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A partir de 2009, esses programas foram incorporados às atividades do Instituto So­


cioambiental (<www.socioambiental.org>).
10. Há várias referências a casos de outras moças capturadas pelos Yanomami no alto
curso dos afluentes da margem esquerda do rio Negro a partir de 1925 (Albert, 1985, pp. 53-6).
Foi publicada, aliás, uma nova versão do relato de Helena Valero, em 1984, na Venezuela, dessa
vez em seu nome, compilada por R. Agagliate e editada por E. Fuentes (Valero, 1984; ver Lizot,
1987). Nascida em 1919, Helena Valero faleceu em 2002.
11. Ver, por exemplo, Brumble, 1993.
12. Como os relatos de vocação xamânica (ver capítulo 3) ou as narrativas de itinerários
migratórios (ver Albert, 2008).

palavras dadas [pp. 63-6]

1. Ter “língua de fantasma” (aka porepë) significa falar uma língua não yanomami, expres-
sar-se desajeitadamente, gaguejar, emitir sons inarticulados ou ser mudo.
2. A palavra napë (pl. pë) significa “forasteiro, inimigo”.
3. Todo ente possui uma “imagem” (utupë a, pl. utupa pë) do tempo das origens, que os
xamãs podem “chamar”, “fazer descer” e “fazer dançar” enquanto “espírito auxiliar” (xapiri a).
Esses seres-imagens (“espíritos”) primordiais são descritos como humanoides minúsculos pa-
ramentados com ornamentos e pinturas corporais extremamente luminosos e coloridos. Entre
os Yanomami orientais, o nome desses espíritos (pl. xapiri pë) designa também os xamãs (xapi-
ri thë pë). Praticar o xamanismo é xapirimuu, “agir em espírito”, tornar-se xamã é xapiripruu,
“tornar-se espírito”. O transe xamânico, consequentemente, põe em cena uma identificação do
xamã com os “espíritos auxiliares” por ele convocados.
4. A expressão pata thë pë designa os líderes de facção ou de grupos locais (os “grandes
homens”) ou, de modo geral, os “anciãos”.
5. Omama é o demiurgo da mitologia yanomami. Ver capítulo 2.
6. Os Yanomami chamam as páginas escritas e, de modo mais geral, os documentos im-
pressos contendo ilustrações (revistas, livros, jornais) de utupa siki (“peles de imagens”). Para o
papel, utilizam a expressão papeo siki, “peles de papel”. Referem-se à escrita com termos que
descrevem certos motivos de sua pintura corporal: oni (séries de traços curtos), turu (conjunto
de pontos grossos) e yãikano (sinusoides). Escrever é, assim, “desenhar traços”, “desenhar pon-
tos” ou “desenhar sinusoides”, e a escrita, tRë ã oni, é um “desenho de palavras”.
7. As gravações de onde nasceu este livro foram feitas num gravador de fitas cassete. A
expressão thë ã utupë, “imagem, sombra das palavras”, refere-se à gravação sonora.
8. Os Yanomami orientais designam seus antigos por três termos genéricos: pata thë pë (os
“grandes homens”, os “anciãos”), xoae kiki (o “conjunto dos avós”, os antepassados históricos,
os maiores) e në pata pë (os ancestrais míticos).
9. Teosi vem do português “Deus”. Essa “gente de “Teosi” são os missionários evangélicos
fundamentalistas da organização americana New Tribes Mission (ntm), que fizeram sua pri-
meira visita ao alto rio Toototobi (Weyahana u) em 1958, quando Davi Kopenawa devia ter dois

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ou três anos. A ntm foi fundada nos Estados Unidos, em 1942, por Paul W. Fleming, e tem sede
em Sanford, Flórida; é conhecida no Brasil como Missão Novas Tribos (mntb).

devir outro

1. desenhos de escrita [pp. 69-79]

