às crianças, o que lhes
confere a condição de cidadãs. Mas o que é cidadania? E ser cidadão? Como uma sociedade
que historicamente negou à criança essa condição pode modificar-se? E, principalmente, qual
o papel da Educação Infantil?
A partir da CF de 1988 uma nova fase da história da educação é inaugurada, pois as
crianças de 0 a 5 anos passam a ter direito de frequentar espaços não domésticos, portanto
pedagógicos, saindo definitivamente da guarda da assistência social. Essa conquista política
possibilitou a criação de uma rede de direitos que se materializaram na construção de espaços
educacionais para a infância, elaboração de materiais pedagógicos específicos, influência nas
pesquisas acadêmicas e fomentou o surgimento de novas legislações comprometidas com os
direitos das crianças.
Nestes Referenciais Curriculares, há o entendimento de que cidadania se constrói
socialmente, ao longo da formação do indivíduo, por meio dos diálogos que ocorrem nos
espaços sociais por ele frequentados, portanto “[...] se busca entender as crianças como atores
sociais, capazes de interpretar o mundo, partindo das interações estabelecidas entre si e com
os adultos” (RCEI, 2010). Nesse sentido, a escola pública é local privilegiado para o debate e
180

a busca de uma formação em que a criança esteja imersa em uma concepção cidadã que vá
além de conhecer direitos e deveres. Ser cidadão pressupõe capacidade de reivindicar e
exercer direitos sabendo que, em sociedade, diferentes culturas, etnias e classes sociais
coexistem e precisam ser respeitadas em sua integralidade humana.
Assim, pensar um currículo dentro de uma perspectiva cidadã é também estar atento à
trajetória de lutas, disputas e mobilizações sociais que por décadas buscam não só respeitar,
mas valorizar grupos historicamente silenciados e marginalizados. Torna-se pauta urgente
discussões relacionadas a gênero, aos povos indígenas, à população negra e a outras minorias,
bem como toda forma de violência física e simbólica à qual estão submetidos.
A dimensão cidadã se coloca nestes Referenciais Curriculares enquanto ação
indispensável para a construção de práticas pedagógicas capazes de auxiliar nossas crianças
na construção de sua dimensão humana. Nos diálogos propostos nas conversas com as
crianças, no acolhimento aos colegas recém-chegados à instituição, no respeito aos que
possuem culturas diferentes, na necessidade de aprender a resolver conflitos por meio da
negociação, entre outras situações que marcam as rotinas da unidade, está presente a
interlocução pedagógica que alicerça uma educação que pretende colaborar para construção
de um cidadão.
Existem algumas ações que podem fazer parte da rotina que são deflagradoras de
tomadas de decisão, escolhas, posicionamentos e consensos. A realização de assembleias e a
construção de listas de combinados com as crianças são alguns exemplos. Nesse movimento,
compreende-se que os conflitos podem ser resolvidos por meio do diálogo e que muitas
decisões podem ser tomadas coletivamente. O ato de tomar decisões de maneira
compartilhada não exime os sujeitos de responsabilidades. Estes são convocados a garantir
que o que foi acordado deve ser mantido. Qualquer possibilidade de mudança também deve
ser levada ao coletivo para novas decisões. Segundo os RCEI (NITERÓI, 2010):

Participar e decidir coletivamente sobre os rumos de nossa sociedade


precisam ser objetivos da educação, o que implica em educar para a vida em
conjunto e para a compreensão do “fazer junto”. Na medida em que o sujeito
se sente como parte integrante de um coletivo, capaz de tomar decisões e
expressar suas opiniões, vai se constituindo como cidadão (NITERÓI, 2010,
p. 43).

Assim, pensar a dimensão cidadã dentro do currículo nos convoca a considerar a


Unidade de Educação Infantil enquanto um espaço de construção de atitudes de cooperação,
solidariedade, posicionamentos, iniciativas, participação e argumentação. Temos clareza de
181

que a escola sozinha não é capaz de formar cidadãos, como nos aponta Sarmento.
Compreendemos que, apesar dos avanços legais,

[...] a criança é tida como um cidadão sob tutela, ou um ser humano em vias
de se tornar cidadão. Em todo o caso, nunca como um cidadão de pleno
direito. Esta situação da criança como ser humano “em vias de” qualquer
coisa é, aliás, inerente à própria condição social da infância, conforme ela foi
assumida nas sociedades ocidentais, na modernidade. A criança é tida, nas
representações sociais hegemônicas e na administração simbólica da infância
– expressa no senso-comum, nas regras formais e informais e no trabalho
institucional – como um ser em transição, em estado de desenvolvimento
(como se não fosse comum a todos os seres humanos estarem em transição e
em desenvolvimento permanente…), um ainda-não, mas em vias de o ser
(SARMENTO, 2012, p. 1).

No entanto, embora a criança tenha especificidades que inspirem cuidado e proteção,


consideramos que na escola ela se apresenta em sua inteireza, ela não é um vir a ser, ela é
alguém que é porque nasceu imersa em cultura e com ela interage desde o nascimento. Isso
pode ser observado quando ela emite opiniões, realiza atitudes solidárias ou não, escolhe a
atividade a realizar etc., o que reflete na sua formação em sociedade. Assim, família, amigos,
escola, mídia, atores que compõem a rede social são corresponsáveis pela constituição da
criança.
Vale ressaltar que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
(DCNEI/2010) reiteram essa concepção de criança enquanto sujeito de direitos, de alteridade
e ativa em seu contexto:

Sujeito histórico e de direitos que, nas suas interações, relações e práticas


cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca,
imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e
constrói sentidos sobre a natureza e sociedade, produzindo cultura (BRASIL,
2010, p. 12).

Portanto, todas as proposições pedagógicas que perpassam os pressupostos destes


Referenciais Curriculares buscam uma educação para as crianças que resguarde seus direitos e
seja pautada em práticas cidadãs. Reforçamos, assim, o que Freire defende sobre nossa
passagem pelo mundo não ser predeterminada, sobre o destino não ser algo posto, mas sim
uma construção de cuja responsabilidade não podemos nos eximir: “Nós fazemos história
com os outros, tomamos feitura disso e, ao problematizarmos o devir, recusamo-nos ao
determinismo, nutrindo a esperança” (FREIRE, 1996, p. 58).

VI - Infâncias e Natureza
182

Quando meus olhos estão sujos da civilização,


cresce por dentro deles um desejo de árvores e
aves

(Manoel de Barros)

Como sujeitos do mundo contemporâneo, imersas na lógica do consumo, de ampliação


das conexões midiáticas, virtuais e muitas vezes aprisionadas em suas casas pela crescente
violência urbana e agigantamento das cidades, as crianças estão com os “olhos sujos” desse
mundo que as distancia e afasta cada vez mais das belezas naturais, do humano. É preciso
despertar novamente nas crianças um desejo não só de “árvores e de aves”, mas de conhecer,
desbravar e conviver com toda potência que a natureza nos proporciona.
É imperativo que ensinemos a importância da Educação Ambiental desde a primeira
infância, enquanto processo que religa o ser humano à natureza, razão e emoção, corpo e
mente, conhecimento e vida. Sobre isso, a visão africana tem muito a nos ensinar. Segundo
Luis Tomas Domingos (2011), ao contrário do homem ocidental, que, de uma maneira geral,
tem como projeto de vida dominar e transformar a natureza para proveito próprio, numa
lógica utilitarista, na cultura africana, em particular os Bantos, podemos observar uma outra
relação com a natureza. Estas não são puramente técnicas,

[...] mas estéticas, não há relação do homem conquistador da natureza; mas


sim relações de respeito recíproco, de participação e de complementaridade.
E esta forma de relação íntima tem como finalidade realizar e manter um
equilíbrio harmonioso entre homem e universo (DOMINGOS, 2011, p. 2).

Nesse sentido, a Educação Ambiental a ser desenvolvida nas Unidades de Educação


Infantil deverá assumir um compromisso com a “ética do cuidado, com o respeito pela
diversidade de culturas e da biodiversidade” (TIRIBA, 2010, p. 0). A proposta é que a relação
entre infância e natureza possa ser promotora de “interação, cuidado, preservação e o
conhecimento da biodiversidade e da sustentabilidade da vida na Terra, assim como o não
desperdício de recursos naturais”, como está previsto no artigo 9º das DCNEI, que claramente
se conectam com a perspectiva de construção histórica de sociedades cada vez mais
sustentáveis.
Infelizmente, não vislumbramos uma verdadeira preocupação com a diversidade
biológica, como já acontece, mesmo que a passos lentos, com a diversidade cultural e com as
diferenças individuais. Sobre isso nos alerta Tiriba (2010, p. 4):
183

Por nossa capacidade de intervenção, vimos provocando danos profundos no


ambiente de que somos parte. As consequências dos avanços tecnológicos de
que tanto nos orgulhamos na verdade não têm colaborado para a preservação
deste ambiente. Pelo contrário, movidos pela ganância, fascinados pelos
objetos, muitas vezes incentivamos as práticas consumistas, esquecendo que
a sua fabricação exige, invariavelmente, domínio e controle da natureza e
pressão sobre o meio em que vivemos.

Esse pressuposto nos desloca para outro entendimento que precisa ser desenvolvido
em nós, nas crianças e em suas famílias − o entendimento de que outra relação se faz
necessária entre a humanidade e a natureza. Ambos fazem parte de um todo. Ao destruirmos a
natureza, estamos nos destruindo. É preciso desenvolver, para além de uma consciência
ambiental local, uma consciência planetária. Cacique Raoni Metuktire dos Kaiapos, em sua
potente narrativa, mostra-nos a importância disso:

Por muitos anos, nós, os líderes indígenas e os povos da Amazônia, temos


avisado vocês, nossos irmãos que causaram tantos danos às nossas florestas.
O que você está fazendo mudará o mundo inteiro e destruirá nossa casa – e
destruirá sua casa também. [...] Quando você enfraquece a Terra assim, ela
começa a morrer. Se a Terra morrer, se nossa Terra morrer, nenhum de nós
será capaz de viver, e todos nós também morreremos. [...] Por que você faz
isso? Você diz que é para desenvolvimento – mas que tipo de
desenvolvimento tira a riqueza da floresta e a substitui por apenas um tipo de
planta ou um tipo de animal? [...] Você destrói nossas terras, envenena o
planeta e semeia a morte, porque está perdido. E logo será tarde demais para
mudar [...] (RAONI, 2020).

Essa relação entre o homem e a Terra, entre o homem e a natureza deve-se caracterizar
por uma ligação concreta e não utilitária da porção da terra dada, deve ser caracterizada pela
indissociabilidade da interdependência entre um e outro que traduz pelas obrigações
recíprocas (DOMINGOS, 2011).
Outra nuance desse pressuposto tão importante quanto a já exposta, é a questão de
“desemparedar” as infâncias. Pela força da urbanização e da presença cada vez mais forte da
violência, as crianças não usufruem, ou fazem pouquíssimo uso, de espaços verdes e abertos,
onde possam ouvir o canto dos pássaros, ter contato com a terra e outros elementos naturais.
Nesse sentido, as Unidades de Educação Infantil públicas tornam-se espaços
privilegiados para que, pensando pedagogicamente na relação Infância e Natureza, possam
religá-las, por meio de um pensamento e de um agir local. Nessa seara, a atuação docente,
juntamente com um projeto político pedagógico coletivo, será decisiva para a instituição de
outras relações da humanidade com a natureza:

Encantar-se com a beleza do dia, brincar na chuva, comer goiaba tirada do


pé, ouvir o canto de um pássaro, observar as nuvens brincando no céu... Que
184

ensinamentos, que aprendizagens, que estados de espírito essas experiências


propiciam? Sabemos o quanto fazem bem e nos tranquilizam, energizam.
Cuidar das crianças significa mantê-las em contato com o universo natural.
Se o nosso compromisso é com sua integridade e com a preservação da vida
no planeta, sol, ar puro, água, terra, barro, areia são elementos e condições
que devem estar presentes no dia a dia de creches e pré-escolas (TIRIBA,
2018, p. 201).

Nessa perspectiva, uma infância em contato com a natureza é algo cada vez mais
difícil na sociedade em que vivemos. A sua relação com o brincar mudou devido aos desafios
do contexto social urbano. Confinadas dentro de casa, muitas vezes as crianças só
experimentam brincadeiras mediadas por aparelhos de celular, computadores, tablets e outros
aparelhos eletrônicos. Pular corda, brincar na lama, subir em árvores, jogar bola na rua, nem
pensar! E o agravante é que tal contexto algumas vezes repete-se nas Unidades de Educação
Infantil.
Sendo assim, é necessário oportunizar a reconexão com a natureza, conscientizar-se
dos prejuízos causados pelo consumo exacerbado, do desperdício voraz. Fazer um caminho de
volta, redesenhando os caminhos de como se pode conhecer. O corpo, por tanto tempo
silenciado, submisso nos bancos escolares, precisa ser escutado. Desafios que nos convidam a
lançar um novo olhar sobre a realidade do mundo no qual estamos inseridos. Segundo Tiriba é
preciso:

Enxergar limites e possibilidades da construção cotidiana de uma utopia


ético-política que tenha o cuidado como referência. E, por mais paradoxal
que pareça, tem o sentido de um novo convite a não desanimar, a acreditar
que vale a pena seguir desejando e apostando em processos educativos que
sejam aliados da vida, da alegria, da liberdade (TIRIBA, 2018, p. 47).

Dessa forma, aliar o planejamento às vivências que podem ser experimentadas fora
das salas de aula é hoje um grande desafio para educadores, crianças e comunidade escolar. A
utilização de ambientes externos na aprendizagem significa uma mudança de cultura
importante, capaz de gerar inúmeros benefícios na formação da personalidade da criança, nas
diferentes formas de aprender e de ser professor.
Correndo, pulando, plantando, subindo em árvores, brincando com água ou
alimentando animais, as crianças trabalham a socialização, conhecem a liberdade,
desenvolvem a criatividade, a autoestima, a confiança e a capacidade de se relacionar com
outro mundo.
Quando são motivadas não apenas para o simples brincar, mas também para a
construção da brincadeira, elas colocam em prática suas relações de afeto, de amizade, de
preservação e de colaboração. Os espaços externos, se bem aproveitados, podem transformar-
185

se em ambientes acolhedores, nos quais elas se sintam confortáveis para vivenciar, manipular
e interagir, conseguindo, assim, idealizar as bases de sua estrutura sensorial, motora e
cognitiva, tão necessárias ao crescimento e à aprendizagem.
Nas escolas que não possuem essa situação tão favorável, é fundamental ofertar outras
possibilidades existentes na comunidade, no entorno. Apropriar-se da cidade, assumindo-a
como seu território, contribui para reafirmar o sentido de pertencimento e de construção da
identidade.

