Você está na página 1de 9

UOL HOST PAGBANK PAGSEGURO CURSOS

  BUSCA  BATE-PAPO  EMAIL

(Juan Carlos Repucci)


A maior biblioteca de livros sobre vinho do mundo
ca no Brasil
10

Juan Carlos Reppucci na sua biblioteca, a maior de livros sobre vinho do mundo, em São Paulo

O que leva uma pessoa a colecionar vinhos? Difícil de nir como essa paixão cresce e se solidi ca dentro
de nós, não? Você começa a se interessar por vinho. Degusta um pouco, passa a conhecer um pouco
mais, pesquisa, descobre coisas interessantes, histórias, curiosidades, novidades. De repente, depara-
se com alguns rótulos que chamam sua atenção. Compra. Guarda. Compra. Guarda. Compra. Guarda.
Depois de algum tempo, bebe algumas das garrafas que comprou, mas logo percebe que formou uma
bela galeria. Sim, você se tornou um colecionador, algumas vezes, sem perceber.
Em nossas adegas, costumamos guardar vinhos que nos tocam, vinhos raros, vinhos caros, vinhos que
nos dizem algo, en m, vinhos aos quais nos apegamos de alguma forma. Uma das coisas que nos leva a
colecionar vinhos é a história. A história do produtor, ou a história daquele rótulo, ou ainda a forma como
a nossa história se relaciona com aquele vinho. Mas o que levaria alguém a colecionar livros de vinho?

LEIA MAIS:
» Monte sua biblioteca
» “Como saber se um vinho passou por barricas de carvalho?”

Coleção do argentino Juan Carlos Reppucci começou nos anos 1980 e hoje supera os 7 mil livros sobre vinho, sendo a maior
biblioteca do mundo sobre o tema

Se é difícil de nir a paixão pelos vinhos, mais complicado é a pelos livros ligados à essa bebida. O
argentino Juan Carlos Reppucci, de 77 anos, bem que tenta explicar sua “compulsão” pelo tema dos
livros com o tema do vinho, mas é quase impossível explicar logicamente como alguém reúne mais de 7
mil títulos, que se tornaram a maior “biblioteca vinária” do planeta, respeitada pelos maiores
colecionadores de obras ligadas à cultura do vinho no mundo, incluindo museus.

Um grupo de amigos
A impressionante biblioteca de Reppucci, que há mais de 40 anos se instalou no Brasil, ca em um
apartamento contiguo ao seu (no qual viveu o piloto Emerson Fittipaldi) na região do Itaim em São Paulo.
Segundo ele, sua coleção começou fortuitamente. Nos anos 1970, atuava como engenheiro de estradas
na Argentina e “ia sempre a lugares ermos”. “Estava na província de Entre Ríos e lá zemos muito amizade
com três casais. Os homens faziam churrasco com vinho, nada so sticado, então comecei a gostar de
vinhos. Comprei alguns livros novos sobre vinhos, mas nada demais”, conta.
A situação na Argentina, contudo, fez com que o dono da empresa para a qual trabalhava decidisse ir
para o Brasil. Reppucci resolveu vir junto e, aos poucos, foi adquirindo partes da companhia. Com o
tempo, fez fortuna na área de construção de obras públicas e concessões com a rma “CCI Concessões
e Construções de Infraestrutura”. Foi em uma viagem a Buenos Aires que o “vício” de colecionar livros
antigos se iniciou.
“Comecei a ir a uma livraria chamada Antaño”, revela. Ele fez amizade com Alfredo Breitfeld, dono da
livraria antiquaria considerada a mais importante da América do Sul. Foi lá, nos anos 1980, que
descobriu o mundo dos livros antigos e raros e adquiriu seus primeiros títulos. Com o
tempo, Reppucci provavelmente se tornou o melhor cliente da Antaño, mas não só dela, como de outras
livrarias antiquarias pelo mundo, especialmente na Itália, Espanha, França e Estados Unidos.