1. Yossi é um nome de origem hebraica, diminutivo de Yossef (Joseph). Davi Kopenawa o


associa aos membros da Comissão Brasileira Demarcadora de Limites (cbdl) que percorreu o
alto Toototobi com o spi, em 1958-9. É mais provável que seja de origem missionária: um pastor
da New Tribes Mission acompanhava a primeira expedição do spi ao alto Toototobi, em junho
de 1958. Acerca da aldeia de Marakana e dos primeiros contatos com os brancos, ver os capítu-
los 10 e 11.
2. A palavra yoasi (pl. pë) designa uma micose (Pityriasis versicolor) que provoca manchas
de despigmentação (pano branco). O ciclo mítico consagrado ao demiurgo yanomami e a seu
irmão apresenta invariavelmente este último como um ser colérico, lúbrico e desastrado (ver M
187, 191, 197-8).
3. Fácil de pronunciar e que não lembra nenhuma palavra yanomami. Os “nomes de bran-
co” que a isso se prestam foneticamente são objeto de inesgotáveis deformações humorísticas,
como Ivana, tornado iwa na, “vagina de jacaré”. Aliás, wããha yahatuai, “maltratar”, ofender o
nome”, equivale a “insultar”.
4. A sedimentação dos “nomes de branco” (napë wããha) nas aldeias yanomami na esteira
da passagem de sucessivos visitantes mereceria um estudo: nomes bíblicos, nomes de agentes da
administração indigenista, de médicos e políticos locais, nomes de estados brasileiros, de estre-
las do futebol ou de programas de televisão, nomes de personagens de desenho animado e até
de marcas publicitárias. Considerados socialmente neutros — contanto que não se aproximem
foneticamente de nenhuma palavra yanomami —, os “nomes de branco” são utilizados não
apenas em situações de contato mas, cada vez mais, entre os jovens yanomami. Os apelidos
tradicionais, que não podem ser pronunciados na presença de seus portadores ou de seus pa-
rentes próximos, conservam, entretanto, seu modo de circulação mais confidencial.
5. Sobre a terminologia de parentesco dos Yanomami orientais, ver Albert & Gomez, 1997,
pp. 289-98. Note-se que o vocativo õse! aplica-se igualmente aos irmãos e irmãs, aos filhos e
inclusive aos sobrinhos e sobrinhas, quando pequenos.
6. Davi Kopenawa utilizou aqui esse termo — que não existe em yanomami — em portu-
guês. Por outro lado, “tio”, “tia” e “avós” traduzem os termos de parentesco yanomami xoae a,
yae a, que correspondem respectivamente às posições genealógicas “irmão da mãe”, “irmã do
pai” e “avô/avó”.
7. Os Yanomami designam esses “nomes da infância” pela expressão wããha oxe kuowi.
8. Além de características físicas ou comportamentais (“Pernas longas”, “cara fechada”,
“Chorão”), os nomes yanomami às vezes denotam eventos associados ao nascimento (Waikama,
nascido após um ataque de um grupo chamado Waika) ou local de nascimento (Yokoto, que
significa “lago”).

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9. A “gente de longe” (praha thëri thë pë) ou “outra gente” (yayo thë pë) são, nesse caso, não
parentes e habitantes de outras casas comunais. Os Yanomami opõem aos nomes de infância os
apelidos pejorativos da idade adulta, descritos pela expressão wããha yahatuaiwi thë ã (“palavras
para maltratar, para ofender o nome”).
10. Não se pode, a fortiori, pronunciar o nome de um morto diante de seus parentes. Além
disso, perguntar abruptamente seu nome “tradicional” a qualquer Yanomami o deixará cons-
trangido e a resposta, em geral, será “Não tenho nome” ou “Não sei; pergunte a outra pessoa”.
11. A família linguística yanomami se subdivide em pelo menos quatro línguas e vários
dialetos (ver Anexo i). “Xiriana” é uma denominação proveniente dos Ye’kuana, vizinhos seten-
trionais dos Yanomami (Arvello-Jimenez, 1971, p. 22, n. 2). O termo era também utilizado,
antigamente, para designar tanto os Yanomami do rio Toototobi (de onde vem Davi Kopenawa)
quanto, a jusante, os Aruaque (Bahuana) do rio Demini (Ramirez, 1992, p. 4).
12. Uma certidão de nascimento com esse nome foi emitida pela Funai para Davi Kope-
nawa em janeiro de 1974 e uma carteira de identidade em julho de 1975. A data de nascimento
(presumida) que consta nesses documentos é 15 de fevereiro de 1956.
13. Essa autodenominação xamânica foi finalmente reconhecida pela Justiça brasileira, em
março de 2008. “Davi Xiriana” pôde, assim, tornar-se “Davi Kopenawa Yanomami”, nome pelo
qual se fez conhecer a partir da década de 1980, no Brasil e fora dele, em sua luta em defesa de
seu povo.
14. Esses assassinatos ocorreram em agosto de 1987, na região do posto Paapiú da Funai,
no alto rio Couto de Magalhães (Hero u). Ver capítulo 16.
15. Davi Kopenawa foi iniciado no xamanismo no início da década de 1980, pelo pai de
sua esposa, líder da comunidade onde reside atualmente com a família, Watoriki. Realizar uma
sessão de xamanismo (xapirimuu, “agir como espírito”) se diz também yãkoanamuu, “agir sob
influência do pó de yãkoana”. Embora se use a expressão “beber (koai) o pó de yãkoana”, este é
inalado. O pó é fabricado a partir da resina tirada da parte interna da casca da árvore Virola
elongata, que contém um poderoso alcaloide alucinógeno, a dimetiltriptamina (dmt). A dmt
possui uma estrutura química próxima da serotonina, um neurotransmissor, e age fixando-se a
alguns dos receptores desta. Seus efeitos psíquicos são semelhantes aos do lsd. O pó de yãkoana
contém ainda diversos ingredientes que provavelmente intensificam seu efeito: folhas secas e
pulverizadas de maxara hana, cinzas de cascas das árvores ama hi e amatha hi (ver Albert &
Milliken, 2009, pp. 114-6).
16. Diz-se que, ao soprar o pó de yãkoana nas narinas de um noviço, o xamã que o inicia
lhe transmite seus espíritos xapiri com seu “sopro vital” (wixia ou wixi aka). Davi Kopenawa
traduz wixia, em português, como “força, riqueza”. Num contexto mais geral, enquanto com-
ponente da pessoa, refere-se a ela como “vida” ou “energia”. Além da respiração, wixia é asso-
ciado à abundância de sangue e aos batimentos cardíacos e, portanto, à imagem do corpo/essên-
cia vital da pessoa (utupë).
17. A dança de apresentação (praiai) desses seres-imagens (“espíritos” xapiri) reproduz a
dos primeiros ancestrais humanos/animais (yarori) no mito de origem do fogo (M 50) e cons-
titui o protótipo superlativo da dança dos convidados (hwama) na abertura das grandes cerimô-
nias intercomunitárias reahu. Esta é realizada em torno da praça central da casa, individualmente
no início, depois em grupo. Batendo no chão com os pés, os homens dançam girando sobre si

