constitucionais poderiam justificar a fungibilidade. No caso
concreto, porém, por se tratar de /ei ordinaria federal editada depois
da promulgacao da CF/88, longe de envolver duvida objetiva, nao
configuraria a fungibilidade por se tratar de erro grosseiro na
escolha do instrumento, violando, assim, o art. 4.°, § 1.°, da Lei n.
9.882/99 (ADPF 314 AgR/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j
11.12.2014, Plenario, DJE de 19.02.2015).
Estamos diante, portanto, da posigéo do STF sobre a aplicagao
do principio da fungibilidade e, como bem colocou o Min. Marco
Aurélio, da orientagao conciliatoria entre “instrumentalidade e
celeridades processuais, de um lado, e necessidade de nao se
baratear os institutos, do outro”. De acordo com os precedentes
citados, admite-se a fungibilidade quando se estiver diante de
duvida razoavel sobre o “caradter auténomo de atos infralegais (...)
como decretos, resolugées, portarias” ou em razdo da “alteragao
superveniente da norma constitucional dita violada’. Fora essas
hipdteses, caracterizado estara o erro grosseiro a afastar a
aplicagao da fungibilidade. Nesses termos, damos um claro exemplo
de erro grosseiro, como verificado no precedente acima:
impugnagao de lei federal pds-constitucional por ADPF, quando
cabivel, no caso, indubitavelmente, a propositura de ADI.
= 6.7.4. Acao Direta de Inconstitucionalidade por Omisséo (ADO)
= 6.7.4.1. Conceito (ADO)
Trata-se de inovagéo da CF/88, inspirada no art. 283 da
Constituigao portuguesa. O que se busca com a ADO é combater
uma ‘“doenga’, chamada pela doutrina de “sindrome de
inefetividade das normas constitucionais”.O art. 103, § 2.°, da CF/88 determina que, declarada a
inconstitucionalidade por omiss4o de medida para tornar efetiva
norma constitucional, sera dada ciéncia ao poder competente para
a adocao das providéncias necessarias e, em se tratando de orgao
administrativo, para fazé-lo em trinta dias. O que se busca é tornar
efetiva norma constitucional destituida de efetividade, ou seja,
somente as normas constitucionais de eficacia limitada!?"
Abrimos um pequeno paréntese, remetendo o leitor para o
capitulo que trata dos remédios constitucionais, sugerindo o
estudo conjunto da ADO com o do mandado de injungao, que
também se caracteriza como um “remédio” cujo objetivo é combater
a “sindrome de inefetividade das normas constitucionais’, de
eficacia limitada. Na ADO temos 0 controle concentrado; através
do mandado de injungao, o controle difuso, pela via de excegado
ou defesa e, atualmente, com algumas particularidades previstas na
Lei n. 13.300/2016, que o regulamentou (cf. item 14.11.5).
Cabe mencionar, por ultimo, a Lei n. 12.063/2009, que passou a
estabelecer a disciplina processual da ADO e sera apresentada nos
itens seguintes.
= 6.7.4.2. Espécies de omissao
“4 Paraaireiativa
A omissao podera ser total (absoluta) ou parcial: total, quando
nao houver o cumprimento do dever de normatizar, editando medida
para tornar efetiva a norma constitucional; parcial, quando houver a
normatizac¢ao infraconstitucional, porém de forma insuficiente.Como exemplo de inconstitucionalidade por omissao total ou
absoluta, destacamos o art. 37, VII, que prevé o direito de greve
para os servidores ptiblicos, ainda ndo regulamentado por lei.222
Outro exemplo é 0 revogado art. 192, § 3.°, que dependia de lei
(limitagao da taxa de juros a 12% ao ano — cf. S. 648/STF e SV
7/2008).
A inconstitucionalidade por omissdo parcial, por seu turno,
divide-se em duas: parcial propriamente dita ou parcial relativa.
Por omissao parcial propriamente dita, o ato normativo,
apesar de editado, regula de forma deficiente o texto. Como
exemplo, temos o art. 7.°, IV, que dispée sobre o direito ao salario
minimo. A lei fixando o seu valor existe, mas o regulamenta de
forma deficiente, pois o valor estabelecido € muito inferior ao
razoavel para cumprir toda a garantia da referida norma
Ja omissao parcial relativa surge quando o ato normativo
existe e outorga determinado beneficio a certa categoria, mas deixa
de concedé-lo a outra, que deveria ter sido contemplada. Nesse
caso, deve-se lembrar o entendimento materializado na Sumula
339/STF, potencializada com a sua conversao na SV 37/2014: “nao
cabe ao Poder Judiciario, que nao tem fungao legislativa, aumentar
vencimentos de servidores ptiblicos sob o fundamento de isonomia’.
= 6.7.4.3. Objeto (ADO)
O art. 103, § 2.°, fala em “omissao de medida” para tornar
efetiva norma constitucional em razao de omissao de qualquer dos
Poderes ou de 6rgao administrativo.
Com preciséo anota Barroso que a omissao é de cunho
normativo, que € mais ampla do que a omissao de cunho
legislativo. Assim, engloba “... atos gerais, abstratos e obrigatoriosde outros Poderes e nado apenas daquele ao qual cabe,
precipuamente, a criagdo do direito positivo”.
A omissao, entéo, pode ser do Poder Legislativo, do Poder
Executivo (atos secundarios de carater geral, como regulamentos,
instrugdes, resolugées etc.), ou do préprio Judiciario (por exemplo,
a omissao em regulamentar algum aspecto processual em seu
Regimento Interno).
