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ft REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO ACORDAO PROCESSO N.° 2394/17 Na Camara do Civel, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo, os Juizes Acordam, em Conferéncia, em nome do Povo: |= RELATORIO Na Sala do Civel e Administrativo do Tribunal Provincial de Benguela, GOVERNO GMD representado pelo Magistrado do Ministério PUblico, notificado da decisao que ordenou o embargo de obra nova, deduziu Oposigao por Embargos conta « iii. LDA, representada pelo Sr. QED a residente no Lobito, RuQ@@ED, pedindo a procedéncia dos embargos e, em consequéncia, deve a providéncia cautelar de embargo de obra nova decretada ficar sem efeito e que seja autorizada a instituigao representada a continuar com a obra. Para fundamentar a sua pretensdo, o Autor alega o seguinte: 1. A deciséo do Juiz embargou uma obra do Estado, feita em terreno pubblico e ofendeu deste modo a proibigao do art.° 414.° do CPC; 2. Ao 11 de Abril de 2013, 0 5, I... representante da empresa QED... dirigiu um requerimento de solicitagaéo de concessdo de direito de superficie de 1,22 hectares localizados no Bairro da Restinga, local inundado; 3. A dita zona, em abono da verdade, 6 um espago fisico localizado na Baia do Lobito, projectado desde o tempo colonial, isto é desde 1945, para dar continuidade da Avenida dos Restauradores de Angola, fazendo a intersecgao com a Rua Capelo Ivans de um lado e com a Rua REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO Alves Rogada, de outro lado, Portanto, o espago em causa é mar em \cujas extremidades est a Avenida dos Restauradores de Angola ¢ que \, ‘desde o tempo colonial existe um projecto de aterro para a ligagao da referida avenida; 4. A despeito do atrés dito, as autoridades administrativas na altura conduziram 0 processo de concessao como se de terreno se tratasse; 5. Assim, sobre o requerimento acima referido recaiu um despacho de ex- Governador 0, datado de 26.04.013 a deferir o pedido e a remeter a D.P.U.H.A e a Administragao Municipal do Lobito; 6. Em cumprimento do referido despacho a D.P. do Ordenamento do Territério, Urbanismo e Ambiente remeteu ao IGCA uma “solicitagéo de instrugéo do processo de concessao de direito de superficie do terreno localizado na zona da Restinga, municipio do Lobito, uma area de 2,4 hectares...”; 7. Remetido ao IGCA-Departamento Provincial de Benguela, este emitiu um parecer favoravel considerando a rea como um terreno, enquadrando a situaco nos cAnones da lei de terras e do regulamento geral de concessao de terrenos; 8. Os técnicos do IGCA procederam a vistoria tendo concluido que se trata de uma parcela confrontada a Norte com as residéncias de terceiros nao cadastrados, a Sul com residéncias de terceiros néo cadastrados e uma estrada, a Este com terreno ocupado, residéncia de terceiros nao cadastrados e a Oeste com 0 Oceano Atlantico; 9. Portanto, nada mais falso que isso porque se trata da area urbana da Restinga com residéncias de caracter definitive, que nao se concebe que nao estejam cadastradas! 10.0 IGCA, como nao se bastasse, remeteu o processo a Direcgo Provincial do Ordenamento do Territério, Urbanismo e Habitacao orientando a elaboragao do contrato de direito de superficie. Entretanto, solicitou parecer da Capitania do Porto do Lobito segundo o despacho 13od REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO do canto esquerdo do doc. n.° 7, mas tal parecer que seria importante no foi elaborado; 11.A Administragao Municipal do Lobito igualmente deu o seu parecer favoravel; 12.0 Instituto Nacional de Ordenamento do Territrio e Desenvolvimento Urbano, Departamento Provincial de Benguela deu igualmente parecer positivo; 13.Assim, aos 06 de Fevereiro de 2014 foi assinado entre 0 Governo Provincial deQD ca QED , 0 contrato de concessao de direito de superficie, mediante o pagamento de uma taxa inicial de 10% do valor total, isto é AKZ 415.000,00; 14.Entretanto, apesar de o ter assinado como autoridade concedente, Sua Excia. O Governador de Benguela, Eng.” Qs , a0 Ihe ser remetido o referido contrato de concessdo, exarou o seguinte despacho: T.C, Nao esta muito clarificado 0 local desta concessao na Baia do Lobito/restinga. Assina: Isaac F. Maria dos Anjos, 24.03.2014; 15.0 alerta do Sr. Governador foi pelo facto de ter verificado que os limites das coordenadas a que se fazia referéncia no correspondiam a um terreno e era uma orientagdo no sentido de se averiguar e trazer novos elementos; 16.Ainda assim, a empresa transforma efectuou 0 pagamento do valor em falta relacionado com a taxa de AKZ 3.735.000,00 perfazendo assim um valor total de AKZ 4.150.000,00; 17.