VII - Pesquisa e Experiência

Sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que


me insere na busca, não aprendo, nem ensino.

(Paulo Freire)

Afirmar a pesquisa como pressuposto significa assumi-la como constituidora dos


processos e experiências de aprendizagem quando compreendemos que os sujeitos adultos e
crianças são ativos, históricos e autores nesses processos. A curiosidade que suscita perguntas,
que provoca inquietudes, que faz olhar atentamente a natureza e seus fenômenos tão presentes
na infância precisa ser alimento essencial da prática pedagógica.
Nesse sentido, cabe ao professor o cuidado, a sensibilidade que demanda uma entrega
num ritmo de trabalho quase artesanal, não no sentido de um fazer manual, mas de um
trabalho que requer paciência, amorosidade e um ritmo lento que dispõe de tempo suficiente
para assimilar as inúmeras narrativas das crianças que nos chegam impregnadas de pistas
riquíssimas. Essas experiências narradas muitas vezes não são percebidas nos contextos
escolares devido à vida acelerada que levamos, ou acabam passando por nós como relatos de
pouca relevância.
Com base nisso, compreendemos a importância das contribuições do filósofo Walter
Benjamin, que interpreta de maneira bem particular os sinais emergentes de sua época,
marcada por uma ofuscante industrialização, cujos efeitos e desdobramentos podemos
perceber nos dias de hoje em novas tendências, mas em grandes proporções.
Benjamin nos possibilita identificar, por meio de suas reflexões, que sujeitos na
sociedade atual se encontram cada vez mais isolados em um mudo particular e privado que os
distancia de experiências coletivas, das tradições e das memórias comuns. Não é um mundo
186

muito diferente daquilo que o filósofo já nos revelava, marcado por um ritmo
demasiadamente acelerado que “transforma cada vez mais nossas vidas de maneira tão total e
tão rápida que não conseguimos assimilar essas mudanças pela palavra” (GAGNEBIN, 1999,
p. 59), afetando a possibilidade de intercambiar experiências, não pela da falta de capacidade,
mas pela falta de condições de transmiti-las e narrá-las.
Hoje, em pleno século XXI, é comum ouvirmos que fazemos parte de uma aldeia
global, que vivemos no mundo da informação e, como consequência do constante contato
com os meios de comunicação de massa, tornamo-nos sujeitos bem informados, como se
apenas isso fosse sinônimo de conhecimento.
Ao contrário, o que podemos observar são sujeitos obcecados pela novidade, à procura
de informações que possam acessar a cada minuto. A velocidade com que essas informações
chegam a nós não nos permite que deixem rastros e marcas. Esse ritmo tão tenso e intenso
impossibilita a partilha, o diálogo e a reflexão. Dizemos saber de muitas coisas, mas nada
efetivamente nos toca, nos acontece.
Larrosa (2002, p. 21), fazendo uso também das reflexões benjaminianas, afirma que “a
informação não é experiência. E mais, a informação não deixa lugar para a experiência, ela é
quase o contrário da experiência, quase uma antiexperiência”. Ele acrescenta ainda “que uma
sociedade constituída sob o signo da informação é uma sociedade na qual a experiência é
impossível” (LARROSA, 2002, p. 21).
O autor aponta quatro fatores que têm levado ao fim da experiência na sociedade
contemporânea. Entretanto, vamos destacar apenas dois deles: a falta de tempo e o excesso de
trabalho. Quanto à falta de tempo, o autor diz que o mundo está cada vez mais veloz. Tudo
acontece cada vez mais depressa, de forma instantânea, efêmera e fragmentada. Para Larrosa:

A velocidade com que nos são dados os acontecimentos e a obsessão pela


novidade, pelo novo, que caracteriza o mundo moderno, impede a conexão
significativa entre acontecimentos. Impede também a memória, já que cada
acontecimento é imediatamente substituído por outro que igualmente nos
excita por um momento, mas sem deixar qualquer vestígio (LARROSA,
2002, p. 23).

Nesse contexto, cada vez mais aumenta o tempo na escola, na universidade, tornando
os sujeitos frutos de uma formação permanente, porém acelerada, “sujeitos da constante
atualização, da reciclagem sem fim” (LARROSA, 2002, p. 23). O tempo é usado como valor,
como uma mercadoria e, por esse motivo, não se pode perdê-lo, tendo sempre que aproveitá-
lo para não ficar para trás. Corre-se cada vez mais e, contraditoriamente, tem-se menos tempo.
187

Faltam o silêncio e a memória, mas o mais grave é que falta a vivência de uma temporalidade
que nos permita intercambiar experiências.
O autor continua afirmando que a experiência está cada vez mais rara devido ao
excesso de trabalho. O homem contemporâneo é um sujeito hiperativo, além de ser
informado, é um sujeito que opina, que está permanentemente agitado e em movimento, é um
ser que trabalha. Ou seja, “que pretende conformar o mundo, tanto o mundo natural quanto o
mundo social e humano, tanto a natureza externa quanto a natureza interna, segundo o seu
saber, seu poder e sua vontade” (LARROSA, 2002, p. 24).
O sujeito moderno considera-se capaz de realizar, controlar e produzir coisas de forma
ininterrupta, por esse motivo é incapaz de viver experiências. Ele está sempre se relacionando
com os acontecimentos do ponto de vista da ação. Como tudo é pretexto para sua atividade,
está sempre a se perguntar sobre o que pode fazer. Vive em função de fazer, produzir e
regular algo. O seu afã é mudar as coisas. Larrosa ainda acrescenta que:

Nisso coincidem os engenheiros, os políticos, os industrialistas, os médicos,


os arquitetos, os sindicalistas, os jornalistas, os cientistas, os pedagogos e
todos aqueles que põem no fazer coisas a sua existência. Nós somos sujeitos
ultrainformados, transbordantes de opiniões e superestimulados, mas
também sujeitos cheios de vontade e hiperativos. E por isso, porque estamos
sempre querendo o que não é, porque estamos sempre em atividade, porque
estamos sempre mobilizados, não podemos parar. E, por não podermos
parar, nada nos acontece (LARROSA, 2002, p. 24).

Mas que experiência é essa de que estamos falando? E quem é esse sujeito da
experiência? Aquilo que nos passa, que nos afeta, produzindo em nós de alguma forma afetos,
marcas, vestígios, efeitos, pode-se entender por experiência. Por isso, é quase impossível, nos
tempos de hoje, viver experiências se não tenho a capacidade de parar, pois essa requer o
gesto de interrupção. É preciso parar para pensar, olhar, escutar e sentir.
O sujeito da experiência é aquele que não se deixa dominar por suas certezas e que não
se define pelos seus sucessos. É um sujeito receptivo e disposto a rever suas convicções
sempre que for confrontado por outros saberes e, à medida que compreende a importância do
outro em suas trajetórias, vai agregando à sua experiência componentes fundamentais, como a
formação e a transformação.
É o saber da experiência que nos ajuda a dar sentido ao que nos acontece. Assim, esse
saber não se dá pelo uso restrito da técnica ou do acúmulo de informações, mas na sua relação
direta com a vida dos sujeitos, por isso é um saber relativo e não definitivo, é particular e
subjetivo. Logo, se compreendemos a experiência como aquilo que nos passa, que nos toca,
que nos acontece, compreendemos também que “duas pessoas, ainda que enfrentem o mesmo
188

acontecimento, não fazem a mesma experiência. O acontecimento é comum, mas a


experiência é para cada qual sua, singular e de alguma maneira impossível de ser repetida”
(LARROSA, 2002, p. 27).
Nesse ponto tomamos as narrativas tanto dos professores quanto das crianças como
elementos riquíssimos que podem e devem subsidiar a prática docente. Tais narrativas são na
verdade leituras das experiências que se constituem na vida dos sujeitos. Não nos referimos a
uma leitura marcada pela simples procura de informação, mas a uma leitura singular,
subjetiva e impregnada por uma interação amorosa, que cultiva a atenção, a paciência e a
delicadeza. Tal reflexão nos leva ao encontro das reflexões de Walter Benjamin (1987, p. 198)
quando afirma que “a experiência que passa de pessoa em pessoa é a fonte a que recorrem
todos os narradores”. São as experiências que nos atingem, que nos tocam, inscritas na
memória que retornam pela narrativa não como uma mera descrição, mas como uma
reconstrução de fatos vividos aos quais podemos atribuir novos significados.
Quando narramos, não estamos simplesmente transmitindo uma informação, mas
intercambiando experiências com potencial transformador, com marca polifônica, uma vez
que traz em seu bojo a força do coletivo, da participação de outros sujeitos. Por isso,
acreditamos não ser redundante nos referirmos a uma experiência instituinte que “se afirma
como uma experiência comum, partilhada por um grupo, contrapondo-se dessa forma à
vivência pontual e fragmentada do sujeito isolado de seus pares” (BRAGANÇA, 2003, p. 2).
É, portanto, esse lugar de pesquisa que queremos potencializar, onde se faz necessário
resgatar vozes e memórias, muitas vezes silenciadas, das crianças e de seus professores,
buscando discutir, refletir e sobretudo socializar experiências como parte de um movimento
constituidor de currículo. Por isso, a relação daquilo que é narrado pelas crianças precisa ser
uma relação não de apropriação, mas de escuta atenta e sensível, cuja condição essencial é a
modéstia que nos coloca dispostos a ouvir o que não sabemos e o que muitas vezes não
queremos e sobretudo dispostos a transformar-nos numa direção desconhecida em direção aos
outros e a nós mesmos.
A partir das perguntas, das formulações de hipóteses das crianças e das professoras,
podemos traçar caminhos coletivos de investigação, provocando não só diálogos entre saberes
prévios e conhecimentos formais, com a produção de conhecimentos próprios e autônomos,
mas também a formação de pesquisadores, sujeitos apaixonados por conhecer o mundo. Para
tal, é necessário reconhecer a multiplicidade de saberes e a potência dos pequenos gestos,
olhares, intuições, respeitando e valorizando as realizações das crianças por menores que
pareçam. Segundo Edwards, Gandini e Forman (2016, p. 93),
189

[...] devemos proporcionar às crianças aquele tipo de ambiente que


potencialize seus interesses e talentos e que aprofunde seu envolvimento na
prática e no pensamento. Um ambiente de “adultos amorosos” que são, eles
mesmos, alienados do mundo ao seu redor é um vácuo educacional. Os
adultos envolvidos no mundo dos seres humanos e da natureza devem levar
esse mundo com eles para as crianças, restrito e seguro, mas sem com isso
perder sua riqueza e promessa de novidade (EDWARDS; GANDINI;
FORMAN, 2016, p. 93).

O adulto precisa manter a capacidade de se encantar para acolher os “encantamentos”,


os olhares curiosos da criança, sua capacidade de se sensibilizar diante do canto dos pássaros,
das trilhas de formigas, do arco-íris em final de tarde, do barulho dos galhos ao vento, das
metamorfoses, das tonalidades do céu, dos aromas das ervas e das hortaliças, das amálgamas
como terra e água. Encantar-se com as indagações que a criança faz, diante do inédito. Mas,
além disso, tornar esse exercício uma ação intencional e cotidiana, registrando, acolhendo
hipóteses, sugerindo caminhos investigativos, organizando um modo de fazer vida-pesquisa.
Nessa perspectiva, Freire aponta a pesquisa como parte fundamental da docência ao
considerar que não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se
encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino, continuo buscando, reprocurando.
“Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar,
constatando, intervenho, intervindo educo e me educo” (FREIRE, 2001, p. 32).
A prática do professor pesquisador e incentivador da pesquisa entre as crianças deve
fomentar e provocar possibilidades de descobertas por meio de diálogos constantes que
acolham e valorizem as percepções, as dúvidas, as hipóteses e as inquietações. Desejos de
explicações e respostas, demandas muitas vezes traduzidas pelos seus porquês. Estar em
companhia das crianças, observando as ações, os gestos e as manifestações infantis, é uma
aposta, por parte dos profissionais da Educação Infantil, da tradução dos porquês cotidianos
em suas hipóteses de estudo e investigação. Sendo assim,

[...] cabe aos professores não facilitar a aprendizagem, ou tratar de forma


simplista e superficial, as questões e inquietações infantis, mas sim ser um
mediador que colabora com a organização, sistematização, busca de fontes e
tratamento crítico das informações, tornando os problemas, mais complexos,
envolventes e excitantes e a aprendizagem, uma experiência significativa
(EDWARD; GANDINI; FORMAN, 2016, p. 155).

Abaixo, compartilhamos uma narrativa de experiência de aprendizagem ocorrida na


UMEI Nilo Neves:

Em 2019 desenvolvemos o Projeto Você Sabia em nossa UMEI. Sabemos


que as crianças são curiosas por natureza, são questionadoras e adoram saber
o porquê de tudo a todo tempo, utilizando essas descobertas que fazem para
190

criar novas hipóteses para conhecer o mundo ao seu redor e construir


significados para a realidade. Na infância, a criança anseia por explicações e
motivos, pois, para ela, não existe acaso. E quem nunca se viu numa
verdadeira saia justa ao ser questionado por uma criança? Os pequenos
baseiam sua realidade por meio de perguntas simples, tais como: Onde?
Como? Por quê? Diante de algumas perguntas das crianças, coube a nós,
adultos educadores, conduzir o processo de construção de hipóteses,
primando pelo protagonismo infantil. Daí surgiu a ideia do projeto. Através
da escuta sensível e da valorização da fala das crianças, nossa UMEI se
tornou um verdadeiro centro de pesquisas. Quantas coisas surpreendentes
acabamos descobrindo pesquisando os objetos de curiosidade dos pequenos
cientistas! Você sabia que as formigas conseguem comunicar-se através do
olfato e possuem cinco narizes diferentes? Você sabia que o que as formigas
comem dependerá da sua espécie? Que algumas são carnívoras, outras
herbívoras, mas a maioria das formigas é onívora, ou seja, elas comem de
tudo, inclusive baratas? Você sabia que as baratas sobrevivem mesmo se
suas cabeças forem arrancadas e que podem viver por até sete dias, até que
morram de fome? Nós agora sabemos, pois, num dia comum, como tantos
outros, as crianças do GREI 4A viram uma barata sendo levada por formigas
e começaram a perguntar várias coisas: “Para onde as formigas estão
levando a barata? O que farão com ela? Elas são amigas?” Movida por estes
e outros questionamentos que foram surgindo, a turma começou uma
pesquisa sobre insetos e pudemos descobrir várias curiosidades sobre o
assunto. O resultado dessas experimentações foi riquíssimo na condução das
pesquisas e aquisição e construção de conhecimentos.