Portanto, continua Barroso, “... sao impugnaveis, no controle
abstrato da omissao, a inércia legislativa em editar quaisquer dos
atos normativos primarios suscetiveis de impugnagaéo em acgao
direta de inconstitucionalidade... O objeto aqui, porém, € mais
amplo: também cabera a fiscalizagao da omissao inconstitucional
em se tratando de atos normativos secundarios, como regulamentos
ou instrug6es, de competéncia do Executivo, e até mesmo,
eventualmente, de atos préprios dos érgaos judiciarios”.225
O STF ja decidiu que, pendente julgamento de ADO, se a norma
constitucional que nao tinha sido regulamentada vier a ser
revogada, a acdo devera ser extinta por perda de objeto, julgando-
se prejudicada (ADI 1.836, Rel. Min. Moreira Alves, j. 18.06.1998).
A mesma decisao, qual seja, pela perda de objeto, tomou o STF
para a hipdtese de encaminhamento de projeto de lei sobre a
matéria ao Congresso Nacional (cf. ADI 130-2/DF), ou, ainda, pelo
nao cabimento da agado se, no momento de sua propositura, 0
processo legislativo j4 havia sido desencadeado (ADI 2.495, Rel.
Min. Ilmar Galvao, j. 02.05.2002, DJ de 02.08.2002).
CUIDADO: este Ultimo posicionamento, contudo, foi repensado
no julgamento da ADO 3.682, entendendo o STF nao se justificar a
demora na aprecia¢ao de projetos ja propostos (inertia deliberandi
das Casas Legislativas), passivel de se caracterizar umadesautorizada “conduta manifestamente negligente ou desidiosa
das Casas Legislativas’, colocando em risco a prépria ordem
constitucional (voto do Min. Gilmar Mendes — tema discutido no
item 6.7.4.9).
Por derradeiro, adotando posicionamento bastante formalista,
sobre o qual deixamos a nossa critica, o STF entendeu inexistente a
fungibilidade da ADO com o mandado de injungao, tendo em vista a
diversidade de pedidos: “Impossibilidade juridica do pedido de
conversdo do mandado de injuncdo em acao direta de
inconstitucionalidade por omissao” (MI 395-QO, Rel. Min. Moreira
Alves, DJ de 11.09.1992).
= 6.7.4.4. Competéncia (ADO)
O Orgao competente para apreciar a acao direta de
inconstitucionalidade por omissao é o STF, de forma originaria (art.
103, § 2.°, c/c, analogicamente, o art. 102, |, “a”).
= 6.7.4.5. Legitimidade (ADO)
Os legitimados para a propositura da ADO sao os mesmos da
ADI genérica, ou seja, o rol previsto no art. 103, com as
peculiaridades ja apontadas em relagao a pertinéncia tematica.
A Lei n. 12.063/2009 ratificou esse posicionamento, nao
havendo mais qualquer duvida sobre a questao.
= 6.7.4.6. Natureza juridica dos legitimados (ADO)
Conforme anota o Min. Gilmar Mendes, assim como acontece na
ADI genérica, 0 processo de controle na ADO tem por escopo a
“defesa da ordem fundamental contra condutas com ela
incompativeis. Nao se destina, pela propria indole, a protecado desituagdes individuais ou de relagées subjetivadas, mas visa
precipuamente a defesa da ordem juridica”. Os legitimados agem
como “advogados do interesse ptblico ou, para usar a expressao
de Kelsen, como advogados da Constituigdo”. Utilizando a
denominagao de Triepel, tem-se “tipico processo objetivo” (voto na
ADI 3.682).
= 6.7.4.7. Procedimento (ADO)
O procedimento da acgao direta de inconstitucionalidade por
omissdo (ADO) é praticamente o mesmo da ADI genérica, com
algumas peculiaridades.
Nos termos do art. 12-B da Lei n. 9.868/99, a peticao inicial,
acompanhada de procuragao, se for o caso, sera apresentada em
duas vias, devendo conter copias dos documentos necessarios para
comprovar a alegagao de omissao, e indicara:
= a omiss&o inconstitucional total ou parcial quanto ao
cumprimento de dever constitucional de legisiar ou quanto a adogao
de providéncia de indole administrativa;
= 0 pedido, com suas especificagées.
Naturalmente, em razdo do peticionamento eletrénico, nao faz
mais sentido a prescrigdo de apresentacdo da peticao em duas vias,
por isso o texto prescreve essa necessidade “se for 0 caso”. Dentro
dessa realidade, de modo acertado, o art. 4.°, § 1.°, da Lei n.
13.300/2016 (que disciplina o processo e o julgamento dos
mandados de injuncgao individual e coletivo) estabelece que,
“quando n4o for transmitida por meio eletrénico, a petigao inicial
e os documentos que a instruem serao acompanhados de tantas
vias quantos forem os impetrados”.A peticao inicial inepta, nado fundamentada, e a manifestamente
improcedente serdo liminarmente indeferidas pelo relator, cabendo
agravo da referida decisao.
Lembramos que, de acordo com o CPC/2015, com vacatio legis
de um ano a contar da data de sua publicagao oficial (art. 1.045),
previsto nos arts. 994, Ill, e 1.021, contra a decisaéo monocratica do
Relator cabera o recurso de agravo interno para o Pleno do STF.A
novidade € que, por forga da regra explicita do art. 1.070 e da
previsao geral fixada no art. 1.003, § 5.°, o prazo para a interposigao
desse recurso, bem como para responder-lhe (art. 1.021, § 2.°),
passa a ser de 15 dias (e nao mais de 5), devendo a contagem,
pela regra geral do art. 219 do Novo CPC/2015, dar-se em dias
Uteis.