£ a panéplia de factos acima narrados que criaram o presente imbréglio e como se pode constatar, houve uma série de erros administrativos, pois vejamos: 18.0 espaco concedido 4 1a, nao é um terreno, é parte da baia do Lobito, em outras palavras é mar, REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO .Estao integrados no dominio piiblico do Estado: as aguas interiores, 0 mar territorial, a plataforma continental, as praias e a orla costeira, numa faixa fixada por foral ou por diploma do Governo, conforme esteja ou no integradas em perimetros urbanos; 20.0 dominio publico € 0 conjunto de coisas que o Estado ou as autoridades locais aproveitam para a prossecugao dos seus fins, usando poderes de autoridade, ou seja, através do direito ptiblico (art° 1.°, al. d) da Lei de Terras (LT); 21.0 n° 2 do art. 29.° da LT € claro estabelecer que os bens do dominio piiblico sd propriedade do Estado e como tal séo inalienaveis, imprescritiveis e impenhoraveis; 22.0 terreno que hoje existe e cujas obras foram embargadas é fruto de um trabalho de aterro que vem sendo efectuado pela empresa Trolha Construgées, na qualidade de empreiteira, contratada pelo Governo Provincial de Benguela; 23.Portanto, esta-se a construir estradas. As estradas pertencem ao dominio piiblico do Estado; 24, Diga-se, em abono da verdade, que com a referida requalificagao, ha-de surgir alguns lotes de terreno que no referido projecto (mapa 4) apresentam tragados em vermelho; 25.0s terrenos que hade surgir estaréo submetidos ao regime de concessao previstos nos arts 1.° a 7 do Decreto Presidencial n.° 232/11 de 23 de Agosto; 26.Mas, 0 Embargante arroga-se a qualidade de superficidrio que nao tem, porque terreno algum the foi concedido; 27.E para que um bem de dominio publico passe para o dominio privado do Estado e consequentemente seja objecto de concessdo é necessério que haja a chamada desafectagdo, que no caso concreto nunca aconteceu; ° REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO 28. Trata-se da area da Restinga do Lobito, diga-se: uma area urbana. 29.Nas areas urbanas, 0 objecto de concessao limita-se aos 2 hectares, ‘excepto a autorizagéo do Ministro que superintende o cadastro, nos termos do art.° 43.° al. a) e c) da Lei de Terras; 30.Supondo que a Area concedida estivesse dentro dos limites legalmente admitidos, ainda assim, a empresa concessiondria nao cumpriu com as obrigagées da cléusula sexta do contrato; 31. Ou seja, ndo apresentou o projecto de licenciamento do loteamento no prazo de 6 meses e consequentemente nao cumpriu com as restantes alineas da referida clausula; 32.Pelo que, nos termos da clausula oitava do ja referido contrato, a autoridade concedente tem o direito de reversao; 33.Mas, conforme se demonstrou nos articulados antecedentes, o negécio celebrado entre a @@EEEEEEKa., ¢ 0 Governo Provincial é nulo, pois incidiu num projecto legalmente impossivel e contrario a lei, nos termos do art.° 280.°, n.° 1 do CC; 34.E nos termos do art.° 286.° do CC “a nulidade 6 invocavel a todo 0 tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal, 35.A nulidade tem efeito retroativo, devendo ser restituido tudo 0 que tiver sido prestado, art.° 289.° do CC. E quanto a isso, o Governo Provincial de Benguela esté de acordo a restituir os valores monetarios recepcionados como pagamento da concessao; 36.Por tudo que atrés dissemos, ndo ha qualquer resquicio de davida que a obra ora embargada é do Estado e esta a ser feita em terreno, ou melhor, recai sobre um bem de dominio publico. Para se aferir este facto, em caso de diivida nada melhor que uma inspecgao judicial. Notificada a Embargada do Requerimento acima referido, veio esta contestar, defendendo-se por impugnacao (fis. 58 a 62). REPUBLICA DE ANGOLA \ TRIBUNAL SUPREMO /’S A_Embargada alega que, por aquilo que relata 0 proprio Ministério Publico, a TERED) 2., f62 tudo aquilo que the competia