Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Educação Infantil - Versão Final
Educação Infantil - Versão Final
Niterói
Dezembro/2022
FICHA TÉCNICA
Diretoria de 1º e 2º ciclos
Andréia Mello Rangel
Diretoria de 3º e 4º ciclos
Camilla Ferreira Souza Alô
Diretoria de Ensino de Jovens e Adultos
Greyce Kelly F. de Almeida
Revisão
Capa
Diagramação
CAPA E DIAGRAMAÇÃO
Tatiana Freire de Moura
Ensino Fundamental
Rosane Cristina Feu Santos
Silvana Malheiro do Nascimento Gama
Educação Infantil
Andreia Viana da Silva Diniz
Cristiane Gonçalves de Souza
Delma Marcelo dos Santos
Eliza Helena Pandino Botelho Leonardo
Fernanda Macieira Bortone
Leda Marina Santos da Silva
Lílian Garcia
Lucimeire Bezerra Costa
Márcia Nico Evangelista
Rosana Ribeiro
Rosângela Motta Dias
Sandra Cristina Ferreira de Sousa
Sirlane Vieira Alves
Sonia de Oliveira Martins
Verônica da Silva Santos
Educação Ambiental
Juliana Martins de Souza
Tecnologias na Aprendizagem
Carla Sena dos Santos Pinto
Eloisa Fatima Figueiredo Semblano Gonçalves
Érika Francisco de Paulo David
Jaqueline Devillart de Macedo
Márcia Luzia Correia de Abreu
Rosangela Aurelia Motta de Alcantara
ARTE
Eires Melo da Silveira (Coordenador – 3º e 4º Ciclos)
Fernanda F. Marques Silva (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Ana Carolina Senos E Santos
Ana Catarina M. C. M. Portugal
André Luiz da Costa Valim
Andrea Santos Alves
Cristiane Rodrigues
Fábio Silva Guimarães
Isabella Ferreira Siqueira
Lisiane de Aguiar Tavares
Marcelo Inagoki Rodrigues
Máslova T. Valença
Paola Queiroz de Figueiredo
Samuel Barreto
CIÊNCIAS
Ana Regina de L. P. Peixoto (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Camilla Ferreira Souza Alô (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Camile Mizumoto
Carmen Pazoto
Cristiane M. Ferreira
Daratilde B. Santana
Deise Fernandes Santos Almeida
Felipe Carvalho de Oliveira
Geisa da Silva Capistrano
João Ricardo Assis
Kelly M. Leal
Stella Maris B. S. Kisse
Thiago Machado da Silva
EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Juliana Martins de Souza (Coordenadora do NAI)
Camilla Ferreira Souza Alô
Carmen Edith Pazoto Mauricio
Carolina da Silva Ribeiro
Cristiane Menezes Ferreira
Fernando Fortunato Faria Ferraz
Janaina Silva de Souza
João Ricardo Assis da Silva
João Carlos Moreira Tristão
Kelly Mauricio Leal
Letícia D'Amato dos Reis Grigorovski
Maíra Jansen Olinisky
Márcia Cristina Palmar de Rezende
Márcia Cristina Soares de Moura Victorino
Renato do Nascimento Moser
Silvia Mauricio Leal
Thiago Machado da Silva
EDUCAÇÃO FÍSICA
Lucia Regina Bessa Voss (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Marise S. C. Fazziola Mendel (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Alexandre Marques da Costa
Aline Fernandes Louzada
Analice Antunes da Fonseca
Andressa Brasil Barbeito de Paula
Antonio Florêncio Braga Monteiro
Cecília Silvano
Diogo Oliveira Gomes
CristovãoElba Mattos Silva Fernandes
Gustavo Oliveira dos Santos
Gutemberg Barros de Moura
Jordão Bruno Neto
Júlio César Araújo da Silva
Laertes Paixão
Luciana Dantas R. Moreira
Luciana dos Santos Aguiar Tavares
Lucineide Vieira Drolhe da Costa
Luiz Felipe Martins Valladão
Marcelo Luiz de Souza
Marlon Torquato de Souza Mattos
Michelle Rodrigues Ferraz Ramos
Paulo César Nayfeld Granja
Ramon Diego Moura Tinoco
Renata de Melo Cardoso Palmares
Renata Fernandes Ramos
Renato do Nascimento Moser
Sandra Souza dos Santos
Silvia Maria Lyrio Figueira Rodrigues
Soyane de Azevedo Vargas do Bonfim
Thiago Coqueiro Mendonça
GEOGRAFIA
Luciano Palmares de Souza (Coordenador – 3º e 4º Ciclos)
Nanaíra da Silva Ferreira (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Angélica Quintanilha J. Devillart Lemos
Aparecida Abreu Ferreira da Silva
Carlos Alexandre Turque Duarte
Helena de Oliveira Silva
João Carlos M. Tristão
Juliana Martins De Souza
Márcia Cristina Palmar
Raphael e Silva Girão
Solange Tubino
Vanderlei Silva Ferreira
HISTÓRIA
Karyne Alves Santos (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Renato Luna (Coordenador – 3º e 4º Ciclos)
Aline de Almeida Hoche
Andreia Coutinho de Andrade Fonseca
Dilma Eunice Marques Silva
Hugo M. Rosa e Silva
Lilian Germano Guimarães
Marcele Moreira de Castro
Marcelo Ramos Duarte
Maria Lucia Cunha do Carmo Lannes
Raphaela de Almeida Santos
Rosiléa Silva Faria
LÍNGUA ESTRANGEIRA
Adjomara Leitão de Souza (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Ana Paula Fernandes (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Patrícia B. de Oliveira Feitosa (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Alice Piza Reis Elizeu
Amanda A. Siqueira Moritz
Ana Carolina da Silva Pinto
Bárbara Cristina de Abreu
Carolina Ecard Barros
Cíntia de Andrade N. Miranda
Fátima Lopes do Amaral Lutfy
Gabrielle O. R. Martins
Isabella S. G. Pereira
Jessica Natarelli
Luciana C. H. Bastos
Luciano do Amaral Silva
Thábata Christina Gomes de Lima
Valéria Teixeira Leite
Vanessa de A. B. A. Pereira
LÍNGUA PORTUGUESA
Fernanda de Araújo Frambach (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Letícia Fernandes Franco (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Adriana Teixeira Lima
Alessandra dos Santos Mendes Oliveira de Souza
Alex Sandro Lins Ramos
Angela Bittencourt Machado
Angélica Araújo da S. Affonso
Daianne Ribeiro
Fabiana Botelho dos Santos
Fernanda de Souza Lima
Homero dos Santos
Janaína S. Souza
Julie Francine S. Braga
Luana Rodrigues Machado
Márcia Luzia Cardoso Carneiro
Mariana Pereira de Oliveira
Marina de M. Lima Barreto
Pamela de Andrade Lima dos Santos
Raphael Cássio de Oliveira Pereira
Renata Vale Ribeiro
Renato Bruno
Robson de Souza (Educação Especial)
Wandréia Lúcia de Souza do Nascimento
MATEMÁTICA
Anne Rocha de Almeida (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Cristiane Custódio S. Andrade (Coordenadora – 1º e 2º Ciclos)
Nice de Oliveira (Coordenadora – 3º e 4º Ciclos)
Alex Fabiano Metello Silva
Bruno de Assis Xarifa
Deiwison Sousa Machado
Diego S.M. Belay
Jessica Folly
João Marcos B. Jucá
Keyla L. Bruck Thedin
Marcia Andrade Oliveira
Maria de Fátima C. Borges
Raphaela Duarte
Rodrigo Pessanha da Cunha
Rosiney de Jesus Ferreira
Vanessa Nunes de Souza
II - Representantes Especialistas:
Aline Javarini
Andréia Mello Rangel
Carla Sena dos Santos Pinto
Cristiane Gonçalves de Souza
Delma Marcelo dos Santos
Elana Cristiana dos Santos Costa
Juliana Martins de Souza
Lívia Moraes Ornelas
Luciana Laureano Costa
Roberta Teixeira de Souza
Rosane Cristina Feu
APRESENTAÇÃO ................................................................................................................. 26
PARTE I
1. CURRÍCULO E MOVIMENTOS INSTITUINTES ....................................................... 29
2. MOVIMENTO PARA ELABORAÇÃO DOS REFERENCIAIS CURRICULARES
DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI ............................. 34
3. EDUCAÇÃO E INCLUSÃO: DIREITOS DE TODOS .................................................. 44
3.1 Por que é lei .................................................................................................................. 45
3.2 Por que as vivências são as ações modeladoras do ato de aprender ....................... 47
3.3 Por que a escola continua sendo o espaço no qual se é possível viver a experiência
da aprendizagem ................................................................................................................ 48
4. EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA: PERSPECTIVAS
CURRICULARES EM CONSTRUÇÃO ............................................................................. 49
5. CURRÍCULO, CULTURA E DIFERENÇA ................................................................... 55
6. A LEITURA LITERÁRIA E A FORMAÇÃO DO LEITOR-AUTOR NA REDE
PÚBLICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE NITERÓI ................................................ 59
7. EDUCAÇÃO AMBIENTAL ............................................................................................. 66
7.1 Educação em riscos ambientais .................................................................................. 70
8. TECNOLOGIAS NA APRENDIZAGEM ....................................................................... 72
8.1 Sociedade contemporânea ........................................................................................... 72
8.2 Sociedade em rede ........................................................................................................ 74
8.3 Cultura digital .............................................................................................................. 75
8.4 Infância e juventude na educação contemporânea .................................................... 76
8.5 Redefinição dos espaços e tempos da escola .............................................................. 78
8.6 Metodologias Ativas da Aprendizagem ..................................................................... 79
8.7 Considerações finais .................................................................................................... 83
9. AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E DA APRENDIZAGEM ....................................... 83
10. CONSIDERAÇÕES SOBRE A TRANSIÇÃO ENTRE CICLOS ............................... 88
11. CICLOS DO ENSINO FUNDAMENTAL ..................................................................... 91
11.1 A Trajetória da Revisão Curricular no Ensino Fundamental ............................. 101
11.2 Leitura e devolutiva das Unidades de Educação................................................... 104
12. REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 105
PARTE II
EDUCAÇÃO INFANTIL .................................................................................................... 114
1. CAMINHOS TRILHADOS ............................................................................................. 115
2. PELOS FIOS DA HISTÓRIA ......................................................................................... 117
2.1 A Rede Pública Municipal de Educação Infantil de Niterói .................................. 121
3. O CICLO INFANTIL ...................................................................................................... 129
3.1 Crianças e infâncias ................................................................................................... 130
3.2 Os Ciclos infantis: da inserção à transição para o Ensino Fundamental ............. 136
4. DOCENTES DA EDUCAÇÃO INFANTIL ................................................................... 139
4.1 Bidocência: desafio de uma caminhada conjunta ................................................... 146
4.2 Docências: interlocuções essenciais .......................................................................... 148
5. DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA ............................................................................ 151
5.1 Avaliação na Educação Infantil ................................................................................ 152
5.2 Relatório avaliativo individual no ciclo infantil ...................................................... 155
6. A COMPOSIÇÃO CURRICULAR ................................................................................ 157
6.1 Eixos Orientadores das Práticas Curriculares na Educação Infantil ................... 162
6.2 Pressupostos ............................................................................................................... 168
I - Cuidar como Compromisso Ético, Estético e Político ............................................. 168
II - Espaço e Tempo para as Infâncias ........................................................................... 171
III - Autonomia e Autoria ............................................................................................... 174
IV - Sensibilidade e Afetividade ..................................................................................... 177
V - Dimensão Cidadã ....................................................................................................... 179
VI - Infâncias e Natureza ................................................................................................ 181
VII - Pesquisa e Experiência ........................................................................................... 185
VIII - Múltiplas Linguagens ........................................................................................... 190
IX - Diferença, Culturas e Singularidades..................................................................... 203
“Natureza da gente não cabe em nenhuma certeza.” ................................................... 205
7. MATRIZ ORIENTADORA ............................................................................................ 208
8. REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 216
ANEXOS ............................................................................................................................... 224
ANEXO 1 – DELIBERAÇÃO CME nº 045/2021 .............................................................. 225
ANEXO 2 – PARECER CME Nº 011/2021 ........................................................................ 227
ANEXO 3 – DELIBERAÇÃO CME Nº 046/2021 ............................................................. 232
ANEXO 4 – PORTARIAS SME Nº 018/2022 E SME Nº 019/2022.................................. 234
26
APRESENTAÇÃO1
1
Documentos referentes à Minuta dos Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de
Niterói.
27
PARTE I
29
Nessa trajetória de discussão e revisão dos Referenciais Curriculares, estava claro desde
o início que não buscaríamos a univocidade teórica, ainda que fôssemos, inúmeras vezes,
questionados sem definir qual seria a teorização curricular predominante nos Referenciais
Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói. Nossa resposta sempre
apontava para o entendimento do currículo como instituinte de sentidos, e que esses sentidos
estavam em disputa na luta pela significação curricular e que qualquer tentativa de fixação
seria fadada ao fracasso, pois os processos de significação não cessam. Cabe esclarecer
também que não defendemos a ideia de que qualquer currículo é válido, mas acreditamos que
a construção do documento curricular de uma rede deve ser realizada a partir de uma agenda
política, na qual cada unidade escolar e seu coletivo tenham participação e, neste processo
relacional de construção, enfraquecermos uma única possibilidade de definição e apostarmos
na negociação de diferentes possibilidades de significação.
Partindo do conceito de um currículo sem fundamentos (LOPES, 2015), apresentamos
ao debate uma possibilidade de pensar a proposta de currículo, de modo a não garantir uma
fixação que não seja passível de desestabilizações. Se entendermos o currículo como um texto
que será lido e traduzido cotidianamente, e assim disputando as significações sobre as práticas
curriculares: como vamos ensinar? Quais conteúdos e conhecimentos serão escolhidos? Para
quais finalidades sociais o currículo deve preparar os alunos? Ainda assim, temos pontos
consensuais sobre quais conteúdos que são importantes ser ensinados (a língua materna, por
exemplo), temos uma tradição do pensamento curricular que tem traços hegemônicos, como a
importância do planejamento e dos objetivos, com base na racionalidade tyleriana e das
disciplinas escolares que determinam a organização da grade curricular.
Desse modo, práticas instituintes são incorporadas ao instituído, promovendo na
política curricular movimentos que podem reforçar os processos de fixação, mas também
outros movimentos que desestabilizam significados, produzindo novos sentidos, tornando a
política curricular e a produção de currículos espaço de criação, em constante fluxo entre
permanência e mudança.
2
VELOSO, Caetano. Gente. Intérprete: Caetano Veloso. In: Caetano Veloso. Bicho. Rio de Janeiro: Philips. 1
disco sonoro (LP). Lado A, faixa 3. 1977.
33
Sensibilizados por esta epígrafe de abertura, em que Walter Kohan (2019, p. 160) nos
inspira a pensar a educação rememorando Paulo Freire, voltamo-nos aos ensejos de revisão do
documento curricular da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, um convite que nos
instiga a mobilizar sentidos sobre o lugar da pergunta, da provisoriedade do conhecimento,
dos processos discursivos que redimensionam as produções curriculares, as relações escolares
que impulsionam o aprender a aprender com a ciência, a arte, a poesia, a dimensão cultural da
vida, frente ao imprevisível (inesperado) com o qual nos deparamos diariamente dentro e fora
da escola. Esses são horizontes que provocam a construção destes Referenciais Curriculares.
Ao nos debruçarmos neste intento, muitos desafios estão postos, entre eles: mobilizar
sentidos junto aos profissionais da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói e a
comunidade escolar; produzir um documento que dialogue com o documento curricular
anterior, visto que politicamente, este também passou por processos democráticos para sua
elaboração e contempla narrativas potentes quanto ao trabalho pedagógico desta Rede; e
como construir um documento curricular que, ao afirmar sentidos, mesmo que provisórios,
não congele práticas pedagógicas, nem conduza a um controle, a uma regulação que restrinja
experiências e sentidos da prática educativa.
Consideramos relevante destacar que, frente aos desafios, observamos, como potência
durante esta construção, o seu processo de elaboração, ocorrido ao longo dos anos de 2019 e
2020, com a possibilidade de favorecer encontros pedagógicos e amplas trocas para, desse
modo, fortalecermos o debate e o nosso diálogo enquanto coletivo da Rede.
A produção deste movimento de discussão curricular, desde o seu início, assumiu o
compromisso de abraçar os desafios da Educação Pública Municipal como pertinente a todo o
coletivo que o protagoniza. Contudo, sem pretender abarcar todo o movimento de corrente
desta revisão curricular, a seguir, apresentamos marcos deste processo, ações e
desdobramentos.
No final de 2018, a Assessoria Especial de Articulação Pedagógica foi mobilizada
para construir junto a Rede Pública Municipal de Educação de Niterói um movimento
coletivo para revisão do documento curricular de 2010. Identificamos como argumentos para
35
revisão dos Referenciais Curriculares para a Rede Municipal de Ensino de Niterói: uma
construção coletiva/2010, mudanças do contexto político, social e educacional após dez anos
de sua elaboração; demanda para revisão do documento, apresentada por Diretores/as e
Pedagogos/as frente à complexidade do cotidiano escolar em reunião com a Assessoria
Especial de Articulação Pedagógica, no dia 08 de outubro de 2018; necessidade de mobilizar
discussões entre os profissionais da rede e a comunidade escolar, para que através de processo
participativo e deliberativo, fosse produzido documento curricular que nos fortalecesse
enquanto Rede Pública Municipal de Educação, em consonância com as Diretrizes
Curriculares da Educação Básica, passando pelo estudo sobre a Base Nacional Comum
Curricular (BNCC). Pensamos que ao firmarmos neste documento nossas escolhas
pedagógicas, ele poderá favorecer a tomada de decisão por parte de instâncias macro para
proposição de políticas curriculares negociadas.
Podemos citar como alguns dos objetivos para realizar este movimento: fomentar o
debate sobre as produções curriculares e a possibilidade do registro destes sentidos para nos
compreendermos como Rede Pública Municipal de Educação; aprimorar o trabalho
pedagógico para Educação com crianças, adolescentes, jovens e adultos em fomento às
aprendizagens e ao desenvolvimento pelas Ciências, Artes e Tecnologias; valorizar as
produções de saberes locais, outras epistemologias, as negociações de sentidos; fortalecer
através de processos formativos, a alteridade, a diferença, culturas e meio ambiente; favorecer
a integração entre os segmentos; envolver a comunidade escolar quanto ao sentimento de
corresponsabilidade e parceria frente aos desafios da educação; incentivar o protagonismo
docente e discente pelos princípios éticos, políticos e estéticos.
Durante os anos de 2019 e 2020, podemos considerar como tônica da elaboração deste
documento sua articulação com os processos formativos e o diálogo constante entre a
Educação Básica e o Ensino Superior, com a colaboração de diferentes grupos de pesquisa.
Em 2019, o processo voltou-se para uma dinâmica de mobilização e a simultaneidade
de cursos e encontros voltados para revisão da versão anterior e para a escrita do documento
curricular. Já no início de 2020, a versão preliminar foi encaminhada para as escolas,
solicitando a participação destas através de pareceres que envolvessem toda a comunidade
escolar. Concomitantemente à elaboração destes pareceres por parte das Unidades de
Educação, as formações na Rede foram acontecendo por meio de encontros on-line (em
decorrência da situação pandêmica instaurada durante este ano) como propósito da análise da
versão preliminar.
36
3
Este foi um primeiro movimento de escrita do texto para os Referenciais Curriculares, que, ao ser encaminhado
para as Unidades de Educação em 2020, passou por modificações em diálogos com a Rede, até assumir a
versão Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói entregue ao Conselho
Municipal de Educação em 14 de dezembro de 2020.
38
Ciclos e
Instituição/Coordenador(es) Evento Modalidades para Datas
formação docente
22/05, 29/05,
12/06, 19/06,
PROPED/UERJ e UFRJ 03/07, 10/07,
Prof. Dr. Guilherme Augusto Educação Infantil 14/08, 28/08,
Curso de Extensão:
e Ensino 11/09,
Rezende Lemos Produção Curricular
Fundamental 25/09,09/10,
Prof. Dr. Thiago Ranniery 16/10, 13/11,
27/11, 04/12 e
11/12/2019
UNIRIO (Grupos de pesquisa
NINA e GITAKA)
03/04, 17/04,
Prof.ª Dra. Léa Tiriba Curso: Infâncias, Natureza 12/06,14/08,
Educação Infantil
e Artes 18/09, 16/10 e
13/11/2019
Diálogos sobre os
Referenciais Curriculares da
Professor Convidado Instituição Data
Rede Pública Municipal de
Educação de Niterói
Secretaria
Municipal de
Prof.ª Dra. Denise Souza
Educação de Educação Física 04/09/2020
Destro
Juiz de
Fora/MG
Prof.ª Dra. Cecília Goulart
UFF Alfabetização na Perspectiva
Prof.ª Dra. Maria Cristina 04/09/2020
IFRJ Discursiva
Corais
Leitura e Escrita na Educação
Prof.ª Dra. Bruna Molisani FFP/UERJ Infantil: a criança como sujeito 10/09/2020
da linguagem
Prof.ª Dra. Andrea Vieira
UNIRIO Matemática 14/09/2020
Thees
Setor da
Integrante da Equipe Formação
SEMECT/FME
Diretoria de Educação
Prof.ª M.ª Fernanda Bortone “Bidocência na Educação Infantil”
Infantil
Diretoria de Educação Prof.ª Delma Marcelo dos “Trabalho Pedagógico da/na Educação
Infantil Santos Infantil em Niterói”
44
Diretoria de Educação
Prof.ª Lucimeire Bezerra Costa “Desenvolvimento Infantil”
Infantil
4
A PEC 25/2017 muda na Constituição Federal. Expressões como “pessoa portadora de deficiência” ou
“portador de deficiência” serão substituídos por “pessoa com deficiência”. A PEC padroniza o termo em 10
artigos da Carta Maior. A padronização segue a Convenção Internacional sobre o Direito das Pessoas com
Deficiência, da Organização das Nações Unidas, criada em 2006.