Proposta a a¢ao, nao se admitira desisténcia, devendo ser, no
que couber, aplicadas as disposigdes constantes da Segao | do
Capitulo II da Lei n. 9.868/99.
Os legitimados constantes do art. 103 da CF/88 poderado
manifestar-se, por escrito, sobre 0 objeto da agdo e pedir a juntada
de documentos reputados titeis para o exame da matéria, no prazo
das informagées, bem como apresentar memoriais.
Modificando o entendimento do STF,274 a lei passou a
estabelecer que o relator podera solicitar a manifestagao do AGU,
cujo encaminhamento devera ser feito no prazo de 15 dias.
O Procurador-Geral da Republica, nas agdes em que nao for
autor, tera vista do processo, por 15 dias, apds o decurso do prazo
para informagées.
Finalmente, segundo Clémerson Merlin Cleve, “nado ha prazo
para a propositura da aco. E evidente, entretanto, que sem o
transcurso de um prazo razoavel, aferivel caso a caso, nao haveraomissao inconstitucional censuravel, mas sim mera lacuna técnica
(omissao constitucional e omissao constitucional em transito para a
inconstitucionalidade)’.225
= 6.7.4.8. Medida cautelar (ADO)
Nesse ponto, a Lei n. 12.063/2009 inovou a matéria, passando a
admitir expressamente medida cautelar na ADO.
Segundo o art. 12-F da Lei n. 9.868/99, em caso de excepcional
urgéncia e relevancia da matéria, o STF, por decisdo da maioria
absoluta de seus membros, observado o disposto no art. 22
(quorum de instalagéo da sessao de julgamento com no minimo 8
Ministros), podera conceder medida cautelar, apés a audiéncia
dos orgaos ou autoridades responsaveis pela omissao
inconstitucional, que deverao pronunciar-se no prazo de 5 dias.226
A medida cautelar podera consistir na suspensao da aplicagao
da lei ou do ato normativo questionado, no caso de omissao
parcial, bem como na suspensao de processos judiciais ou de
procedimentos administrativos, ou ainda em outra providéncia a
ser fixada pelo Tribunal.
O relator, julgando indispensavel, ouvira o Procurador-Geral da
Republica, no prazo de 3 dias.
No julgamento do pedido de medida cautelar, sera facultada
sustentagdo oral aos representantes judiciais do requerente e das
autoridades ou orgaos responsaveis pela omissao inconstitucional,
na forma do previsto no Regimento do Tribunal.
Concedida a medida cautelar, o STF fara publicar, em secao
especial do Diario Oficial da Unido e do Diario da Justiga da Uniao,
a parte dispositiva da decisao no prazo de 10 dias, devendo solicitar
as informag6es a autoridade ou ao orgao responsavel pela omissaoinconstitucional, observando-se, no que couber, 0 procedimento
estabelecido na Secao | do Capitulo Il da Lei n. 9.868/99.
= 6.7.4.9. Efeitos da decisao (ADO)
= 6.7.4.9.1. Regras gerais
Declarada a inconstitucionalidade em razao de omiss4o total ou
parcial, indagamos se o STF (Poder Judiciario) poderia elaborar a
lei, para suprir a omissao
Em respeito ao principio da tripartigao dos Poderes, insculpido
no art. 2.° da CF/88, nao é permitido ao Judiciario legislar (salvo nas
hipoteses constitucionalmente previstas, como a elaboragao de seu
Regimento Interno).
O art. 103, § 2.°, estabelece efeitos diversos para o poder
competente e para o 6rgao administrativo:
=| poder competente: sera dada ciéncia ao poder competente,
nao tendo sido fixado qualquer prazo para a adocao das
providéncias necessarias;
= Orgdo administrativo: devera suprir a omissao da medida no
prazo de 30 dias, sob pena de responsabilidade, ou, na dicgao do
art. 12-H, § 1.°, da Lei n. 9.868/99, em prazo razoavel a ser
estipulado excepcionalmente pelo Tribunal, tendo em vista as
circunstancias especificas do caso e o interesse publico
envolvido.
Neste ponto, o art. 103, § 2.°, poderia ser interpretado de duas
maneiras: a) ou o prazo foi estabelecido apenas para o orgao
administrativo, nado podendo o STF fixar prazo para o Legislativo ou
outro Poder omisso; b) ou o prazo pode ser fixado pelo Judiciario
tanto para o érgdo administrativo como para o Legislativo ou outro6rgao omisso. Porém, se estabelecido para o orgdo administrativo,
devera ser dentro de 30 dias e, agora, nos termos do art. 12-H, §
1.°, da Lei n. 9.868/99, em prazo razoavel a ser estipulado
excepcionalmente pelo Tribunal, tendo em vista as circunstancias
especificas do caso e o interesse ptiblico envolvido.
Nesse sentido, o Min. Carlos Britto, no julgamento da ADO
3.682, observou, acompanhando o voto do Min. relator:
“diferentemente da Constituigado portuguesa, a nossa nao se limitou
a cuidar da ADI por omissao de medida legislativa; foi além. Quando
a nossa Constituigaéo falou em dar ciéncia ao poder competente,
claro que mais de um poder, nado so ao Poder Legislativo, apenas a
Constituigao avangou o comando de que, em se tratando de orgao
administrativo, esse prazo seria de trinta dias, mas sem com isso
excluir a possibilidade de se fixar um prazo, logicamente, maior
para o Poder Legislativo” (grifamos).
O tema, nessa linha, foi amplamente revisto pelo STF no
precedente citado (e de indispensavel leitura para as provas e
concursos), no qual se discutiu a inércia do legisiador em elaborar a
LC federal, prevista nos termos do art. 18, § 4.°, na redagado dada
pela EC n. 15/96, fixando o procedimento de criagao dos novos
Municipios (cf. item 7.6.1).