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mesmos e brandindo suas armas ou objetos de troca. As mulheres agitam galhos novos de pal-
meira enquanto se movem para a frente e para trás.
18. O “rastro do ensinamento” que remete à origem mítica de um costume se diz hirama-
no, de hira-, “nomear, ensinar, criar”, -ma (passivo), -no, “rastro”.
19. Para os Yanomami das terras baixas, o epicentro da guerra e do ímpeto guerreiro está
situado entre a gente das terras altas, no coração histórico do território yanomami, na serra
Parima. Sobre essa “Gente da Guerra” (Niyayopa thëri), ver o capítulo 21.
20. Waithiri, a palavra utilizada aqui por Davi Kopenawa, tem ambos os significados.
21. O estado ritual (õnokae) do guerreiro homicida (que tem “a testa engordurada”) re-
mete ao fato de se considerar que ele tem de digerir ritualmente (õnokaemuu) o cadáver ensan-
guentado e a gordura de sua vítima (ver Albert, 1985, cap. 11).
22. Em outra versão desse mito, narrada pelo sogro de Davi Kopenawa (M 288), Aro se
transforma em onça. A terminação -wë, acrescentada ao nome desse personagem, é um emprés-
timo à onomástica dos Yanomami ocidentais (Xamathari).
23. Esses seres maléficos da floresta são designados, genericamente, pela expressão në wãri
pë: në (“valor de”), wãri “mal, mau”, pë (pl.).
24. Para os Yanomami, a carne e o sangue do feto são formados pelo esperma do (ou dos)
genitor(es), acumulado por sucessivas relações sexuais durante a gravidez.
25. Os Titi kiki (“noite” seguido de um plural de conjunto) projetam abaixo de si uma
mancha de escuridão que se espalha quando são flechados (ver M 80).
26. Acerca da queda do céu, ver M 7. A mitologia yanomami compreende dois conjuntos
principais de narrativas. O primeiro descreve a socialidade anômica dos ancestrais humanos/
animais (yarori) da primeira humanidade, que provocou sua metamorfose em caça (yaro) e a de
suas “imagens” (utupë) em espíritos xamânicos (xapiri). O outro desenvolve a gesta do demiurgo
Omama e de seu irmão, o enganador Yoasi, criadores do mundo e da sociedade humana atuais.
27. Os Yanomami cultivam uma centena de variedades de cerca de quarenta espécies ve-
getais (ver Albert & Milliken, 2009, pp. 32-41).
28. Os Yanomami consideram que as doenças contagiosas se propagam na forma de fu-
maça, de onde a expressão xawara wakixi, “fumaça de epidemia” (ver Albert, 1988, 1993, e Albert
& Gomez, 1997, pp. 48, 112-5). Xawara designa, genericamente, todas as doenças infecciosas
contagiosas. Os Yanomami orientais distinguem dezoito tipos de xawara (Albert & Gomez, 1997,
pp. 112-5).
29. O reahu, grande festa intercomunitária, é ao mesmo tempo uma cerimônia de aliança
política e um ritual funerário (ver Albert, 1985).
30. As oposições entre Teosi e Omama (com uma certa “teologização” deste), entre escri-
ta e oralidade, bem como entre culto cristão e xamanismo, são pilares centrais da “reversão”
efetuada por Davi Kopenawa da pregação evangélica a que foi submetido na infância (ver capí-
tulo 11).
31. Alusão ao livro do antropólogo americano N. A. Chagnon sobre os Yanomami da
Venezuela, Yanomamö, The Fierce People, publicado em 1968. Essa obra (republicada com o
mesmo subtítulo em 1977 e 1983) e escritos posteriores do mesmo autor (como Chagnon, 1988)
contribuíram para propagar, durante várias décadas, a imagem preconceituosa dos Yanomami
como um povo belicoso e violento. Tais escritos têm sido regularmente contestados por outros