47
Antes desta Lei, a visão que existia era de que a deficiência era uma condição das pessoas.
Hoje, ela é entendida como uma situação dos espaços (físicos ou sociais), que não estão
prontos para recebê-las. A tendência atual é enxergar, cada vez mais, a educação como
inclusiva e, cada vez menos, como especial. Isso significa que as metodologias, espaços e
materiais devem ser capazes de atender a todos, ao longo da vida e com foco na
potencialidade, segundo o art. 27 da LBI:
3.3 Por que a escola continua sendo o espaço no qual se é possível viver a experiência da
aprendizagem
chegada, que a transformação acontece, ainda que as críticas aos fazeres da escola como
produtores de indivíduos para o trabalho sejam cada vez mais acirradas. É em meio às críticas
que se insere a luta por acessibilidade e inclusão.
importância da difusão das ideias e da implementação das práticas que corroborem com o
princípio de sua universalidade.
Com base nessa perspectiva de análise, concebem-se as políticas educacionais do
município de Niterói, articuladas com a proposta da Educação em Direitos Humanos. Parte-se
do princípio de que tais políticas pautam-se nas mudanças das práticas sociais oriundas da luta
do movimento social e coletivo por meio de uma práxis dialógica, e que, portanto, traz em
seus atributos os valores de relações com horizontalidade e a igualdade sob a ótica da
dimensão humana em sua essência.
Como destacado anteriormente, a dimensão de uma cultura de Direitos Humanos é
historicamente recente e tem se constituído um campo fértil para o aprofundamento de
reflexões, especificamente sobre o papel da escola, locus privilegiado para o desenvolvimento
de uma sociedade mais fraterna, justa e igualitária.
As discussões sobre o tema têm adquirido importantes direcionamentos no debate
nacional e, apesar da complexidade que ele envolve e das ideias que não se confluem, as
discussões representam um esforço assentado na racionalidade contínua para o trato devido
das questões que envolvem as pautas da educação pública.
Ressalta-se que a formação da Educação em Direitos Humanos não se limita, portanto,
ao campo cognitivo das aprendizagens, direcionando-se também aos valores de
comportamentos, das relações e respostas frente aos desafios da vida cotidiana escolar.
Estudos de Candau (2007) contribuem para o aprimoramento do debate sobre os
direitos humanos, levando-nos a compreendê-los como um processo histórico dinâmico,
contraditório e complexo. A difusão desta concepção no campo das ideias pode ser localizada
em um conjunto de outros estudos que nos fornecem elementos contundentes, sobretudo para
repensarmos, na perspectiva curricular, os caminhos teórico-metodológicos que orientam as
práticas pedagógicas.
As experiências de Educação em Direitos Humanos têm se multiplicado ao longo de
todo o continente latino-americano. A partir das informações disponíveis, constatamos que a
maior parte delas tem sido realizada em âmbitos de educação não formal, aspecto
tradicionalmente privilegiado pela educação popular (Ibid., p. 401).
Com base nesses argumentos, considera-se que, historicamente, o Brasil é um país
ainda jovem, em processo de reconhecimento e de consolidação dos direitos humanos e da
cidadania pela via das políticas públicas, buscando, gradualmente, assegurar que todos os
indivíduos sejam reconhecidos em sua dignidade e múltiplas formas de expressão da
diversidade.
53
A leitura pulsa em nós desde a tenra idade. Lemos o movimento das folhas das
árvores, o vai e vem das ondas do mar, as cores do céu, o olhar e os gestos daqueles que
colorem nossas vidas. Afinal, não se leem apenas letras e livros, lê-se o mundo em toda a sua
complexidade. Lemos “o verde da manga-espada verde, o verde da manga-espada inchada, o
amarelo-esverdeado da mesma manga amadurecendo, as pintas negras da manga mais além de
madura” (FREIRE, 2003, p. 13). Lemos o verde das matas ameaçadas, o verde da bandeira, o
verde-esperança pintado nos quadros. A noção ampliada de texto que aqui trazemos nos
conduz a compreender a leitura enquanto produção de sentidos. O ato de ler se descortina em
nossas experiências por meio das múltiplas linguagens que nos circundam. O clássico texto A
importância do ato de ler, de Paulo Freire (FREIRE, 2003), mobiliza-nos na defesa pela
60
leitura para além das palavras escritas. A leitura, nessa concepção, possibilita-nos uma
diferenciada relação como outro e com o mundo.
Na perspectiva da leitura como ato interativo, em que esta pode ser sentida, indagada e
refletida, encontramos o ato de ler sendo produzido por meio do diálogo entre leitor-texto-
autor. Este entrelace dialógico, em que discursos disputam espaço, pois implica valores
ideológicos, tensão e diferentes pontos de vista sobre o mundo, pode promover
desdobramentos de sentidos, além de desencadear no leitor uma “compreensão ativamente
responsiva” (BAKHTIN, 2011, p. 272).
Essa compreensão a respeito da leitura ancora-se nos estudos do filósofo Mikhail
Bakhtin (2006, 2011), para quem o indivíduo, ao ler, o faz como um participante real do ato
de ler, e não como um leitor passivo. O leitor traz significações externas para o interior do
texto e produz, explícita ou implicitamente, uma resposta, uma concordância ou objeção ao
que se lê (SILVA, 2016; MORAIS & SILVA, 2015).
Perspectivando, portanto, a leitura por esse viés, ressalta-se o processo dialógico-
interativo nas esferas de uso da linguagem e, desse modo, a categoria básica de concepção de
linguagem de Bakhtin (2006, 2011), a interação verbal, cuja realidade fundamental é seu
caráter dialógico. O sentido do enunciado se dá por meio de uma compreensão responsiva
ativa entre sujeitos, a partir da interação. O enunciado se constitui como uma unidade de
comunicação e significação, inserido em um determinado contexto, podendo ser atualizado
muitas vezes. A cada nova situação, ganha um novo sentido em função do contexto de
produção, gerando diversas possibilidades de ressignificação, pois uma enunciação sempre
pressupõe outras enunciações que a antecederam e que lhe sucederão, visto que ela constitui
apenas um elo na cadeia da interação verbal.
Assim, uma enunciação concreta, produzida de modo significativo em um dado
momento social e histórico, não deixa de atingir os muitos fios dialógicos existentes.
Qualquer campo de produção da linguagem está repleto de relações dialógicas. O dialogismo
está no cerne da linguagem, é parte integrante de todo processo de comunicação, conforme
salienta o filósofo do diálogo, que destaca que toda enunciação, mesmo na forma imobilizada
da escrita, é uma resposta, não passando de um elo da cadeia dos atos de fala, pois toda
inscrição prolonga aquelas que a precederam, travando uma polêmica com elas, pois “conta
com as reações ativas da compreensão, antecipa-as” (BAKHTIN, 2006, p. 99).
Desse modo, “para que a educação seja de fato um espaço pleno de significados e
aprendizagens, é importante não esquecer que é na interação com o outro e com o mundo que
se constrói o conhecimento e se compreende a realidade” (E. M. EULÁLIA DA SILVEIRA
61
5
No decorrer deste documento, serão apresentadas citações de pareceres ou de grupos de trabalho (GTs)
realizados pelos profissionais em suas Unidades de Educação da Rede Pública Municipal de Educação de
Niterói. Ressalte-se que todos os pareceres e estudos dos GTs estão disponíveis no Conselho Municipal de
Educação para consulta.
62
[...] ser autor significa dizer a própria palavra, cunhar nela sua marca pessoal
e marcar-se a si e aos outros pela palavra dita, gritada, sonhada, grafada...
Ser autor significa resgatar a possibilidade de “ser humano”, de agir
coletivamente pelo que caracteriza e distingue os homens... Ser autor
significa produzir com e para o outro... (KRAMER, 1993, p. 83).
escritos. Esse encontro acontece, na maioria das vezes, no ambiente escolar, pois, para muitos
de nossos alunos, a escola torna-se o local privilegiado de encontro com o texto literário.
Portanto, “o livro precisa ser manuseado, lido, relido, ‘amassado’, consumido. Um livro
fechado, em cima de uma prateleira é só um monte de papel cheio de poeira e ácaros. Um
livro aberto na mão de um leitor é a entrada em um universo de possibilidades sem sair do
lugar” (UMEI PROFESSOR IGUATEMI COQUINOT DE ALCÂNTARA NUNES/Parecer,
2020).
Defendemos a presença da literatura, enquanto experiência, desde o início da
Educação Infantil até o final do Ensino Fundamental. Concordamos que os livros literários e
de diferentes gêneros precisam ser disponibilizados pelas instituições, tanto para uso no
próprio espaço escolar, quanto para empréstimo responsável para as crianças e suas famílias.
Os livros ainda se constituem como artigos de difícil acesso para uma parcela da população
brasileira. “A escola, desse modo, poderá agir como mediadora entre as crianças, as famílias e
os livros, fomentando contextos de leitura” (E. M. JOÃO BRAZIL/Parecer, 2020) em todos
os componentes curriculares, como uma leitura que gere reflexão, fruição, que exista para
além do momento em que foi realizada, que se converta em experiência.
A leitura constitui um elemento essencial na formação do aluno, pois é capaz de levá-
lo a desenvolver a reflexão e a capacidade crítica, sendo também uma prática que contribui
para o processo de reconhecimento de si mesmo e do outro. A leitura, mais do que um mero
exercício que desenvolve o nível intelectual do indivíduo, possibilita a ampliação da leitura de
mundo, o crescimento interior, a vivência de diferentes experiências que aguçarão emoções e
sentimentos. Por meio da leitura, o ser humano não só adquire conhecimento, como também
pode transformá-lo, em um processo contínuo de construção e aprimoramento. Ler é criar
uma teia de sentidos que se diferencia de leitor para leitor, é interagir com o texto e lhe
atribuir sentidos, em um contínuo processo dialógico.
A leitura, assim, está associada à criação, à interação, à multiplicidade de sentidos e,
portanto, contribui para o desenvolvimento da reflexão e da capacidade crítica do sujeito, não
podendo ser concebida como prática mecânica de decodificação. Ler não se associa à
passividade e à aquiescência, mas refere-se à partilha, à interação, à atribuição de sentidos, ao
processo de tecer argumentos e pontos de vista, à revisão de conceitos e quebra de
preconceitos. A leitura traz respostas, mas também faz nascer novas perguntas, amplia a
percepção, aguça o olhar, sensibiliza.
E o professor, também ele leitor-autor, mediador nesse processo de formação, buscará,
por meio da literatura, independentemente da etapa de ensino e do componente curricular com
64
o qual esteja trabalhando, contribuir com a formação crítica que vise à “autorização” dos
sujeitos e ao aprofundamento de suas leituras, que possibilite que esses sujeitos escrevam e se
inscrevam no mundo, ética e esteticamente.
Assim sendo, compreende-se que a leitura e seus sentidos não se encontram nem no
texto, nem fora dele, mas na relação, no processo de interação que se estabelece entre aquele
que escreve e aquele que lê, mediado pelo texto e, nesse processo, entram em cena, também,
outros mediadores, bem como outros sujeitos que podem compor as interações de leitura:
professor-educando, educando-educando, educando-bibliotecário etc. Dessa forma, é
importante destacar que o trabalho com a literatura não está restrito apenas ao planejamento
do professor de língua portuguesa, do professor da Sala de Leitura e daqueles cuja atribuição
está mais explicitamente direcionada ao texto literário. A leitura é uma responsabilidade de
todo professor. A literatura refere-se à vida e é um direito inalienável do sujeito (CANDIDO,
1989). A leitura é um ato político, ético e estético, e nossa função enquanto escola pública
direciona-se à formação de leitores-autores críticos, reflexivos e conscientes de seu papel
social no contexto em que vivemos e atuamos.
A literatura infantil precisa estar presente entre as crianças desde os primeiros anos de
vida. A criança, desde cedo, já demonstra interesse em ouvir a leitura de um poema ou uma
história bem contada, em manusear um livro bem ilustrado. A literatura tem o poder de
despertar o encantamento, trabalhar o imaginário, sensibilizar, mobilizar o mundo interior do
indivíduo. Defendemos, portanto, a presença do texto literário desde a creche. Salutto (2017)
salienta que a Educação Infantil pode ser um lugar de liberdade para se ter acesso à cultura
escrita, para vivê-la ampla e plenamente. E pensar a leitura literária na Educação Infantil
significa “compreendê-la como um lugar de relações, de brincadeiras, de produção de sentido,
de conhecimento de si e do outro, de constituição da subjetividade, de ampliação das
experiências e, também, de imersão na cultura escrita”, sem o propósito de alfabetizar. Nessa
direção, acreditamos que a literatura precisa estar presente na Educação Infantil como relação,
troca, ampliação, jogo, ludicidade, imaginação, criação (SALUTTO, 2017, p. 28).
Eliana Yunes e Glória Pondé (1988) afirmam que a literatura assume um papel
político muito mais amplo, deixando de ser mero sinal de erudição para “contribuir para a
formação do pensamento crítico e atuar como instrumento de reflexão, uma vez que pode
questionar, através de sua linguagem, a hegemonia do discurso oficial e o consenso
estabelecido pela ideologia dominante” (YUNES & PONDÉ, 1988, p. 37). Desse modo,
compreendemos a “força democratizadora da leitura”, sabendo que a literatura influencia não
apenas o aprendizado linguístico, mas contribui para o desenvolvimento da criticidade, da
busca por respostas divergentes do senso comum, o que significa trabalhar o imaginário, a
criatividade sobre o uso da linguagem e também para a vida, a ampliação do olhar, a criação
de outras perspectivas, o pensamento divergente, a luta por justiça social.
66
A partir de nossas experiências, cremos que “a criança que ouve literatura se apaixona
pela leitura e pela escrita. Logo, o professor tem que ser leitor. Devemos olhar para a
literatura como um tesouro” (E. M. SEBASTIANA GONÇALVES PINHO/Parecer, 2020). A
literatura nos auxilia no processo de formação do leitor crítico, aquele que não é apenas um
decifrador de sinais, um decodificador de palavras, mas alguém capaz de decifrar a palavra
enquanto signo ideológico, ler a sua própria história, os implícitos e as entrelinhas da História.
A arte nos leva a questionar o mundo:
7. EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Nesta nova fase, percebe-se um enorme desapego que, outrora, permeava as relações
entre homem e natureza: o cerne do respeito, que se concentra o direito de ser e de existir. Na
nova realidade, o dominar o ambiente ecoa sem preocupações significativas nos
desdobramentos e, com isso, os impactos são os mais devastadores possíveis, principalmente
quando se compreende que o ambiente trata devida.
A produção de resíduos aumenta substancialmente, os espaços vão sendo suprimidos,
a ocupação e o uso do solo ganham novas dimensões, o ar e a água ficam cada vez mais
poluídos, ações políticas desbravam para um ecogenocídio, não se respeitam as
individualidades, as diversidades dos povos, culturas e gerações, os seres humanos vão
caminhando sem olhar para as pegadas que estão deixando e que implicarão, cada vez mais, a
própria dinâmica do existir. Abandona-se o ouvir os outros, as tradições que, por séculos,
foram construídas e passadas para os que chegavam, em detrimento do domínio dos espaços
e, consequentemente, das naturezas presentes. O lugar do outro não importa mais, as diversas
manifestações culturais e identitárias não se aplicam se não couberem em um sistema rígido
de um desenvolvimento desigual e combinado.
Em um momento em que se privilegia a cultura das monoculturas nos campos, busca-
se formar também uma monocultura de pensamentos, na qual o que é real para todos que
promovem a mega sociodiversidade, que enriquece e enobrece as dinâmicas ambientais por
conta do enorme acervo de conhecimentos acumulados por meio das experiências, não é
respeitado. O que passa a ter respeito são os interesses individuais e as especulações, que
acabam por fomentar os abismos existentes entre as pessoas e a natureza. Quando falamos
com o outro, pensamos em toda a biodiversidade que nos cerca. Entendemos que não somos
dominadores dessa biodiversidade, mas sim parte integrante desse todo, que precisamos estar
em um constante equilíbrio. Essa falta do outro acaba promovendo o aumento dos
desequilíbrios que vivenciamos.
Ainda no século presente, emerge um conceito que, para muitos, surge como uma
possibilidade de mudança e, para outros, como mais uma forma de promover-se diante do
sistema para fomentar ainda mais os abismos da sociedade e do ambiente, o conceito de
desenvolvimento sustentável.
É fato que se deve pensar no desenvolvimento sem que se comprometam as gerações
futuras, mas o uso do discurso não pode ficar no campo das falácias. Ao tratarmos de temas
que envolvem propostas sobre as questões ambientais, quase sempre emergem discussões e
trabalhos ligados à reciclagem, porém cabe problematizarmos diversas questões assim como
esta, para além do óbvio, do que é perceptível, como nesse caso, para além do
69
erosão, colapsos de solo etc.) e riscos biológicos às questões associadas à fauna e à flora. É
importante a compreensão de que um mesmo tipo de fenômeno natural pode ocasionar
impactos negativos e riscos com níveis diferentes sobre a população.
Faz-se necessário e urgente ampliar a discussão acerca da temática e, dentro desta
premissa, as escolas se tornam lócus privilegiado para tal ação. Os docentes, além de terem a
facilidade das múltiplas linguagens para atingir diferentes faixas etárias e saberem como
conduzir o processo de forma significativa para alcançar os objetivos junto aos alunos, podem
favorecer uma educação pautada nos riscos que podem surgir do ambiente e assim mitigar,
através da cultura de prevenção, tanto a degradação ambiental quanto a minimização de
perdas e danos.
Educar é um ato político, pois, ao assumir o compromisso com o outro, estamos no
processo de construção deste, para que possa ser sujeito da sua história e do seu processo de
aprendizagem, fazendo a leitura do mundo, devendo compreender ações que possibilitem a
construção de autonomia, para que a educação seja também uma forma de intervenção no
mundo (FREIRE, 1996). Nessa perspectiva, compreender a educação passa necessariamente
por entender a dimensão da vida e das relações que se estabelecem. Dessa forma,
compreende-se que a educação para riscos ambientais, além de necessária por tudo que já fora
exposto, é também parte do processo de emancipação dos sujeitos, da formação de atores
críticos e reflexivos na construção do seu existir e de onde estão inseridos.
Podemos, então, ressaltar que a Educação Ambiental atua diretamente na busca de
atitudes positivas para o cuidado com o ambiente e o próprio existir. Assim sendo, oferece
parâmetros para a busca de estratégias educativas. Pensar na Educação Ambiental e ampliar
sua discussão para uma educação para riscos ambientais junto à comunidade escolar podem se
tornar um importante agente social no trabalho de uma cultura de prevenção e transformação.
Pode ainda levar ao entendimento do ambiente em suas mais variadas complexidades,
contribuindo para a formação de um cidadão consciente da realidade que o cerca e a
possibilidade de um futuro diferenciado para as gerações futuras no que tange às questões
socioambientais.
8. TECNOLOGIAS NA APRENDIZAGEM
6
O conceito foi introduzido pelo sociólogo e professor emérito da Universidade de Harvard Daniel Bell na sua
obra The Coming of Post Industrial Society: A Venture in Social Forecasting, de1973.
7
Também conhecida como era digital ou era tecnológica, é o nome dado ao período que vem após a era
industrial, mais especificamente após a década de 1980.
8
“a própria noção de máquina que está sendo definitivamente substituída por um agenciamento instável e
complicado de circuitos, órgãos, aparelhos diversos, camadas de programas, interfaces, cada parte podendo,
por sua vez, decompor-se em redes de interfaces” (SANTAELLA, 1997, p. 41).
74
Esses diferentes contornos permitem aos sujeitos se engajarem nos modos como a
informação é veiculada, interferindo em sua forma e conteúdo. Como André Lemos (2007)
aponta, nos seus estudos sobre cibercultura, os sujeitos antes apenas receptores, agora são
produtores de mídias informativas e transitam entre os polos “emissão” e “recepção”. A
liberação do polo de emissão9 possibilita que pessoas comuns sejam capazes de produzir e
emitir suas próprias informações, por meio de diferentes formatos midiáticos, como
fotografias, vídeos ou podcasts. Hjarvard (2014, p. 23)10 sugere que como resultado dessa
liberação “várias formas de mídia foram integradas nas práticas da vida cotidiana, desde os
locais de trabalho até na família”, evidenciando uma estreita relação entre as mudanças
ocorridas nas esferas socioculturais. Dessa forma, torna-se fundamental a problematização,
junto aos educandos, dos usos e conteúdos produzidos e emitidos tanto nas mídias de massa
quanto nas mídias sociais, no contexto escolar.
9
A liberação do polo de emissão é o princípio básico da cultura pós-massiva e a principal característica da
cibercultura (LEMOS, 2007).
10
“(internet, telefones móveis, televisão via satélite etc.)” (HJARVARD, 2014, p. 23).
75
Não há como negar que a cultura digital vem sendo muito utilizada por crianças e
jovens na contemporaneidade e que esse elemento se faz presente nos seus processos
cotidianos de aprendizagem. Uma das discussões mais importantes da educação é a garantia
da construção do conhecimento. Marco Silva (2015) aponta que, para garantir uma
aprendizagem colaborativa, é essencial uma abordagem inspirada no construtivismo e no
interacionismo: “De acordo com esses referenciais, a aprendizagem acontece na interação dos
aprendizes entre si e na interação com os conteúdos, com os objetos de aprendizagem” (Ibid.,
p .46). Para garantir a construção da mediação da aprendizagem, o docente tem “a seu favor
expressão livre e plural da autoria, compartilhamento, conectividade, colaboração, autonomia,
76
11
Em todos os componentes curriculares, diversas habilidades fazem menção explícita à tecnologia.
12
As Competências Gerais da BNCC “articulam-se na construção de conhecimentos, no desenvolvimento de
habilidades e na formação de atitudes e valores, nos termos da LDB” (BRASIL, 2019, p. 9).
13
Competência 4.
14
Competência 5.
77
O jovem imerso nesta era digital já não apenas se comporta de forma diferente, mas
também pensa diferente. A dinâmica das redes potencializa esse jovem no sentido de criar,
simular, emitir sua opinião, criticar, construir e desconstruir o mundo em tempo real.