Como se sabe, a EC n. 15/96, alterando a redagao do art. 18, §
4.°, foi publicada em 13.09.1996. Apesar de fazer mais de 20 anos,
a lei complementar federal ainda nao é uma realidade, mostrando-
se, portanto, flagrante a omissao. (Devemos lembrar que o
Congresso Nacional ja aprovou projeto de lei complementar
disciplinando a matéria, porém, este foi vetado pela entao
Presidente da Republica Dilma Rousseff mais de uma vez. O ultimo,
nos mesmos termos de veto anterior, de acordo com a mensagem n.
250/2014, teve por fundamento o dito interesse publico:“depreende-se que havera aumento de despesas com as novas
estruturas municipais sem que haja a correspondente geracdo de
novas receitas”).
O Min. Relator, Gilmar Mendes, no julgamento da citada ADO
3.682, a época antes da aprovagao dos mencionados projetos de lei
(que, alias, como visto, foram todos vetados), estabeleceu: “...
apesar de existirem no Congresso Nacional diversos projetos de lei
apresentados visando a regulamentagdo do art. 18, § 4.°, da
Constituigao, € possivel constatar a omissao inconstitucional
quanto 4a efetiva deliberagdo e aprovagado da lei complementar
em referéncia. As peculiaridades da atividade parlamentar que
afetam, inexoravelmente, 0 processo legislativo, nao justificam
uma conduta manifestamente negligente ou desidiosa das
Casas Legislativas, conduta esta que pode por em risco a propria
ordem constitucional. A inertia deliberandi das Casas
Legislativas pode ser objeto da acao direta de inconstitucionalidade
por omissao. A omissdo legislativa em relacéo a regulamentagao do
art. 18, § 4.°, da Constituigao, acabou dando ensejo a conformagao
e a consolidagao de estados de inconstitucionalidade que nao
podem ser ignorados pelo legislador na elaboracao da lei
complementar federal”
Pelo que se observa do voto do Min. Gilmar Mendes, no direito
alemao, com o objetivo de afastar as omissées legislativas, varias
técnicas surgiram, como aquela que declara a
inconstitucionalidade sem pronuncia de nulidade
(Unvereinbarerlarung), ou aquela de apelo ao_ legislador
(Appellentschedung), esta ultima “... decisao na qual se afirma que a
situagao juridica em apreco ainda se afigura constitucional, devendo
o legislador empreender as medidas requeridas para evitar aconsolidagdo de um estado de inconstitucionalidade”, tudo para se
evitar uma inconcebivel situagdo de “auténtico caos juridico”.
E conclui: “o principio do Estado de Direito (art. 1.°), a clausula
que assegura a imediata aplicacao dos direitos fundamentais (art.
5.°, § 1.°) e o disposto no art. 5.°, LXXI, que, ao conceder o
mandado de injungado para garantir os direitos e liberdades
constitucionais, impde ao legislador o dever de agir para a
concretizacgao desses direitos, exigem agao imediata para eliminar o
estado de inconstitucionalidade’.
Assim, a aco foi julgada “... procedente para declarar o estado
de mora em que se encontra o Congresso Nacional, a fim de que,
em prazo razoavel de 18 (dezoito) meses, adote ele todas as
providéncias legislativas necessarias ao cumprimento do dever
constitucional imposto pelo art. 18, § 4.°, da Constituigao, devendo
ser contempladas as situagdes imperfeitas decorrentes do estado de
inconstitucionalidade gerado pela omissao. Nao se trata de impor
um prazo para a atuacdo legislativa do Congresso Nacional, mas
apenas da fixacao de um parametro temporal razoavel, tendo em
vista 0 prazo de 24 meses determinado pelo Tribunal nas ADI n.
2.240, 3.316, 3.489 e 3.689 para que as leis estaduais que criam
municipios ou alteram seus limites territoriais continuem vigendo,
até que a lei complementar federal seja promulgada contemplando
as realidades desses municipios” (ADO 3.682, Rel. Min. Gilmar
Mendes, j. 09.05.2007, DJ de 06.09.2007).
Muito embora a ementa acima reproduzida nao indique o carater
coercitivo da decisdo do STF (“nado se trata de impor um prazo para
a atuacao legislativa do Congresso Nacional, mas apenas da
fixagéo de um parametro temporal razoavel’), a leitura do
acérdao?2” e suas discussées finais nos dava a ideia de que, em
tazao do carater mandamental da decisao, o Congresso Nacionalteria de legislar dentro de tal periodo de 18 meses, prazo, inclusive,
fixado no dispositivo do acérdao.
Em nao elaborando a lei, dado o carater mandamental,
consequéncias processuais poderiam decorrer e, ainda, parece-nos
que seria possivel aplicar, por analogia, o art. 64 e seus paragrafos
(CF/88), com a ideia de travamento de pauta, ou, quem sabe, diante
da evolugado da jurisprudéncia do STF no controle das omissées
legislativas (MI 712 — cf. item 14.11.57) e das novidades
introduzidas pela Lei n. 13.300/2016, o suprimento da omissao pelo
proprio STF.
Questionando os efeitos praticos da ADO 3.682, em 11.09.2008,
o Presidente da Camara dos Deputados encaminhou o Oficio n.
1073/2008/SGM/P, de 02.09.2008, ao Presidente do STF, dizendo
nao ter tomado conhecimento de decisdo que “obrigasse” o
Parlamento a elaborar a LC, assim como alertando sobre o risco de
a decisao do STF violar o principio da separagao de Poderes (art.