A narrativa da UMEI Nilo Neves nos revela um espaço de experiências, de pesquisa


potente. Não estamos nos referindo a experimentos, mas a experiências plenas que só são
possíveis mediante a modéstia que nos coloca dispostos a ouvir aquilo que as crianças têm a
nos dizer, movimento indispensável para constituição curricular. Precisamos estar atentos ao
inusitado, ao imprevisível das perguntas infantis que nos revelam sua curiosidade e como as
crianças vão construindo o conhecimento dentro de uma relação profundamente partilhada.
Vemos também, a partir dessa narrativa, que não há uma preocupação com um
currículo prescrito, que se apresenta muitas vezes de forma extensa e que pouco dialoga com
os contextos infantis, que valoriza mais a quantidade de temas ou assuntos trabalhados do que
com os modos pelos quais as crianças aprendem. Ao contrário, há uma interação amorosa, que
cultiva a atenção, a paciência e a delicadeza, que requer tempo para a escuta, para o diálogo,
para as descobertas. Não há nesse relato uma simples transmissão de informação, mas um
intercâmbio de experiências como potencial transformador na medida que nos atravessa, afeta
e toca.

VIII - Múltiplas Linguagens


191

A criança tem cem mãos, cem pensamentos,


cem modos de pensar, de jogar e de falar.
Cem, sempre cem modos de escutar
as maravilhas de amar.
Cem alegrias para cantar e compreender.
Cem mundos para descobrir.
Cem mundos para inventar.
Cem mundos para sonhar.

(Loris Malaguzzi)

Loris Malaguzzi, educador italiano de Reggio Emilia, citado na epígrafe acima, diz
poeticamente que não só o que a criança pensa é válido, mas válidas são também as múltiplas
linguagens da infância e a forma como as crianças pesquisam, produzem sentido e
conhecimento.
Ao falarmos das múltiplas linguagens na escola de Educação Infantil, não podemos
separá-las do processo da própria vida, do nosso percurso e história, da cultura na qual
estamos inseridos e da qual somos produtores. Ao revisitarmos os Referenciais Curriculares
para Educação Infantil da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói (2010),
percebemos nitidamente a sensibilidade já apontada pelos profissionais que compuseram essa
escrita, quando trazem à tona a reflexão sobre a criança e as diferentes linguagens. “A criança
nasce um ser de cultura, envolta nas diferentes linguagens e, como todo ser humano, é
constituída na e constituinte de cultura” (NITERÓI, 2010, p. 32).
Nesse sentido, as falas e considerações das crianças, suas expressões orais e silêncios,
seus gestos em diferentes movimentos, seus desenhos e manifestações gráficas, seus olhares e
expressões, suas contemplações e impressões para os detalhes das coisas simples, até das
criações mais complexas apresentadas pela cultura que as cerca, precisam ser considerados.
Assim, as criações e recriações sobre essa mesma cultura, seus jogos, principalmente suas
brincadeiras, não são estanques. As linguagens se manifestam nos cotidianos com dinamismo,
fazendo intercâmbios variados entre si. Com elas e por meio delas, comunicamo-nos,
interagimos, relacionamo-nos com os outros, estabelecendo conexões. Portanto, trabalhar com
diferentes linguagens não deve acontecer de forma delimitada; deve haver entre elas
integração e interdependência.
Assim, quanto maior a diversidade de parceiros e experiências potencialmente, mais
enriquecido torna-se o desenvolvimento infantil. As crianças têm potencial de encantar-se,
desejo de crescer, curiosidade que as impulsiona, desejo de interagir com outras pessoas e
assim comunicar-se. Segundo Rinaldi (1999),
192

[...] isso provavelmente explica por que as crianças se sentem dispostas a


expressarem-se dentro do contexto de uma pluralidade de linguagens
simbólicas, e também porque são muito abertas a intercâmbios e
reciprocidade, como atos de amor. Elas não apenas desejam receber, mas
também querem oferecer (RINALDI, 1999, p. 247).

Ao compreendermos o modo como a experiência da imaginação é socialmente


construída pelas crianças no contexto da produção das linguagens e considerarmos esse
processo tanto do ponto de vista de suas singularidades, quanto do ponto de vista da sua
relação com o outro e com o mundo, estaremos caminhando rumo à compreensão do
entrecruzamento das culturas produzidas para as crianças e as culturas produzidas pelas
crianças.
Assim, é importante aguçarmos a percepção e refletirmos sobre algumas questões, tais
como: Quais as experiências com a cultura são promovidas na Educação Infantil? Como
apresentamos as artes plásticas, a música, a literatura, as artes cênicas (teatro), a linguagem
midiática, a dança e tantas outras? Como se dá esse encontro com as artes, coletivo e
individual, e a geração de apreciação e sensibilização? O que dizem as crianças, em suas
singularidades, nesses encontros? Como é exposto, colocado e expandido o repertório artístico
e cultural de forma a potencializar a produção cultural das crianças em suas brincadeiras e
ações criativas?
De acordo com as DCNEI (BRASIL, 2009), as propostas pedagógicas da Educação
Infantil devem respeitar princípios estéticos, considerando a diversidade cultural, religiosa,
étnica, econômica e social do país. Compreendemos, assim, que o acesso a um vasto
repertório de manifestações artísticas é um direito e um caminho para o pleno
desenvolvimento da criança cidadã.
Posto isso, apresentamos algumas considerações que compreendemos ser de suma
importância para o trabalho desenvolvido na Educação Infantil de nossa Rede.
Conversaremos um pouco sobre algumas linguagens, chamando-as para a roda, sem atribuir
grau de importância maior ou prioridade para alguma delas na composição do currículo.
Como acontece nas cirandas, dança dramática característica do Nordeste do Brasil,
mais especificamente de Pernambuco, que faz sua composição coreográfica no juntar de mãos
e na circularidade, assim são as múltiplas linguagens. Cada componente que chega é um
agregador. Se a roda crescer em demasia, outra será formada em seu interior. Adultos e
crianças podem participar. Da direita para esquerda, em um movimento rítmico bem
demarcado pela percussão. Perna esquerda pontuando e movimentando o corpo para a
centralidade da roda. Canções tradicionais e inventadas são aceitas, enquanto rodando se vai.
193

Apesar de apresentar-se complexa em seu planejamento coreográfico, ela flui simples,


brincante, espontânea e cedendo ao outro. Elas chegarão para roda, regidas pela circularidade
das brincadeiras. Mão com mão, coreografada e rítmica, contudo aberta e atenta à entrada de
outros, em suas expressões. Planejada em sua realização, contudo sensível ao seu crescimento
e desenvoltura do todo.
Desde pequenas, as crianças brincam com a linguagem, atentando para o som das
palavras, seus significados e intencionalidades. Quando bebês, embora não entendam todos os
sentidos das palavras que lhes são ditas, os pequenos apreciam a melodia da voz dos adultos,
balançam o corpo ao som de canções, choram em solicitação ou lamento, inquietam-se e
aquietam ao ouvir uma história e, frequentemente, respondem com movimentos, balbucios e
outros sons graciosos, estabelecendo uma deliciosa brincadeira com a sonoridade da
comunicação humana.
Assim que aprendem a falar, ampliam suas próprias expressões para se comunicar.
Nesse sentido, é fundamental que o trabalho na Educação Infantil seja contextualizado pelo
diálogo constante, sensível e direto, aproveitando todos os momentos, inclusive do cuidado
corporal, para estabelecer relações dialógicas com os pequenos.
Tendo em vista que, desde o ventre, as crianças são expostas a sons que são por elas
percebidos, gerando reações e interações, a linguagem musical faz parte da escola de
Educação Infantil de forma relevante e contínua. Isso implica rever práticas em que a música
serve apenas para a moralização, normatização, disciplinarização dos corpos e seu
silenciamento. A utilização de pequenos refrões para a chamada ao encontro, ao encerramento
de atividades, no deslocamento pela escola, como reforço aos hábitos de higiene etc. não se
configura como utilização da linguagem musical, conforme ressalta Gobbi (2010).
O canadense Murray Schafer (1991), importante educador musical, convida-nos para
conhecer o conceito de "paisagem sonora" (soundscape), conduzindo-nos a descobertas e
experiências inesperadas, e para compreender a música em toda a sua essência e potência
como arte. O autor aponta a relevância desse ambiente sônico que nos envolve como
fenômeno musical, composto por sonoridades que vão do ruído estridente das metrópoles aos
sons dos elementos primordiais − terra, fogo, água e ar. Dessa forma, abre-se um novo
domínio compreensivo da música, que não deixa de dar lugar aos sons antigos já perdidos e
ao silêncio dos lugares distantes e esquecidos. O autor conclama:

Abra-te! Abre-te ouvido para os sons do mundo, abra-te ouvido, para os sons
existentes, desaparecidos, pensados, fruídos! Abra-te para os sons originais,
da criação do mundo, do início de todas as eras... Para os sons rituais, para
194

os sons míticos, místicos e mágicos. Para os sons de hoje e de amanhã. Para


os sons da terra, do ar e da água... Para os sons cósmicos, microcósmicos...
Mas, abra-te também para os sons daqui e de agora, par os sons do cotidiano,
da cidade, dos campos, das máquinas, dos animais, do corpo, da voz [...]
Abra-te ouvido para os sons da vida [...] (SCHAFER, 1991, p. 10-11).

A música, portanto, não se limita à audição ou reprodução de canções; ela também nos
instiga, adultos e crianças, a viver experimentações e descobertas sonoras, ou seja, um
processo de musicalização pelos caminhos da intensidade, duração, frequência e timbre
sonoros, nos diferentes e mais variados contextos.
Além disso, Schafer (1991) preocupa-se em particular com os elementos mais simples,
com as observações mais corriqueiras. Dessa forma, compreendemos que a música pode
perpassar diferentes atividades, como a sonorização das histórias, o reconhecimento dos sons
presentes na escola, as propostas para distinguir as diferentes vozes das professoras, das
crianças e funcionários, as brincadeiras para tirar sons de objetos que convencionalmente não
são instrumentos musicais, a reflexão sobre nossa reação e a relação com a ausência de sons.
Dessa forma, é possível compreender que a musicalidade se desenvolve nas vivências infantis
dos seus mais diferentes lugares.
Essa concepção apresentada também nos aproxima dos mais variados estilos, não só
para reproduzi-los ou conhecê-los a partir de um recorte. O trabalho com a música, levando
em consideração toda a sua essência e potência, entendendo-a como arte, possibilitará
experiências significativas, a fim de que estejamos mais receptivos e sensíveis ao que a
música tem a nos dizer. A UMEI Elenir Ramos Meirelles compartilha conosco uma
experiência sonora musical diferenciada:

No ano de 2019, experimentamos um trabalho com música buscando romper


com usos tradicionais que muitas vezes são feitos na Educação Infantil. Por
meio de nosso Projeto Instituinte intitulado “Crianças Geniais e suas
Histórias”, nos abrimos ao encontro com gêneros, estilos e ritmos musicais
variados, bem como com diferentes músicos e musicistas. Segundo Clifton,
traduzida por Freitas (1997, p. 24): “Música é um arranjamento ordenado de
sons e silêncios [...]”. Dessa forma, iniciamos nosso trabalho conhecendo
sons e também o silêncio. Produzimos sons com o corpo e com muitos
materiais que fomos encontrando pelo caminho. Descobrimos o que Judith
Akoschky (2005) chama de cotidiáfonos, que é a possibilidade de produzir
sons com materiais de uso cotidiano, como aparelhos eletrodomésticos,
potes, panelas, latas, grãos, garrafas etc. Desse movimento foi possível
construir instrumentos sonoros alternativos e o que chamamos de aparelhos
sonoros com objetos maiores. Utilizamos pés de mesas que não serviam,
pallets, latas vazias, potes de iogurte, cascas de coco, tampas de garrafas,
entre outros cotidiáfonos para montar nosso Parque Sonoro. Trabalhar com
música, dessa forma, permitiu ampliar as interações tanto entre crianças
como entre as crianças e os adultos. Notadamente os repertórios de
brincadeiras ganharam novos elementos. Dividir brinquedos, instrumentos e
195

materiais foi aos poucos deixando de ser tão difícil para quem no início
sentia essa dificuldade. Disponibilizar tempo, material e espaço para
produção de instrumentos e aparelhos sonoros e para escuta de diferentes
gêneros e estilos musicais nos mostrou a capacidade inventiva das crianças e
nos fez pensar sobre a importância da arte em nossas vidas e no trabalho
com crianças pequenas (relato apresentado na Mostra de Projetos Instituintes
de 2019).