Ao considerarmos a imersão das crianças e jovens na cultura digital na sociedade
contemporânea, é válido consultar as orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e
da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) com referência ao tempo de exposição a telas por
parte desses sujeitos.
Outro aspecto que pode ser pontuado é a definição de espaço e tempo. A escola tem a
delimitação de tempos e espaços com normas específicas. Redefinir os tempos e os espaços na
escola é fundamental na atual sociedade contemporânea. Para se comunicar com o outro, não
é necessariamente mais preciso estar ao mesmo lado fisicamente. A lógica de crianças
sentadas, enfileiradas, quietas umas atrás das outras, de frente para o quadro, é colocada em
xeque no momento atual, assim como abordam Ferreira e Mattos (2015) se reportando a uma
reflexão de Bauman:
romper com um modelo tradicional de ensino, no qual não são consideradas as experiências e
a cultura dos estudantes como parte significativa do eixo da aprendizagem, articulando os
fazeres e saberes em sala de aula de forma dialógica e reflexiva. Para Valente (2014), o
desenvolvimento de abordagens educacionais baseadas na aprendizagem ativa implica
É nesta perspectiva que Moran (2018, p.3) nos ensina que “ ensinar e aprender
tornam-se fascinantes quando se convertem em processos de pesquisa constantes, de
questionamento, de criação, de experimentação, de reflexão e de compartilhamento crescentes
[...]” A educação, dessa forma, fica mais desafiadora e atrativa.
No contexto das metodologias ativas, temos, ainda, a aprendizagem baseada em
projetos, cuja abordagem permite a integração de diversos saberes com o protagonismo dos
alunos na construção de seu conhecimento. O trabalho baseia-se na elucidação de problemas,
desenvolvendo a criatividade e o pensamento crítico de forma cooperativa.
Segundo Campos (2013), a Aprendizagem Baseada em Projetos (PBL) tem sido um
dos principais focos da discussão, não apenas como abordagem de aprendizagem ativa, mas
também como alternativa para elaborarem-se currículos e adotarem-se práticas inovadoras na
educação. Exige que o professor reflita sobre a atividade docente e mude a sua postura
tradicional de especialista em conteúdo para mediador e que os estudantes assumam maior
responsabilidade em sua própria aprendizagem.
Hernández e Ventura (1998) tratam da pedagogia de projetos como um percurso
metodológico que envolve professores e alunos em uma dinâmica busca pelo conhecimento.
Movimento esse que tem como forte característica “evitar o perigo da estandardização e
homogeneização das fontes de informação” (Ibid., p. 64), garantindo espaço para a troca entre
as diferentes fontes de saberes elencadas pelo grupo envolvido no estudo. A prática
pedagógica que tem a pedagogia de projetos como forma estruturante do seu caminhar prevê a
elaboração de “um dossiê de síntese dos aspectos tratados no projeto” desenvolvido, como
podemos observar:
Ainda sobre o trabalho por projetos, Corsino (2009, p. 106) afirma que esses
“valorizam o trabalho e a função do professor que, em vez de ser alguém que reproduz ou
adapta o que está nos livros didáticos e nos seus manuais, passa a ser pesquisador do seu
próprio trabalho”. Com isso, destaca que, em um trabalho baseado na pedagogia de projetos, a
função do professor passa a ser de pesquisador de sua prática e que este professor-pesquisador
compreende que os alunos são sujeitos que possuem uma história, da qual participam de
forma ativa, e produtores de cultura no mundo em que vivem. Corsino (Ibid., p. 105) ressalta
ainda que “trabalhar com projetos na escola desde a Educação Infantil é uma forma de
vincular o aprendizado escolar aos interesses e preocupações das crianças, aos problemas
emergentes na sociedade em que vivemos, à realidade fora da escola e às questões culturais
do grupo”.
Diante do cenário de pandemia imposto à toda a sociedade no ano de 2020, fez-se
urgente repensar as estratégias e percursos metodológicos a serem adotados pelos professores
da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, com o intuito de manter o vínculo com os
alunos e, de forma emergencial, ampará-los no que diz respeito ao acesso à educação.
Com esse pensamento, fez-se necessário apontar formas para uma abordagem
pedagógica que, num primeiro momento, se valesse de encontros assíncronos e síncronos
mediados por AVAs. O atual cenário nos aponta a necessidade de pensar formas e estratégias
que vislumbrem uma educação mediada pelo ensino híbrido, perspectiva que compreende
combinar o ensino presencial com propostas de ensino remoto. Tais abordagens podem estar
amparadas na perspectiva da sala de aula invertida, método que inverte a lógica convencional
de organização do fazer pedagógico. Essa abordagem compreende que os alunos tenham um
primeiro contato com os conteúdos em suas próprias casas, por meio de diferentes mídias e
recursos digitais, como videoaulas, games e podcasts, indicados pelos professores. A aula
presencial seria o momento de problematizar esses conteúdos, um espaço para a realização de
exercícios, de atividades em grupo e privilegiado espaço para a construção de projetos.
O referencial curricular está sendo construído para um mundo que não existe
mais como o conhecíamos e é necessário que reflitamos sobre os modos de
ensinar e aprender com base nos novos comportamentos de segurança, saúde
e tecnologia necessários.[...] É urgente pensar novos espaços educacionais
com estratégias híbridas, atraentes para as crianças das várias faixas etárias e
a criação de estratégias de “alfabetização” digital para docentes e discentes
(E. M. Eulália da Silveira Bragança/Parecer, 2020).
(2012) avalia serem necessárias novas práticas escolares que contemplem desde a “produção
de conteúdos” até a “análise crítica como receptor” (Ibid., p. 21), isto é, tornam-se necessárias
novas abordagens para além dos registros de escrita manual e impressa, contemplando
também o áudio, o vídeo, o tratamento da imagem, a edição e a diagramação. O acesso às
novas formas de comunicação e informação “acarretam novos letramentos, de caráter
multimodal ou multissemiótico” (Ibid., p. 13), emergindo uma necessidade por uma
pedagogia dos multiletramentos15.
Dessa forma, trazemos questões que possam refletir sobre todo o trabalho já realizado
com mídias e tecnologias digitais na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, iniciado
em 1996, com a implementação dos laboratórios de informática nas Unidades de Ensino
Fundamental, passando pelo uso de recursos digitais diversos desde a Educação Infantil até o
trabalho com diferentes metodologias no momento atual. Tais propostas priorizam o fazer
pedagógico mediado pelas mídias e tecnologias digitais de forma crítica e reflexiva,
potencializando a produção do conhecimento entre professores e alunos, nas mais variadas
formas: uso de aplicativos, softwares, projetos com robótica educacional, atividades maker,
filmes de animação digital, produção midiática, atividades gamificadas, realidade aumentada,
plataformas digitais, aproximando a escola da cultura digital.
Diante do papel que a avaliação tem assumido enquanto política pública no Brasil e no
mundo, provocando questionamentos e tensões, torna-se imprescindível o estabelecimento de
diálogo e parceria com a comunidade educativa, compreendendo o movimento de
participação como manifestação indispensável para o avanço das discussões no campo da
avaliação.
15
Termo cunhado pelo Grupo de Nova Londres para abranger a multiculturalidade característica das sociedades
globalizadas e a multimodalidade dos textos por meio dos quais a multiculturalidade se comunica e informa
(Rojo, 2012, p. 13).
84
Dessa maneira, avaliar implica outros modos de pensar o ser humano, não mais como
sujeito pronto, determinado, mas sim em permanente construção e transformação. Uma
proposta pedagógica que busca a formação integral dos sujeitos compreende o conhecimento
em sua complexidade, concebendo a avaliação a partir de uma perspectiva que considere o
ensino e a aprendizagem como fenômenos sociais construídos na relação dialógica entre
sujeitos e saberes. Tal concepção aponta a existência de múltiplos modos, tempos, estratégias,
estilos e jeitos de ensinar e aprender16.
Nessa ótica, ensinar e aprender são frutos da interação entre os sujeitos e as diferentes
formas de comunicação, expressão e construção social, sendo, então, a avaliação assumida
como parte do processo pedagógico. Para isso, ela deve ser contínua, realizada em diferentes
momentos, oportunizando um acompanhamento sistematizado do ensino e da aprendizagem.
Gatti (2003) ressalta
[...] que a avaliação não seja apenas finalista, mas, sim, incluída no processo
de ensino e aprendizagem como meio para o autodesenvolvimento, tanto dos
alunos em suas aprendizagens, quanto dos professores, como profissionais,
em face das suas formas de ensinar (GATTI, 2003, p.102).
16
Parágrafo adaptado do texto apresentado pelo grupo de trabalho que discutiu a Proposta Pedagógica em 2015.
87
Ainda presente em muitas escolas, a avaliação feita apenas no fim do processo e como
mera constatação não contribui para o avanço da aprendizagem do aluno. A constatação é o
início de um processo, é o ponto em que atribuímos uma qualidade (positiva ou negativa) ao
que está sendo avaliado. A partir daí, entra a análise e a tomada de decisão sobre “o que
fazer”, por isso a avaliação deve ser contínua, e não feita tão somente no fim do processo.
É o mesmo Luckesi (2011) quem nos diz que
Caso seja percebido, durante o processo de ensino, que alguns alunos não conseguiram
atingir os objetivos propostos, é hora de redirecionar as ações para que as metas de
aprendizagem sejam atingidas. Por outro lado, também é importante que se desenvolva nos
alunos a habilidade de se autoavaliar, para que assim possam apropriar-se dos recursos
internos que utilizam (metacognição) e, dessa forma, sejam capazes de estabelecer ações que
favoreçam a autorregulação da própria aprendizagem.
Tudo isso reforça a ideia de que a prática da avaliação da aprendizagem deve apontar
para a busca do melhor (potencial) de todos os educandos, por isso é diagnóstica e não se
interrompe na simples constatação.
Acrescenta-se a esse ponto de vista o entendimento de que se faz necessária a
participação e a responsabilidade de todos os atores da comunidade educativa neste processo.
Cabe destacar que, no espaço educativo, todos ensinam e aprendem, mútua e continuamente,
portanto, todos devem avaliar seus fazeres.
É essa cultura avaliativa que este documento pretende disseminar, uma cultura
entendida como prática articulatória em constante negociação, engendrada em diferentes
tempos e espaços, ou seja, que não é dada a priori nem é estanque, mas se constitui pelos
diferentes sentidos, pelas diferentes leituras produzidas pelos diferentes atores e situações de
aprendizagem e de ensino.
88
A infância não é aqui concebida como um mero período da vida, com limites impostos
para o seu início e fim. Pelo contrário, compreendemos a infância como construção social que
se constitui na relação com o outro e com o contexto sócio-histórico-cultural, como parte
essencial dos aspectos que nos tornam humanos.
Nesse sentido, reafirmamos o compromisso de pensar a infância em sua dimensão
plural, pois caminhamos na direção contrária à ideia de concebê-la a partir de um conceito
único, abstrato e fixo, para além de sua raiz etimológica. Além disso, perspectivando pensar
sobre as crianças e suas infâncias com amorosidade, afetos e legitimação do outro como
sujeito singular/plural, concebemos a infância enquanto experiência humana, permeada por
sentidos, brincadeiras, imaginação, criação e ruptura com as tentativas de fragmentação e
engessamento da sociedade.
Assim, lançamos um olhar atento para essas questões, pois elas nos convocam a
refletir sobre a passagem da criança da Educação Infantil para o Ensino Fundamental, assim
como para os processos de ensino-aprendizagem, na perspectiva da humanidade em
transformação.
Nesse sentido, dedicamos as linhas que se seguem a trazer à cena reflexões em torno
da questão da transição de alunos de uma etapa para outra, com o propósito de suscitar olhares
outros, mais sensíveis, para esse movimento inerente ao processo de escolarização.
As crianças ingressam no universo escolar com expectativas e curiosidades. Na escola,
elas interagem, estabelecem relações, vivem experiências variadas, aguçam percepções, fazem
descobertas, afloram sensibilidades e afetos, falam e agem com desenvoltura e
espontaneidade. O reconhecimento dessa infância com base em uma concepção que rompa
com uma dimensão didatizadora adultocêntrica evidencia a necessidade de uma escuta
sensível às questões apresentadas pelas crianças. Estudos do campo do currículo articulados
com estudos da infância nos ajudam a conclamar por práticas educacionais com as crianças no
contexto escolar e não apenas sobre e para elas, o que revela a compreensão de que o
protagonismo da criança esteja em cena na produção curricular desde a mais tenra idade.
Afinal, precisamos superar, na prática, a ideia da criança como infante, pois sabemos que “a
fala é um instrumento de direito, uma proclamação: negação daquilo que o silêncio é –
submissão, complacência, desigualdade, menoridade” (MARTINS, 1993, p. 54).
89
são concebidos e desenvolvidos acabam por burocratizar as relações. Eles são mediados de
modo diferente, às vezes com tom prescritivo e nesse momento tornam-se pretexto para o
encaminhamento de atividades pedagógicas, estratégias para deixar um determinado momento
do dia menos cansativo. Contudo, tais práticas não são reconhecidas como linguagem e força
potencial para o desenvolvimento e aprendizagem dos sujeitos.
Salientamos, portanto, a importância de se construir um fazer pedagógico dialógico,
interacional e contínuo. Por esse viés, a produção de conhecimento, o processo de ensino-
aprendizagem é concebido com/a partir de estratégias que valorizem e legitimem as
aprendizagens já vivenciadas na etapa anterior de estudos. Há, nesse sentido, a preocupação
em se promoverem ações que buscam favorecer a continuidade de experiências próprias do
universo infantil. Desse modo, a possível ruptura no processo do “rito de passagem” pode, em
certa medida, ser suavizada, e tal movimento constitutivo da vida moderna pode ser
vivenciado com menos ansiedade e insegurança.
Nesse sentido, destacamos a importância das interações. Ao abordar a disponibilidade
ao diálogo no processo educativo, Freire (2019) aponta que “[...] o sujeito que se abre ao
mundo e aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica em que se confirma como
inquietação e curiosidade, como inconclusão em permanente movimento na história”
(FREIRE, 2019, p. 133).
Nós somos seres singulares e sociais, inconclusos. Constituímo-nos na relação com o
outro. É também nesse movimento alteritário que ampliamos nossa percepção sobre nós
mesmos e sobre o mundo, despontamos processos criativos, autorais, tomamos consciência
no/do mundo e de nós mesmos. Portanto, na interação uns com os outros produzimos
conhecimentos. Dessa forma, almejamos que os espaços escolares de todas as etapas de
ensino sejam repletos de ludicidade, vivacidade, imaginação, criação e encontros com o outro.
Em vez de focar na (re)produção, a escola precisa investir na criação, no
desenvolvimento da sensibilidade, no aguçamento dos sentidos, deslocando o conceito de
criatividade de um viés produtivo para um viés mais sensível, caminhando na contramão da
concepção utilitária do pensamento (DALUZ, 2019). Para estimular o pensamento criativo na
escola, torna-se fundamental desviar o foco das atividades intrinsecamente pragmáticas,
literais, que visem a uma suposta unicidade, que busquem a resposta certa, caminhando para
uma atitude estética e filosófica que indague os fenômenos por meio do olhar e da escuta
sensível. É preciso, portanto, que caminhemos para uma abertura do olhar, dos sentidos, da
metaforização, da multiplicidade de leituras, da sensibilidade, para “a liberdade de
imaginação e o desenvolvimento da sensibilidade estética” (SILVA, 2013, p. 31).
91
Em uma sociedade capitalista que não cansa de impor uma educação marcada pelo
viés econômico utilitário, a arte e o brincar cumprem o importante papel de contraexistir
como uma forma de resistência. Assim, que haja continuidade e ampliação das narrativas
discentes, dos afetos, das brincadeiras, conversas, jogos, repertórios de histórias, faz de conta,
rodas de interesses, da experiência estética com a literatura e as artes. Que ao chegar ao
Ensino Fundamental, as experiências que as crianças trazem da Educação Infantil e as suas
vivências fora da escola não tenham uma escuta limitada e regulada. Que assim também seja
em qualquer momento de transição. Que saibamos valorizar as histórias e as bagagens da
viagem. Que a importância do que sabem e pensam sejam reveladoras de caminhos para
novas "leituras" que estejam além da decodificação das palavras. Que a espontaneidade e
sabedoria infantis sejam motrizes para um processo de ensino-aprendizagem significativo em
todos os anos do Ensino Fundamental da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói. E
que a viagem seja bonita, incrível e leve para todos.
17
Como sujeitos históricos que são, as características de desenvolvimento dos educandos estão muito
relacionadas com seus modos próprios de vida e suas múltiplas experiências culturais e sociais, de sorte que
mais adequado seria falar de infâncias e adolescências no plural (BRASIL, 2010, p. 110).
92
2006; SARMENTO, 2018). “É preciso levar em conta a pluralidade cultural na qual nos
inserimos e o respeito às diferenças que dela provém e caracterizam cada educando como um
ser único com suas especificidades” (E. M. PROFESSOR ANDRÉ TROUCHE/GTs, 2019).
O Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) considera a infância como o
período que vai do nascimento até os 12 anos incompletos, e a adolescência como a etapa da
vida compreendida entre os 12 e os 18 anos de idade. A Constituição de 1988, no artigo 227,
declara que
inserção e participação nos grupos que frequenta, consequentemente na trama dos valores
culturais daqueles grupos” (NIA, 1992, p. 22).
Destacamos também que a criança, desde a mais tenra idade, apresenta capacidade de
criar, reelaborando impressões vivenciadas em seu cotidiano. Nesse sentido, “a criação é
condição necessária da existência” (VIGOTSKI, 2009, p. 16). Junto a essa capacidade de
criação, ressaltamos a imaginação ou fantasia, “base de toda atividade criadora [...]”
(VIGOTSKI, 2009, p. 14). Assim, é fundamental que a escola leve isso em consideração,
buscando caminhos para que a criança se reconheça como sujeito crítico e atuante, “capaz de
pensar, refletir e analisar o mundo em que vive, construindo sua própria leitura ao participar
ativamente do processo histórico coletivo, mantendo sua autonomia” (NIA, 1992, p.21).
A respeito da adolescência, destacamos que o senso comum aponta essa fase como
uma transição entre as infâncias e a fase adulta, devido às intensas transformações vividas
pelo ser humano. No entanto, sabemos que o ser humano está sempre mudando, aprendendo
e, logo, em transição. Entendemos que as colocações que concebem a adolescência apenas
como transição tendem a fortalecer a concepção de um não-lugar, que tira dessa fase da vida
humana o caráter “de ser”, em contraposição a nossa defesa do adolescente como sujeito.
O amadurecimento psicológico, as mudanças biológicas, corporais e emocionais
colocam o sujeito em novas posições ainda não experimentadas, tanto no que diz respeito a
sua própria constituição, quanto a novas possibilidades de tornar-se. Da mesma forma,
estabelecem-se novas relações com os outros e com o mundo, o que pode ocasionar conflitos.
Tudo isso torna a adolescência uma fase em que grandes desafios se apresentam para a família
e para a escola, em que a adolescência é vivida em grande parte do tempo.
No entanto, essa fase do desenvolvimento também agrupa grandes possibilidades na
expansão da autonomia do sujeito, que poderá ser incentivado a pensar não apenas o seu papel
no mundo, mas sua possibilidade/responsabilidade de intervenção, permeada por relações de
solidariedade; a ultrapassar limites que a sociedade lhe impõe, ou que ele próprio estabelece; a
aprofundar conhecimentos, relacionando-os com os saberes que já possui; a desenvolver a
capacidade de tomar decisões mais assertivas e de se expressar.
Apesar de algumas características serem similares na adolescência, como foi dito
anteriormente, não há homogeneidade entre sujeitos. Concordamos com Gadoti (2006, p. 139)
ao afirmar que “a nossa pedagogia dirige-se a um aluno médio, que é uma abstração. O nosso
aluno real, contudo, o aluno concreto, é único. Cada um deles é diferente e precisa ser tratado
em sua individualidade [...]”. Por isso, é preciso avançar no reconhecimento de que seres
94
humanos têm construções culturais diferentes, influenciadas por classe, gênero, etnia e
religião, que os constituem como sujeitos.
Além das diferentes fases de desenvolvimento, é preciso atentar para os diferentes
contextos geográficos em que crianças e adolescentes vivem no município de Niterói. Esses
contextos constituem histórias e trajetórias plurais que nossos estudantes possuem e com as
quais serão feitas conexões para possibilitar a construção de novos conhecimentos.
Dessa forma, é preciso considerar diferentes formas de aprender na relação com os
distintos contextos de vida. Se os objetos de conhecimento18 permanecem os mesmos, as
práticas, estratégias e recursos podem ser diversos, a fim de aumentar as oportunidades de
aprendizagem e construção de sentidos.
A maioria das crianças e adolescentes no mundo, atualmente, vive em cidades19, onde
estabelecem seus universos culturais, dentro de realidades socioeconômicas distintas e
desiguais, configurando uma enorme complexidade, que condiciona, em grande medida, a
vida daqueles que vivem as (nas) cidades.
A dualidade na produção do espaço condiciona possibilidades diferentes de
apropriação do espaço urbano e de convivência dos diferentes, a exemplo dos espaços
públicos e patrimônios materiais e imateriais da cidade. Nesse sentido, a escola pública
aparece como uma grande porta de acesso dos nossos estudantes a essa vivência, de inúmeras
questões atuais, a exemplo da questão ambiental, tratada em capítulo anterior neste
documento20. Não é mais possível ignorar que o modelo de desenvolvimento baseado apenas
em crescimento econômico levou o planeta a um esgotamento de recursos e às mudanças nos
sistemas climáticos.
Reafirmamos o princípio de que o estudante é um sujeito de direito; reconhecemos que
ele pode e deve participar ativamente da tomada de decisões (visto que é na ação política que
se constitui sujeito) e contribuir para uma reflexão e um fazer democráticos. Apesar de muitas
vezes essa visão ser aceita no campo das ideias (respaldada tanto por documentos oficiais
quanto na literatura educacional), ainda há dificuldades para colocá-la em prática no cotidiano
da escola, em que as vozes dos estudantes muitas vezes são silenciadas ou ignoradas nas mais
diferentes situações do ambiente escolar.