2.° da CF/88), caso fosse realmente impositiva a decisdo proferida.
Contudo, restringindo nossa opinido, o entaéo Presidente do
STF, Min. Gilmar Mendes, determinou, em 12.09.2008, por meio do
Oficio n. 346/GP, fosse comunicado ao Presidente da Camara dos
Deputados 0 inteiro teor do acérdao de fis. 132-187, e esclareceu:
“nao se trata de impor um prazo para a atuacdo legislativa do
Congresso Nacional, mas apenas da fixagao de um parametro
temporal razoavel, tendo em vista o prazo de 24 meses
determinado pelo Tribunal nas ADI ns. 2.240, 3.316, 3.489 e
3.689 para que as leis estaduais que criam municipios ou
alteram seus limites territoriais continuem vigendo, até que a lei
complementar federal seja promulgada contemplando as
realidades desses municipios”.Deixou claro, no entanto, que findo o prazo de 24 meses e nao
resolvida a situacao dos Municipios criados violando a regra contida
no art. 18, § 4.°, eles desapareceriam, restabelecendo a situagao
anterior.
Para tentar resolver esse impasse, o CN promulgou a EC n.
57/2008, que acrescentou 0 art. 96 ao ADCT.: “ficam convalidados os
atos de criac&o, fusao, incorporagéo e desmembramento de
Municipios, cuja lei tenha sido publicada até 31 de dezembro de
2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legisiagao do
respectivo Estado a época de sua criagao”.
Percebe-se que referida EC convalidou, de acordo com os
limites temporais indicados, o vicio formal de todas as leis estaduais
que criaram Municipios sem a observancia do art. 18, § 4.°,
“constitucionalizando”, de maneira ilegitima, leis que nasceram
inconstitucionais.
Parece-nos bem complicado aceitar que Municipios que foram
criados, alguns até, por exemplo, sem o plebiscito adequado, sem
um rigoroso estudo de viabilidade, sejam convalidados por emenda
constitucional em um “gritante’ e imoral mecanismo de
constitucionalidade superveniente.
Em nosso entender, a EC foi contra a decisao do STF que fazia
um “apelo” para se elaborar a lei complementar e, uma vez
elaborada, a decisdo do STF era no sentido de se corrigir 0 vicio
apontado, dando oportunidade para que os Municipios criados
preenchessem todos os requisitos constantes do art. 18, § 4.°.
Foi por esse motivo que o STF fixou um prazo distinto na
modulagao dos efeitos.
Lembrando, o apelo era para o Congresso Nacional fazer a lei
em 18 meses e, em relacgao aos Municipios, foi fixado o prazo de 24meses de sobrevida. Essa diferenga de 6 meses seria para que 0
Municipio corrigisse 0 vicio formal de inconstitucionalidade, e, se
nada fizesse, findo o prazo maior de 24 meses, implacavelmente, o
Municipio desapareceria. Sem duvida, novamente, insistimos, a EC
mostra-se ilegitima e inconstitucional.
Resta saber como o STF interpretara essa questao se,
eventualmente, a EC n. 57/2008 vier a ser objeto de futura ADI
(matéria pendente).
Temos observado que os municipios que foram criados a partir
de 31.12.2006, data estabelecida pela emenda, nao estéo sendo
preservados pelo STF, ja que referida emenda convalidou
expressamente apenas aqueles que foram efetivamente criados até
aquela data, conforme se observa pelo comando contido no art. 96
do ADCT (cf. ADI 4.992, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 11.09.2014,
Plenario, DJE de 13.11.2014)
Alertamos, contudo, que, em determinado caso concreto, o STF
acabou aceitando os termos da referida emenda, o que, com o
maximo respeito, pelos motivos expostos, nado entendemos ter sido
a melhor decisao, até porque sustentamos que a EC n. 57/2008,
além de ser imoral, é flagrantemente inconstitucional por violar a
regra contida no art. 18, § 4.°, CF/88. Vejamos:
“EMENTA: Criagao do Municipio de Pinto Bandeira/RS. Acao
julgada prejudicada pela edicgdo superveniente da EC
57/2008. Alegagao de contrariedade a EC 15/96 (...). Como
advento da EC 57/2008, foram convalidados os atos de
criagao de Municipios cuja lei tenha sido publicada até
31.12.2006, atendidos os requisitos na legislagaéo do
respectivo estado a época de sua criagdo. A Lei 11.375/99 foi
publicada nos termos do art. 9.° da Constituigaéo do Estado doRio Grande do Sul, alterado pela EC 20/97, pelo que a criagdo
do Municipio de Pinto Bandeira foi convalidada” (ADI 2.384
AgR, Rel. Min. Carmen Lucia, j. 24.03.2011, Plenario, DJE de
11.04.2011).
= 6.7.4.9.2. Novas perspectivas: ADOs 24, 25 e 26 — um passo
adiante nas decisé6es meramente recomendatérias
LET ed
Passamos a estudar trés importantes casos que sinalizam uma
perspectiva de superacao do timido entendimento que se firmou na
jurisprudéncia do STF no sentido de simplesmente constituir o
Poder competente em mora.
O primeiro deles foi a decisdo tomada pelo Min. Dias Toffoli, no
julgamento monocratico do pedido de medida cautelar na ADO 24
(j. 1.°.07.2013). Apesar de se tratar de julgamento monocratico e
nao pelo Plenario (como aquele proferido na ADO 25, a seguir
analisado), a sua importancia se mostra extremamente relevante, e,
por isso, o seu destaque.
O art. 27 da EC n. 19/98 estabeleceu 0 prazo de 120 dias para
que o Congresso Nacional elaborasse a lei de defesa do usuario
de servicgos publicos, alias, um assunto extremamente importante
quando se pensa nos servicgos de satide, educacao, transporte,
assisténcia social etc.