Aos primórdios
A curiosidade e a paixão de Reppucci pelos livros antigos com tema de vinho foi crescendo cada vez
mais e o levou até um campo muito estimado pelos colecionadores de livros, os incunábulos.
Incunábulos são primeiros livros impressos na história, desde 1450 quando o
alemão Johannes Gutenberg inventou a primeira prensa de tipos móveis, até 1500. São verdadeiros
tesouros, raros e caros, sobreviventes, seculares, dignos de veneração.

Além de incunábulos, Reppucci tem um livro manuscrito de Pietro de’ Crescenzi, copiado por escribas, por volta de 1230
“A Crônica de Nuremberg”, incunábulo de 1493, o maior livro ilustrado de sua época, com cerca de 1600 xilogravuras
Uma das estantes do apartamento/ biblioteca de Reppucci com algumas das obras mais raras de sua coleção

Primeira edição de “História Natural” de Plínio, o Velho, de 1476, encomendada pelo rei Ferdinando, de Nápoles
A parte onde essas preciosidades estão guardadas em sua biblioteca é certamente a favorita
de Reppucci, que faz questão de mostrá-la aos seus visitantes, muitas vezes sob os olhares “a itos” de
sua assistente Carla Midori Tamae, que cuida da catalogação, restauro e conservação dos livros.
Segundo a cuidadosa Carla, hoje são 91 incunábulos. “Muitas bibliotecas importantes do mundo não têm
essa quantidade”, comenta orgulhoso Reppucci, que vai direto à prateleira e retira uma de suas maiores
“riquezas”, um exemplar da História Natural de Plínio, o Velho.
“É um livro importante, um incunábulo, em língua vulgar, em italiano, a primeira edição de 1476 de
História Natural. É escrita em italiano antigo, língua orentina. Impresso a pedido de Ferdinando rei de
Nápoles”, admira, como se fosse a primeira vez que olhasse a obra, considerada uma das mais
importantes do período romano a ter sobrevivido até a era moderna e que trata dos mais diversos temas
da vida do homem.
A bíblia de Gutenberg
Dando outra olhada nas prateleiras, Reppucci “enca fado” questiona sobre onde está um livro especí co
do qual o nome lhe fugiu momentaneamente. De repente, a prestativa Carla aparece com outro tesouro
da biblioteca, “A Crônica de Nuremberg”, um famoso incunábulo de 1493, por se tratar do maior livro
ilustrado de sua época, com cerca de 1600 xilogravuras. “É um livro raro, não tem muitos exemplares
dando a volta no mundo”, comenta Reppucci.

De antes da prensa
Mas ele possui livros ainda mais antigos e raros. Um deles é um exemplar manuscrito (isso mesmo, feito
por escribas) por volta de 1230 da Ruralia Commoda, de Pietro de’ Crescenzi. Um manual de agricultura
cujo autor se baseou em outros títulos clássicos para produzir, como o De Re Rustica, de Columella, por
exemplo. Ao ser questionado se tinha algo desse clássico autor romano, a resposta de Reppucci é
bastante direta: “Sim, vários”. E vai empilhando alguns que tira das prateleiras.
Instigado por perguntas sobre alguns autores e obras clássicas do mundo do vinho, Reppucci vai
dizendo à Carla para procurar em seu vasto catálogo, todo organizado, e “seguro em nuvem”, faz questão
de dizer. Ele conta que já houve grandes colecionadores de livros sobre vinho no mundo, o mais
conhecido da história provavelmente foi André-Louis Simon, um bibliógrafo e escritor francês que se
dedicou à literatura do vinho. Além de escrever diretamente sobre o tema, ele também escreveu livros
com bibliogra as que até hoje servem de referências para livreiros e colecionadores. “Ele listou tudo, os
livros que tinha e os que não tinha, mas sabia que existiam, e onde estavam”, aponta Reppucci tirando
uma das diversas obras de catálogo feitas por Simon. Além delas, ele também possui alguns exemplares
cujo ex-libris (propriedade do livro) revela que foram da biblioteca do francês.
Perguntado sobre obras de outro escritor francês conhecido por ser um dos primeiros “críticos” do
mundo, André Julien, Reppucci não titubeia e logo Carla aparece com diversas edições dos mais
conhecidos títulos do autor, como “Topogra a de todos os vinhedos conhecidos” e “Manual do
Sommelier”, por exemplo, em edições raras.