18
Esses “objetos de conhecimento” a que nos referimos são temas diversos que constam nas matrizes
curriculares e serão trabalhados em sala de aula por professores e alunos para a construção do conhecimento.
19
ONU News. Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2019/02/1660701.
20
Capítulo que trata sobre Educação Ambiental.
95
currículo escolar atualmente é inflado de conteúdos, muitos dos quais apresentados sem real
articulação com o contexto do estudante (professora da E. M. JOÃO BRAZIL/GTs, 2019).
Conceituamos, assim, a educação integral como aquela que promove o
desenvolvimento do estudante em todas as suas dimensões (intelectual, física, social,
emocional e cultural) e que explicita a fluidez das fronteiras entre essas dimensões.
Acreditamos na educação integral como potente para a formação de um sujeito de direito e de
deveres, “não entendendo o sujeito como um ser pronto e acabado, mas como aquele que se
constitui em decisões políticas, em processos de subjetivação” (UMEI DARCY
RIBEIRO/Parecer, 2019). Ressaltamos uma abordagem pedagógica voltada a desenvolver
todo o potencial dos estudantes e prepará-los para se realizarem como pessoas, profissionais e
cidadãos comprometidos com o seu próprio bem-estar, com a humanidade e com o planeta.
Maia e Fagundes (2021) propõem que a educação integral seja
[...] uma proposta que se volta à formação ampliada dos alunos, que
enriquece o relacionamento humano e que vislumbra um panorama mais
comunitário. Para isso, sem dúvidas, a extensão da jornada diária é uma
estratégia facilitadora, mas que precisa ser acompanhada de outras formas de
organização social da escola. Essas outras formas irão fomentar novas
possibilidades e novos desafios a todos os envolvidos nos processos
educativos em seu interior e, consequentemente, às relações tecidas no
ambiente escolar (MAIA e FAGUNDES, 2021, p. 165).
21
A organização curricular em ciclos na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói foi regulamentada pela
Portaria 132/2008, discutida e legitimada nos Referenciais Curriculares da Rede de 2010 e, após a
implementação destes últimos, a proposta em ciclos foi novamente regulamentada pela Portaria 085/2011, que
instituiu as Diretrizes e os Referenciais Curriculares e Didáticos da Rede.
97
A partir, sobretudo, das contribuições dadas pela Prof.ª Dra. Érika Virgílio da Cunha
(Universidade Federal do Mato Grosso), em uma das Conversas Pedagógicas promovidas em
setembro/2020 para fomentar discussões no processo de construção destes Referenciais
Curriculares, entendemos que a política de ciclo não tem uma essência dada a priori, mas
pode se constituir como um compromisso democrático na medida em que considere múltiplas
formas de educar e que seja pensada como uma possibilidade de se abrir ao outro em seu
fluxo da diferença e em sua complexa experiência educacional.
Para isso, defendemos a importância de um constante e atento investimento nas
Unidades de Educação da Rede, sobretudo no que diz respeito aos aspectos infraestruturais,
para que a organização escolar por ciclos, anunciada em documentos da Rede de Educação de
Niterói, seja facilitada.
Também partindo principalmente das contribuições de Cunha (2020), compreendemos
que há uma dimensão da política relacionada ao que precisa ser previamente definido como
condição de realização (como os aspectos infraestruturais mencionados acima). Entendemos a
importância de ressaltar essa dimensão da política como investimento nas escolas, para que a
experiência educativa construída por professores, educandos e demais profissionais das
Unidades de Educação − que por ser incontrolável, complexa e imponderável não pode ser
definida antecipadamente − tenham condições de construir uma política de ciclos fora da
norma da aplicabilidade, pensando a política como negociações contextuais e contingentes.
Antes de passarmos à apresentação dos quatro ciclos que organizam o Ensino
Fundamental na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, precisamos expressar mais
algumas considerações a respeito do processo de avaliação das aprendizagens que
defendemos. A avaliação deve ser “contínua e cumulativa no percurso educativo, com
prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do
período sobre os de eventuais provas finais”22. Considerando as diferentes formas de
mediação para a aprendizagem, em termos práticos, é preciso que o docente utilize múltiplos
instrumentos de avaliação, sem que haja um peso maior para avaliações que encerram
períodos. A avaliação compõe o processo de ensino e aprendizagem em um contexto amplo,
ou seja, ela deve ser considerada em seus aspectos formativos e precisa ser adotada na
recondução do planejamento do trabalho pedagógico, sempre que necessário. Sendo assim, os
estudos de recuperação das aprendizagens são obrigatórios e precisam ser realizados
22
Acompanhamos as indicações da LDBEN 9394/1996.
98
paralelamente ao período letivo, não devendo ser alvo de um momento específico ao final do
período.
Os nove anos do Ensino Fundamental, portanto, são organizados em quatro ciclos.
O Primeiro Ciclo compreende a trajetória de crianças ao longo de três anos de
escolaridade (1º ao 3º ano de escolaridade) que não deixaram de viver as infâncias pelo
simples fato de ingressarem no Ensino Fundamental. Neste ciclo, priorizam-se os tempos e
espaços escolares e as propostas pedagógicas que possibilitam o aprendizado da leitura, da
escrita e da alfabetização matemática e científica, bem como a ampliação de relações sociais e
afetivas nos diferentes espaços vivenciados. Nesse sentido, confirmamos as premissas
indicadas pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (BRASIL, 2015) e pelo
Núcleo Integrado de Alfabetização − NIA (NITERÓI, 1992), defendendo que
● crianças são detentoras de direitos e deveres. Elas têm suas necessidades, seus
processos físicos, cognitivos, emocionais e características individuais – sexo, idade,
etnia, raça e classe social – e, portanto, têm seus direitos e deveres. Destacamos, nessa
direção, a premissa de que as propostas pedagógicas devem privilegiar a participação
infantil pautada no diálogo e no compromisso ético-político com a educação pública
de qualidade socialmente referenciada;
● crianças têm direito a acessar múltiplas linguagens, inclusive a escrita. Nessa fase,
a escola deve promover a integração entre a aprendizagem da leitura e a produção
textual de forma articulada às aprendizagens dos diferentes Componentes
Curriculares, em plena sintonia e convivência com a brincadeira, com o lúdico e com
o tecnológico. “O trabalho de alfabetização não deve se restringir ao campo da Língua
Portuguesa, pois lemos e escrevemos em qualquer área do conhecimento” (UMEI
JACY PACHECO/GTs, 2019). Acreditamos que esse trabalho não deve obrigar as
crianças a aprender a ler, a escrever e a operar matematicamente por meio de
exercícios enfadonhos e inadequados para a sua faixa etária, mas o conhecimento deve
ser construído de modo reflexivo, instigante e prazeroso para que os alunos possam
desenvolver o pensamento e a compreensão d emundo. Além disso, a criança deve se
expressar nas várias linguagens (oral, corporal, cênica, plástica, literária, musical etc.),
por meio de propostas de atividades criativas que lhe possibilitam externar seus
conhecimentos, sentimentos, emoções e valores. Deve-se, ainda, considerar o desenho
99
Os ofícios n.º 07/2019, n.º 18/2019 e n.º 21/2019 foram encaminhados às Unidades de
Educação, solicitando discussões curriculares e que as contribuições fossem registradas e
encaminhadas à Fundação Municipal de Educação. Depois do desenvolvimento dessas
primeiras discussões nas escolas, os ofícios n.º113/2019 e nº.127/2019, da Diretoria de 3º e 4º
ciclos e da Diretoria de 1º e 2º ciclos, respectivamente, foram enviados às escolas convidando
docentes do Ensino Fundamental para representarem suas Unidades de Educação na Revisão
dos Referenciais Curriculares da Rede, por meio da formação de Grupos de Trabalho (GTs)
reunidos de acordo com os nove componentes curriculares que compõem a grade curricular
do município de Niterói.
Em 14 de agosto de 2019, cerca de 200 docentes, indicados por suas Unidades de
Educação, reuniram-se para discutirem bases conceituais e metodológicas a fim de pensar o
currículo da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói. Houve formação de oito GTs,
que se reuniram em diferentes datas e dedicaram-se a atualizar o pensamento sobre a
Educação em Niterói e sobre as matrizes curriculares, esforçando-se no diálogo com a Base
Nacional Comum Curricular (BNCC)23, mas, acima de tudo, dando voz ao que acontece nas
escolas, colocando nosso educando no centro do processo e mantendo um compromisso com
a educação de qualidade que defendemos e na qual acreditamos.
Adotamos nesta revisão as áreas do conhecimento, com agrupamento dos
componentes curriculares da seguinte forma: Linguagens − Língua Portuguesa, Língua
Estrangeira (Inglês, Espanhol e Francês), Arte e Educação Física; Matemática − Matemática;
Ciências da Natureza − Ciências; Ciências Humanas − Geografia e História.
A apresentação de cada componente curricular se faz por meio de textos introdutórios
com pressupostos de importância para a educação defendida na Rede, seguidos das matrizes
curriculares. Os textos e matrizes apresentados neste documento foram elaborados e
discutidos de forma coletiva, a partir das reflexões dos professores que formaram os GTs.
Atendemos à BNCC, mas optamos por ir além do que é proposto por ela, atendendo ao direito
de aprendizagem dos nossos estudantes no que diz respeito a conhecimentos não previstos
pela Base, mas considerados de importância pelos docentes.
23
Homologada em 20 de dezembro de 2017, tem o ano de 2019 como de sua implantação em todo o território
nacional, por meio da construção de currículos locais, de responsabilidade das redes de ensino e escolas, que
têm autonomia para organizar seus percursos formativos a partir da sua própria realidade.
103
O que se apresenta nos textos introdutórios e nas matrizes não tem a intenção de servir
como determinações para o trabalho pedagógico das escolas, e sim como uma orientação do
que se defende na Rede como direito de aprendizagem e se reconhece como uma educação de
qualidade socialmente referenciada, objetivando, como colocado anteriormente, uma
formação integral do ser humano. A prática pedagógica nas Unidades de Educação qualificará
as orientações aqui apresentadas.
As matrizes buscam a praticidade para o planejamento no cotidiano escolar,
possibilitam fácil compreensão e apropriação das informações, com a visualização de
objetivos cognitivos e de desenvolvimento. Para garantir que a mesma concepção de educação
de cada componente permeasse todo o Ensino Fundamental, optamos por apresentar, na
primeira coluna, os Núcleos Temáticos, que agrupam Objetos de Conhecimento que se
comunicam entre si. Cabe destacar que os Núcleos Temáticos também foram pauta de
discussão nos GTs e traduzem o movimento de cada componente curricular em direção ao
trabalho interdisciplinar no Ensino Fundamental.
A interdisciplinaridade é, portanto, entendida aqui como abordagem teórico-
metodológica em que a ênfase incide sobre o trabalho de integração das diferentes áreas do
conhecimento, um real trabalho de cooperação e troca, aberto ao diálogo e ao planejamento
(NOGUEIRA, 2001). Pela abordagem interdisciplinar, ocorre a transversalidade do
conhecimento constitutivo de diferentes disciplinas e cabe destacar, neste propósito, o papel
fundamental da ação didático-pedagógica mediada pela pedagogia dos projetos temáticos
(BRASIL, 2010).
Os Objetos de Conhecimento especificam, de forma ampla, temas trabalhados em sala
de aula. Na coluna ao lado dos Objetos de Conhecimento, estão os Objetivos de
Aprendizagem e Desenvolvimento, que dizem respeito ao conjunto de saberes que serão
desenvolvidos no processo de ensino e aprendizagem, em múltiplas experiências. Finalmente,
na última coluna, são apresentadas as propostas e sugestões de estratégias e possíveis
metodologias para o trabalho pedagógico.
Tanto a proposta de ciclos quanto a proposta de formação integral requerem que a
abordagem feita dos conhecimentos historicamente construídos, se tratados como
componentes curriculares, siga uma lógica de problematização dos Objetos de Conhecimento.
Seguimos a orientação dos Referenciais de 2010, que sugerem:
12. REFERÊNCIAS
ADICHIE, C. N. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
BANKS, J. Diversity and Citizenship Education. San Francisco: John Wiley & Sons, 2004.
BBC BRASIL. Brasil é o país da América mais afetado por desastres. Disponível em
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/story/2003/07/030717. Acesso em 7 dez. 2020.
. Magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense (Obras Escolhidas, v.1).
1994.
. MEC. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF, 2019. Disponível em:
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf.A
cesso em: 13 dez. 2019.
. MEC. Base Nacional Comum Curricular: segunda versão revista. Brasília: MEC,
2016.
. Por uma política curricular para a educação básica. Brasília: MEC/SEB, 2014b.
CARRANO, P. C. R.; MARTINS, C. H. dos S.. A escola diante das culturas juvenis:
reconhecer para dialogar. Educação, Santa Maria, v. 36, n. 1, p. 43-56, jan./abr. 2011.
GADOTI, M.. A Escola na Cidade que Educa. Cadernos CENPEC, n.º1, 2006, p.133-139.
KOHAN, W. Paulo Freire, mais do que nunca: uma biografia filosófica. Belo Horizonte,
Vestígio, 2019.
109
KRAMER, S. A Infância e sua singularidade. In: Brasil. Ensino fundamental de nove anos:
orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade. Brasília: FNDE, Estação Gráfica,
2006.
. Leitura e escrita como experiência – notas sobre seu papel na formação. In:
ZACCUR, E. (org.). A magia da linguagem. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.
.Por entre as pedras: arma e sonho na escola. São Paulo: Ática, 1993.
KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. Companhia das Letras, SãoPaulo, 2019.
. Literatura, experiência ef ormação: uma entrevista com Jorge Larrosa. In: Costa M.
V. (org.). Caminhos investigativos: novos olhares na pesquisa em educação. Porto Alegre:
Mediação, 1996.
_______. Tremores. Escritos sobre experiência. Tradução Cristina Antunes, João Wanderley
Geraldi – Belo Horizonte: Autêntica, 2016.
et al. Ciências para Educação: uma ponte entre dois mundos. São Paulo: Editora
Atheneu, 2018.
LOPES, A. C. Ainda é possível um currículo político? In: LOPES, A. C.; ALBA, A. de.
(orgs.) Diálogos Curriculares entre Brasil e México. EdUERJ, Rio de Janeiro, 2014.
MARANDOLA JR., E. & HOGAN, D. J. Riscos e perigos: o estudo geográfico dos natural
hazards. ENCONTRO TRANSDISCIPLINAR SOBRE ESPAÇO E POPULAÇÃO. 1, 2003,
Campinas. Anais [...] Campinas: NEPO/ABEP, 2003.
MARTINS, J. S. Regimar e seus amigos: a criança na luta pela terra e pela vida. In______. O
massacre dos inocentes. São Paulo: Hucitec, 1993.
. Metodologias ativas para uma aprendizagem mais profunda. In: BACICH, Lilian;
MORAN, José (org.). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem
teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018, p. 1-25.
PINAR, W.; LOPES, A. C.; MACEDO, E. (orgs.). Estudos Curriculares. Rio de Janeiro:
Cortez, 2016.
ROJO, R.; MOURA, E. (org.). Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola Editorial,
2012. 264 p.
ROSA, J. G. Grande Sertão: Veredas. 20. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994.
SAVIANI, D. Educação: do senso comum à consciência filosófica. 19. ed. São Paulo:
Autores Associados, 2013a (Coleção educação contemporânea).
SIMAS, L. A.; RUFINO, L.. Fogo no Mato. Rio de Janeiro: Ed. Mórula, 2018.
TEZZA, C.. Sobre o autor e o herói – um roteiro de leitura. In: FARACO, C. A.; TEZZA, C.;
CASTRO, G (orgs.). Diálogos com Bakhtin. Curitiba: Editora UFPR, 2007.
UNICEF, Fundo das Nações Unidas Para a Infância. Cenários da Exclusão Escolar no
Brasil. Unicef para cada criança, 2019.
VIOLA, S. E. A. Direitos Humanos no Brasil: abrindo portas sobre neblina. In: Educação
em Direitos Humanos: fundamentos teórico-metodológicos. SILVEIRA, Rosa Maria Godoy
et al. JoãoPessoa: Editora Universitária, 2007. 513 p.
YUNES, E. & PONDÉ, G. Leitura e Leituras da Literatura Infantil. São Paulo: FTD,
1988.
114
PARTE II
EDUCAÇÃO INFANTIL
115
1. CAMINHOS TRILHADOS
[...] o currículo é, ele mesmo, uma prática discursiva. Isso significa que ele é
uma prática de poder, mas também a prática de significação, de atribuição de
sentidos. Ele constrói a realidade, nos governa, constrange nosso
comportamento, projeta nossa identidade, tudo isso produzindo sentidos.
Trata-se, portanto, de um discurso produzido na interseção entre diferentes
discursos sociais e culturais, que, ao mesmo tempo, reitera sentidos postos
por tais discursos e os recria. Claro que, como essa recriação está envolta em
relações de poder, na interseção em que ela se torna possível, nem tudo pode
ser dito. O entendimento do currículo como prática de significação, como
criação ou enunciação de sentidos, torna inócua distinções como currículo
formal, vivido, oculto. Qualquer manifestação do currículo, qualquer
episódio curricular, é a mesma coisa: a produção de sentidos. Seja escrito,
falado, velado, o currículo é um texto que tenta direcionar o “leitor”, mas
que apenas o faz parcialmente (LOPES, 2011, p. 41).
interno de reformulação dos Referenciais Curriculares de 2010. Para tanto, foram criados
grupos de trabalho que buscavam potencializar tal discussão. Percebemos, então, uma
crescente necessidade de mobilização dos profissionais, de forma que, em um processo
participativo e deliberativo, fosse produzido um documento curricular que fomentasse ações
pedagógicas coerentes com a legislação da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói.
Nesse movimento, as unidades de Educação Infantil foram convidadas, por meio de
link, para socializarem os diversos movimentos de leituras e reflexões sobre os referenciais,
suas percepções sobre a BNCC, a pertinência de potencializar temas já presentes no
documento de 2010 e a possibilidade de abordagem de novas questões que hoje perpassam a
Educação Infantil.
No dia 30 de agosto de 2019, após recebermos as respostas do link, reunimo-nos a fim
de tecermos os caminhos que seguiríamos para intensificar as discussões e os registros
escritos que comporiam o documento preliminar. A partir daí, encaminhamos nove textos às
unidades para fomentar discussões que posteriormente geraram registros escritos e materiais
para construção do texto. As discussões foram organizadas a partir de dois eixos − Currículo
e Infâncias na Contemporaneidade e Formação Docente e Práxis na Educação Infantil − que
seriam dinamizados em dois encontros nos sete polos. Esses polos, também compreendidos
como GTs, buscavam potencializar alguns pressupostos já existentes nos referenciais de 2010,
bem como acrescentar outros de acordo com as reflexões e proposições dos participantes.
Outra frente importante foi a realização do III Seminário de Educação Infantil 2019,
em que, enquanto um espaço de formação continuada, deflagraram-se outras discussões. No
Seminário, ficou evidenciado o protagonismo da criança nos trabalhos apresentados pelos
docentes da rede, apontando-se possibilidades de pensar uma proposta curricular tomada
como referência.
Concomitantemente a esse processo, destacamos as parcerias realizadas com as
universidades públicas que viabilizaram momentos de formação continuada. Estiveram
conosco a professora Luciana Ostetto (UFF) − A Formação do Professor Brincante, a
professora Lea Tiriba (UNIRIO) − Infâncias e Natureza / Infâncias Niteroienses, a professora
Vera Vasconcellos (PROPED/UERJ) − As muitas faces de uma creche e as professoras Zoia
Prestes (UFF), Heloísa Carreiro (UERJ/FFP), Leda Marina (PUC-MG) e Lilian Garcia
(UFRJ) − Transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental, constituindo, assim, um
movimento polifônico de construção de saberes.
Esse documento preliminar retornou à Rede tendo em seu bojo as intencionalidades
não findas, indo ao encontro das apreciações dos nossos pares participantes que se colocaram
117
24
Texto produzido por Maria Felisberta Baptista da Trindade, Secretária Municipal de Educação/Presidente da
Fundação Municipal de Educação de Niterói, nos Registros das Conferências do Plano Municipal de
Educação: Rumo à Cidade Educadora, em 2004.
118
teve início no final da década de 1960, por meio de “bolsas de estudos” que garantiam a
matrícula dos alunos em escolas particulares.
A cartografia educacional da cidade ganhou novos contornos devido ao processo de
descentralização de suas ações, impulsionado, principalmente a partir da década de 1980, pela
homologação da Constituição Federal de 1988. Este foi um marco regulador dos direitos da
criança à Educação Infantil, uma vez que garante que “os municípios atuarão prioritariamente
no ensino fundamental e na educação infantil” (BRASIL, 1988). Seguindo a trajetória traçada
pela Constituição, o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) e a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) alicerçaram a reestruturação da
Educação, pautando-a como direito social fundamental à promoção e consolidação de direitos
humanos. Dessa forma, a Educação firma-se como valor de cidadania e dignidade da pessoa
humana e torna-se meio de construção de uma sociedade livre, justa e solidária,
nacionalmente desenvolvida, que busca a erradicação da pobreza, da marginalização e das
desigualdades sociais.
A consolidação da importância social e o caráter educativo das instituições que atuam
com a primeira infância reverberaram nas políticas públicas de Niterói. Até o ano de 1992, o
atendimento da criança de 0 a 6 anos ocorria em instituições filantrópicas, comunitárias,
Casas da Criança e Jardins de Infância vinculados à Secretaria de Educação do Estado, sob
responsabilidade da Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social. Com a criação da Fundação
Municipal de Educação de Niterói (FME), esse atendimento tornou-se responsabilidade da
FME, dando início ao processo de construção da Rede Pública Municipal de Educação
Infantil, que teve como principais características a municipalização de instituições estaduais, a
criação de creches comunitárias e a construção de novas unidades voltadas exclusivamente à
criança nessa faixa etária.