Nesse sentido, o art. 37, § 3.°, |, CF/88 estabelece que a lei
disciplinara as formas de participagao do usuario na administragao
publica direta e indireta, regulando especialmente e dentre outrasquestées as reclamagées relativas a prestacdo dos servicos
publicos em geral, asseguradas a manutengado de servicos de
atendimento ao usuario e a avaliagdo periddica, externa e interna,
da qualidade dos servigos. O art. 175, |, CF/88, por sua vez, ao
disciplinar a prestagao de servicos publicos, assevera, dentre outras
questées, que a lei dispora sobre os direitos dos usuarios e a
obrigagdo de manter o servi¢o adequado.
No momento do julgamento do pedido de liminar (j. 1.°.07.2013),
haviam-se passado quase 20 anos, e a lei, que deveria ter sido
editada em 120 dias, a contar da data da EC n. 19/98, ainda nao
tinha sido elaborada, apesar da existéncia de projetos de lei
tramitando (PLC n. 6.953/2002, substitutivo do PL n. 674/99).
Tratava-se de mais um complicado exemplo de inatividade
legislativa e, no caso, por existirem os projetos de lei, de inertia
deliberandi (discussao e votagao).
Em sua decisao, de maneira acertada, o Ministro entendeu que a
inércia na apreciagao dos projetos de lei se mostrava inaceitavel,
ja que manifesta a omiss4o a caracterizar afronta a Constituigao
(e, por que nao dizer, nas palavras do Min. Gilmar Mendes, no
julgamento da ADO 3.682, omissdo negligente e desidiosa a
colocar em risco a propria ordem constitucional).
Dessa forma, acolhendo o pedido formulado pela OAB, fixou o
prazo de 120 dias para que o Congresso Nacional elaborasse a lei.
Muito embora tenha sido fixado o prazo de 120 dias para que o
Congresso Nacional elaborasse a lei, de maneira extremamente
complicada, pois nao se respeitou a ordem judicial que fixava o
prazo mais do que razoavel, somente em 26.06.2017 foi editada a
Lei n. 13.460, estabelecendo as normas basicas para participagao,protecdo e defesa dos direitos do usuario dos servigos publicos
prestados direta ou indiretamente pela administragao publica.
A lei é@ bastante avancada e traz importantes conquistas.
Contudo, algo nos chamou muito a atengao: o art. 25 do dispositivo
legal estabelece os seguintes prazos, a contarem da publicacdo,
para sua vigéncia (vacatio legis):
= 360 dias para a Unido, os Estados, o Distrito Federal e os
Municipios com mais de quinhentos mil habitantes;
= 540 dias para os Municipios entre cem mil e quinhentos mil
habitantes; e
= 720 dias para os Municipios com menos de cem mil
habitantes.
Realmente, lamentavel essa previsdo de vacatio legis
extremamente desarrazoada! A EC n. 19/98, ha 19 anos, fixou um
prazo de 120 dias para que a lei fosse elaborada. Passados nao 120
dias, mas 19 anos, ou seja, quase 7.000 dias (e nao 120, insista-
se), a lei foi publicada. Curiosamente, os Parlamentares fixaram
novos prazos para sua vigéncia, totalmente inaceitaveis. Em nosso
entender, o art. 25 da lei, que estabelece referidos prazos, tendo
como parametro o de 120 dias a contar da promulgagao da EC n.
19/98, ou seja, a contar de 04.06.1998, é flagrantemente
inconstitucional.
Essa questao, pensamos, poderia ter sido discutida na referida
ADO em analise, sob a perspectiva de que o desproporcional prazo
de vacatio legis significou afronta ao prazo de 120 dias fixado na
liminar, que foi proferida no ano de 2013. Em 20.12.2017, contudo, o
processo foi extinto em razao do advento da lei e, assim, eventual
discussao somente podera ser travada em acdao individual ou
mediante a propositura de eventual ADI.Agora passamos a analisar o segundo precedente, qual seja, 0
julgamento da ADO 25, que se deu pelo Plenario do STF e, assim,
sem duvida, trouxe novas e avan¢gadas perspectivas.
Conforme expresso na E.M.I. n. 84/MF/C.Civil, de 30.04.2003,
que encaminhou a PEC 41/2003, aprovada como EC n. 42/2003
(‘Reforma Tributaria”), objetivava-se, com as alteragdes propostas.
“mantendo a arrecadagéo nas trés esferas de governo e
fortalecendo a Federagao”, “estimular a atividade econémica e a
competitividade do Pais, através da racionalizagao e simplificagao
dos tributos’”.
Assim, dentre as varias modificagdes introduzidas pela reforma,
destacamos a constitucionalizagao da desoneragdo do ICMS
prevista na Lei Kandir (LC n. 87/96 e suas alteragées). Essa medida,
contudo, gerou expressivo impacto nas finangas estaduais e
prejuizos, ja que, ao se prescrever a imunidade constitucional (art.
155, § 2.°, X, “a”), acabou com a referida receita publica.
Para compensar essa perda de arrecadagao, o art. 91 do
ADCT, introduzido pela EC n. 42/2003, estabeleceu uma formula de
transferéncia constitucional obrigatoria da Unido para os Estados e
o DF, consagrando um inegavel exemplo de federalismo
cooperativo, com o objetivo de atenuar os impactos financeiros
decorrentes dos incentivos tributarios.