Portanto, a ampliação, variedade e audição sensível de um repertório diverso e a


reprodução de cantigas trazem diferentes elementos rítmicos e levam-nos ao encontro dos
nossos próprios corpos, embalando, impulsionando os mais variados movimentos.
Envolver as crianças em improvisações expressivas, que permitam a exploração de
diferentes qualidades e dinâmicas do movimento trará à tona a relevância do corpo em
movimento para o desenvolvimento infantil nessa etapa da Educação Básica. Força,
velocidade, resistência e flexibilidade vão traduzindo as intenções expressivas e promovendo
o conhecimento gradativo dos limites e das potencialidades corporais.
Segundo Voss, Tavares, Batalha, Carvalho e Mendonça (2019, p. 1), quando
pensamos em movimento, muitas vezes não imaginamos sua importância dele nem o quanto
contribui para o desenvolvimento do ser humano. A linguagem corporal, que já é vivenciada
desde o ventre da mãe, vai se estruturando ao longo dos meses, tornando-se a primeira forma
de comunicação do bebê com o mundo. Suas emoções já se traduzem por meio de seus
olhares, gestos e sentimentos.
Dessa forma, a linguagem corporal exerce um papel essencial na construção do
conhecimento. A exploração de diferentes formas de locomoção pelo espaço, seja pela
imitação, seja pela criação livre de movimentos, favorece a ampliação progressiva da
autonomia do controle sobre o próprio corpo. A brincadeira simbólica e/ou a dramatização
das situações cotidianas ou ficcionais, das histórias contadas, das músicas ouvidas, das danças
dramáticas do Brasil36 (cirandas, cateretês, cheganças, jongo, cantigas de rodas, o boi etc.),
bem como os mais variados estilos de dança são incorporados a essas improvisações de som e
movimento, incentivando as crianças a experimentarem diferentes papéis e personagens, de
maneira que se apropriem de maiores possibilidades de interação com o mundo.
A linguagem plástica, em suas expressões variadas de pinturas, desenhos, esculturas,
no uso dos mais diversos materiais, estilos e técnicas, do clássico ao contemporâneo, constitui
uma forma de representação e de significação do mundo, na qual entra em jogo a imaginação
36
No livro Danças Dramáticas do Brasil, Tomo 1, Mario de Andrade recolheu material da música popular
brasileira, numa preciosíssima discoteca, em que há de tudo, danças, congados, fandangos, pastoris, lundus,
modinhas, cocos, de todas as regiões do Brasil.
196

e o processo de criação. Ao se aproximarem das artes, pelas dimensões imaginativa e criativa,


pelas atividades de brincar com tintas, modelar, explorar materiais diversos, diferentes cores e
texturas, usando diferentes tipos de suportes como o chão, papéis, telas e o próprio corpo, as
crianças se expressam do mesmo modo que ocorre quando brincam, instaurando novos
sentidos e compartilhando visões sobre o mundo em que vivem e sobre si mesmas. Daí a
importância do acesso a materiais e objetos como pincéis, esponjas, giz, carvão, canetas, lápis,
dentre outros. Tais propostas trazem consigo um caráter lúdico comum, dado pela liberdade
de escolha, pela possibilidade de transfigurar o real e de inverter a ordem e pela ausência de
compromisso com a produção de um resultado determinado.
Segundo Moura, (2006) nas atividades artísticas, as crianças se conectam com seus
sentimentos. Por isso, os tempos e espaços oferecidos à expressão artística, o conhecimento e
manuseio dos materiais mais diversos, que ultrapassam o convencionalmente usado e o
contato com um vasto repertório já produzido, não havendo limites ou barreiras nesse
continuum, precisam ser levados em consideração nos cotidianos da Educação Infantil.
Para Fischer (1971), em contato com a arte, sempre procuraremos aquilo que
carecemos; nunca é uma coisa em si, fora da realidade humana, mas sempre atribuímos
significado conforme as nossas experiências. Dessa forma, o autor ressalta que a arte é
necessária ao humano não somente para conhecer e mudar o mundo, mas também pela magia
que lhe é inerente.
A arte-educadora dinamarquesa Anna Marie Holm (2019) nos desafia a valorizar os
ambientes externos, indo ao encontro de lugares ainda não explorados, e usando materiais que
não causem danos ao ambiente, à natureza e ao ser humano. Esta autora nos provoca,
enquanto docentes, ao discutir sobre a importância do processo de criação sobrepujar-se em
relação ao produto final. Mesmo em uma organização planejada de materiais e estruturas
formais, as crianças farão uma elaboração própria de organização e criação. Nesse sentido, a
experimentação das crianças é a prioridade e deve ser reconhecida como uma “pesquisa
artística”, isto é, um momento de inúmeras descobertas que podem ser feitas também com o
uso de materiais não estruturados. Criações com terra, galhos, folhas, sementes, cascas de
árvores, flores etc. trarão elementos da natureza para a brincadeira de uma nova construção
estética e abertura aos novos diálogos sobre a arte, o senso do belo e a compreensão que
humano e natureza não caminham separados.
Ainda falando a respeito da importância da linguagem artística na Educação Infantil,
Gobbi (2010) ressalta a importância da exposição das produções infantis, afirmando que esta
pode colaborar para a construção do sentido de pertencimento das crianças ao espaço ocupado
197

e vivenciado por elas todos os dias. A exposição das criações contribui para narrar a história
dos processos criativos individuais e coletivos, e não apenas os resultados, revelando a
cumplicidade entre crianças e professores, seus registros dos processos de elaboração e como
essas variadas expressões se concretizaram.
A leitura e a escrita, umas das tantas linguagens a serem consideradas na construção
do currículo, precisam ser repensadas, uma vez que, no contexto da Educação Infantil, ficam
as inquietações de como promover seu desenvolvimento e quais seriam os caminhos mais
adequados a serem trilhados. Convém destacar que a leitura e a escrita nesta etapa não têm
caráter preparatório para o Ensino Fundamental nem visam à antecipação da alfabetização.
Não levar em conta as culturas infantis e as especificidades desse momento de vida e relação
ativa e criativa com o mundo significa desconsiderar as crianças em sua potência. Muitas
vezes também significa fazer escolhas curriculares que sacrificam o tempo e os espaços de
brincadeira e criação.
Concordando com Paulo Freire (1989, p. 9), consideramos ser essencial haver, na
construção do currículo, intimidade com o ambiente/mundo. Segundo o autor, “a leitura de
mundo antecede a leitura da palavra” e permite a criação de símbolos e signos, mesmo antes
da compreensão dos registros formais. Essa assunção correlaciona-se com o que é proposto
por Vigotski, quando afirma que as crianças são sujeitos históricos e culturalmente situados,
ativos e produtores de cultura. É na interação e cooperação com outros, com o ambiente que
as envolve, nas múltiplas interações que o aprender se consolida.
Smolka (2003) nos faz refletir sobre práticas equivocadas que ainda se fazem
presentes em nossas instituições:

A leitura e a escrita produzidas pela/na escola pouco têm a ver com as


experiências de vida e de linguagem das crianças. Nesse sentido, é estéril e
estática, porque baseada na repetição, na reprodução, na manutenção do
status quo. Funciona como empecilho, um bloqueio à transformação e à
elaboração do conhecimento crítico (SMOLKA, 2003, p. 49-50).

Sendo assim, as crianças não se apropriam da leitura e da escrita quando lhes


oferecemos contextos como os mencionados acima pela autora. Elas enfrentam dificuldades
na elaboração de sentido, no registro de sentimentos, ideias, criando identidade e pensamento
crítico.
Além disso, convém ressaltar que as crianças, desde muito pequenas, entram em
contato com a linguagem escrita, pois estamos inseridos em uma cultura grafocêntrica
(centrada na escrita), objeto da cultura que nos contextualiza. Portanto, elas reconhecem suas
198

marcas preferidas, nomes de brinquedos, heróis, desenhos animados, relacionando-os à


função social da escrita mesmo antes de chegarem à escola. Portanto, a aproximação da
leitura e da escrita na Educação Infantil deverá acontecer de forma viva e significativa, a
partir de propostas que possibilitem às crianças se reconhecerem como leitoras e produtoras
de texto.
Dessa forma, a criação de um ambiente permeado por atividades brincantes,
interativas, criativas e lúdicas trarão a leitura e a escrita para a roda e estas se farão presentes
na Educação Infantil como as outras linguagens. Como define Smolka (2000), pela leitura, a
criança aprende a ouvir e compreender o outro; pela escrita, aprende a dizer sua palavra. É nas
relações interdiscursivas que a vida e a linguagem se entrelaçam.
Tendo em vista a importância do trabalho com leitura na Educação Infantil, a
linguagem literária é primordial, uma vez que oferece à criança material simbólico inicial
para que possa descobrir não apenas quem ela é, mas também quem ela quer e pode ser.
Mesmo antes de aprender a ler, a criança pode e deve ser colocada em contato com a
literatura. Ao ver o adulto lendo, ao ouvir uma história, ao perceber as rimas de um poema ou
música, torna-se perceptiva e sensível para o mundo das palavras, ideias, imaginação,
potencializando-se como leitora.
Por isso, importa salientar que ser leitor não se limita à capacidade de reconhecer e
decodificar códigos da escrita, mas envolve conhecimento da linguagem e experiência do ser
que lida com sua capacidade de compreensão e leitura de mundo. Portanto, articula emoção e
conhecimento, fazendo com que o que é lido desperte os sentidos e sentimentos.
De acordo com Goulart (2011, p. 63), uma grande riqueza que as crianças levam para
a aprendizagem da leitura e da escrita é seu discurso oral: “São práticas discursivas orais que
tornam o texto escrito significativo para as crianças. Estas práticas estão na origem das
relações entre crianças e o texto”. Daí a importância de que as crianças possam expressar
coletiva e individualmente as compreensões e interpretações dos textos que são lidos por elas
ou para elas.
Por isso consideramos que na contação de histórias, no manuseio livre dos livros, nos
recontos ricos de imaginação, na criação de suas próprias histórias e narrativas, há um pacto
entre leitor e texto que inclui as dimensões imaginária, criativa e crítica, as quais ampliam seu
repertório, estreitam sua relação com essa linguagem, sua participação na vida social e a
apropriação de novos conhecimentos. Na Educação Infantil, a linguagem literária é convidada
para a roda manejada pelo brincar. Dessa forma, os livros precisam estar organizados e
dispostos não somente nas bibliotecas, salas de leituras e de referência, mas devem estar
199

próximos, ao alcance das crianças e do seu livre manuseio, compondo diferentes tempos e
espaços.
Além disso, é preciso investir em atividades significativas com diferentes gêneros e
suportes textuais, propondo múltiplas formas de apresentar a literatura, como, por exemplo, a
leitura, a dramatização e a contação de história, utilizando diferentes objetos e recursos,
produção de recontos e releitura de forma que as professoras sejam escribas. Também é
possível, a partir das histórias, propiciar que as crianças expressem suas leituras por meio de
desenhos, pinturas, esculturas, usos de imagens etc.
Dentre os diferentes gêneros textuais, destacamos a potência da poesia como um solo
fértil a ser fecundado na Educação Infantil. Carlos Drummond de Andrade nos inspira quando
diz: “As crianças são poetas por natureza.” Esse gênero, que pode parecer difícil e
inalcançável, é um potente instrumento de interpretação da vida, das coisas tangíveis e
intangíveis. Como nos revela Drummond, a criança se aproxima muito do poeta pelo seu jeito
peculiar de ver e interpretar o mundo, pois a poesia nos sensibiliza, brinca com a realidade,
subverte e é geradora de sonhos, esperança. No entanto, o próprio autor indica que a escola
faz fenecer o encantamento em suas formas de compartimentar sujeitos e saberes:

[...] Mas, se o adulto, na maioria dos casos, perde essa comunhão com a
poesia, não estará na escola, mais do que em qualquer outra instituição
social, o elemento corrosivo do instinto poético da infância, que vai
fenecendo, à proporção que o estudo sistemático se desenvolve, até
desaparecer no homem feito e preparado supostamente para a vida? Receio
que sim.
[...] A escola não repara em seu ser poético, não o atende em sua capacidade
de viver poeticamente o conhecimento e o mundo. Sei que se consome
poesia nas salas de aula, que se decoram versos e se estimulam pequenas
declamadoras, mas será isso cultivar o núcleo poético da pessoa humana?
(DRUMMOND, 1974, p. 1).

As experiências com a poesia podem conduzir à reflexão sobre sentimentos alheios e


próprios. Ao brincar com as palavras, é possível um estreitamento dessa relação com os
diferentes textos, que farão composição com a vida em desdobramentos sensíveis e criativos.
Assim, reitera-se que não se distancia o humano do sentido verdadeiro do aprender.
A linguagem literária desencadeia interlocuções das mais diversas entre leitor e autor,
sendo um processo inerentemente social, realizado individualmente ou na coletividade. Não
se trata, portanto, de mera recepção, mas de interação, troca, comunicação, produção de
sentidos. Esse processo dialógico é o que permite a criança-leitora ampliar seu potencial
comunicativo e assumir posições críticas diante da realidade.
200

Na atualidade, existem outras formas de dizer de si e de ouvir o outro. Principalmente


pela grande influência da linguagem midiática. Como mídia podemos compreender as
Tecnologias da Informação e Comunicação, que na contemporaneidade auxiliam na
sistematização, no registro e nas formas como os conhecimentos são abordados no cotidiano
escolar. Fernandes (2019, p. 49) aponta que devemos considerar como mídia toda a rede
comunicativa visual e digital, compreendendo a comunicação e a informação como suporte
por meio do qual “as crianças e jovens se informam, aprendem, trocam informações e se
divertem”.
Isso implica a necessidade de que a linguagem midiática seja incorporada, nos
cotidianos escolares, desde a Educação Infantil. Conforme aponta Fernandes (2019, p. 44), “O
convívio com as novas tecnologias modificou a maneira como as crianças aprendem”,
resultando uma nova forma de apreender a realidade e transitar no mundo. A construção do
conhecimento precisa ser compreendida como processo que se dá de forma não linear, o que
implica levar em conta diferentes pontos de vista e realidades que perpassam desde a história
registrada nos livros até a história pessoal/familiar dos indivíduos envolvidos no processo de
ensinar e aprender. A linguagem midiática, quando usada de forma significativa, crítica e
criativa, pode fazer um contraponto à educação bancária, que, segundo Paulo Freire, seria
uma concepção verticalizada de educação, em que o aluno não sabe nada e o professor
assume o papel de detentor do saber elencado pela escola.
Queremos dar destaque a uma forma de entender o processo de ensino numa
perspectiva democrática, e essa atitude implica um fazer “junto”, um fazer “com”. Assim,
consideramos que as crianças têm fundamental participação no processo de aprender,
(re)conhecendo o ensinado e tornando-o cognoscível. Por isso, ensinar é “um ato criador, um
ato crítico e não mecânico” (FREIRE, 1992, p. 81). Essa perspectiva corrobora com o que é
apontado por Fernandes:

Na atualidade a cultura da mídia assume, ao lado das instituições


tradicionais, importante papel na socialização das crianças e jovens e estes,
muitas vezes, recebem da mídia os papéis e elementos mais decisivos para a
formação de sua identidade através de dispositivos pedagógicos da mídia
(FERNANDES, 2019, p. 48).