Ainda nesse mesmo período, com o objetivo de cumprir o disposto na Carta Magna, o
município de Niterói criou, sob o Decreto Legislativo n.º 287/1994, o Programa Criança na
Creche (PROCC), que regulamenta a relação entre FME e Creches Comunitárias por meio de
convênios anuais. Dentre as contrapartidas exigidas da instituição conveniada, ter o currículo
orientado pelos Referenciais Curriculares da Educação Infantil e fomentar a participação de
seus profissionais nos processos de formação continuada oferecidos pela FME são requisitos
que colaboram para a construção de equidade no atendimento à infância niteroiense.
No ano de 1996, a FME produziu um documento intitulado Construindo a Educação
Infantil do Município de Niterói em parceria com a antiga Divisão Materno-Infantil, as
equipes técnicas das unidades de Educação Infantil e o Núcleo Multidisciplinar de Pesquisa,
119
25
Registros das Conferências do Plano Municipal de Educação: Rumo à Cidade Educadora. Dezembro de 2004.
26
Registros das Conferências do Plano Municipal de Educação: Rumo à Cidade Educadora. Dezembro de 2004.
120
democrático sobre pontos nevrálgicos como, por exemplo, a ampliação do número de vagas e
espaços físicos próprios que respeitem os parâmetros orientados pelo MEC. Além disso, são
frequentes os debates para construção de documentos municipais voltados à Educação.
Conforme estabelecido na Constituição Federal de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB), cabe a cada município instituir seu Sistema Municipal de
Educação, por meio do qual delimita e explicita seu espaço de autonomia e responsabilidade
educacional. A Prefeitura Municipal de Niterói é uma entidade jurídica de Direito Público,
mantenedora de uma rede escolar, que integra o Sistema Municipal de Educação, instituído
pelo Decreto n.º 9820/2006, cuja finalidade primordial é oferecer a Educação Básica nos
níveis de Educação Infantil e Ensino Fundamental, nas modalidades de Educação de Jovens e
Adultos e Educação Especial.
Após cinco décadas de atuação na Educação pública, Niterói consolidou sua Rede
Pública Municipal de Educação, ampliando o atendimento, principalmente, na etapa da
Educação Infantil. Nesse percurso, além do investimento em construção e municipalização de
instituições, houve atenção à valorização e formação docente. As conquistas da Educação
Infantil foram possíveis por meio da construção de políticas públicas fomentadas, em sua
maioria, pela mobilização dos profissionais da Educação e legislações pertinentes no âmbito
federal. Rever parte desse processo, portanto, auxilia-nos a olhar para o futuro não com a
tranquilidade do dever cumprido, mas com a certeza de que devemos rever nossa história e
currículo com o objetivo de revisitar concepções, ampliar possibilidades e fomentar
permanentes avanços na Educação de nossas crianças.
reflexões importantes para o trabalho com esse grupo de sujeitos que recém-chegaram a este
mundo.
As crianças guardam na sua pequenez física a potência do ser humano que assim se
torna na interação com outros humanos. Durante muito tempo, a Educação Infantil foi campo
de aplicação de um Ensino Fundamental diminuto. Tais pesquisas nos evidenciam que essa
etapa exige um olhar próprio e uma forma também própria de realizar o trabalho pedagógico.
Durante muitos anos, bebês e crianças foram vistos pela política educacional, pela Saúde e
pela Assistência Social sob a ótica da fragilidade, incapacidade e imaturidade. Nos últimos
anos, essa mentalidade, pelo menos no campo educacional, vem sendo alterada graças a essas
pesquisas que deslocam o olhar da falta para o da potência.
A Educação Infantil, ao tornar-se direito público, apresenta novas demandas por
espaços, profissionais habilitados, currículo específico, entre outras. Nesse sentido, aliar
qualidade à ampliação do atendimento tem sido um desafio nas construções dessas políticas,
principalmente em planos municipais de educação. A discussão curricular caminha junto a
essas construções embasadas em pesquisas e lutas, com avanços e retrocessos. As várias
ações, construídas e implementadas no diálogo entre poder público, profissionais da
educação, responsáveis das crianças e demais representantes da sociedade civil organizada,
expressam o esforço de garantir a essa faixa etária ampliação do atendimento com qualidade.
A Meta 1 do Plano Nacional de Educação propõe
27
O Programa Mais Infância foi uma política pública importante para ampliação de vagas (2013-2020) na
Educação Infantil no município de Niterói.
123
Não há como não considerar que balbucios, gestos, choros e ecolalias são
manifestações dos bebês na interação com o mundo, com os adultos e com outras crianças que
os cercam. Cada movimento corporal realizado é a expressão de que sua aprendizagem está
em pleno desenvolvimento, pois ela se dá de corpo inteiro na interação ininterrupta com
pessoas, objetos e com a própria cultura que os envolve desde antes do nascimento.
Na Educação Infantil, compreendem-se os processos de educar de forma integral, na
inteireza dos sujeitos, contemplando os aspectos cognitivo, afetivo e corporal/físico. Durante
uma troca de fralda, por exemplo, muitas aprendizagens são construídas pela professora e pela
criança. Isso se dará na troca de olhares, no toque da pele, na diferenciação que, pouco a
pouco, o bebê vai fazendo do que é estar limpo e do que é necessitar ser limpo, bem como na
narrativa afetuosa de todo o processo que ora vivenciam. Tudo o que acontece nesse
movimento aqui descrito como em tantos outros ao longo da jornada diária numa Unidade
Municipal de Educação Infantil é mediação, interação e aprendizagem. Entretanto, para que
uma interação assim aconteça, os adultos educadores necessitam colocar-se na relação com a
124
Para que essas práticas se efetivem nas Unidades de Educação Infantil, devem ser
superados muitos desafios, dentre eles a necessidade imperiosa de romper definitivamente
com algumas práticas escolarizantes que ainda resistem no cotidiano. Sabe-se que a criança
descobre pela observação, pela experimentação, pela interação com seus pares e os adultos. O
que caracteriza esse trabalho é a sutileza, o contato interpessoal entre as crianças,
principalmente os bebês, entre elas e os adultos e a relação estabelecida entre as crianças e os
materiais disponibilizados a elas.
Quanto à organização e as formas de atendimento na/da Educação Infantil, a Rede
Pública Municipal de Educação Infantil de Niterói chega ao ano de 2020 com um total de 78
instituições. Das 69 unidades que funcionam em horário integral, 12 atendem crianças a partir
de 4 meses de idade. A Rede está distribuída da seguinte forma:
3. O CICLO INFANTIL
28
No município de Niterói, as crianças ingressam na Educação Infantil com quatro meses. A esse agrupamento
etário dá-se o nome de Grupe de Referência 0 (GREI 0). Os demais vão recebendo a numeração de acordo
com a idade das crianças.
29
Artigo alterado pela Lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, que dispõe sobre o Ensino Fundamental de nove
anos.
130
30
O termo aqui empregado é entendido conforme nos estabelece Jorge Larrosa. "Experiência" é, segundo este
autor, “o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se passa, não o que acontece, ou o que
toca. A cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece”.
131
Diante dessa percepção, é possível delimitar o que é infância? É ela tempo cronológico
ou uma dimensão humana marcada por uma multiplicidade de fatores? Pensar na infância em
sua característica plural nos leva a mensurar a ideia de infâncias. A criança como sujeito traz
em si não somente uma diversidade de aspectos físicos e de personalidade, mas também uma
gama de vivências, ainda que em tenra idade cronológica. No que diz respeito ao fazer
pedagógico, é nítida a demonstração dessa pluralidade mesmo no trabalho com bebês.
A época contemporânea carrega em si, nos mais diversificados aspectos, traços
históricos − alguns remodelados, outros com características bem semelhantes às suas origens.
A Modernidade trouxe consigo um “sentimento de infância” (ARIÈS, 1978) que não era visto
na Idade Média. É inegável que esse “sentimento de infância” trouxe novo olhar, voltado aos
interesses da criança. No entanto, os profissionais da Educação Infantil devem ter atenção
quando o que está em questão é a criança na centralidade do processo pedagógico, pois o fato
de ela ter se tornado objeto de estudo ao longo do tempo não obrigatoriamente faz com que
ocupe seu espaço de sujeito na narrativa.
Outra questão que não pode ser posta à margem das reflexões diz respeito à crescente
urbanização da sociedade contemporânea, que faz com que a maioria das crianças do mundo
viva em cidades em contextos considerados de “risco” sob os mais diversos aspectos
(UNICEF, 2012). Segundo dados do IBGE (2010), o estado do Rio de Janeiro, por exemplo,
registra a maior taxa de urbanização do Brasil.
Nesse sentido, como a cidade acolhe as infâncias e se apresenta a elas? Como os
espaços urbanos contemplam as infâncias e as fazem pertencentes à cidade? Como as
Unidades Escolares se apropriam dessas reflexões e possibilitam essa inserção? Niterói, uma
cidade cujo potencial artístico, cultural, natural e histórico convive com os desafios impostos
pelas desigualdades sociais e resiste a eles, também exprime na sua organização a
“estratificação” dos espaços, que é também a estratificação social.
Diante do desafio da urbanização da metrópole que se expande, invisibiliza e
empareda as infâncias, Gobbi (2019) rememora a pessoa de Mário de Andrade, quando este
pensa uma cidade mais acessível às infâncias, trazendo a reflexão de lugares/espaços para se
brincar livremente e salvaguardar o ser criança. O conceito dos Parques Infantis extrapola o
contexto local para o qual foi pensado e alcança as reflexões sobre a Educação Infantil, sendo
usado por diferentes autores, por fazer referência ao direito de ser criança, de se brincar
livremente, da ruptura dos muros que cerceiam as infâncias, da proteção e plenitude ao seu
desenvolvimento e principalmente da instituição de políticas públicas que considerem de fato
esse direito.
133
[...] essas crianças que têm suas infâncias marcadas pela dura realidade que
as cerca também apresentam firme determinação e resistência das mais
diferentes formas, desde as brincadeiras no quintal, onde se permitem
fantasiar uma outra realidade, até se tornarem os heróis dessa tão desejada
transformação, até sua participação efetiva nos movimentos que buscam essa
mudança (AQUINO e GONÇALVES, 2018, p. 34).
• Paz
Ser amigo é não brigar com as pessoas, ajudar os pais e ficar quietinho. (5 anos)
Não bater e não dar socos. (5 anos)
• Cidadania
Nossos direitos e deveres. (6 anos)
Não jogar lixo no chão, lixo é no lixo. Eu sou uma cidadã. (5 anos)
• Família
Grupo de pessoas unidas, juntas na mesma casa. (6 anos)
• Escola
Aprender. A gente lê livros, a gente brinca no pátio, a gente brinca com os amigos, a gente
faz atividades, escuta historinhas... muitas coisas legais. (6 anos)
31
Registros em vídeo enviados pelas UMEIs e Creches Comunitárias por ocasião do III Seminário de Educação
Infantil Infância, Arte e Imaginação: Eu Fico com a Pureza da Resposta das Crianças.
135
• Educação
Ser amigo de todo mundo. Ser feliz. É ser respeitável para os amigos. (6 anos)
• Amizade
Para brincar, dividir os brinquedos, ser amigo, dar amor, dar carinho, é... ajudar os amigos.
(6 anos)
É aprender, dizer e não é só isso, é violência, amor e tudo mais. (5 anos)
A vida é brincar e ser feliz. (5 anos)
A vida é brincar na pracinha, na rua, porque assim fica mais legal. (5anos)
A vida é natureza, cheio de plantas e pessoas. (5 anos)
A gente é criança para poder brincar! (5 anos)
Ser criança, encontrar com os amigos e brincar. (5 anos)
A vida é viver, não ficar triste e não ter medo de andar de bicicleta sem rodinha. (5 anos)
O amor é só dar um abraço e não ficar triste. (5 anos)
Alegria é a gente brincar, correr e ir para a escola. (5 anos)
[...] na importância de ser leve em meio a tanta dor, a tanta coisa negativa
que nos cerca. Para a gente conseguir viver, sobreviver. Então eu acredito
muito no poder da arte, no poder da educação como potenciais de
transformação [...] o caminho é pela arte, é pela música, é pela dança, é pela
expressão corporal, é pela união das pessoas que acreditam numa educação
diferente. Não pelo consumismo, não pelo dinheiro, não por nada disso, não
pelo mostrar-se, exibir-se, mas por fazer enquanto ser humano, enquanto
autores das suas vidas. [...] Enfim, a gente pensa muito nesse encontro, que
cada dia seja um encontro e não só um simples trabalho burocrático [...] o
que nos motiva é acreditar no outro, no potencial do outro, em quem ele é,
pelo humano que é e não só pelo lugar que ele está (UMEI Margareth Flores,
2019).
136
32
Célestin Freinet, (1896-1966), pedagogo francês, importante referência da Pedagogia de sua época, cujas
propostas continuam a ter grande repercussão na atualidade.
137
A criança não se resume a ser alguém que não é, mas que se tornará (adulto,
no dia em que deixar de ser criança). Reconhecemos o que é específico da
infância: seu poder de imaginação, a fantasia, a criação, a brincadeira
entendida como experiência de cultura. Crianças são cidadãs, pessoas
detentoras de direitos, que produzem cultura e são nela produzidas
(KRAMER, 2007, p. 15).
Esse modo de compreender a criança nos permite perceber sua capacidade criadora,
seu potencial enquanto sujeito inserido em contextos distintos cujas vivências e experiências
interferirão em suas ações e no processo de elaboração de sentidos.
Muitos são os desafios ao recebermos as crianças nos espaços de Educação Infantil e
ajudá-las a conhecer e apropriar-se desse vasto mundo, do qual todos fazemos parte. Nesse
sentido, a primeira transição por qual passam as crianças e seus familiares/responsáveis, que
se dá a partir da decisão de matriculá-las nas instituições educacionais, constitui-se em algo
complexo, uma vez que há uma sequência de novidades, experiências, expectativas e desafios
que afetam os sujeitos envolvidos nesse processo.
Na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, a Educação Infantil é constituída
por um ciclo único composto por seis anos, no qual as crianças têm o direito de ingressar a
partir dos 4 meses. A esse momento de chegada das crianças e de seus familiares/responsáveis
a nossas instituições chamamos de inserção. Esse é o início de uma relação que perdurará por
um longo tempo, devendo considerar-se a criança como sujeito de autoria, de direitos, oriunda
de diferentes contextos sociais e culturais, que chegam ao espaço institucional inaugurando
um novo ciclo de interações, o qual deve ser contextualizado por afetos, escutas e percepções
sensíveis, alcançando toda a comunidade escolar.
Antes de seu ingresso na Unidade de Educação, as crianças convivem com rotinas
estabelecidas no contexto familiar. Sua chegada a esse novo espaço trará mudanças que
implicam rupturas, uma educação compartilhada entre duas instituições (famílias/responsáveis
e unidade de educação), possibilidades de ser e estar em outros grupos a partir de novos
encontros e experiências. Por isso, o momento de inserção é extremamente importante,
138
A fala acima nos aponta indícios para a construção de uma práxis docente que se
constitua no diálogo com as infâncias. A professora, ao se colocar como aprendiz, desvela os
afetos produzidos no encontro com as crianças e a intensidade dessa relação como parte
fundante de seu fazer e do processo de constituir-se professora. Como no texto da epígrafe, a
professora dispõe-se a seguir os passos, olhares e gestos das crianças, a caminhar de mãos
dadas, a ser levada a conhecer o mundo por elas e com elas e a se (re)encantar.
Nessa perspectiva, na ação de ser conduzido a partir da escuta das vozes infantis, da
observação dos caminhos e gestos das crianças, manifestam-se experiências, o encontro de
sentidos e a riqueza do acolhimento na construção do conhecimento, como encontramos na
narrativa abaixo:
Algo que nós, educadores das infâncias, precisamos nos habituar a fazer é a
observação e a escuta atenta das crianças, principalmente nos momentos de
brincadeiras. Elas são nutridas de um potencial ímpar e, ao mesmo tempo,
repletas de expectativas e cheias de curiosidade sobre o mundo, a vida, o
Universo. Costumo ouvir as crianças com quem trabalho e elas planejam
comigo os projetos e as atividades que desenvolvemos. Assim elas se tornam
coautoras de seus conhecimentos (Eliete Marcelino − Docente da Rede
Pública Municipal de Educação Infantil).
143
A fala dessa professora nos traz muitas pistas sobre a importância de escutar as
crianças, de estar disponível e atento aos gestos, aos sorrisos, ao choro, aos desenhos, às
produções, aos caminhos que elas percorrem, ao uso dos espaços-tempos, às escolhas de
brinquedos e brincadeiras, ao modo como se relacionam com outras crianças e com adultos da
UMEI. Além disso, é preciso observar o modo como elas usam e organizam os materiais
artísticos, quais alimentos preferem, como gostam e se gostam de descansar após o almoço,
como se expressam por meio das linguagens artísticas, como narram suas histórias, suas falas,
seus ritmos, seus silêncios... Para escutar, é preciso estar totalmente disponível às histórias do
outro, às singularidades, ao entendimento das diferenças como potências e estar sensível à
vida do outro. Nesse sentido, nas UMEIs não só as crianças precisam ser escutadas, mas
também suas famílias, os professores e os funcionários, uma vez que a escuta é um princípio
da convivência cuidadosa, amorosa e democrática.
Tal relato aponta que ser professora da Educação Infantil é ter a possibilidade de se
reinventar profissionalmente a cada dia, diante de cada novo contexto; é refletir sobre o fazer-
se professora também como efeito dos encontros com as crianças. Nesse cenário, os registros
são fontes potentes de reflexão, avaliação de si e das crianças e de propulsão de mudança da
prática pedagógica, pois, a partir deles, não só se registram de forma sistemática observações
e dados objetivos, mas também sentimentos, venturas e desventuras.
Como explicitado por Ostetto (2018), os registros pedagógicos ou a “documentação
pedagógica”, como sugere a pedagogia italiana, surgem da observação como um ato que não
apenas descreve a realidade, mas a interpreta, traduzindo intenções, concepções, valores,
expectativas e representações daquele que observa. O modo como registramos o que
selecionamos para registrar e a forma como apresentamos os registros revelam o nosso olhar,
o modo como compreendemos as infâncias e sua passagem pela educação infantil:
como também saberes da ordem do sensível, que possibilitem experiências estéticas, artísticas
e culturais. Segundo Leite e Ostetto (2012),
esse marco, a Educação Infantil passou a ter um caráter pedagógico e institucional, rompendo
com as amarras históricas do ambiente doméstico e do assistencialismo.
Niterói vem caminhando, juntamente com o movimento nacional, para o oferecimento
de escolas para essa faixa etária da população infantil. Nos últimos anos, Unidades de
Educação Infantil foram inauguradas com o objetivo de contemplar a demanda crescente.
Concomitante com o crescimento de sua rede física, o aspecto pedagógico também vem se
transformando, e investimentos são propiciados para que esse atendimento guarde a qualidade
ideal e necessária.
A experiência da bidocência é vivida como uma aposta intencional na melhoria do
atendimento à criança pequena. Essa escolha é um dos diferenciais da nossa Rede no que
tange ao trabalho pedagógico na Educação Infantil. Profissionais com formação pedagógica
desenvolvem olhares e escutas sensíveis, sobretudo na compreensão das múltiplas linguagens
que perpassam o universo infantil: o corpo e seus movimentos, as tensões e as apreensões, os
sentidos do choro, do riso, as demonstrações de carinho, raiva, partilha.
As crianças pequenas estão desenvolvendo sua oralidade, a capacidade de expressão,
portanto necessitam ser ouvidas com atenção e cuidado. Tais manifestações devem ser
organizadoras da rotina, do espaço e do currículo na Educação Infantil. Por meio do
acompanhamento às Unidades Escolares realizado pela Diretoria de Educação Infantil,
observamos que, quanto maior o número de crianças para um professor, a tendência da prática
pedagógica é homogeneizar as ações de cuidar-educar. Assim, estabelecem horários fixos,
planejamentos rígidos e estratégias didáticas padronizadas.
Além disso, as crianças pequenas precisam de atenção bastante individualizada em
muitas circunstâncias e requerem amplos cuidados dos adultos. Elas estão aprendendo a
cuidar de si, ganhando autonomia, necessitando da intervenção constante do adulto para
atividades de cuidados, higiene, uso dos espaços, em suas descobertas e experiências. As
crianças estão aprendendo a lidar com o mundo que as cerca, desbravando e contemplando o
seu entorno e precisam da presença de profissionais da Educação Infantil que possam com
elas dialogar pedagogicamente sobre os processos de socialização, ampliação de repertórios
culturais, seu caminhar com segurança pelos espaços-tempos da escola.
Várias experiências em nossa rede, bem como avanços na legislação, estão
frequentemente se modificando à procura de caminhos que busquem o melhor atendimento à
Educação Infantil. Essa opção se caracteriza pelo oferecimento de dois professores como
responsáveis por uma turma e, ainda, pelo planejamento, pela avaliação e pela atuação
pedagógica com as crianças. Essa organização do trabalho pressupõe a integralidade da ação
148
pedagógica com as crianças e seu direito a uma atenção singular. Ações relacionadas à
higiene, alimentação, proteção, escolha de livros literários e informativos, organização dos
espaços e dos materiais, seleção de repertório musical, entre outros, são atividades que cabem
aos dois professores de igual modo. Além dessa perspectiva, a presença de dois professores
contribui e enriquece o trabalho pedagógico, realizado a partir da análise e do diálogo entre
eles, com as crianças e a Equipe de Articulação Pedagógica em ação integrada.
Há ainda a complexa teia que envolve a Educação Infantil nos últimos anos, em
específico nesta última década, em relação à legislação e sua valorização no contexto
educacional. Primeiro se deu a promulgação da LDB, em 1996, depois a criação da Emenda
Constitucional n.o 59/2009, que prevê a obrigatoriedade do ensino para a população dos
quatro aos 17 anos de idade, depois a Lei n.o 12.796/2013, que altera a Lei n.o 9394/1996 e
estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, elucidando, em seu artigo 62, a
formação de docentes para atuar na educação básica, até que vieram os Planos de Educação.
A política de planos é outro dispositivo legal que orienta caminhos e ilumina as várias esferas
do poder público para a constituição de suas políticas de governo com o objetivo de alcançar
metas estabelecidas.