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especialistas nesse grupo desde a década de 1970 (ver Tierney, 2000; Borofsky, 2005) e, mais
recentemente, pelos próprios Yanomami (ver capítulo 21).
32. A geração dos pais de Davi Kopenawa foi dizimada por duas epidemias sucessivas, nas
décadas de 1950 e 1960; o grupo do pai de sua esposa, do mesmo modo, em 1973 e em 1977. Ver
capítulos 11 e 13.
33. Essa pergunta e a insistência com que é feita deixam os Yanomami ainda mais perple-
xos na medida em que esse etnônimo é uma adaptação externa de uma expressão que significa
“os humanos” (ver anexo i).
34. Entre os Yanomami ocidentais, as cinzas dos ossos dos mortos são ingeridas com o
conteúdo de uma cabaça de mingau de banana-da-terra. Entre os Yanomami orientais, apenas
as cinzas das crianças são consumidas desse modo, ao passo que as dos adultos são sepultadas
na fogueira de seus parentes mais próximos. Em ambos os casos, o serviço funerário fica a cargo
dos afins potenciais do morto. A expressão “pôr as cinzas em esquecimento” (uxi pë nëhë mo-
hotiamãi) se refere a esse processo de ingestão ou sepultamento (ver Albert, 1985).

2. o primeiro xamã [pp. 80-7]

1. De yaro, (animal de) caça, seguido do sufixo -ri (pl. pë), que denota o que se refere ao
tempo das origens, não humano, superlativo, monstruoso ou de extrema intensidade. Esses
ancestrais (në pata pë) compunham a primeira humanidade, que foi se transformando paulati-
namente em caça, em razão de seu comportamento desregrado. Trata-se, na mitologia yanoma-
mi, de seres cuja forma pré-humana, sempre instável, está sujeita a uma irresistível propensão
ao “devir animal” (yaroprai). De modo geral, os comportamentos que precipitam tais metamor-
foses (xi wãri-) invertem as normas sociais atuais, particularmente as que regem as relações
entre afins. São as imagens (utupë) desses seres primordiais que são convocadas como entidades
(“espíritos”) xamânicas (xapiri).
2. Acerca da queda do céu e desses ancestrais ctônicos, ver M 7 e cap. 6 e 7.
3. Placa circular de cerâmica utilizada para assar os beijus de mandioca (mahe).
4. Os Yanomami descrevem o nível celeste (hutu mosi) como um tipo de abóbada apoiada
no nível terrestre (warõ patarima mosi) graças a “pés” (estacas) gigantescos.
5. Sobre o poder patogênico do metal que Omama escondeu dentro da terra, ver o cap. 16.
6. Sobre Omama e a origem dos rios, ver M 202; sobre Omama e a origem do metal, ver
cap. 9.
7. Sobre o monstro aquático Tëpërësiki (às vezes associado à sucuri), a união de sua filha
com Omama e a origem das plantas cultivadas, ver M 197 e 198.
8. Sobre o nascimento do filho de Omama, ver M 22. Davi Kopenawa às vezes chama esse
filho de Pirimari, que é também o nome da “estrela” que os Yanomami chamam de “genro da
lua”, o planeta Vênus.
9. A forma desse nome possui um caráter de redobramento do feminino: thuë, “mulher,
esposa”, -yoma, sufixo feminino (por exemplo, napëyoma = “mulher branca (napë)”. O que
expressa bem o quanto se trata da (primeira) Mulher. É uma “mulher-peixe”, que Davi Kope-
nawa costuma comparar a nossa imagem da sereia (ver cap. 20).

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