Podemos afirmar, portanto, que o avanço tecnológico e os novos processos de


referência37 demarcam o tempo presente e se revelam nas formas como a sociedade atual se

37
Seriam os processos de interação social considerados base, principais. Estes serviriam como parâmetro para
outros processos e poderiam ser considerados como critério de validação e “definidores de lógicas centrais”.
(BRAGA, 2006 p. 11). A escrita, por exemplo, constitui-se como um processo interacional de referência.
201

constrói. Hoje, a produção mediatizada38 na escola ganha importante espaço na transmissão e


produção de significados e sentidos, não se concentrando apenas no papel organizacional do
fazer pedagógico. Vamos encontrar com recorrência iniciativas que se utilizam de linguagens
mediatizadas para dar contornos ao fazer pedagógico, sendo elas: a fotografia, os vídeos de
animação digital, os documentários e tantas outras formas de registrar os conhecimentos
escolares mediados por tecnologia.
Em nossas UMEIs, tem crescido significativamente o interesse pelo uso das mídias em
seus cotidianos. Na construção de portfólios, que servem de apoio à avaliação, e na produção
de animações que vão ao encontro dos projetos trabalhados as crianças são protagonistas e
autoras em processos mediados pelas professoras. Um exemplo nos é apresentado pela
professora Luciana Costa, da UMEI Professora Áurea Trindade Pimentel de Menezes, que
nos fala do seu interesse pela linguagem midiática:

Uso a fotografia como registro de momentos vividos no cotidiano da escola,


a princípio incentivada por uma colega de trabalho, e com registros
realizados por mim com a câmera do celular. Anos se passaram e percebi
que as crianças se apropriavam dessa linguagem. Tinham acesso e muito
interesse pelo uso de aparelhos celulares. Diante disto, entendi que elas
também poderiam utilizar esse suporte para realizar seus registros na escola.
Logo comecei a disponibilizar o uso da câmera fotográfica digital ou mesmo
meu aparelho de celular para que eles tivessem a possibilidade de realizar
seus próprios registros do cotidiano. Nesse caminhar, conheci o trabalho de
produção de filmes de animação digital com as crianças da Educação
Infantil. Começamos a produzir junto com as crianças fotografias para
registrar nosso dia a dia, nossa rotina, e para produzir pequenos filmes de
animação a partir de pesquisas realizados com o grupo. Os suportes
midiáticos estão presentes no dia a dia da maioria de nossas crianças com o
uso de tablets, celulares... Essa tecnologia pode ser uma grande aliada para
mediação no processo de construção da aprendizagem com resultados muito
significativos no contexto escolar. Assim, utilizo a linguagem midiática na
escola como forma de mediar saberes e veicular sentido, tendo em vista que
esses recursos são amplamente consumidos pelos sujeitos envolvidos, alunos
e professores. (Entrevista realizada com a professora para elaboração dos
Referenciais Curriculares da Educação Infantil em 2019).

A vivência relatada acima nos mostra a possibilidade de uso dos suportes midiáticos −
tão presentes na atualidade − que podem ser utilizados na Educação Infantil como mais um
recurso para tornar mais rica a construção do conhecimento.

38
Refere-se a processos sociais específicos que passam a se desenvolver segundo as lógicas das mídias. Aqui
pode-se falar em mediatização de instâncias da política, do entretenimento e da aprendizagem (BRAGA, 2006,
p. 10).
202

Para Vygotsky, a imaginação é a base de toda a atividade criadora e manifesta-se em


todos os campos da vida cultural. A criatividade baseia-se na imaginação:

No cotidiano, designa-se como imaginação ou fantasia tudo o que não é real,


que não corresponde à realidade e, portanto, não pode ter qualquer
significado prático sério. Na verdade, a imaginação, base de toda a atividade
criadora, manifesta-se, sem dúvida, em todos os campos da vida cultural,
tornando-se igualmente possível a criação artística, a científica e a técnica.
Nesse sentido, necessariamente, tudo o que nos cerca e foi feito pelas mãos
do homem, todo o mundo da cultura, diferentemente do mundo da natureza,
tudo isso é produto da imaginação e da criação humana que nela baseia-se
(VYGOTSKY, 1989, p. 16).

Dessa forma, salientamos que o brincar precisa ser o protagonista na costura desses
fios de tantas linguagens, desdobrando-se em ações criativas que não se dão em um reduzido
momento do dia, nem se restringem somente às atividades artísticas. As ações criativas se
expandem a diversos campos de produção de conhecimento; elas se fazem e dialogam nos
cotidianos, atravessando os projetos pedagógicos, a organização dos espaços/tempos ou
mesmo inspirando temáticas de trabalhos.
Consideramos, por conseguinte, a importância do brincar e sua constituição como
fonte inesgotável do processo de aprender. Para Wajskop (2001, p. 35), a brincadeira é uma
situação privilegiada de aprendizagem infantil, por levar o desenvolvimento a alcançar níveis
mais complexos, exatamente pela possibilidade de interação que oferece. Durante o brincar é
que valores, conhecimentos, habilidades e formas de participação social serão construídos,
reconstruídos, reinventados, inclusive a aprendizagem da leitura e escrita. Cabe repensar a
nossa estrutura de formação como docentes, por vezes afeitos a uma compreensão
compartimentada do conhecimento, separado por blocos ou áreas do saber, como também a
necessidade do controle de um cronos (tempo), de fases fixas de início e fim do conhecer.
Para Moura (2006), a brincadeira é promotora do encontro de todas as artes. Nesse
sentido, ela nos inspira a compreender que a criança vive as experiências com as diferentes
linguagens, sem preocupação com um produto final, mas primordialmente (re)elabora o
mundo por meio de suas experiências brincantes e linguageiras de forma integral e intensa.
Enquanto desenha, canta. Enquanto dança, desenha no ar com movimentos. Enquanto brinca
com as palavras num exercício poético, não abandona os gestos do corpo e as sensações
provocadas pelas palavras. Enquanto se mistura no barro e faz bonecos, dramatiza. Dança
espontaneamente, brinca movimentando-se.
Portanto, o brincar tece o encontro das artes e das mais variadas expressões do
humano. Sublime encontro na tessitura dos fios que puxam “invencionices” e “as coisas
203

menos importantes”, “os desperdícios”, “os silêncios”, “onde as águas guardam sotaques”,
onde “seres desprezíveis” ganham valor e contemplação, Como nos diz o poeta Manoel de
Barros:

Uso a palavra para compor os meus silêncios.


Não gosto das palavras fatigadas de informar.
Dou mais respeito às que vivem de barriga no chão tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes
E aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
Das tartarugas mais que a dos mísseis.

IX - Diferença, Culturas e Singularidades

Trazer, como um pressuposto para o trabalho na Educação Infantil, “Diferença,


Culturas e Singularidades” vem ao encontro da busca por aprofundar saberes e fazeres que
ampliem nossos olhares e a compreensão dos discursos que são produzidos, bem como os
sentidos que os compõem e traduzem significações como escola, criança, docência e
currículo. Compreendemos a própria revisão destes Referenciais Curriculares como um
encontro e disputa por muitas possibilidades de significação. Se, por um lado, é um desafio,
uma “conversa complicada”, por outro, reconhecemos que, além de necessária, essa
“conversa” que vai produzindo este documento é a potência para afirmamos o horizonte
democrático que se institui com a ampla possibilidade de participação, portanto de produção
de sentidos. Sendo assim,

Nessa reflexão, convém consolidar a realização de práticas, presentes em


nossa rotina, que permitam potencializar “um sentido de educação que
favoreça a manifestação da singularidade dos sujeitos” (UMEI Vinícius de
Moraes apud MACEDO, 2014).

Na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, percebemos que, para além dos
projetos educacionais instituintes (que emergem de situações e problematizações pensadas por
cada Unidade de Educação), é primordial considerarmos a realização de práticas que
favoreçam, nas interações cotidianas, o respeito aos diferentes modos de estar no mundo,
potencializando um sentido de educação que possibilite a manifestação da singularidade dos
sujeitos.
204

Nesse sentido, as Leis 10.639/03 e 11.645/08 têm tido desdobramentos instituintes nos
currículos das Unidades de Educação por meio de formações que contribuem para a
mobilização de discussões e práticas sobre a temática das relações étnico-raciais e para a
afirmação de uma educação antirracista. Buscamos, portanto, construir sensibilidades
relacionadas às diferentes expressões culturais e artísticas, como, por exemplo, indígenas e
afro-brasileiras, mas também entendemos a importância de conhecer outras possibilidades e
lógicas na produção de conhecimento, dialogar com elas na expectativa de desconstruir
verdades que se pretendem absolutas e são, por vezes, um obstáculo para o surgimento
criativo no cotidiano escolar, um entrave para a circulação da diferença e da enunciação de
novos sentidos.
Reconhecemos como potência a promoção de práticas curriculares que se abram a
outras epistemologias, contribuindo, desse modo, para uma educação antirracista e que
fortaleça os fluxos da diferença. Como justifica Botelho (2007),

[...] é preciso criar novos espaços e eleger outros atores sociais para um
conhecimento educacional diferenciado e, nesse aspecto, privilegiar os
conhecimentos dos quilombolas, do povo de santo, das comunidades da
floresta, de grupos que carregam o respeito à natureza. Será benéfico para a
nossa sociedade competitiva e destruidora, que, na preeminência do lucro,
devasta grandiosas áreas e desrespeita a irmã-árvore, o irmão-céu, a irmã-
terra, o irmão-rio, enfim, uma comunidade infinita que sustenta a existência
da humanidade (BOTELHO, 2007, p. 2013).

Defendemos, ainda, com Macedo (2014) a educação como processo que deve permitir
o emergir do sujeito singular:

Esse sujeito não é apenas o sujeito do reconhecimento, ele surge na ação que
cria sentidos novos, na enunciação do novo, na produção da diferença em si.
Ele é o outro de si mesmo, o diferir, a diferença em si e não em relação a
algo que lhe é externo. Essa diferença não inferioriza, ao contrário, ela é a
condição de surgimento do sujeito. É, portanto, essa diferença que temos de
recuperar, libertando-a do sentido de diferença entre (MACEDO, 2014, p.
100).

Assim, é preciso pensar currículos como cultura, como sistemas de significações e


representações que buscam a regulação, também marcados pela marca colonial da regulação,
por serem produção da cultura, necessariamente híbridos, logo não alcançam a regulação
total. Compreendendo ser o currículo um espaço de luta constante, em que sentidos
sedimentados podem ser desestabilizados por outras significações que surgem, a diferença
emerge, pois não é outra cultura, mas a criação de outros sentidos dentro dos sistemas
discursivos hegemônicos. Nessa perspectiva,
205

[...] a concepção de cultura como conjunto de sistemas de significação tem


implicações para a compreensão do que encaramos como multiculturalismo
da sociedade contemporânea e implica uma revisão da própria ideia de que
há culturas para entrar em diálogo ou negociação. Operando no que seriam
zonas de fronteiras, autores pós-coloniais têm destacado os fluxos culturais e
não as culturas. Para autores como Arjun Appadurai, as culturas são meros
estancamentos artificiais dos fluxos, uma espécie de fotografia que paralisa e
nomeia o que é puro movimento. Na medida em que estamos acostumados a
pensar a partir desses repertórios nomeados, superá-los exige um processo de
desconstrução que vem sendo realizado com a discussão da cultura como
híbrido. Trata-se de uma discussão que temos entendido como a mais
produtiva no sentido de pensar o currículo, na incerteza do mundo
contemporâneo, como prática de atribuição de sentidos ou como enunciação
(LOPES; MACEDO, 2011, p. 186).

Sendo assim, será que, em nossos currículos, ouvimos de fato as crianças que habitam
as áreas de vulnerabilidade, as comunidades submetidas ao cotidiano de violência e conflitos?
Será que, em nossos currículos, criamos espaços-tempos para que elas possam ser ouvidas
com atenção? Será que a dor presente em suas falas pode ser recebida e suscitar debates
importantes na escola, como violência, exclusão, racismo, desigualdade e injustiça social?
Será que a dor, se for ouvida, pode se converter em projetos que desprivatizem esse
sentimento e possibilitem conversas entre crianças e adultos que acolham? Será que nossos
currículos compreendem esses temas como parte da vida das crianças que habitam nossas
escolas?
Concordamos com o manifesto da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa
em Educação (ANPED) (GT 12 – Currículo) e da Associação Brasileira de Currículo, quando
ressaltam a valorização da localidade, das negociações e da diversidade de sentidos que
fortalecem a autonomia das escolas e se desdobram no fortalecimento da democracia e
legitimidade das lutas políticas por justiça social, nas quais muitos sentidos surgem e
disputam o poder de significação.

Entendemos que a qualidade da Educação Básica só pode ser pensada


socialmente e como direito público de todo e qualquer cidadão.
Consequentemente, qualquer proposta curricular precisa considerar as
adversidades e diversidades locais – de ordem étnica, cultural, social,
política e econômica (Anped/ABdC, 2015).

“Natureza da gente não cabe em nenhuma certeza.”

O subtítulo acima retoma um título de Frangella (2015) inspirada em Rosa (1956). Ao


discutir currículo, regulação e identidades, a autora argumenta o quanto é precária qualquer
206

definição identitária a priori. Contrapondo a ideia de um sujeito autocentrado e autônomo na


condição de ser o que é defendido pelo ideário iluminista, defende que a ideia de uma
identidade cultural/nacional é indeterminada e a necessidade de desestabilizar a imagem de
uma totalidade e coesão, promovendo, desse modo, um maior diálogo com as diferenças, de
modo a rasurar identificações absolutas (FRANGELLA, 2015).
Dessa forma, as políticas curriculares pretendem instituir um sentido e a regulação
total das significações e representações possíveis, no entanto currículo e cultura são híbridos e
ambivalentes, logo a regulação total é impossível de ser alcançada, pois há sempre um outro
sentido possível.
No artigo Olha aquele preto ali! Quando a diferença interroga a produção curricular:
o que fazer?, Rita de Cássia Prazeres Frangella, ao propor um currículo na fronteira como
entre-lugar de formação, destaca o hibridismo e a negociação como possibilidades de irmos
além de formulações essenciais dos sujeitos, ressaltando a potência de pensar a identidade em
uma perspectiva dialógica, promovendo, dessa forma, a experiência da alteridade. Segundo a
autora,

A contemporaneidade expõe a presença da diferença como afrontamento; do


combate e questionamento da homogeneização moderna, a diferença emerge
com força desconcertante; não mais combatida, apreciada até, impõe o
desafio de como viver com e na diferença. A reparticularização das
identidades revela a ambiguidade dos paradoxos dos tempos
contemporâneos: por um lado, há o combate a um passado assimilacionista,
universalista e homogêneo; por outro, os processos de globalização instituem
novas formas de universalização e homogeneidade. Nesse sentido, há a
emergência de novas filiações: gênero, raça, etnia, cultura, sexo são
categorias assumidas por grupos que reivindicam o reconhecimento de suas
“particularidades”. Assim, há uma forma de reencontro subjetivo que se dá
na diferenciação entre esses posicionamentos. A ênfase na noção de
diferença é fundamental para o debate sobre a constituição das identidades
(FRANGELLA, 2009, p. 197).