Partindo desse pressuposto, o Plano Nacional de Educação (PNE), Lei n.o
13.005/2014, em suas Metas 15, 16, 17 e 18, dispõe sobre os profissionais da educação e, em
específico, na Meta 15, sobre os professores da Educação Básica. Dessa forma, a bidocência
no município de Niterói se apresenta como uma conquista e um indicador de qualidade no que
se refere ao atendimento infantil e ao trabalho pedagógico de seus docentes.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n.º 9.394/1996,
em seu artigo 26, a Educação Física é componente curricular obrigatório na Educação Básica
e tem trazido inúmeras contribuições para o desenvolvimento das funções psicomotoras,
afetivas, políticas e sociais das crianças. Para isso, o professor de Educação Física vem, ao
longo do tempo, legitimando suas ações pedagógicas, na Educação Infantil, por meio de seu
conhecimento científico, pesquisas e aportes teóricos que evidenciam a importância do
movimento humano na sua complexidade, buscando, em seus conteúdos, elementos da cultura
corporal.
149
Nesse sentido, Santoro (2012) realiza uma crítica às instituições escolares de um modo
geral que buscam construir seus conhecimentos muitas vezes negando a participação corporal.
Na maior parte do tempo escolar, o corpo se encontra estático, obediente, em fila e calado. A
educação precisa ter movimento, ser lúdica e criativa, para que o conhecimento seja
construído por completo, por inteiro, e não apenas com a cabeça.
Ademais, Tiriba (2018, p. 239) aprofunda a crítica a esse modelo ao afirmar que “a
escola assume a tarefa de higienizar o corpo, isto é, formá-lo, corrigi-lo, qualificá-lo, fazendo
dele um ente capaz de trabalhar”. Segundo a mesma autora, é o corpo que nos faz vivo,
materializa nossa existência. “A partir das referências corporais, os seres humanos fazem
cultura. Da mesma maneira que os conhecimentos e valores, as expressões corporais são
constituídas também na cultura” (TIRIBA, 2018, p. 243).
Destacamos, então, algumas áreas do conhecimento que podem ser trabalhadas pelo
profissional da Educação Física: a cultura corporal do movimento, que abarcará jogos,
brincadeiras populares, danças e todo gestual pertencente a um grupo socialmente construído;
a psicomotricidade, na qual o corpo é compreendido em seus aspectos cognitivo, socioafetivo
e psicomotor; e o desenvolvimento motor, que, de acordo com Gallahue (2013, p. 67), são
“mudanças do comportamento dos movimentos ao longo do tempo”. Essas grandes áreas do
conhecimento não devem ser trabalhadas separadamente nem de maneira hierarquizada, uma
vez que o trabalho pedagógico deve valer-se de uma integração entre elas, não seguindo um
tempo predefinido.
Dessa forma, a Educação Física escolar, inserida no âmbito da Educação Infantil, pode
dialogar com os saberes presentes nas escolas e potencializá-los, assentando-se em uma
perspectiva dialógica na qual o corpo é acolhido, assim como as culturas infantis, as
brincadeiras inventadas ou (re)criadas pelas crianças ou mesmo aquelas do repertório popular.
As brincadeiras populares surgidas no entrecruzamento de diversas culturas que nos
constituíram, tais como cirandas, piques, brincadeiras cantadas, danças, podem ser
inspiradoras de projetos e atividades elaboradas pelo profissional de Educação Física, em
companhia das crianças e de seus demais professores. Nesse diálogo, percebemos e
referendamos que “os corpos infantis se movimentam em todo e qualquer espaço, e não só nas
aulas de Educação Física” (UMEI Vinícius de Moraes).
O profissional de Educação Física, na Educação Infantil, contribui para o pleno
desenvolvimento das crianças por meio de interações que valorizam o aprendizado, as
experiências diversas do fazer e refazer, aliadas às brincadeiras na perspectiva da autonomia e
autoria. Ele atuará diretamente no desenvolvimento do processo da apropriação e das
150
Nesse movimento, a família é chamada não apenas para tomar ciência do caminhar
pedagógico e administrativo das unidades, por meio do Conselho Escola-Comunidade (CEC),
das reuniões de planejamento e demais fóruns de discussão, mas também para atuar de
maneira integrada, tomando decisões e realizando escolhas em colaboração com profissionais
docentes e não docentes, uma vez que a ação educativa cabe a ambos. Essa integração deverá
estar referendada no Projeto Político Pedagógico.
151
5. DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA
33
Região da Itália na qual há uma rede de escolas da infância que desenvolve uma proposta teórico-prática
reconhecida e que inspira educadores e estudiosos de diversos países, inclusive o Brasil, tendo Loris
Malaguzzi como seu mentor e principal teórico.
152
Tanto nos documentos normativos, quanto nas interlocuções realizadas como Rede,
encontraremos parâmetros que servirão para orientar as diferentes Unidades Escolares,
considerando os contextos regionais/locais, além de delinear um caminho articulado para dar
sentido e significado aos processos educativos em curso. De acordo com os Referenciais
Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói,
Nessa perspectiva, não há como pensar avaliação na Educação Infantil, sem trazer para
a centralidade a criança. Como percebê-la sem ouvi-la? Como compreender suas intenções
sem de fato conhecê-la? Como determinado nas DCNEI (2009), as práticas pedagógicas,
incluindo as práticas de avaliação, devem afirmar as crianças como
6. A COMPOSIÇÃO CURRICULAR
A narrativa trazida acima pelas professoras reforça a importância das interações entre
crianças e docentes e da escuta das crianças. Nesse sentido, Barbosa (2009, p. 8) defende que
“as crianças pequenas solicitam aos educadores uma pedagogia sustentada nas relações, nas
interações e em práticas educativas intencionalmente voltadas para suas experiências
cotidianas e seus processos de aprendizagem no espaço coletivo” (BARBOSA, 2009, p. 8).
Nessa perspectiva, as Diretrizes Curriculares da Educação Infantil, Resolução n.° 5, de
17 de dezembro de 2009, normatizam que as práticas pedagógicas devem se pautar pelas
interações e brincadeiras, reafirmam os Princípios Éticos da Autonomia, da Responsabilidade,
da Solidariedade e do Respeito ao bem comum, os Princípios Políticos dos Direitos e Deveres
de Cidadania, do Exercício da Criticidade e do Respeito à Ordem Democrática e os Princípios
Estéticos da Sensibilidade, da Criatividade, da Ludicidade, da Qualidade e da Diversidade de
manifestações Artísticas e Culturais, entendendo como indissociável e intrínseco o cuidar e o
educar das crianças até cinco anos de idade. A dimensão curricular neste documento está
formalizada como um
Nesse sentido, o trabalho orientado por projetos, que considera a interação entre os
sujeitos envolvidos elemento central da aprendizagem, entende que o “saber” da criança é
fonte para pesquisas e, sendo assim, o conhecimento se constrói nas interações entre saberes
da criança/criança, criança/adulto, adulto/adulto (Vygotsky, 1989). A ação de identificar, no
universo de questionamentos trazidos pelas crianças, o tema do projeto requer ao educador
sensibilidade para ouvir e vivenciar a docência como ato de partilhar não saberes e saberes.
Assim nos inspiram as docentes da UMEI Regina Leite Garcia:
159
Concordando com esta prática e com a narrativa acima, a UMEI Alberto de Oliveira
também destaca que
quais fazem parte. Em continuidade a essa discussão, a UMEI Vinícius de Moraes evidencia a
busca pela construção de uma gestão que busca trazer o protagonismo das crianças para a
condução de seu cotidiano. Vemos o trabalho pautado por práticas pedagógicas respaldadas
em processos de investigação e pesquisas acadêmicas, como segue:
Ainda ao nos referirmos à UMEI Vinícius de Moraes, vemos no relato abaixo marcas
de espaços-tempos que são organizadas de modo a possibilitar singularidades e ampliação das
experiências das crianças:
a uma organização pedagógica que prioriza as efemérides. Essa é uma questão bastante
desafiadora, que nos exige reflexões e abertura ao diálogo.
Nesse contexto, é relevante considerar que datas comemorativas, na maioria das vezes,
seguem um calendário preestabelecido, entrecortado pela religiosidade e contextualizado pela
cultura da fé cristã. A laicidade da escola pública é um importante tema que traz consigo a
necessidade de estudos e interlocuções no seio das Unidades Escolares.
Vale destacar também que, embora algumas datas comemorativas tenham um
significado em determinados contextos sociais, em outros lugares e circunstâncias em nada
contemplariam as crianças ou a comunidade escolar. Como nos alerta Maia (2016), “a data é
utilizada para reforçar um estereótipo [...] (imagem e papel social) que vai sendo incutido nas
crianças desde cedo” (MAIA, 2016, s.p.).
Outra face não menos importante que chega junto com essas datas são os pontuais
equívocos sobre nossa identidade como brasileiros, mascarando nossa cultura e criando
estereótipos sobre o ser brasileiro e a nossa verdadeira história. Acerca desse tema, Ostetto
define bem o planejamento pedagógico referenciado pelas datas comemorativas:
Nesse contexto, Maia nos ajuda a pensar sobre as tensões curriculares causadas por
uma organização pautada nas efemérides:
[...]
A criança tem cem linguagens (e depois cem, cem, cem)
mas roubaram-lhe noventa e nove.
A escola e a cultura lhe separam a cabeça e o corpo.
162
Dizem-lhe:
de pensar sem as mãos
de fazer sem a cabeça
de escutar e de não falar
de compreender sem alegrias
de amar e maravilhar-se
só na Páscoa e no Natal.
[...]
Dessa forma, entendemos que “somente quando uma criança é considerada, quando se
sente reconhecida em suas iniciativas, pode desenvolver uma atividade livre e rica,
espontânea, sem necessidade de intervenção” (CHOKLER, 2019, p. 193). Esse
reconhecimento acontece também no ato de ver suas questões valorizadas dentro dos projetos
das UMEIs. As narrativas sobre os currículos nas Unidades com Educação Infantil aqui
presentes nos informam sobre diferentes dimensões acerca da criação do currículo e de como
as Diretrizes Curriculares da Educação Infantil são ressignificadas nesses cotidianos.
Nesse contexto, sobre a organização curricular por projetos, a UMEI Jacy Pacheco
destaca que
Assim, dar centralidade às singularidades nos faz pensar sobre as políticas curriculares
e nos remete a contemplar ampla discussão posta de disputas em torno de sentidos e interesses
isentos de neutralidade. A elaboração destes Referenciais Curriculares busca, portanto,
afirmar caminhos e escolhas em movimentos instituintes fortalecidos pela experiência dos
autores que protagonizam a história da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói ao
longo das últimas décadas. Experiências que se realizam pela história (construída em
produção de sentidos, em meio a memórias, narrativas, linguagens), para além do acúmulo de
informações que não se articulam em saberes produzidos.
(Silvana Tavano)
INTERAÇÕES BRINCADEIRA
Ainda segundo a autora, “a brincadeira não é algo dado na vida do ser humano, ou
seja, aprende-se a brincar, desde cedo, nas relações que os sujeitos estabelecem com os outros
e com a cultura” (BORBA, 2007, p. 36). Como afirma a UMEI Olga Benário Prestes, “a
brincadeira [...] é uma forma de expressão e desenvolvimento da identidade da criança.
Através dela, existe a possibilidade de socialização em que diversos papéis são vivenciados, o
que oportuniza a construção e reconstrução cultural” (NITERÓI, 2010, p.26).
No que se refere às interações, faz-se necessário pensá-las nas relações não somente
entre as crianças e seus pares etários, mas também com os adultos da escola e fora dela, com
os materiais escolares e não escolares, brinquedos estruturados e não estruturados, com os
espaços a elas oferecidos nas Unidades de Educação Infantil. Portanto, nas interações e
brincadeira, o diálogo entre a criança de hoje e de outrora (adulto) é potencializado,
reproduzindo e reconstruindo o brincar e os sujeitos sociais.
Pensando nas interações com bebês, em particular, um exemplo de material que
estimula sobremaneira a aprendizagem pelos sentidos são os cestos de tesouros, material
desenvolvido pela educadora Elionor Goldschmied, que consolidou suas experiências
educacionais trabalhando em instituições estatais italianas para crianças abandonadas.
O cesto de tesouros consiste numa atividade sensorial manipulativa e autônoma de
origem montessoriana que utiliza cestos que podem ser de tamanhos e profundidades
diferentes, onde são colocados objetos do cotidiano com texturas, cores, formas e tamanhos
diversos. Os bebês exploram esses objetos variados, principalmente por meio do tato,
favorecendo, sobremaneira, o desenvolvimento psicomotor e a coordenação mão-olho-boca.
As crianças poderão explorar, mexer e observar utensílios que fazem parte do espaço
doméstico ou não. Essa atividade se contextualiza em uma abordagem que contempla o
brincar livre e autônomo com objetos não estruturados de diferentes procedências e materiais.
Também chamado de brincar heurístico, que equivale a um processo investigativo, de procura
e descobertas.
166
Nesse contexto, Kramer (2007, p. 21) afirma que “sem conhecer as interações, não há
como educar crianças e jovens numa perspectiva de humanização necessária para subsidiar
políticas públicas e práticas educativas solidárias”. Com base nessa fala e ainda considerando
a importância das interações, cabe retornar a Smolka (2009) e suas apreciações dos estudos de
Vigotski, quando afirma que “o homem é agregado de relações sociais” no que se refere à
sociogênese34 do desenvolvimento humano e ao conhecimento. Ela ainda destaca a
importância de se considerar o desenvolvimento ontogenético no âmbito individual articulado
à história e à cultura, quando há internalização das práticas sociais, e as funções mentais
superiores são relações sociais internalizadas.
Assim, o desenvolvimento da criança encontra-se intrinsecamente relacionado à
apropriação da cultura. Essa apropriação implica uma participação ativa da criança na cultura,
tornando próprios dela mesma os modos sociais de perceber, sentir, falar, pensar e relacionar-
se com os outros.
Ainda segundo a autora, Vigotski apontava para a importância do trabalho pedagógico
na criação de condições e na abertura de novas formas de participação das crianças na cultura
e afirmava ser na trama social, com base no trabalho e ideias de outros, nomeados ou
anônimos, que se pode criar e produzir o novo. Não se cria do nada.
Nesse processo de apropriação da cultura, não só a criança assimila a produção de
cultura e se enriquece com ela; como a própria cultura, reelabora em profundidade a
composição natural de sua conduta e dá uma orientação nova ao curso do desenvolvimento. O
desenvolvimento cultural da criança apresenta-se, assim, em seu caráter dialético, como um
autêntico drama. Nesse sentido, “o desenvolvimento da criança não é simplesmente um
desenvolvimento espontâneo, linear e natural: é um trabalho de construção do homem sobre o
homem” (SMOLKA, 2009, p. 10).
Ainda reforçando a importância das interações, evidenciamos uma outra contribuição
teórica relevante para a prática pedagógica com e para bebês, que surgiu logo após a Segunda
Guerra Mundial (1946), quando a pediatra húngara Emmi Pikler desenvolve seu trabalho com
bebês e crianças em situação de abrigamento, órfãs da guerra ou separadas de suas famílias.
Sua concepção de trabalho com bebês está amparada nos seguintes pilares: a
motricidade livre, a autonomia e a segurança afetiva que envolve o vínculo adulto/criança.
34
A ontogênese refere-se à evolução humana, iniciada na concepção, seguida de transformações sequenciadas
até a morte, de tal forma que cada estágio apresenta um determinado nível de maturidade. A sociogênese
estuda as interações sociais como sendo as raízes das funções mentais superiores, que só passam a existir no
indivíduo na relação mediada com o mundo externo (Moura, E. A).
167
Nessa relação adulto/criança, o bebê é visto como metade de um par interativo e só precisa de
estabilidade, confiança e autonomia para que então torne sua subjetivação estruturante. Nesse
contexto, a narrativa pedagógica trazida pela NAEI Vila Ipiranga (2019) compartilha conosco
uma experiência proporcionada aos bebês do GREI 0, que referenda o exposto acima:
[...] os bebês, que começaram na turma com idade a partir dos 4 meses e, até
o presente, estão na faixa de 1 ano e 8 meses, tiveram a possibilidade do
autoconhecimento e percepção do outro, além do contato com a diversidade
existente ao nosso redor e se compreenderem como seres neste mundo, com
suas especificidades e particularidades, que os tornam diferentes uns dos
outros, porém iguais em direitos e deveres. Puderam mergulhar no mundo
das sensações e percepções por meio do(a): • Contato visual − cores e seus
tons (leitura de livros e revistas, desenhos, objetos, natureza etc.); • Tato −
tocar diferentes tipos de texturas, como tapete sensorial (EVA, folhas,
tampas de garrafa, algodão, pena, plástico bolha); • Olfato − puderam sentir
o cheiro de uma flor, por exemplo e • Audição − tocaram diversos tipos de
instrumentos com a bandinha da escola, onde puderam perceber a distinção
do som.
6.2 Pressupostos
Acolhemos aqui a concepção de cuidar como ética expressa por Boff (1999, p. 92). O
autor considera o cuidado como uma atitude e um modo de ser: “a forma como a pessoa
humana se estrutura e se realiza no mundo com os outros [...] é um modo de ser-no-mundo
que funda as relações que se estabelecem com todas as coisas. Não temos cuidado, mas somos
cuidado. As relações dos homens entre si e deles com a natureza, mediada pelo cuidado,
implicam não em dominação, mas comunhão, pertencimento, convivência. [...] Cuidar
significa atender, considerar.” (BOFF, 199, p. 92). O autor ainda afirma que, em tudo o que
fazemos, há o cuidado: cuidamos do que amamos; amamos o que cuidamos.
Diante dessas provocações de Boff (1999), torna-se importante nos perguntarmos
sobre como o cuidar enquanto ética se traduz nas ações cotidianas das UMEIs. Temos
buscado nos relacionar de forma amorosa, suave, amigável uns com os outros, com as
crianças e com a natureza? Estamos disponíveis e atentos aos gestos e expressões, às falas e
aos olhares uns dos outros e das crianças? Ensinamos as crianças a cuidarem umas das outras,
de nós, da escola, da cidade e do ambiente? Os espaços-tempos da escola são organizados de
forma cuidadosa, numa perspectiva da ética que pressupõe cuidados como atenção, escuta,
disponibilidade ao outro e a sua história de vida? Os espaços-tempos da escola são
organizados de forma cuidadosa, numa perspectiva da ética que pressupõe cuidado com a
natureza? Observamos os ritmos próprios das crianças, suas vivências fora da UMEI e a
constituição de suas famílias, quando planejamos ações de trocas de fraldas, alimentação,
banho, circulação nos espaços e períodos de inserção? No planejamento de nossas ações
pedagógicas, projetos e projetos políticos pedagógicos temos o cuidado como fundamento?
Nesse contexto, Tiriba (2018) afirma que quem cuida não pode estar voltado para si
mesmo, mas receptivo, atento e sensível para poder perceber o que o outro pode precisar. Para
cuidar, é necessário um conhecimento daquele que necessita de cuidados, o que exige
proximidade, tempo, entrega. Cuidar implica responsabilidade e compromisso contínuos. Por
isso, é necessariamente uma atividade relacional. Se o objeto de minhas ações são pessoas e
não coisas, cuidar envolve “responder às necessidades particulares, concretas, físicas,
espirituais, intelectuais, psíquicas e emocionais de outros” (TIRIBA, 2018, p. 178).
Em uma Educação Infantil que entende a criança como um ser integral, educar e
cuidar devem ser vividos de modo interligado, gerando uma relação estreita entre crianças e
adultos, religando, assim, o que foi historicamente separado: razão e emoção, corpo e mente,
cuidado e educação.
Ainda neste sentido, Guimarães (2015) nos indaga: “Seria possível acompanhar o
outro, educar, sem estar atento a ele, sem cuidar cuidando?” (GUIMARÃES, 2015, p. 35-36).
170
A autora defende também que o cuidado é uma dimensão que está presente no cotidiano, nas
interações, nas atividades, na organização e no planejamento dos espaços e das rotinas:
[...] quando dialogamos com choro das crianças, buscando seus sentidos;
quando respondemos aos seus gestos comunicativos com os nossos gestos e
palavras; quando damos visibilidade às suas brincadeiras, nomeamos suas
iniciativas, observamos atentamente o que produzem com seus movimentos
e palavras; quando festejamos suas conquistas; quando reconhecemos as
exigências e limites nas suas relações com o mundo. Essas situações
ocorrem no banho, no sono, na roda, na narrativa de uma história, na
construção de um jogo em diversos momentos nos quais se concretiza a
educação na creche ou escola de educação infantil, momentos de interação
das crianças entre si e com os adultos (GUIMARÃES, 2015, p. 37).
O relato trazido pela UMEI Jacy Pacheco nos dá uma dimensão ampliada do cuidado
na Educação Infantil. Sendo assim, cuidar não se restringe mais a alimentar, evitar perigos,
dar banho, mas também a preparar o espaço para receber as crianças e escolher os materiais a
serem disponibilizados.
35
Termo cunhado pelo arquiteto francês Alain Legendre, em 1983 (LEGENDRE, 1983), para referir-se aos
aspectos quantitativos e qualitativos de um determinado espaço físico. Campos-de-Carvalho e Rubiano (1994)
destacaram a relação entre esses dois aspectos, ou seja, a maneira como eles estão posicionados entre si.
174
IV - Sensibilidade e Afetividade
inaugurando um tempo de possibilidades a partir dos seus olhares curiosos, simples e atentos,
das suas leituras próprias de mundo e dos seus percursos fora e dentro da escola.
Ao nos relacionarmos com as crianças, devemos levar em conta suas manifestações,
bem como suas emoções, instrumentos preciosos e genuínos de expressão. É preciso trazer
para o centro do trabalho docente as sutilezas impressas corporal e afetivamente, em um
movimento de sensibilidade que envolva intencionalidade e disponibilidade. Segundo Dantas,
[...] investindo na busca pela identificação dos sentimentos e como lidar com
eles, com vias à resolução de conflitos e respeito mútuo [...] surge o projeto
“Museu das Emoções” (UMEI Regina Leite Garcia).