Todo esse mecanismo compensatorio, contudo, de acordo com a
regra constitucional introduzida, depende de lei complementar
nacional, que definira o montante de acordo com critérios, prazos e
condigdes nela determinados, podendo considerar as exportagées
para o exterior de produtos primarios e semielaborados, a
relagado entre as exportag6es e as importagées, os créditos
decorrentes de aquisi¢ées destinadas ao ativo permanente e aefetiva manutengdo e aproveitamento do crédito do imposto a
que se refere o art. 155, § 2.°, X, “a”.
Muito embora tenham sido fixados critérios provisorios de
repasse nos termos do art. 91, § 3.°, ADCT, que remete as regras da
Lei Kandir, essa previsao se mostra timida e nao reflete a realidade,
estando muitos Estados com vultosos prejuizos. Ha, portanto, uma
inegavel mora legislativa do Congresso Nacional desde 2003.
Diante desse quadro, em 30.11.2016, o STF julgou a ADO 25 e,
por maioria, fixou prazo de 12 meses para o Congresso Nacional
sanar a omissao. Findo esse prazo e nao sendo elaborada a lei
complementar, caberaé ao Tribunal de Contas da Unido
(justificando essa incumbéncia ao TCU em razao do prescrito no art.
161, paragrafo Unico, da CF/88) a) fixar o valor do montante total a
ser transferido aos Estados-membros e ao DF, considerando os
critérios do art. 91 do ADCT; b) calcular o valor das quotas a que
cada um deles fara jus, considerando os entendimentos entre os
Estados-membros e o Distrito Federal realizados no ambito do
Conselho Nacional de Politica Fazendaria — CONFAZ. Quando vier
a ser elaborada a necessaria lei complementar pelo Congresso
Nacional, naturalmente, cessara de imediato a competéncia do
TCU, conferida de forma precaria e excepcional pela decisao
judicial da Corte.
Estamos diante, neste caso da ADO 25, de precedente
extremamente significativo e emblematico, que consagra a posigao
concretista intermediaria que é a regra estabelecida pela lei que
regulamentou o mandado de injungado (cf. art. 8.° da Lei n.
13.300/2016 e discussao no item 14.11.5.7 deste nosso estudo).
Como disse a Min. Carmen Lucia, “a fixagao de um prazo para que
o parlamento supra a omissdo € um passo adiante na naturezarecomendatoria que se tinha no julgamento das ADOs’” (Noticias
STF de 30.11.2016).
Destacamos que houve pedido de prorrogagado do prazo por
mais 12 meses e, depois, por mais 90 dias, tendo sido referendada
a decisdo do Relator pela maioria dos Ministros. Em seguida, foi
homologado acordo firmado entre a Unido e todos os Entes
Estaduais para encaminhamento ao Congresso Nacional para as
providéncias cabiveis, nos termos do voto do Relator.
Trata-se, sem duvida, de situacdo inédita no ambito federativo.
“A Corte registrou a inauguragao, nesta ADO, do pensamento do
possivel no Federalismo cooperativo, uma das facetas mais
formidaveis da interpretagao constitucional. Todos os atores do
pacto federativo foram chamados para tentarem solucionar o
impasse entre as esferas federal, estadual e distrital, que se
prolongava desde a instituigdo da Lei Kandir (Lei Complementar
87/1996), com algumas atuagGes pontuais produzidas pelas Leis
Complementares 102/2000 e 115/2002 e com a EC 42/2003. As
unidades federativas foram conclamadas para que, na linha do
pensamento do possivel, se dissipassem de suas certezas
absolutas, interesses estratificados e compreendessem a
oportunidade sob o olhar do federalismo cooperativo, no afaé de
diminuir as tens6es/diferengas e aproximar as convergéncias”.
No referido acordo, “chegou-se a um consenso minimo quanto a
valores e forma de pagamento, deu-se quitagao de eventuais
dividas pretéritas e futuras. Previu-se que a _ parcela
constitucionalmente devida aos municipios (25%) esta reservada e
que nao serao devidos honorarios advocaticios nas agGes judiciais
extintas em decorréncia dele. Nele, ha clausula resolutdria e eleigao
de foro para dirimir eventuais entraves que surjam em sua
interpretagdo” (Inf. 978/STF)O Congresso Nacional, em criticavel demora, somente em 29 de
dezembro de 2020, editou a LC n. 176 para dispor sobre a
compensagaéo das perdas na arrecadagdo, conforme acima
estudado, sendo que a EC n. 109/2021 revogou o art. 91 do ADCT.
Finalmente, destacamos o julgamento da ADO 26 (em conjunto
com o MI 4.733), na qual, de maneira inovadora, o STF adotou a
posicao concretista direta, geral e com efeito vinculante.
O Tribunal, por maioria, reconheceu o “estado de mora
inconstitucional do Congresso Nacional na implementagaéo da
prestagdo legislativa destinada a cumprir o mandado de
incriminagao a que se referem os incisos XLI e XLII do art. 5.° da
Constituigao, para efeito de protegao penal aos integrantes do grupo
LGBT”.
Assim, diante da _ existéncia de omissao normativa
inconstitucional do Poder Legislativo da Uniao, a Corte
cientificou o Congresso Nacional, constituindo-o em mora formal.
Contudo, sem dar qualquer prazo ou obrigar 0 Congresso
Nacional a legislar (o que poderia significar afronta 4 separagao de
poderes), o STF deu “interpretagaéo conforme a Constituigao, em
face dos mandados constitucionais de incriminagao inscritos nos
incisos XLI e XLII do art. 5.° da Carta Politica, para enquadrar a
homofobia e a transfobia, qualquer que seja a forma de sua
manifestagado, nos diversos tipos penais definidos na Lei n.