No que se refere às questões de gênero, por exemplo, os desafios que se colocam são
para que as relações se deem numa condição de liberdade de escolha: buscar impor cores para
as roupas, brinquedos específicos e até padrões de comportamento prescritivos para
diferenciar o que devem fazer meninos e meninas. A escola de Educação Infantil e, em
consequência, as suas elaborações curriculares precisam problematizar as situações
carregadas de estereótipos que imprimem uma versão para o que é ser mulher e homem, o que
acaba por desrespeitar as preferências, as subjetividades, as escolhas de cada criança. Desse
modo,
207

[...] uma educação igualitária entre meninos e meninas começa pela não
segregação na definição “do que” ensinar e “como” ensinar. Tanto as
informações compartilhadas quanto os meios para tal devem ser igualmente
proporcionados às crianças. Neste sentido, a classificação entre “brinquedos
de menina” e “brinquedos de menino” estaria impedindo o acesso ao
conhecimento e ao desenvolvimento das habilidades que o brinquedo
proporciona e desenvolve (FURLANI, 2011, p. 120).

O cuidado necessário a este aspecto, no cotidiano da Educação Infantil, vai na direção


de se ter o conhecimento de que as referências relacionadas aos papéis sociais acabam sendo
aquelas determinadas pelos adultos, o que pode, dentro dos limites da escola, naturalizar as
relações baseadas no domínio do gênero masculino sobre os outros gêneros. Nesse sentido,

[...] quanto à questão de gênero, o currículo precisa problematizar e


desconstruir padrões presentes em discursos e brincadeiras carregados de
estereótipos machistas e patriarcais enraizados em nossa sociedade, que
silenciam e desrespeitam, por muitas vezes, as subjetividades e as
preferências de cada criança (UMEI Vinícius de Moraes).

Muitos de nós temos essa formação, enquanto frutos da educação patriarcal em que se
sustenta a construção social brasileira. Daí a importância de se buscarem caminhos que
possibilitem às crianças a discussão sobre as normas e posturas impostas pela sociedade,
permitindo que as professoras e os professores se reconstruam nesse lugar de trabalho com as
crianças.

Portanto, parece evidente que, enquanto as pessoas adultas explicitam seu


pânico pedagógico diante de um menino, por exemplo, que se fantasia de
bailarina e desliza um batom vermelho em seus lábios, estão demonstrando
sua homofobia e sua misoginia. Enquanto ser homossexual, gay, lésbica,
travesti, transexual, transgênero for algo considerado negativo em nossa
cultura, pais e mães, professores e professoras se sentirão muito
desconfortáveis em permitir que meninos e meninas brinquem, livremente,
com seus brinquedos (FURLANI, 2011, p. 121).

Acreditamos que o direito de aprender e ser sujeito do próprio processo educativo é o


potencial para pensar uma educação na qual todos os mundos tenham o seu lugar, onde o
direito à igualdade caminha ao lado do direito à diferença. Afirmamos, portanto, com Macedo
e Miller (2018)

[...] que a educação que reduz o outro ao mesmo ou ao já sabido mata a si


própria. Educar implica alteridade e, portanto, é preciso fazê-lo ‘(...) tão
longe quanto possível, para além do lugar em que nos encontramos e para
além das zonas já identificáveis’ (DERRIDA, 2010, p. 56). Por isso, ao invés
de ordená-lo, seria produtivo que as políticas públicas em educação
reconhecessem o imprevisível que pipoca nas intra-ações, porque é ele que
nos desloca para cada vez mais longe (MACEDO e MILLER, 2018, p. 962).
208

Dessa forma, argumentamos em defesa do currículo como instituinte de sentidos, em


vários espaços-tempos, reconhecendo como potente colocar em suspeita todo movimento que
pretenda realçar um sentido de universal que institui sentidos para a produção curricular e
mesmo para uma educação das relações étnico-raciais, de gênero e sexualidade. Nossa
proposta caminha na direção de compreender ser mais enriquecedor articular e ampliar a
discussão sobre cultura, ética, formação humana, gênero, cidadania e sustentabilidade
ambiental, assim como discutir a questão racial e da discriminação, assumindo-se que também
esse espaço é uma arena de luta discursiva pelo poder de significar e demarcar fronteiras.

7. MATRIZ ORIENTADORA

EIXO: INTERAÇÕES E BRINCADEIRAS

Objetivos e Orientações à Equipe de Articulação Pedagógica e aos


PRESSUPOSTOS
Docentes

● Garantir a inserção da criança e sua família no espaço escolar de


forma sensível, acolhedora e amorosa;
● Propiciar interações com adultos, crianças, diferentes espaços, com a
natureza, objetos e seres a sua volta, de forma a ampliar experiências e
conhecimentos;
● Compreender que o educar envolve um conjunto de práticas
intencionais que caminham juntas e contemplam a criança de forma
não fragmentada, a fim de proporcionar experiências de compreender
I ASPECTOS o mundo na totalidade de seus sentidos, que se relacionam
COGNITIVO, intrinsecamente entre razão, emoção, expressão corporal e verbal,
AFETIVO E experimentação e elaborações conceituais;
CORPORAL/ ● Atender às necessidades e demandas da criança pertinentes a unidade
FÍSICO: escolar em parceria com outras instituições;
COMPROMISSO ● Atentar para as relações adultos-crianças, crianças-crianças e suas
ÉTICO, ESTÉTICO emoções visando o acolhimento e a perspectiva de que aprendam a se
E POLÍTICO conhecerem, a cuidar de si, do outro e dos ambientes;
● Desenvolver hábitos de higiene e cuidados com o corpo, com o
ambiente para manutenção da saúde pessoal e coletiva;
● Estimular a alimentação saudável;
● Promover a integridade física, emocional, estética (não fazendo do
corpo suporte para fantasias estereotipadas vinculadas às datas
comemorativas) e ética das crianças durante sua permanência na
unidade de Educação Infantil;
● Acolher, problematizar e criar condições pedagógicas para combater
209

atitudes de cunho racista e preconceituoso;


● Garantir que pessoas não sejam reduzidas a estereótipos buscando
reconhecê-las enquanto seres humanos dentro de suas singularidades;
● Selecionar de maneira minuciosa e atenta os materiais a serem
oferecidos, tendo a criança como protagonista;
● Organizar os diferentes espaços disponíveis dentro e fora da sala de
referência e da unidade de Educação Infantil, considerando a
diversidade de materiais e a disposição espacial diferenciada dos
mesmos.

● Selecionar diferentes materiais organizando-os em tamanhos,


formatos, cores, texturas, dimensões e espaços diversificados em
diálogo com as crianças;
● Priorizar materiais naturais/orgânicos tais como palha, folhas, jutas,
pedras e cascalhos, areia, terra, água, entre outros refugos, bem como
o reaproveitamento de retalhos de tecidos, papéis, barbantes, linhas,
lãs, caixas e bandejas de papelão etc.;
● Organizar os espaços da unidade de Educação Infantil, que NÃO se
restringe apenas à sala de referência, levando em consideração os
materiais e as estratégias que serão desenvolvidas com base no
planejamento coletivo da ação docente;
● Respeitar a identidade da criança e suas autorias para que o espaço da
unidade preserve e apresente as culturas infantis, afirmando Paulo
Freire quando recusa um fazer docente bancário e a produção em
série;
II - ESPAÇO E ● O perfil da comunidade escolar e dos grupos de referência deverá ser
TEMPO PARA AS considerado para pensar uma rotina mais humanizada e que não se
INFÂNCIAS sobreponha às necessidades e singularidades das infâncias que se
revelam nos cotidianos;
● Considerar que todas as ações desenvolvidas nos espaços e tempos
dentro das unidades são pedagógicas;
● Zelar pelo espaço da unidade e pelos materiais de uso coletivo em
diálogo com as crianças;
● Proporcionar espaços e tempos para que as crianças brinquem de
maneira livre e/ou dirigida com brinquedos estruturados e não
estruturados, com elementos da natureza e outros materiais;
● Pensar espaços e tempos de brincadeiras que rompam com os
estereótipos de gênero (brinquedos para meninos/meninas, rosa/azul,
comportamentos diferenciados);
● Pensar espaços e tempos que possibilitem o acesso aos brinquedos e
brincadeiras de origem africana e indígena;
● Possibilitar que a criança no seu tempo possa realizar jogos
simbólicos.
210

● Promover momentos que auxiliem o desenvolvimento da autonomia


da criança em seu cotidiano;
● Possibilitar que as crianças se expressem a partir das múltiplas
linguagens;
● Incentivar a prática da linguagem oral e da representação simbólica;
● Criar ambiente acolhedor e seguro para que as crianças possam se
expressar em liberdade, vivenciando limites e possiblidades do corpo;
● Ouvir de forma atenta as demandas das crianças, suas interpelações,
suas ideias e sentimentos, buscando formas de apoiá-las através de
diálogo sensível, tomando todos os momentos da rotina da Educação
Infantil como espaços potentes de falas infantis;
III - AUTONOMIA ● Proporcionar experiências de forma que as crianças possam se
E AUTORIA locomover no espaço da unidade de Educação Infantil livremente, com
combinados prévios;
● Organizar espaços externos e internos da unidade de Educação Infantil
para que as crianças tenham a possibilidade de brincar com
movimentos amplos de abaixar, levantar, correr, arrastar, engatinhar,
subir, descer, saltar, dar cambalhota, passar entre, passar por dentro e
por fora, rolar etc. por meio de circuitos ou livremente;
● Vivenciar experiências que envolvem diferentes tipos de brinquedos e
brincadeiras de nosso patrimônio histórico e cultural procurando
conhecer aquelas específicas do município de Niterói, de outras
culturas, povos e tempos;
● Proporcionar situações em que as crianças possam criar brinquedos e
brincadeiras compartilhando-os com outras crianças e adultos.

● Valorizar e socializar as produções e registros das crianças


(ilustrações, desenhos, modelagens, construções, pinturas, vídeos,
fotos, escrita, movimentos corporais, entre outros);
● Conferir às crianças e seus familiares apoio emocional, social e
cognitivo;
IV - ● Acolher as crianças e seus familiares em situações que envolvam
SENSIBILIDADE E vulnerabilidade, doenças, perdas, luto e/ou violências (físicas e
AFETIVIDADE simbólicas);
● Promover espaço seguro e confiável de aceitação e respeito às
singularidades e individualidades;
● Acolher e respeitar as manifestações emocionais e físicas das crianças
(choros, birras, inquietações etc.) sejam elas em situações de conflito
ou não. Elas devem poder externalizar o que sentem.
211

● Garantir a participação da criança na organização da rotina, no


planejamento das propostas a serem desenvolvidas tais como:
projetos, eventos culturais, discussões e debates para a elaboração de
documentos orientadores da proposta político pedagógica da unidade,
nas avaliações e a organização de tempo-espaço;
● Proporcionar acesso aos saberes e conhecimentos socialmente
construídos incluindo também aqueles referentes aos povos indígenas
e africanos como forma de combate ao epistemicídio;
● Desenvolver ações pedagógicas que corroborem com práticas
antirracistas nas atitudes cotidianas;
● Trabalhar situações de vida cotidiana e fomentar a participação em
jogos, brincadeiras e atividades que estimulem a cooperação;
● Estar atento a toda forma de expressão da criança (gestos, choro,
narrativas, falas etc.) proporcionando espaços-tempos para que elas
possam acontecer;
V - DIMENSÃO ● Incentivar a participação das crianças na elaboração coletiva de regras
CIDADÃ e combinados de convívio social;
● Contribuir para que as crianças desenvolvam atitudes de respeito e
tolerância frente às diferenças (religiosa, de gênero, étnico-racial, de
ideias etc.) aprendendo a conviver com elas;
● Estimular atitudes de iniciativa, participação, argumentação e tomada
de decisões;
● Pensar junto às crianças, estratégias de negociação por meio do
diálogo como forma de resolver conflitos;
● Discutir situações que envolvem as mais variadas formas de violência
inclusive as simbólicas, bem como formas combatê-las no cotidiano;
● Fomentar situações em que a criança se perceba enquanto um sujeito
de direitos e deveres;
● Vivenciar junto às crianças situações em que se perceba que a vida em
sociedade é marcada por diferentes culturas, etnias, classes sociais que
precisam coexistir de forma democrática, respeitosa preservando a
integralidade humana.