Assim como as crianças, suas famílias também devem ser acolhidas com amorosidade
e cuidado. Devem ainda ser entendidas como protagonistas no processo educativo e não
meros coadjuvantes. Mais do que convidados para reuniões e festividades, precisam encontrar
nas escolas espaços de participação e de tomada de decisão.
179
V - Dimensão Cidadã
a busca de uma formação em que a criança esteja imersa em uma concepção cidadã que vá
além de conhecer direitos e deveres. Ser cidadão pressupõe capacidade de reivindicar e
exercer direitos sabendo que, em sociedade, diferentes culturas, etnias e classes sociais
coexistem e precisam ser respeitadas em sua integralidade humana.
Assim, pensar um currículo dentro de uma perspectiva cidadã é também estar atento à
trajetória de lutas, disputas e mobilizações sociais que por décadas buscam não só respeitar,
mas valorizar grupos historicamente silenciados e marginalizados. Torna-se pauta urgente
discussões relacionadas a gênero, aos povos indígenas, à população negra e a outras minorias,
bem como toda forma de violência física e simbólica à qual estão submetidos.
A dimensão cidadã se coloca nestes Referenciais Curriculares enquanto ação
indispensável para a construção de práticas pedagógicas capazes de auxiliar nossas crianças
na construção de sua dimensão humana. Nos diálogos propostos nas conversas com as
crianças, no acolhimento aos colegas recém-chegados à instituição, no respeito aos que
possuem culturas diferentes, na necessidade de aprender a resolver conflitos por meio da
negociação, entre outras situações que marcam as rotinas da unidade, está presente a
interlocução pedagógica que alicerça uma educação que pretende colaborar para construção
de um cidadão.
Existem algumas ações que podem fazer parte da rotina que são deflagradoras de
tomadas de decisão, escolhas, posicionamentos e consensos. A realização de assembleias e a
construção de listas de combinados com as crianças são alguns exemplos. Nesse movimento,
compreende-se que os conflitos podem ser resolvidos por meio do diálogo e que muitas
decisões podem ser tomadas coletivamente. O ato de tomar decisões de maneira
compartilhada não exime os sujeitos de responsabilidades. Estes são convocados a garantir
que o que foi acordado deve ser mantido. Qualquer possibilidade de mudança também deve
ser levada ao coletivo para novas decisões. Segundo os RCEI (NITERÓI, 2010):
que a escola sozinha não é capaz de formar cidadãos, como nos aponta Sarmento.
Compreendemos que, apesar dos avanços legais,
[...] a criança é tida como um cidadão sob tutela, ou um ser humano em vias
de se tornar cidadão. Em todo o caso, nunca como um cidadão de pleno
direito. Esta situação da criança como ser humano “em vias de” qualquer
coisa é, aliás, inerente à própria condição social da infância, conforme ela foi
assumida nas sociedades ocidentais, na modernidade. A criança é tida, nas
representações sociais hegemônicas e na administração simbólica da infância
– expressa no senso-comum, nas regras formais e informais e no trabalho
institucional – como um ser em transição, em estado de desenvolvimento
(como se não fosse comum a todos os seres humanos estarem em transição e
em desenvolvimento permanente…), um ainda-não, mas em vias de o ser
(SARMENTO, 2012, p. 1).
VI - Infâncias e Natureza
182
(Manoel de Barros)
Esse pressuposto nos desloca para outro entendimento que precisa ser desenvolvido
em nós, nas crianças e em suas famílias − o entendimento de que outra relação se faz
necessária entre a humanidade e a natureza. Ambos fazem parte de um todo. Ao destruirmos a
natureza, estamos nos destruindo. É preciso desenvolver, para além de uma consciência
ambiental local, uma consciência planetária. Cacique Raoni Metuktire dos Kaiapos, em sua
potente narrativa, mostra-nos a importância disso:
Essa relação entre o homem e a Terra, entre o homem e a natureza deve-se caracterizar
por uma ligação concreta e não utilitária da porção da terra dada, deve ser caracterizada pela
indissociabilidade da interdependência entre um e outro que traduz pelas obrigações
recíprocas (DOMINGOS, 2011).
Outra nuance desse pressuposto tão importante quanto a já exposta, é a questão de
“desemparedar” as infâncias. Pela força da urbanização e da presença cada vez mais forte da
violência, as crianças não usufruem, ou fazem pouquíssimo uso, de espaços verdes e abertos,
onde possam ouvir o canto dos pássaros, ter contato com a terra e outros elementos naturais.
Nesse sentido, as Unidades de Educação Infantil públicas tornam-se espaços
privilegiados para que, pensando pedagogicamente na relação Infância e Natureza, possam
religá-las, por meio de um pensamento e de um agir local. Nessa seara, a atuação docente,
juntamente com um projeto político pedagógico coletivo, será decisiva para a instituição de
outras relações da humanidade com a natureza:
Nessa perspectiva, uma infância em contato com a natureza é algo cada vez mais
difícil na sociedade em que vivemos. A sua relação com o brincar mudou devido aos desafios
do contexto social urbano. Confinadas dentro de casa, muitas vezes as crianças só
experimentam brincadeiras mediadas por aparelhos de celular, computadores, tablets e outros
aparelhos eletrônicos. Pular corda, brincar na lama, subir em árvores, jogar bola na rua, nem
pensar! E o agravante é que tal contexto algumas vezes repete-se nas Unidades de Educação
Infantil.
Sendo assim, é necessário oportunizar a reconexão com a natureza, conscientizar-se
dos prejuízos causados pelo consumo exacerbado, do desperdício voraz. Fazer um caminho de
volta, redesenhando os caminhos de como se pode conhecer. O corpo, por tanto tempo
silenciado, submisso nos bancos escolares, precisa ser escutado. Desafios que nos convidam a
lançar um novo olhar sobre a realidade do mundo no qual estamos inseridos. Segundo Tiriba é
preciso:
Dessa forma, aliar o planejamento às vivências que podem ser experimentadas fora
das salas de aula é hoje um grande desafio para educadores, crianças e comunidade escolar. A
utilização de ambientes externos na aprendizagem significa uma mudança de cultura
importante, capaz de gerar inúmeros benefícios na formação da personalidade da criança, nas
diferentes formas de aprender e de ser professor.
Correndo, pulando, plantando, subindo em árvores, brincando com água ou
alimentando animais, as crianças trabalham a socialização, conhecem a liberdade,
desenvolvem a criatividade, a autoestima, a confiança e a capacidade de se relacionar com
outro mundo.
Quando são motivadas não apenas para o simples brincar, mas também para a
construção da brincadeira, elas colocam em prática suas relações de afeto, de amizade, de
preservação e de colaboração. Os espaços externos, se bem aproveitados, podem transformar-
185
se em ambientes acolhedores, nos quais elas se sintam confortáveis para vivenciar, manipular
e interagir, conseguindo, assim, idealizar as bases de sua estrutura sensorial, motora e
cognitiva, tão necessárias ao crescimento e à aprendizagem.
Nas escolas que não possuem essa situação tão favorável, é fundamental ofertar outras
possibilidades existentes na comunidade, no entorno. Apropriar-se da cidade, assumindo-a
como seu território, contribui para reafirmar o sentido de pertencimento e de construção da
identidade.
(Paulo Freire)
muito diferente daquilo que o filósofo já nos revelava, marcado por um ritmo
demasiadamente acelerado que “transforma cada vez mais nossas vidas de maneira tão total e
tão rápida que não conseguimos assimilar essas mudanças pela palavra” (GAGNEBIN, 1999,
p. 59), afetando a possibilidade de intercambiar experiências, não pela da falta de capacidade,
mas pela falta de condições de transmiti-las e narrá-las.
Hoje, em pleno século XXI, é comum ouvirmos que fazemos parte de uma aldeia
global, que vivemos no mundo da informação e, como consequência do constante contato
com os meios de comunicação de massa, tornamo-nos sujeitos bem informados, como se
apenas isso fosse sinônimo de conhecimento.
Ao contrário, o que podemos observar são sujeitos obcecados pela novidade, à procura
de informações que possam acessar a cada minuto. A velocidade com que essas informações
chegam a nós não nos permite que deixem rastros e marcas. Esse ritmo tão tenso e intenso
impossibilita a partilha, o diálogo e a reflexão. Dizemos saber de muitas coisas, mas nada
efetivamente nos toca, nos acontece.
Larrosa (2002, p. 21), fazendo uso também das reflexões benjaminianas, afirma que “a
informação não é experiência. E mais, a informação não deixa lugar para a experiência, ela é
quase o contrário da experiência, quase uma antiexperiência”. Ele acrescenta ainda “que uma
sociedade constituída sob o signo da informação é uma sociedade na qual a experiência é
impossível” (LARROSA, 2002, p. 21).
O autor aponta quatro fatores que têm levado ao fim da experiência na sociedade
contemporânea. Entretanto, vamos destacar apenas dois deles: a falta de tempo e o excesso de
trabalho. Quanto à falta de tempo, o autor diz que o mundo está cada vez mais veloz. Tudo
acontece cada vez mais depressa, de forma instantânea, efêmera e fragmentada. Para Larrosa:
Nesse contexto, cada vez mais aumenta o tempo na escola, na universidade, tornando
os sujeitos frutos de uma formação permanente, porém acelerada, “sujeitos da constante
atualização, da reciclagem sem fim” (LARROSA, 2002, p. 23). O tempo é usado como valor,
como uma mercadoria e, por esse motivo, não se pode perdê-lo, tendo sempre que aproveitá-
lo para não ficar para trás. Corre-se cada vez mais e, contraditoriamente, tem-se menos tempo.
187
Faltam o silêncio e a memória, mas o mais grave é que falta a vivência de uma temporalidade
que nos permita intercambiar experiências.
O autor continua afirmando que a experiência está cada vez mais rara devido ao
excesso de trabalho. O homem contemporâneo é um sujeito hiperativo, além de ser
informado, é um sujeito que opina, que está permanentemente agitado e em movimento, é um
ser que trabalha. Ou seja, “que pretende conformar o mundo, tanto o mundo natural quanto o
mundo social e humano, tanto a natureza externa quanto a natureza interna, segundo o seu
saber, seu poder e sua vontade” (LARROSA, 2002, p. 24).
O sujeito moderno considera-se capaz de realizar, controlar e produzir coisas de forma
ininterrupta, por esse motivo é incapaz de viver experiências. Ele está sempre se relacionando
com os acontecimentos do ponto de vista da ação. Como tudo é pretexto para sua atividade,
está sempre a se perguntar sobre o que pode fazer. Vive em função de fazer, produzir e
regular algo. O seu afã é mudar as coisas. Larrosa ainda acrescenta que:
Mas que experiência é essa de que estamos falando? E quem é esse sujeito da
experiência? Aquilo que nos passa, que nos afeta, produzindo em nós de alguma forma afetos,
marcas, vestígios, efeitos, pode-se entender por experiência. Por isso, é quase impossível, nos
tempos de hoje, viver experiências se não tenho a capacidade de parar, pois essa requer o
gesto de interrupção. É preciso parar para pensar, olhar, escutar e sentir.
O sujeito da experiência é aquele que não se deixa dominar por suas certezas e que não
se define pelos seus sucessos. É um sujeito receptivo e disposto a rever suas convicções
sempre que for confrontado por outros saberes e, à medida que compreende a importância do
outro em suas trajetórias, vai agregando à sua experiência componentes fundamentais, como a
formação e a transformação.
É o saber da experiência que nos ajuda a dar sentido ao que nos acontece. Assim, esse
saber não se dá pelo uso restrito da técnica ou do acúmulo de informações, mas na sua relação
direta com a vida dos sujeitos, por isso é um saber relativo e não definitivo, é particular e
subjetivo. Logo, se compreendemos a experiência como aquilo que nos passa, que nos toca,
que nos acontece, compreendemos também que “duas pessoas, ainda que enfrentem o mesmo
188
(Loris Malaguzzi)
Loris Malaguzzi, educador italiano de Reggio Emilia, citado na epígrafe acima, diz
poeticamente que não só o que a criança pensa é válido, mas válidas são também as múltiplas
linguagens da infância e a forma como as crianças pesquisam, produzem sentido e
conhecimento.
Ao falarmos das múltiplas linguagens na escola de Educação Infantil, não podemos
separá-las do processo da própria vida, do nosso percurso e história, da cultura na qual
estamos inseridos e da qual somos produtores. Ao revisitarmos os Referenciais Curriculares
para Educação Infantil da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói (2010),
percebemos nitidamente a sensibilidade já apontada pelos profissionais que compuseram essa
escrita, quando trazem à tona a reflexão sobre a criança e as diferentes linguagens. “A criança
nasce um ser de cultura, envolta nas diferentes linguagens e, como todo ser humano, é
constituída na e constituinte de cultura” (NITERÓI, 2010, p. 32).
Nesse sentido, as falas e considerações das crianças, suas expressões orais e silêncios,
seus gestos em diferentes movimentos, seus desenhos e manifestações gráficas, seus olhares e
expressões, suas contemplações e impressões para os detalhes das coisas simples, até das
criações mais complexas apresentadas pela cultura que as cerca, precisam ser considerados.
Assim, as criações e recriações sobre essa mesma cultura, seus jogos, principalmente suas
brincadeiras, não são estanques. As linguagens se manifestam nos cotidianos com dinamismo,
fazendo intercâmbios variados entre si. Com elas e por meio delas, comunicamo-nos,
interagimos, relacionamo-nos com os outros, estabelecendo conexões. Portanto, trabalhar com
diferentes linguagens não deve acontecer de forma delimitada; deve haver entre elas
integração e interdependência.
Assim, quanto maior a diversidade de parceiros e experiências potencialmente, mais
enriquecido torna-se o desenvolvimento infantil. As crianças têm potencial de encantar-se,
desejo de crescer, curiosidade que as impulsiona, desejo de interagir com outras pessoas e
assim comunicar-se. Segundo Rinaldi (1999),
192
Abra-te! Abre-te ouvido para os sons do mundo, abra-te ouvido, para os sons
existentes, desaparecidos, pensados, fruídos! Abra-te para os sons originais,
da criação do mundo, do início de todas as eras... Para os sons rituais, para
194
A música, portanto, não se limita à audição ou reprodução de canções; ela também nos
instiga, adultos e crianças, a viver experimentações e descobertas sonoras, ou seja, um
processo de musicalização pelos caminhos da intensidade, duração, frequência e timbre
sonoros, nos diferentes e mais variados contextos.
Além disso, Schafer (1991) preocupa-se em particular com os elementos mais simples,
com as observações mais corriqueiras. Dessa forma, compreendemos que a música pode
perpassar diferentes atividades, como a sonorização das histórias, o reconhecimento dos sons
presentes na escola, as propostas para distinguir as diferentes vozes das professoras, das
crianças e funcionários, as brincadeiras para tirar sons de objetos que convencionalmente não
são instrumentos musicais, a reflexão sobre nossa reação e a relação com a ausência de sons.
Dessa forma, é possível compreender que a musicalidade se desenvolve nas vivências infantis
dos seus mais diferentes lugares.
Essa concepção apresentada também nos aproxima dos mais variados estilos, não só
para reproduzi-los ou conhecê-los a partir de um recorte. O trabalho com a música, levando
em consideração toda a sua essência e potência, entendendo-a como arte, possibilitará
experiências significativas, a fim de que estejamos mais receptivos e sensíveis ao que a
música tem a nos dizer. A UMEI Elenir Ramos Meirelles compartilha conosco uma
experiência sonora musical diferenciada:
materiais foi aos poucos deixando de ser tão difícil para quem no início
sentia essa dificuldade. Disponibilizar tempo, material e espaço para
produção de instrumentos e aparelhos sonoros e para escuta de diferentes
gêneros e estilos musicais nos mostrou a capacidade inventiva das crianças e
nos fez pensar sobre a importância da arte em nossas vidas e no trabalho
com crianças pequenas (relato apresentado na Mostra de Projetos Instituintes
de 2019).
e vivenciado por elas todos os dias. A exposição das criações contribui para narrar a história
dos processos criativos individuais e coletivos, e não apenas os resultados, revelando a
cumplicidade entre crianças e professores, seus registros dos processos de elaboração e como
essas variadas expressões se concretizaram.
A leitura e a escrita, umas das tantas linguagens a serem consideradas na construção
do currículo, precisam ser repensadas, uma vez que, no contexto da Educação Infantil, ficam
as inquietações de como promover seu desenvolvimento e quais seriam os caminhos mais
adequados a serem trilhados. Convém destacar que a leitura e a escrita nesta etapa não têm
caráter preparatório para o Ensino Fundamental nem visam à antecipação da alfabetização.
Não levar em conta as culturas infantis e as especificidades desse momento de vida e relação
ativa e criativa com o mundo significa desconsiderar as crianças em sua potência. Muitas
vezes também significa fazer escolhas curriculares que sacrificam o tempo e os espaços de
brincadeira e criação.
Concordando com Paulo Freire (1989, p. 9), consideramos ser essencial haver, na
construção do currículo, intimidade com o ambiente/mundo. Segundo o autor, “a leitura de
mundo antecede a leitura da palavra” e permite a criação de símbolos e signos, mesmo antes
da compreensão dos registros formais. Essa assunção correlaciona-se com o que é proposto
por Vigotski, quando afirma que as crianças são sujeitos históricos e culturalmente situados,
ativos e produtores de cultura. É na interação e cooperação com outros, com o ambiente que
as envolve, nas múltiplas interações que o aprender se consolida.
Smolka (2003) nos faz refletir sobre práticas equivocadas que ainda se fazem
presentes em nossas instituições:
próximos, ao alcance das crianças e do seu livre manuseio, compondo diferentes tempos e
espaços.
Além disso, é preciso investir em atividades significativas com diferentes gêneros e
suportes textuais, propondo múltiplas formas de apresentar a literatura, como, por exemplo, a
leitura, a dramatização e a contação de história, utilizando diferentes objetos e recursos,
produção de recontos e releitura de forma que as professoras sejam escribas. Também é
possível, a partir das histórias, propiciar que as crianças expressem suas leituras por meio de
desenhos, pinturas, esculturas, usos de imagens etc.
Dentre os diferentes gêneros textuais, destacamos a potência da poesia como um solo
fértil a ser fecundado na Educação Infantil. Carlos Drummond de Andrade nos inspira quando
diz: “As crianças são poetas por natureza.” Esse gênero, que pode parecer difícil e
inalcançável, é um potente instrumento de interpretação da vida, das coisas tangíveis e
intangíveis. Como nos revela Drummond, a criança se aproxima muito do poeta pelo seu jeito
peculiar de ver e interpretar o mundo, pois a poesia nos sensibiliza, brinca com a realidade,
subverte e é geradora de sonhos, esperança. No entanto, o próprio autor indica que a escola
faz fenecer o encantamento em suas formas de compartimentar sujeitos e saberes:
[...] Mas, se o adulto, na maioria dos casos, perde essa comunhão com a
poesia, não estará na escola, mais do que em qualquer outra instituição
social, o elemento corrosivo do instinto poético da infância, que vai
fenecendo, à proporção que o estudo sistemático se desenvolve, até
desaparecer no homem feito e preparado supostamente para a vida? Receio
que sim.
[...] A escola não repara em seu ser poético, não o atende em sua capacidade
de viver poeticamente o conhecimento e o mundo. Sei que se consome
poesia nas salas de aula, que se decoram versos e se estimulam pequenas
declamadoras, mas será isso cultivar o núcleo poético da pessoa humana?
(DRUMMOND, 1974, p. 1).
37
Seriam os processos de interação social considerados base, principais. Estes serviriam como parâmetro para
outros processos e poderiam ser considerados como critério de validação e “definidores de lógicas centrais”.
(BRAGA, 2006 p. 11). A escrita, por exemplo, constitui-se como um processo interacional de referência.
201
A vivência relatada acima nos mostra a possibilidade de uso dos suportes midiáticos −
tão presentes na atualidade − que podem ser utilizados na Educação Infantil como mais um
recurso para tornar mais rica a construção do conhecimento.
38
Refere-se a processos sociais específicos que passam a se desenvolver segundo as lógicas das mídias. Aqui
pode-se falar em mediatização de instâncias da política, do entretenimento e da aprendizagem (BRAGA, 2006,
p. 10).
202
Dessa forma, salientamos que o brincar precisa ser o protagonista na costura desses
fios de tantas linguagens, desdobrando-se em ações criativas que não se dão em um reduzido
momento do dia, nem se restringem somente às atividades artísticas. As ações criativas se
expandem a diversos campos de produção de conhecimento; elas se fazem e dialogam nos
cotidianos, atravessando os projetos pedagógicos, a organização dos espaços/tempos ou
mesmo inspirando temáticas de trabalhos.
Consideramos, por conseguinte, a importância do brincar e sua constituição como
fonte inesgotável do processo de aprender. Para Wajskop (2001, p. 35), a brincadeira é uma
situação privilegiada de aprendizagem infantil, por levar o desenvolvimento a alcançar níveis
mais complexos, exatamente pela possibilidade de interação que oferece. Durante o brincar é
que valores, conhecimentos, habilidades e formas de participação social serão construídos,
reconstruídos, reinventados, inclusive a aprendizagem da leitura e escrita. Cabe repensar a
nossa estrutura de formação como docentes, por vezes afeitos a uma compreensão
compartimentada do conhecimento, separado por blocos ou áreas do saber, como também a
necessidade do controle de um cronos (tempo), de fases fixas de início e fim do conhecer.
Para Moura (2006), a brincadeira é promotora do encontro de todas as artes. Nesse
sentido, ela nos inspira a compreender que a criança vive as experiências com as diferentes
linguagens, sem preocupação com um produto final, mas primordialmente (re)elabora o
mundo por meio de suas experiências brincantes e linguageiras de forma integral e intensa.
Enquanto desenha, canta. Enquanto dança, desenha no ar com movimentos. Enquanto brinca
com as palavras num exercício poético, não abandona os gestos do corpo e as sensações
provocadas pelas palavras. Enquanto se mistura no barro e faz bonecos, dramatiza. Dança
espontaneamente, brinca movimentando-se.