Questão de origem
Voltando aos livros antigos, Reppucci mostra um fac-símile da primeira bíblia de Gutenberg. “Não existe
nenhum exemplar à venda, e mesmo que tivesse teria um preço impossível de comprar. Colecionadores
não vão atrás de fac-símiles, mas tenho um fantástico, feito em 1950 nos Estados Unidos. Fotografaram a
original e colocaram as cores e tudo”, conta.
Contudo, Reppucci não revela quanto gastou com sua coleção de livros e, apesar de não ter parado de
comprar, diz que é cada vez mais seletivo. Se antes ele ia atrás dos livreiros, hoje são eles que lhe
contatam caso tenham novidades que possam lhe interessar. “Eles têm que vender, então, sabendo que
o vinho é o motivo da minha coleção, sempre me mandam. Hoje em dia compro – sempre que o dinheiro
permite – algo mais selecionado, mais antigo, mais singular. Muitas vezes me oferecem muito do normal,
mas livro nunca acaba pois descorem que alguém em 1700 escreveu sobre o tema...”, diz.
Ele aponta ainda que, assim como no mundo dos vinhos, no universo dos livros raros também conta
muito a origem. “De onde saem os livros? Como foi mantido? Nos livros também têm muito problema de
roubo, falsi cação, temos um aqui que foi feito uma edição pirata em 1700 na Suíça. Era um livro difícil de
encontrar, então foi feita uma cópia”, revela.
Adega ou biblioteca
Ele também não fala sobre os custos de manutenção da biblioteca, que tem controle de temperatura e
umidade, além do trabalho constante de higienização dos livros. Carla conta que, por exemplo,
os títulos novos cam em quarentena antes de se juntarem aos outros da biblioteca, para garantir que
possíveis infestações não se propaguem.
Há 11 anos, Reppucci publica um pequeno livro com algum tema de vinho, uma espécie de excerto das
obras de sua fantástica biblioteca. A cada ano, são cerca de 150 exemplares distribuídos para amigos e
feitos “apenas por prazer” com a curadoria e supervisão do amigo Claudio Giordano, “um velho editor, no
bom sentido”. Em 2019, o tema foi “O Vinho nos Rubaiyat de Omar Khayyam”, por exemplo.
Sobre o futuro de sua coleção de livros, Reppucci não sabe precisar. Já no campo do vinho
especi camente, ele diz que possui quatro adegas em casa e outra em Monte Verde, somando cerca de
1500 garrafas. Quando questionado sobre quais rótulos coleciona, responde: “Não coleciono, bebo”, mas
enumera alguns châteaux clássicos bordaleses, domaines borgonheses de prestígio e nomes famosos
de outros países. Seu preferido, La Mission Haut-Brion (pelo qual se apaixonou depois de beber uma
safra 1978).
Se a coleção de vinhos parece ser mais simples de “liquidar” (basta literalmente beber o estoque), a de
livros ainda é uma incógnita. “Não tenho nada de nido”, admite, apesar de dizer que seus lhos têm
instruções claras para procurar os grandes livreiros caso Reppucci faleça. Que esse tesouro todo, possa
car em boas mãos e com acesso para que os estudiosos do mundo do vinho desfrutem do seu
conhecimento.

Da redação
Publicado em 5 de Maio de 2020 às 16:18

Notícias

Artigo publicado nesta revista


Revista ADEGA 173 · Março/2020 · Esquerda ou
direita?
As diferenças entre os vinhos das duas margens de Bordeaux

Para evitar a uva defumada Mundovino


A culpa é da rolha? Mundovino
Taça esperta contra o Alzheimer Mundovino
Argentinos bebendo mais Mundovino
Chablis permanece na Borgonha Mundovino

Você também pode gostar