7.716/89, até que sobrevenha legislagao auténoma, editada pelo
Congresso Nacional, seja por considerar-se, nos termos deste voto,
que as praticas homotransfobicas qualificam-se como espécies
do género racismo, na dimensao de racismo social consagrada
pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento plenario do HC
82.424/RS (caso Ellwanger), na medida em que tais condutas
importam em atos de segregagao que inferiorizam membrosintegrantes do grupo LGBT, em razao de sua orientacdo sexual ou
de sua identidade de género, seja, ainda, porque tais
comportamentos de homotransfobia ajustam-se ao conceito de
atos de discriminagao e de ofensa a direitos e liberdades
fundamentais daqueles que compéem o grupo vulneravel em
questao” (ADO 26, j. 13.06.2019, DJE de 06.10.2020).
Os Ministros Lewandowski e Toffoli questionaram se seria
possivel o Poder Judiciario estabelecer a criminalizagdo de
determinada conduta, especialmente diante da regra contida no art.
5.°, XXXIX, da CF/88, que consagra o principio da estrita reserva
legal (cf. item 14.10.28.2). Em outras palavras e abrindo o
questionamento: poderia o Poder Judiciario ter criminalizado uma
determinada conduta, invadindo a atribuigaéo especifica do Poder
Legislativo?
Em um primeiro momento, entendemos que nao, mesmo que se
esteja diante de interpretagao conforme a Constituigao. Pensamos
que o Supremo “legislou”, e, nesse sentido, por mais que tenhamos
a expectativa de um STF mais ativo no controle das omissées
normativas, essa atuagdo positiva em matéria penal, definindo
condutas criminosas, mostra-se muito delicada. (Estamos avaliando,
contudo, diante do importante comando constitucional estabelecido
nos mandados constitucionais de incriminagao inscritos nos incisos
XLI e XLII do art. 5.°, até que ponto se poderia tolerar a inércia
parlamentar. Qual seria o limite dessa omissao inconstitucional?)
De todo modo, deixando de lado essa nossa critica, analisando
apenas a evolucdo das decisées tomadas pelo STF nas ADOs 24,
25 e 26, temos esperangas de que essas novas perspectivas
consagrem um novo sentido para a ADO que nao seja o da
ineficiente “mera ciéncia”’= 6.7.4.10. A atual jurisprudéncia do STF admite a fungibilidade
entre ADI e ADO?
SIM.
Pedimos vénia para transcrever a ementa do precedente,
recomendando a leitura do voto do Min. Gilmar Mendes, bem como
a analise da discuss4o que expusemos no item 6.7.3.10 deste
estudo, tendo o STF estabelecido alguns parametros:
“EMENTA: Senhores Ministros, Senhoras Ministras. Estamos
diante de um caso deveras interessante. Temos quatro acdes
diretas de inconstitucionalidade (ADI n. 1.987/DF, ADI n.
875/DF, ADI n. 2.727/DF e ADI n. 3.243/DF) imbricadas por
uma evidente relagao de conexao, fendmeno que determina o
seu julgamento conjunto, conforme a jurisprudéncia desta
Corte (ADI-MC n. 150, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 9.3.1990).
Por outro lado, é possivel observar a intengao dos requerentes
de estabelecer uma nitida distin¢do de pedidos: uns pela
declara¢ao da inconstitucionalidade por omissao e outros pela
declaragao da inconstitucionalidade (por agao). (...) O quadro
aqui revelado, portanto, esta a demonstrar uma clara
imbricagao de pedidos e causas de pedir e, dessa forma, a
evidenciar a patente fungibilidade que pode existir entre a
agao direta de inconsti nalidade e a agao direta de
inconstitucionalidade por omissao. (...) A Lei n. 9.868/99
possui capitulos especificos para a acdo direta de
inconstitucionalidade (Capitulo Il) e para a agao declaratéria
de constitucionalidade (Capitulo Ill). Com a nova Lei n. 12.063,
de 22 de outubro de 2009, a Lei n. 9.868/99 passa a contar
com o capitulo IIl-A, que estabelece rito procedimental e
medidas cautelares especificas para a agao direta deinconstitucionalidade por omissao. A Lei n. 9.882/99, por seu
turno, trata da arguigaéo de descumprimento de preceito
fundamental. No Supremo Tribunal Federal, atualmente, todas
as agdes possuem uma classe especifica de autuagao: Agao
Direta de Inconstitucionalidade (ADI); Agao Declaratoria de
Constitucionalidade (ADC); Acgao Direta de
Inconstitucionalidade por Omissao (ADO) e Arguigaéo de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). Portanto,
ante a aparente confusao inicialmente verificada nos
diversos pedidos, como demonstrado, e tendo em vista a
patente defasagem da jurisprudéncia até entao adotada
pelo Tribunal, temos aqui uma valiosa oportunidade para
superarmos o antigo entendimento e reconhecermos o
carater fungivel entre as agGes” (ADI 875; ADI 1.987; ADI
2.727, voto do Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 24.02.2010,
Plenario, DJE de 30.04.2010).
= 6.7.5. Representagao Interventiva (IF)
= 6.7.5.1. Conceito (IF)
O art. 18, caput, da CF/88 estabelece que a organizagao politico-
administrativa da Reptblica Federativa do Brasil compreende a
Unido, os Estados, o Distrito Federal e os Municipios, todos
auténomos. Vale dizer, como regra geral, nenhum ente federativo
devera intervir em qualquer outro.
Excepcionalmente, no entanto, a CF prevé situagdes (de
anormalidade) em que podera haver a intervengao:
= Unido 4 nos Estados, Distrito Federal (hipoteses do art. 34)
e nos Municipios localizados em Territério Federal?® (hipétese
do art. 35);