● Promover diálogos que possibilitem a nossa reconexão com a


natureza, compreendendo-nos enquanto sujeitos que fazem parte dela,
revendo o desperdício, o consumismo e as violências cometidas contra
as crianças devido aos emparedamentos;
● Estimular o contato da criança com elementos da natureza;
VI - INFÂNCIAS E
● Propiciar tempo ao ar livre (praias, hortos, parques, campos etc.) para
NATUREZA
que as crianças possam brincar desenvolvendo intimidade afetividade,
respeito, cuidado e compromisso com a natureza;
● Possibilitar vivências diretas com a natureza por meio de caminhadas,
piqueniques, coletas de elementos, aprendizado sobre plantas, animais
e a ação do ser humano sobre o meio (biótico e abiótico) etc.;
● Brincar com água, ar, vento, luz, sombra, terra, sons entre outros
212

elementos da natureza;
● Promover a observação e a contemplação da natureza por meio de
seus elementos e de seus movimentos cíclicos como o dia e a noite, as
estações, o ciclo da água etc.;
● Propor a observação de plantas e animais no ecossistema, modos de
vida, cadeia alimentar etc.;
● Promover o contato das crianças com hortas e jardins e com objetos de
diferentes características físicas, buscando formas de organizá-los;
● Realizar com as crianças experimentos e invenções, fazendo uso de
instrumentos convencionais e não convencionais;
● Brincar com misturas (consistência, temperaturas, texturas, aromas,
massa, formas) provocando mudanças físicas e químicas por meio de
atividades como culinária, pintura e manuseio de elementos da
natureza como terra, folhas, especiarias, pigmentos (urucum,
beterraba, cenoura, jenipapo, pó de café, folhas, entre outros) etc.;
● Problematizar a questão do lixo (sua produção, descarte, coleta e
reciclagem) destacando seus impactos na natureza e suas
consequências na vida do ser humano e de outras espécies;
● Promover discussões a respeito da poluição, contaminação,
deterioração dos mares, rios, lagoas, praias, as fontes, o ar, solo,
espaço aéreo, bem como a poluição visual e sonora provocadas pela
ação do ser humano;
● Selecionar e ofertar às crianças materiais que não tragam impactos à
natureza (caixas e bandejas de papelão, palha, retalhos de tecido e
papel, juta, barbantes, linhas, lãs, entre outros) para que estas
experienciem no processo de criação a potencialidade desses materiais
e seus usos conscientes;
● Promover contato com outras culturas e suas formas de compreender a
relação homem e natureza (africanos, indígenas, entre outros.).
213

● Tomar as narrativas das crianças e dos adultos como elementos


expressivos e norteadores da organização e planejamento do trabalho
pedagógico;
● Criar situações deflagradoras das narrativas das crianças e dos adultos
garantindo com escuta atenta os espaços de fala. “Falar com o outro e
não para o outro” como nos ensina Paulo Freire;
● Propor caminhos coletivos de investigação, provocando não só
diálogos entre saberes prévios e conhecimentos formais, mas também
com a produção de conhecimentos próprios e autônomos;
● Fomentar possibilidades de descobertas por meio de diálogos
constantes que acolham e valorizem curiosidades, percepções,
VII - PESQUISA E
dúvidas, hipóteses e inquietações das crianças;
EXPERIÊNCIA
● Realizar aulas de campo, aulas passeios, experimentos com as crianças
com intenção de coletar, levantar e/ou confirmar hipóteses a partir da
observação e do manuseio de diferentes materiais incentivando
possibilidades de registros (fotográficos, blocão de desenhos, diário de
bordo, livro da vida, vídeos etc.);
● Inserir no planejamento da turma, bem como no Plano de Ação da
Unidade Escolar passeios culturais a museus, sítios arqueológicos,
aldeias indígenas, quilombos, reservas ambientais, hortos florestais,
jardins botânicos, observatórios, planetários, cinemas, teatros, lonas
culturais, salas de concertos, galerias de artes, bibliotecas, centros
culturais, pontos turísticos, monumentos, entre outros.

● Proporcionar experiências sensoriais e motoras e a ampla expressão


corporal, respeitando as necessidades de movimento do corpo;
● Propor uma apreciação crítica da obra de arte (contextualizando seu
tempo histórico, materiais e técnicas utilizados, exploração de
texturas, cores, sons, ritmos, biografia do autor da obra etc.)
possibilitando inúmera leituras e elaborações de sentidos;
● Apresentar e garantir o acesso às obras de artes plásticas, cênicas
dramáticas, fotográficas, danças, audiovisuais e músicas como
possibilidade de fruição;
● Apresentar e garantir a música como possibilidade de fruição;
VIII - MÚLTIPLAS ● Ampliar o repertório de ritmos, sons, canções, danças e o
LINGUAGENS desenvolvimento da musicalidade do povo brasileiro, incluindo e
potencializando aqueles de origem africana e indígena;
● Possibilitar o aguçar da percepção sensível de diferentes paisagens
sonoras em diferentes contextos (dentro e fora da unidade de
Educação Infantil);
● Oferecer ambientes ricos em possibilidade de apreciação musical a
partir de diferentes gêneros (samba, forró, erudito, ancestrais etc.) e
sons (oferecidos pela natureza, pelos objetos, pelas diferentes falas e
ruídos da cidade, pelos instrumentos, pelo corpo etc.) favorecendo
assim, a criação musical e de novas paisagens sonoras;
● Possibilitar acesso às produções artísticas dos povos africanos e
214

indígenas;
● Promover o contato com a literatura, as artes, as tecnologias,
percebendo as expressões culturais em seus múltiplos aspectos e
intensificar o conhecimento do patrimônio cultural e artístico, dando
destaque aos bens materiais e imateriais da cidade de Niterói;
● Organizar espaços e tempos para vivência do faz de conta, jogos
cênicos e dramáticos, teatro de fantoche, teatro de sombras e
marionetes criando cenários, personagens e tramas em diálogo com as
crianças;
● Oferecer às crianças as mais diversas possibilidades de interação com
livros que tratem das questões étnico-raciais, assim como questões de
gênero e diversidade de configurações familiares;
● Apresentar e garantir a leitura literária como momento de fruição;
● Proporcionar experiências com leitura e a escrita a partir da
perspectiva discursiva levando em consideração a diversidade dos
portadores textuais, a dialogicidade, os contextos culturais,
compreendendo a criança como sujeito que pensa sobre a sua própria
escrita;
● Valorizar o desenho como linguagem reconhecendo-o como forma
legítima e potente de expressão tanto no campo do registro quanto do
estético;
● Atentar para expressões rotineiras carregadas de valores sociais muitas
vezes com teor racista, preconceituoso e violento (cabelo ruim, cabelo
duro, samba do crioulo doido, associar bagunça a um comportamento
indígena, mulher no volante perigo constante etc.) buscando sua
problematização e formas de combate;
● Garantir experiências que apresentem a influência dos povos africanos
e indígenas na constituição de nosso vocabulário;
● Assegurar o acesso e convívio com os diversos gêneros discursivos
(receitas, listas, poesias, contos, fábulas etc.);
● Possibilitar o uso de vários equipamentos digitais como câmeras,
tablets, computadores, celulares etc. como forma de realizar registro e
comunicação entre os sujeitos;
● Organizar experiências com fotografia que possibilitem o registro das
mais variadas imagens, planos e ângulos, bem como desenvolvimento
de sensibilidade e inúmeras leituras;
● Disponibilizar às crianças vídeos de animação, de filmes com
temáticas referentes a natureza, aos povos nas suas culturas diversas,
entre outros, curtas e documentários de modo a garantir o acesso e a
incentivar a produção infantil.

● Realizar projetos que emergem do coletivo atendendo as demandas


IX - DIFERENÇA,
das crianças;
CULTURAS E
● Promover momentos de interação em agrupamentos diversos de
SINGULARIDADE
crianças em multi-idade;
215

● Valorizar o patrimônio natural, histórico, cultural (material e


imaterial) da cidade de Niterói, nos projetos pedagógicos e nas demais
propostas cotidianas de acordo com as pertinências deles;
● Proporcionar que as crianças conheçam as manifestações culturais da
cidade de Niterói, bem como de outros lugares e seus modos de
produzir cultura;
● Garantir que as Leis 10.639/2003 e 11.645/2008 sejam aplicadas no
cotidiano da Educação Infantil;
● Compartilhar com as crianças e seus familiares práticas cotidianas
para uma educação antirracista por meio de diálogos, projetos
produções escritas, vídeos, entre outros;
● Referenciar positivamente a população negra e indígena por meio das
artes (literatura, música, teatro, cinema, dança...) da produção
acadêmica etc.;
● Incluir a contribuição das culturas (africana, indígena, caiçara,
ribeirinha, regionais, entre outras) nos projetos pedagógicos e nas
relações interpessoais e institucionais;
● Promover experiências que potencializem discussões sobre o respeito
a diferença, singularidade, subjetividade de adultos e crianças.
216

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RIO DE JANEIRO (Estado). Associação Nacional em Pesquisa e Educação. Exposição de


motivos sobre a Base Nacional Comum Curricular. 2015. Disponível em: https://1fce3adf-
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223

SARMENTO, M. J. A criança cidadã: vias e encruzilhadas. Imprópria. Política e pensamento


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Disponível em: https://youtu.be/TC3RpoTFb1w. Acesso em: 13 ago. 2021.

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Múltiplas possibilidades no cotidiano das Creches. Revista Humanidades e Inovação, v. 2,
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TAVANO, S. Como começa? São Paulo: Callis, 2011.

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Movimento – perspectivas atuais. São Paulo: Belo Horizonte, novembro, 2010.

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MENDONÇA, T. C. A Educação Física e sua atuação na Educação Infantil e suas
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para Educação Infantil da Rede de Niterói.

VYGOTSKY, L. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

______. Imaginação e Criação na Infância: apresentação e comentários Ana Luiza Smolka.


Tradução Zoia Prestes. São Paulo: Ática, 2009.
224

ANEXOS
225

ANEXO 1 – DELIBERAÇÃO CME nº 045/2021

PREFEITURA DE NITERÓI
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

ATO DO SECRETÁRIO
O Secretário Municipal de Educação, no uso de suas atribuições legais,
HOMOLOGA:
A DELIBERAÇÃO CME nº 045/2021 do Conselho Municipal de Educação de Niterói,
aprovada na Sessão Plenária do dia 05 de julho de 2021, que institui Comissão Especial para
análise e pronunciamento sobre os Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de
Ensino de Niterói.

VINICIUS GOMES WU
SECRETÁRIO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

Deliberação CME nº 045/202139

Institui Comissão Especial para análise e


pronunciamento sobre os Referenciais Curriculares
da Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói.

O CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI, no uso de suas atribuições


legais e regimentais e,

Considerando o Artigo 4º da Lei n° 2272, de 16 de dezembro de 2005, que dispõe sobre as


atribuições, a composição e o funcionamento do Conselho Municipal de Educação de Niterói;

Considerando os princípios da Educação inscritos nos arts. 2º e 3º da Lei de Diretrizes e


Bases da Educação Nacional nº 9394/96;

Considerando o disposto nos arts. 12 e 13 do mesmo documento legal, em especial no que se


refere à incumbência dos estabelecimentos de ensino elaborar sua proposta pedagógica e a
indicação da necessária participação dos docentes na elaboração da proposta pedagógica,
respectivamente.
DELIBERA:
Art. 1º. Fica instituída a Comissão Especial para análise e pronunciamento sobre os
Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói.

Art. 2º. A Comissão Especial terá a seguinte composição:

39
Publicada em 23 de julho de 2021
226

I - André Antunes Martins, Lilian Azevedo da Silva, Luiz Fernando Conde Sangenis, Luiza
Cristina Rangel Pinto Sassi, Maria Felisberta Baptista da Trindade, Marta Nidia Varella
Gomes Maia, Severine Carmem Macedo e Tatiana Ribeiro dos Santos – Representantes do
Conselho Municipal de Educação de Niterói;

II - Aline Javarini, Andréia Mello Rangel, Carla Sena dos Santos Pinto, Cristiane Gonçalves
de Souza, Delma Marcelo dos Santos, Elana Cristiana dos Santos Costa, Juliana Martins de
Souza, Luciana Laureano Costa, Roberta Teixeira de Freitas, Lívia Moraes Ornelas e Rosane
Cristina Feu - Representantes Especialistas;

III - Alyne Oliveira Pecly Tavares, Ana Cláudia Santana da Silva Cruz, Fernanda de Araújo
Dias, Gisele Coelho de Oliveira, Juliana Cristina da Silva Ignacio, Luciana Silva dos Santos,
Ludiany Tavares da Costa Carvalho, Mônica Gonçalves, Priscila Artte Rosa Nascimento,
Raphael Cássio de Oliveira Pereira, Rosa Aletice e Sonia de Oliveira Martins -
Representantes de Professores e Pedagogos da Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói.

Art. 3º. A Comissão Especial será coordenada pela Prof. Luciana Laureano Costa, que será
substituída em suas faltas e impedimentos por um componente da comissão por ela designado.

Art. 4º. Ao fim dos trabalhos, a Comissão Especial apresentará suas conclusões ao Plenário
do CME que se pronunciará.

Art. 5º. Os trabalhos realizados pela Comissão Especial são considerados de relevante
interesse público.

Art. 6º. Esta Deliberação entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas todas
as disposições em contrário.

CONCLUSÃO DO PLENÁRIO

Aprovada em Sessão Plenária de 05 de julho de 2021.

Conselheiros
VINÍCIUS GOMES WU – Presidente
EVELYN DOS SANTOS SOUZA
IDUÍNA EDITH MONT’ALVERNE BRAUN CHAVES
LILIAN AZEVEDO DA SILVA
LUIZ FERNANDO CONDE SANGENIS
LUIZ HENRIQUE MANSUR BARBOSA
LUIZA CRISTINA RANGEL PINTO SASSI
MARCELA BITTENCOURT THOMAZ DE AQUINO ESCOBAR
MARCO ANTONIO KONOPACKI
MARIA FELISBERTA BAPTISTA DA TRINDADE
MARTA NIDIA VARELLA GOMES MAIA
MAURICIO BENEVIDES SALKINI
TATIANA RIBEIRO DOS SANTOS
THIAGO SOARES RISSO POSSAS
227

ANEXO 2 – PARECER CME Nº 011/2021

PREFEITURA DE NITERÓI
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

ATO DO SECRETÁRIO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

O Secretário Municipal de Educação, no uso de suas atribuições legais,


HOMOLOGA:
O Parecer CME nº 011/2021 do Conselho Municipal de Educação de Niterói, aprovado na
Sessão Plenária do dia 29 de novembro de 2021.