Portanto, o brincar tece o encontro das artes e das mais variadas expressões do
humano. Sublime encontro na tessitura dos fios que puxam “invencionices” e “as coisas
203
menos importantes”, “os desperdícios”, “os silêncios”, “onde as águas guardam sotaques”,
onde “seres desprezíveis” ganham valor e contemplação, Como nos diz o poeta Manoel de
Barros:
Na Rede Pública Municipal de Educação de Niterói, percebemos que, para além dos
projetos educacionais instituintes (que emergem de situações e problematizações pensadas por
cada Unidade de Educação), é primordial considerarmos a realização de práticas que
favoreçam, nas interações cotidianas, o respeito aos diferentes modos de estar no mundo,
potencializando um sentido de educação que possibilite a manifestação da singularidade dos
sujeitos.
204
Nesse sentido, as Leis 10.639/03 e 11.645/08 têm tido desdobramentos instituintes nos
currículos das Unidades de Educação por meio de formações que contribuem para a
mobilização de discussões e práticas sobre a temática das relações étnico-raciais e para a
afirmação de uma educação antirracista. Buscamos, portanto, construir sensibilidades
relacionadas às diferentes expressões culturais e artísticas, como, por exemplo, indígenas e
afro-brasileiras, mas também entendemos a importância de conhecer outras possibilidades e
lógicas na produção de conhecimento, dialogar com elas na expectativa de desconstruir
verdades que se pretendem absolutas e são, por vezes, um obstáculo para o surgimento
criativo no cotidiano escolar, um entrave para a circulação da diferença e da enunciação de
novos sentidos.
Reconhecemos como potência a promoção de práticas curriculares que se abram a
outras epistemologias, contribuindo, desse modo, para uma educação antirracista e que
fortaleça os fluxos da diferença. Como justifica Botelho (2007),
[...] é preciso criar novos espaços e eleger outros atores sociais para um
conhecimento educacional diferenciado e, nesse aspecto, privilegiar os
conhecimentos dos quilombolas, do povo de santo, das comunidades da
floresta, de grupos que carregam o respeito à natureza. Será benéfico para a
nossa sociedade competitiva e destruidora, que, na preeminência do lucro,
devasta grandiosas áreas e desrespeita a irmã-árvore, o irmão-céu, a irmã-
terra, o irmão-rio, enfim, uma comunidade infinita que sustenta a existência
da humanidade (BOTELHO, 2007, p. 2013).
Defendemos, ainda, com Macedo (2014) a educação como processo que deve permitir
o emergir do sujeito singular:
Esse sujeito não é apenas o sujeito do reconhecimento, ele surge na ação que
cria sentidos novos, na enunciação do novo, na produção da diferença em si.
Ele é o outro de si mesmo, o diferir, a diferença em si e não em relação a
algo que lhe é externo. Essa diferença não inferioriza, ao contrário, ela é a
condição de surgimento do sujeito. É, portanto, essa diferença que temos de
recuperar, libertando-a do sentido de diferença entre (MACEDO, 2014, p.
100).
Sendo assim, será que, em nossos currículos, ouvimos de fato as crianças que habitam
as áreas de vulnerabilidade, as comunidades submetidas ao cotidiano de violência e conflitos?
Será que, em nossos currículos, criamos espaços-tempos para que elas possam ser ouvidas
com atenção? Será que a dor presente em suas falas pode ser recebida e suscitar debates
importantes na escola, como violência, exclusão, racismo, desigualdade e injustiça social?
Será que a dor, se for ouvida, pode se converter em projetos que desprivatizem esse
sentimento e possibilitem conversas entre crianças e adultos que acolham? Será que nossos
currículos compreendem esses temas como parte da vida das crianças que habitam nossas
escolas?
Concordamos com o manifesto da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa
em Educação (ANPED) (GT 12 – Currículo) e da Associação Brasileira de Currículo, quando
ressaltam a valorização da localidade, das negociações e da diversidade de sentidos que
fortalecem a autonomia das escolas e se desdobram no fortalecimento da democracia e
legitimidade das lutas políticas por justiça social, nas quais muitos sentidos surgem e
disputam o poder de significação.
No que se refere às questões de gênero, por exemplo, os desafios que se colocam são
para que as relações se deem numa condição de liberdade de escolha: buscar impor cores para
as roupas, brinquedos específicos e até padrões de comportamento prescritivos para
diferenciar o que devem fazer meninos e meninas. A escola de Educação Infantil e, em
consequência, as suas elaborações curriculares precisam problematizar as situações
carregadas de estereótipos que imprimem uma versão para o que é ser mulher e homem, o que
acaba por desrespeitar as preferências, as subjetividades, as escolhas de cada criança. Desse
modo,
207
[...] uma educação igualitária entre meninos e meninas começa pela não
segregação na definição “do que” ensinar e “como” ensinar. Tanto as
informações compartilhadas quanto os meios para tal devem ser igualmente
proporcionados às crianças. Neste sentido, a classificação entre “brinquedos
de menina” e “brinquedos de menino” estaria impedindo o acesso ao
conhecimento e ao desenvolvimento das habilidades que o brinquedo
proporciona e desenvolve (FURLANI, 2011, p. 120).
Muitos de nós temos essa formação, enquanto frutos da educação patriarcal em que se
sustenta a construção social brasileira. Daí a importância de se buscarem caminhos que
possibilitem às crianças a discussão sobre as normas e posturas impostas pela sociedade,
permitindo que as professoras e os professores se reconstruam nesse lugar de trabalho com as
crianças.
7. MATRIZ ORIENTADORA
elementos da natureza;
● Promover a observação e a contemplação da natureza por meio de
seus elementos e de seus movimentos cíclicos como o dia e a noite, as
estações, o ciclo da água etc.;
● Propor a observação de plantas e animais no ecossistema, modos de
vida, cadeia alimentar etc.;
● Promover o contato das crianças com hortas e jardins e com objetos de
diferentes características físicas, buscando formas de organizá-los;
● Realizar com as crianças experimentos e invenções, fazendo uso de
instrumentos convencionais e não convencionais;
● Brincar com misturas (consistência, temperaturas, texturas, aromas,
massa, formas) provocando mudanças físicas e químicas por meio de
atividades como culinária, pintura e manuseio de elementos da
natureza como terra, folhas, especiarias, pigmentos (urucum,
beterraba, cenoura, jenipapo, pó de café, folhas, entre outros) etc.;
● Problematizar a questão do lixo (sua produção, descarte, coleta e
reciclagem) destacando seus impactos na natureza e suas
consequências na vida do ser humano e de outras espécies;
● Promover discussões a respeito da poluição, contaminação,
deterioração dos mares, rios, lagoas, praias, as fontes, o ar, solo,
espaço aéreo, bem como a poluição visual e sonora provocadas pela
ação do ser humano;
● Selecionar e ofertar às crianças materiais que não tragam impactos à
natureza (caixas e bandejas de papelão, palha, retalhos de tecido e
papel, juta, barbantes, linhas, lãs, entre outros) para que estas
experienciem no processo de criação a potencialidade desses materiais
e seus usos conscientes;
● Promover contato com outras culturas e suas formas de compreender a
relação homem e natureza (africanos, indígenas, entre outros.).
213
indígenas;
● Promover o contato com a literatura, as artes, as tecnologias,
percebendo as expressões culturais em seus múltiplos aspectos e
intensificar o conhecimento do patrimônio cultural e artístico, dando
destaque aos bens materiais e imateriais da cidade de Niterói;
● Organizar espaços e tempos para vivência do faz de conta, jogos
cênicos e dramáticos, teatro de fantoche, teatro de sombras e
marionetes criando cenários, personagens e tramas em diálogo com as
crianças;
● Oferecer às crianças as mais diversas possibilidades de interação com
livros que tratem das questões étnico-raciais, assim como questões de
gênero e diversidade de configurações familiares;
● Apresentar e garantir a leitura literária como momento de fruição;
● Proporcionar experiências com leitura e a escrita a partir da
perspectiva discursiva levando em consideração a diversidade dos
portadores textuais, a dialogicidade, os contextos culturais,
compreendendo a criança como sujeito que pensa sobre a sua própria
escrita;
● Valorizar o desenho como linguagem reconhecendo-o como forma
legítima e potente de expressão tanto no campo do registro quanto do
estético;
● Atentar para expressões rotineiras carregadas de valores sociais muitas
vezes com teor racista, preconceituoso e violento (cabelo ruim, cabelo
duro, samba do crioulo doido, associar bagunça a um comportamento
indígena, mulher no volante perigo constante etc.) buscando sua
problematização e formas de combate;
● Garantir experiências que apresentem a influência dos povos africanos
e indígenas na constituição de nosso vocabulário;
● Assegurar o acesso e convívio com os diversos gêneros discursivos
(receitas, listas, poesias, contos, fábulas etc.);
● Possibilitar o uso de vários equipamentos digitais como câmeras,
tablets, computadores, celulares etc. como forma de realizar registro e
comunicação entre os sujeitos;
● Organizar experiências com fotografia que possibilitem o registro das
mais variadas imagens, planos e ângulos, bem como desenvolvimento
de sensibilidade e inúmeras leituras;
● Disponibilizar às crianças vídeos de animação, de filmes com
temáticas referentes a natureza, aos povos nas suas culturas diversas,
entre outros, curtas e documentários de modo a garantir o acesso e a
incentivar a produção infantil.
8. REFERÊNCIAS
ANDRADE, C. D. de. A educação do ser poético. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 20 jul.
1974.
BENJAMIN, W. Obras escolhidas. Magia e técnica, arte e política. 7. ed. v. 1. São Paulo:
Brasiliense, 1994.
______. Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013. Altera dispositivos da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da República
Federativa do Brasil, Brasília, DF, 2013.
EISNER, E. E. O que pode a educação aprender das artes sobre a prática da educação?
Currículo sem fronteiras, v. 8, n. 2, p. 5-17, jul./dez. 2008.
______. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 43. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2001.
______. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho d’água, 2010.
GADOTTI, M. Escola. In: STRECK, D. R.; REDIN E.; ZITKOSKI, J. J. (orgs.). Dicionário
Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.
______. Homenagem aos 80 anos dos Parques Infantis e ao poeta Mário de Andrade. In:
SANTOS, M. W. dos; TOMAZZETI, C. M.; MELLO, S. A. (orgs.). Eu ainda sou criança:
Educação Infantil e resistência. São Carlos, SP: EduFSCar, 2019.
HOFFMAN, J. Avaliar para promover: as setas do caminho. Porto Alegre: Mediação, 2001.
HOLM, A. M. Uma conversa com Anna Marie Holm: arte, natureza e a poesia da infância.
Entrevista realizada por Tempo de Creche. Disponível em:
https://tempodecreche.com.br/palavra-de-especialista/uma-conversa-com-anna-marie-holm-
arte-natureza-e-a-poesia-da-infancia/. Acesso em: 20 dez. 2019.
KOHAN, W. Paulo Freire, mais do que nunca: uma biografia filosófica. Belo Horizonte:
Vestígio, 2019.
______. Infância, Cultura Contemporânea e Educação contra a Barbárie. In: KRAMER, S.;
BAZILIO, L. C. Infância, educação e direitos humanos. São Paulo: Cortez, 2003.
______. A infância e sua singularidade. In: Ensino Fundamental de nove anos: orientações
para a inclusão da criança de seis anos de idade. p. 13-21. Brasília: FNDE, 2006.
LOPES, A. C.; MACEDO, E.. Teorias do currículo. São Paulo: Cortez, 2011.
MACEDO, E.. Currículo, cultura e diferença. In: LOPES, A. C.; ALBA, A. de (orgs.).
Diálogos curriculares entre Brasil e México. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2014.
MAIA, M. Isso é o que eu não sei responder. O currículo na palavra das crianças. Texto
apresentado no Seminário Vozes da Educação, 2016, p. 1-16.
MALAGUZZI, L. História, ideias e filosofia básica. In: EDWARDS, C.; GANDINNI, L.;
FORMAN, G. As cem linguagens da criança. Porto Alegre: Artmed, 1999.
MOSS, P. What future for the relationship between Early Childhood Education and Careand
Compulsory Schooling? Research in Comparative e International Education, v. 3, 2008.
In: MOTTA, F. M. N. Transições e Ruptura na passagem da Educação Infantil ao Ensino
Fundamental.
MOURA, E. Por que as crianças?. In: CARVALHO, C. H. de; MOURA, E. B. de; ARAUJO,
J. C. (orgs.) A infância na modernidade: entre a educação e o trabalho. Uberlândia:
UDUFU, 2007.
MOURA, M. T. J. A brincadeira como encontro de todas as artes. In: Salto para o futuro –
Boletim 23. Ministério da Educação. Brasília, 2006.
NITERÓI. Decreto Legislativo nº 287 de 1994. Autorização para o Termo de Convênio com
as Associações de Moradores do Município. Programa Criança na Creche. Diário Oficial da
Prefeitura de Niterói. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a1/rj/n/niteroi/decreto-
legislativo/1994/28/287/decreto-legislativo-n-287-1994-fica-o-poder-executivo-autorizado-a-
222
celebrar-termo-de-convenio-com-as-associacoes-de-moradores-do-municipio-visando-o-
desenvolvimento-do-programa-crianca-na-creche. Acesso em: 6 maio 2021.
______. Lei Municipal nº 924, de 25 de janeiro de 1991. Autorização para o Poder Executivo
criar a Fundação Municipal de Educação. Niterói, 1991. Diário Oficial da Prefeitura de
Niterói. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a/rj/n/niteroi/lei-
ordinaria/1991/93/924/lei-ordinaria-n-924-1991-fica-o-poder-executivo-autorizado-a-criar-a-
fundacao-municipal-de-educacao-de-niteroi-1991-01-25-versao-original. Acesso em: 5 maio
2021.
ROCHA, E. A. C. Por que ouvir as crianças? Algumas questões para um debate científico
multidisciplinar. In: CRUZ, S. H. V. (org). A criança fala: a escuta de crianças em pesquisas.
São Paulo: Cortez, 2008, p. 43-51.
SCHAFER, R. M. O ouvido Pensante. Trad. Marisa Fonterrada et. al. São Paulo: Fundação
Editora da Unesp, 1991.
TAILLE et al. Piaget, Vigotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo:
Summus, 1992b.
UNICEF. Relatório Situação Mundial da Infância 2012. In: United Nations Children’s
Fund (UNICEF), fev. 2012.
ANEXOS
225
PREFEITURA DE NITERÓI
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
ATO DO SECRETÁRIO
O Secretário Municipal de Educação, no uso de suas atribuições legais,
HOMOLOGA:
A DELIBERAÇÃO CME nº 045/2021 do Conselho Municipal de Educação de Niterói,
aprovada na Sessão Plenária do dia 05 de julho de 2021, que institui Comissão Especial para
análise e pronunciamento sobre os Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de
Ensino de Niterói.
VINICIUS GOMES WU
SECRETÁRIO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
39
Publicada em 23 de julho de 2021
226
I - André Antunes Martins, Lilian Azevedo da Silva, Luiz Fernando Conde Sangenis, Luiza
Cristina Rangel Pinto Sassi, Maria Felisberta Baptista da Trindade, Marta Nidia Varella
Gomes Maia, Severine Carmem Macedo e Tatiana Ribeiro dos Santos – Representantes do
Conselho Municipal de Educação de Niterói;
II - Aline Javarini, Andréia Mello Rangel, Carla Sena dos Santos Pinto, Cristiane Gonçalves
de Souza, Delma Marcelo dos Santos, Elana Cristiana dos Santos Costa, Juliana Martins de
Souza, Luciana Laureano Costa, Roberta Teixeira de Freitas, Lívia Moraes Ornelas e Rosane
Cristina Feu - Representantes Especialistas;
III - Alyne Oliveira Pecly Tavares, Ana Cláudia Santana da Silva Cruz, Fernanda de Araújo
Dias, Gisele Coelho de Oliveira, Juliana Cristina da Silva Ignacio, Luciana Silva dos Santos,
Ludiany Tavares da Costa Carvalho, Mônica Gonçalves, Priscila Artte Rosa Nascimento,
Raphael Cássio de Oliveira Pereira, Rosa Aletice e Sonia de Oliveira Martins -
Representantes de Professores e Pedagogos da Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói.
Art. 3º. A Comissão Especial será coordenada pela Prof. Luciana Laureano Costa, que será
substituída em suas faltas e impedimentos por um componente da comissão por ela designado.
Art. 4º. Ao fim dos trabalhos, a Comissão Especial apresentará suas conclusões ao Plenário
do CME que se pronunciará.
Art. 5º. Os trabalhos realizados pela Comissão Especial são considerados de relevante
interesse público.
Art. 6º. Esta Deliberação entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas todas
as disposições em contrário.
CONCLUSÃO DO PLENÁRIO
Conselheiros
VINÍCIUS GOMES WU – Presidente
EVELYN DOS SANTOS SOUZA
IDUÍNA EDITH MONT’ALVERNE BRAUN CHAVES
LILIAN AZEVEDO DA SILVA
LUIZ FERNANDO CONDE SANGENIS
LUIZ HENRIQUE MANSUR BARBOSA
LUIZA CRISTINA RANGEL PINTO SASSI
MARCELA BITTENCOURT THOMAZ DE AQUINO ESCOBAR
MARCO ANTONIO KONOPACKI
MARIA FELISBERTA BAPTISTA DA TRINDADE
MARTA NIDIA VARELLA GOMES MAIA
MAURICIO BENEVIDES SALKINI
TATIANA RIBEIRO DOS SANTOS
THIAGO SOARES RISSO POSSAS
227
PREFEITURA DE NITERÓI
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
VINICIUS GOMES WU
Secretário Municipal de Educação
I – RELATÓRIO
1. HISTÓRICO
Na 264ª Sessão Plenária do Conselho Municipal de Educação, realizada em 14/12/2020,
a então Conselheira Prof. Cristiane Gonçalves de Souza apresentou, a pedido da Secretaria
Municipal de Educação de Niterói, o conjunto de minutas das Diretrizes Curriculares da Rede
Pública Municipal de Educação de Niterói, para fins de apreciação e votação pelo Colegiado.
Em 23 de julho de 2021, foi publicada a Deliberação CME nº 045/2021, que instituiu a
Comissão Especial para análise e pronunciamento sobre os Referenciais supramencionados,
40
Publicado em 24 de dezembro de 2021.
228
2. MÉRITO
Na análise do mérito, foi considerada a legislação educacional vigente.
I - André Antunes Martins, Lilian Azevedo da Silva, Luiz Fernando Conde Sangenis,
Luiza Cristina Rangel Pinto Sassi, Maria Felisberta Baptista da Trindade, Marta Nidia Varella
Gomes Maia, Severine Carmem Macedo e Tatiana Ribeiro dos Santos – Representantes do
Conselho Municipal de Educação de Niterói;
II - Aline Javarini, Andréia Mello Rangel, Carla Sena dos Santos Pinto, Cristiane
Gonçalves de Souza, Delma Marcelo dos Santos, Elana Cristiana dos Santos Costa, Juliana
229
Martins de Souza, Luciana Laureano Costa, Roberta Teixeira de Souza, Lívia Moraes Ornelas
e Rosane Cristina Feu - Representantes Especialistas;
III - Alyne Oliveira Pecly Tavares, Ana Cláudia Santana da Silva Cruz, Fernanda de
Araújo Dias, Gisele Coelho de Oliveira, Juliana Cristina da Silva Ignacio, Luciana Silva dos
Santos, Ludiany Tavares da Costa Carvalho, Mônica Gonçalves, Priscila Artte Rosa
Nascimento, Raphael Cássio de Oliveira Pereira, Rosa Aletice e Sonia de Oliveira Martins -
Representantes de Professores e Pedagogos da Rede Pública Municipal de Ensino de Niterói;
coordenada pela Professora Luciana Laureano, reuniu-se 12 vezes no período de 30 de julho
de 2021 a 19 de novembro de 2021.
Durante as reuniões foram apresentadas as observações e contribuições por parte dos
componentes da Comissão e especialistas das áreas consultados. Diversas contribuições foram
acrescidas ao texto com o propósito de aprimorar o mesmo quanto a sua redação e mesmo dar
visibilidade a alguns conceitos ou torná-los mais explicitados, sempre com a necessária escuta
dos Representantes de Professores e Pedagogos da Rede Pública Municipal de Ensino de
Niterói que compunham a Comissão e a realização de uma reunião especial com
representantes das respectivas áreas do conhecimento que participaram da elaboração do
documento analisado.
A Comissão inicialmente ressalta o valor de uma Rede Pública Municipal de Educação
Ensino envidar esforços para a escrita coletiva de seu próprio referencial curricular; reconhece
que o mesmo segue a legislação que envolve a educação pública municipal; observa o
compromisso com o debate democrático, a fidelidade ao debate teórico mais atual e a
complexidade de se redigir um texto com a participação de tantos sujeitos, tantas mãos e em
diferentes etapas.
Oportuno frisar que a construção deste Referencial contou com ampla assessoria de
especialistas da área do Currículo em diálogo com os profissionais da rede, o que não só lhe
confere qualidade e importância, como também legitimidade frente a essa Rede Pública
Municipal de Educação.
Compreendendo que toda proposta curricular traz em si um olhar sobre a história
vivida, tensões do presente e projeções para caminhos a serem trilhados, o Referencial
Curricular de Niterói se apresenta tanto como um documento histórico, quanto orientador das
práticas cotidianas e fomentador de novos estudos, análises e experiências.
Isso posto, essa Comissão recomenda:
1 - A aprovação na íntegra do Referencial Curricular de Niterói;
2 - A entrada em vigor do RCN imediatamente após a sua aprovação e consequente publicação;
230
Conselheiros (as):
André Antunes Martins
Evelyn dos Santos Souza
Luiz Fernando Conde Sangenis
Luiz Henrique Mansur Barbosa
Luiza Cristina Rangel Pinto Sassi
Marcela Bittencourt Thomaz de Aquino Escobar
Marco Antonio Konopacki
231
VINICIUS GOMES WU
PRESIDENTE
232
PREFEITURA DE NITERÓI
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
ATO DO SECRETÁRIO
VINÍCIUS GOMES WU
Secretário Municipal de Educação
Considerando o Parecer CME nº 011/2021, que aprova o parecer da Comissão Especial sobre
os Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói.
DELIBERA:
41
Publicada em 24 de dezembro de 2021.
233
Art. 2º. Esta Deliberação entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições
em contrário.