VINICIUS GOMES WU
Secretário Municipal de Educação

INTERESSADO (A): SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI /


FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI

ASSUNTO: REFERENCIAIS CURRICULARES DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE


EDUCAÇÃO DE NITERÓI

RELATOR (A): Luiz Fernando Conde Sangenis

PARECER CME NO: APROVADO EM:


011/202140 29/11/2021

I – RELATÓRIO

1. HISTÓRICO
Na 264ª Sessão Plenária do Conselho Municipal de Educação, realizada em 14/12/2020,
a então Conselheira Prof. Cristiane Gonçalves de Souza apresentou, a pedido da Secretaria
Municipal de Educação de Niterói, o conjunto de minutas das Diretrizes Curriculares da Rede
Pública Municipal de Educação de Niterói, para fins de apreciação e votação pelo Colegiado.
Em 23 de julho de 2021, foi publicada a Deliberação CME nº 045/2021, que instituiu a
Comissão Especial para análise e pronunciamento sobre os Referenciais supramencionados,

40
Publicado em 24 de dezembro de 2021.
228

Em conformidade com o previsto no Parágrafo Único do art. 35 do Regimento Interno do


CME. A Comissão ficou constituída por Conselheiros e Especialistas sob a Coordenação da
Prof. Luciana Laureano Costa.
A Comissão constituída deliberou que as reuniões ocorreriam quinzenalmente, com
prazo de 6 (seis) meses para conclusão dos trabalhos. Como metodologia de análise, adotou o
critério de leitura com destaques individuais e que seriam convidados alguns professores e
pedagogos da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói para participar, por meio de um
chamamento público.
A Comissão deliberou ainda sobre o calendário de encontros e a sequência dos
documentos como segue: Em 27 de agosto, o Texto Introdutório e o Referencial de Arte; em
10 de setembro, os Referenciais de Matemática e Educação Física; em 24 de setembro, os
Referenciais de Geografia e História; em 08 de outubro, os Referenciais de Língua Portuguesa
e Língua Estrangeira; em 22 de outubro, os Referenciais de Ciências e Educação de Jovens e
Adultos; e em 5 e 19 de novembro, o Referencial de Educação Infantil.
Em 19 de novembro do ano em curso, a Comissão aprovou o parecer com as
recomendações para o conjunto de textos analisados, que seriam apreciados pelo plenário do
Conselho Municipal de Educação de Niterói.

2. MÉRITO
Na análise do mérito, foi considerada a legislação educacional vigente.

II – VOTO DA COMISSÃO ESPECIAL

A Comissão Especial para análise e pronunciamento sobre os Referenciais


Curriculares da Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói instituída pela Deliberação
CME Nº 045/2021 do Conselho Municipal de Educação de Niterói, aprovada na Sessão
Plenária do dia 05 de julho de 2021, pronuncia a este Conselho as conclusões de sua análise.

A Comissão composta por:

I - André Antunes Martins, Lilian Azevedo da Silva, Luiz Fernando Conde Sangenis,
Luiza Cristina Rangel Pinto Sassi, Maria Felisberta Baptista da Trindade, Marta Nidia Varella
Gomes Maia, Severine Carmem Macedo e Tatiana Ribeiro dos Santos – Representantes do
Conselho Municipal de Educação de Niterói;
II - Aline Javarini, Andréia Mello Rangel, Carla Sena dos Santos Pinto, Cristiane
Gonçalves de Souza, Delma Marcelo dos Santos, Elana Cristiana dos Santos Costa, Juliana
229

Martins de Souza, Luciana Laureano Costa, Roberta Teixeira de Souza, Lívia Moraes Ornelas
e Rosane Cristina Feu - Representantes Especialistas;
III - Alyne Oliveira Pecly Tavares, Ana Cláudia Santana da Silva Cruz, Fernanda de
Araújo Dias, Gisele Coelho de Oliveira, Juliana Cristina da Silva Ignacio, Luciana Silva dos
Santos, Ludiany Tavares da Costa Carvalho, Mônica Gonçalves, Priscila Artte Rosa
Nascimento, Raphael Cássio de Oliveira Pereira, Rosa Aletice e Sonia de Oliveira Martins -
Representantes de Professores e Pedagogos da Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói;
coordenada pela Professora Luciana Laureano, reuniu-se 12 vezes no período de 30 de julho
de 2021 a 19 de novembro de 2021.
Durante as reuniões foram apresentadas as observações e contribuições por parte dos
componentes da Comissão e especialistas das áreas consultados. Diversas contribuições foram
acrescidas ao texto com o propósito de aprimorar o mesmo quanto a sua redação e mesmo dar
visibilidade a alguns conceitos ou torná-los mais explicitados, sempre com a necessária escuta
dos Representantes de Professores e Pedagogos da Rede Pública Municipal de Ensino de
Niterói que compunham a Comissão e a realização de uma reunião especial com
representantes das respectivas áreas do conhecimento que participaram da elaboração do
documento analisado.
A Comissão inicialmente ressalta o valor de uma Rede Pública Municipal de Educação
Ensino envidar esforços para a escrita coletiva de seu próprio referencial curricular; reconhece
que o mesmo segue a legislação que envolve a educação pública municipal; observa o
compromisso com o debate democrático, a fidelidade ao debate teórico mais atual e a
complexidade de se redigir um texto com a participação de tantos sujeitos, tantas mãos e em
diferentes etapas.
Oportuno frisar que a construção deste Referencial contou com ampla assessoria de
especialistas da área do Currículo em diálogo com os profissionais da rede, o que não só lhe
confere qualidade e importância, como também legitimidade frente a essa Rede Pública
Municipal de Educação.
Compreendendo que toda proposta curricular traz em si um olhar sobre a história
vivida, tensões do presente e projeções para caminhos a serem trilhados, o Referencial
Curricular de Niterói se apresenta tanto como um documento histórico, quanto orientador das
práticas cotidianas e fomentador de novos estudos, análises e experiências.
Isso posto, essa Comissão recomenda:
1 - A aprovação na íntegra do Referencial Curricular de Niterói;
2 - A entrada em vigor do RCN imediatamente após a sua aprovação e consequente publicação;
230

3 - A elaboração pela SME/FME de um programa de divulgação, socialização e formação sobre


o teor do RCN;
4 - A criação pela SME/FME de uma comissão de acompanhamento da penetrabilidade do
RCN nos fazeres cotidianos das UMEI e EM;
5 - A centralização do acúmulo de debates pela comissão de acompanhamento sobre e a partir
do RCN, provendo as equipes da SME/FME de elementos para a sua futura revisão e
atualização;
6 - A revisão e atualização do RCN após cinco anos da data de sua publicação;
7 - A condução da revisão e atualização do RCN por uma equipe designada para esse fim,
composta por profissionais do quadro permanente da SME/FME, tanto da sede quanto das
unidades de Educação, em amplo diálogo com a Rede;
8 - A criação de um repositório na página/site da SME/FME, a fim de que o conjunto dos
pareceres feitos pelos integrantes desta Comissão e os que foram solicitados a pareceristas
externos seja disponibilizado para os profissionais da Rede e a sociedade, de modo que um
amplo e democrático acesso a esses pareceres seja viabilizado.
9 - A promoção de futuras formações promovidas pela SME/FME durante a implementação e
atualização do RCN sobre os apontamentos e proposições apresentados nos pareceres feitos
pelos integrantes dessa Comissão e os que por ela foram solicitados a pareceristas externos.

III – DECISÃO DO PLENÁRIO

O Plenário aprova o parecer da Comissão Especial sobre os Referenciais Curriculares


da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, indicando a publicação da Deliberação
CME nº 046/2021.
O Colegiado dedica a conclusão deste trabalho à Conselheira Prof. Maria Felisberta
Baptista da Trindade, que participou incansavelmente das discussões, além da luta
empreendida durante toda sua vida pela Educação Pública.

Conselheiros (as):
André Antunes Martins
Evelyn dos Santos Souza
Luiz Fernando Conde Sangenis
Luiz Henrique Mansur Barbosa
Luiza Cristina Rangel Pinto Sassi
Marcela Bittencourt Thomaz de Aquino Escobar
Marco Antonio Konopacki
231

Marta Nidia Varella Gomes Maia


Mauricio Benevides Salkini
Tatiana Ribeiro dos Santos

Sessão Plenária, 29 de novembro de 2021

VINICIUS GOMES WU
PRESIDENTE
232

ANEXO 3 – DELIBERAÇÃO CME Nº 046/2021

PREFEITURA DE NITERÓI
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

ATO DO SECRETÁRIO

O Secretário Municipal de Educação, no uso de suas atribuições legais,


HOMOLOGA:
a Deliberação CME nº 046/2021 do Conselho Municipal de Educação de Niterói, aprovada na
Sessão Plenária do dia 29 de novembro de 2021.

VINÍCIUS GOMES WU
Secretário Municipal de Educação

DELIBERAÇÃO CME Nº 046/202141

Dispõe sobre os Referenciais Curriculares da Rede


Municipal de Educação de Niterói

O CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI, no uso de suas atribuições


legais,

Considerando o art. 11 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96;

Considerando a solicitação de apreciação pelo CME dos Referenciais Curriculares da Rede


Pública Municipal de Educação pela Secretaria Municipal de Educação na Sessão Plenária do
dia 14/12/2020;

Considerando a Deliberação CME n° 045/2021, publicada em 23 de julho de 2021, que


institui a Comissão Especial para análise e pronunciamento sobre os Referenciais Curriculares
da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói;

Considerando o Parecer CME nº 011/2021, que aprova o parecer da Comissão Especial sobre
os Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói.

DELIBERA:

Art. 1º. Ficam aprovados os Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de


Educação de Niterói.

41
Publicada em 24 de dezembro de 2021.
233

Art. 2º. Esta Deliberação entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições
em contrário.

Sessão Plenária, do dia 29 de novembro de 2021.

CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO


VINÍCIUS GOMES WU – Presidente
ANDRÉ ANTUNES MARTINS
EVELYN DOS SANTOS SOUZA
LUIZ FERNANDO CONDE SANGENIS
LUIZ HENRIQUE MANSUR BARBOSA
LUIZA CRISTINA RANGEL PINTO SASSI
MARCELA BITTENCOURT THOMAZ DE AQUINO ESCOBAR
MARCO ANTONIO KONOPACKI
MARTA NIDIA VARELLA GOMES MAIA
MAURICIO BENEVIDES SALKINI
TATIANA RIBEIRO DOS SANTOS
THIAGO SOARES RISSO POSSAS
234

ANEXO 4 – PORTARIAS SME Nº 018/2022 E SME Nº 019/2022

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO


FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
PORTARIA SME Nº 018/202242 43

O SECRETÁRIO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI, no uso das atribuições que


lhe foram conferidas por lei e,
 CONSIDERANDO o Parecer CME nº 011/2021, publicado em 24 de dezembro de 2021,
que aprova o parecer da Comissão Especial sobre os Referenciais Curriculares da Rede
Pública Municipal de Educação de Niterói;
 CONSIDERANDO a Deliberação CME nº 046/2021, publicada em 24 de dezembro de
2021, que dispõe sobre os Referenciais Curriculares da Rede Municipal de Educação de
Niterói.
RESOLVE:
Art. 1º: Instituir a Comissão de Acompanhamento dos Referenciais Curriculares da Rede
Pública Municipal de Educação de Niterói nos fazeres cotidianos das Unidades de Educação e
na sua revisão gráfica para publicação.
Art. 2º: A Comissão será composta pelos seguintes membros, sob a presidência do primeiro: I.
Djenane Luisa Freire Firmino - Mat. 11236568-2 - Subsecretária de Desenvolvimento
Educacional;
II. Cíntia da Luz Rodrigues - Mat. 11234918-1 - Representante do Conselho Municipal de
Educação de Niterói (CMEN);
III. Jessica Fernandes Braga - Mat. 11234280-6 e Carla Cristina Martins da Conceição
Vasconcellos - Mat. 11233150-2 - Representantes da Diretoria de Gestão Escolar;
IV. Fernanda Pinheiro de Macedo - Mat. 11235262-3 e Alessandra da Costa Abreu - Mat.
11235994-1 - Representantes da Diretoria de Educação Infantil;
V. Andréia Mello Rangel - Mat. 11234103-8 e Nathalie D'Oliveira Mendes - Mat. 11236810-
8 - Representantes da Diretoria de 1º e 2º Ciclos;
VI. Lucilaine Maria da Silva Reis - Mat. 11236192-1 e Patrícia Brito de Oliveira Feitosa -
Mat. 11235611-1 - Representantes da Diretoria de 3º e 4º Ciclos;
VII. Silvana Malheiro do Nascimento Gama - Mat. 11234581-7 e Delma Marcelo dos Santos
- Mat. 11235783-8 - Representantes da Diretoria de Articulação Pedagógica;
VIII. Greyce Kelly Fernandes de Almeida - Mat. 11236167-3 e Mônica Pereira da Costa
Ianov - Mat. 11235837-2 - Representantes da Diretoria de Educação de Jovens e Adultos; IX.
Lucienne de Oliveira Jesus Souza - Mat. 11235328-2 e Robson de Souza - Mat. 11236499-0 -
Representantes da Coordenação de Educação Especial;
X. Romana Camarinha Dominguez - Mat. 11218812-6 - Representante da Coordenação de
Supervisão Educacional (COESE);
XI. Carla Sena dos Santos Pinto - Mat. 11232564-5 e Eloisa Fátima Figueiredo Semblano
Gonçalves Mat. 11231293-2 - Representantes da Coordenação de Mídias e Novas
Tecnologias;
XII. Cristiane Gonçalves de Souza - Mat. 11232864-9 e Sandra Cristina Ferreira de Souza
Pastorino de Almeida - Mat. 11234258-2 - Representantes da Coordenação de Educação na
Diferença;
42
Publicada em 08/06/2022.
43
Alterada pela Portaria SME/19/2022 publicada em 23/06/2022.
235

XIII. Maria Cristina Rezende de Campos - Mat. 11232833-4 - Representante da Casa da


Avaliação e Formação.
XIII - Maria Cristina Rezende de Campos, Matrícula n° 11232833-4 e Cristina Ferreira
Gonçalves Padilha, Matrícula 11236133-5 - Representante da Casa da Avaliação e Formação.
(INCLUÍDO PELA PORTARIA SME nº 19/2022)
Art. 3º: Esta Portaria entrará em vigor na data de sua publicação.

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO


PORTARIA n° 019/2022
Art. 1º - INCLUIR as servidoras Maria Cristina Rezende de Campos, Matrícula n° 11232833-
4 e Cristina Ferreira Gonçalves Padilha, Matrícula 11236133-5 na Composição da Comissão
de Acompanhamento dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação
de Niterói, instituída pela Portaria SME nº 018/2022.
Art. 2º - Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

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