fazer enquanto pretendente do terreno ou enquanto candidato a concessao, pelo que, considera que o processo de concessdo seguiu' a mais correcta tramitagao legal até a sua conclusao. Alega ainda a Embargada que, embora o processo que culminou com a concessao tivesse iniciado na era do Sr. Armando da Cruz Neto, a verdade é que 0 contrato de direito de superficie como tal foi assinado pelo proprio Governador | @iNEIENNEEEROs ¢ este tinha pleno conhecimento daquilo que a (QE... viria efectuar no terreno em causa. Além disso, a Embargada alega que o Sr. QQ c. GQHEED da, sabiam que, desde o tempo colonial, os servigos municipais do Lobito tinha 0 projecto de ligar a Avenida dos Restauradores de Angola que esta inacabada e fazendo-a interceder com as Ruas Capelo Ivans Alves Rogada. E imperioso considerar que para se fazer tal trabalho havia a necessidade incontornavel de se fazer aterro e, ao fazer-se 0 aterro, teriam que surgir talhdes de terreno que delimitariam a estrada a ser construfda, lotes de terreno que viriam a ser comercializados pela QI». para ali retirar 0 dinheiro que iria a gastar. Ou seja, seria desta forma que a Qa. iria ressarcir-se. Conclui dizendo que, é esta _a tunica ratio do contrato de superficie que o governo celebrou com a EEE. A Embargada interroga: se o Estado sabia que ndo podia ceder 0 espago, por se tratar de um terreno de dominio publico do Estado, porque é que o cedeu 3 i da.? Outrossim, a Embargada alega que a nica coisa que o Sr. Governador Provincial fez foi trocar a QED. pela TROLHA, ignorando pura e simplesmente 0 contrato de direito de superficie que celebrou com a ‘GREED. © justo isso? Alem disso, alega a Embargante que, de forma deliberada, 0 Governo de Benguela e a Trolha omitiram revelar o valor da obra precisamente para evitarem a realizagao do concurso ptiblico. E mais, a Embargada alega que pelo orgamento cujas copias juntamos néo se vislumbra quaisquer obras publicas a serem efectuadas na Restinga do Lobito, isso faz- nos coneluir com toda a certeza que a estrada de que tanto se fala toda ela estd a ser custeada pela Trolhas, Lda., e, para ressarcir-se esté a vender os lotes — era isso que também faria ou iré fazer a transforma. REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO, Alega ainda que precisa ser respeitado nos termos do art? 406° do CC Portanto, nao havendo nenhuma obra pliblica, havendo sim um contrato de direito de superficie valido que deve ser necessariamente respeitado, ndo temos a minima diivida de que o embargo foi muito bem decretado e que a decisdo deve manter-se. De seguida, realizou-se audiéncia preparatéria em conformidade com o formalismo legal (fls. 74 a 74v). Por sua vez, velo o Governo da Provincia de Benguela, representado pelo Ministério PUblico, arguir irregularidade do mandato dos mandatarios da Embargada, alegando que os mesmos eram funciondrios puiblicos (fis. 75 a 77). Mais uma vez realizou-se audiéncia preparatoria em conformidade com 0 formalismo legal (fis. 80 a 81). Conclusos os autos, o Tribunal “a quo" proferiu sentenga, julgando procedente a acgdo de oposigao dos embargos e, em consequéncia, deu por sem efeito o despacho que deferiu a providéncia cautelar de embargo de obra nova no proc. 22/016 e ordenou o Governo da Provincia dar continuidade as obras (fis. 82 a 88). Notificada o Embargante da sentenga, veio a Empresa Trolhas Construgées, Lda., empreiteira das obras to terreno em questo, requerer ao Tribunal “a quo” a execugao da sentenca para proceder a continuacao das obras (fis. 95). Inconformada a Embargada com a decisdo, veio esta interpor recurso de apelagdo, com subida imediata, nos préprios autos e efeito suspensivo (fis. 96). © Tribunal “a quo” deferiu o requerimento de fis. 95 dos autos, pedindo a continuagéo das obras e deferiu o recurso como de apelagdo a subir imediatamente nos préprios autos e efeito meramente devolutivo (fis. 97 a 97v). Remetidos aos autos ao Tribunal ‘ad quem”, este veio proferir despacho, ordenando no prazo de 8 dias a Recorrente juntar novas alagagdes em conformidade com o disposto no art.° 690.°, n.° 1, do CPC (fis. 160). REPUBLICA DE ANGOLA \ TRIBUNAL SUPREMO 3 _ Notificada a Recorrente do despacho acima referido, veio esta apresentar ’ alegagdes (fis. 165 a 169), concluindo o seguinte: 1. O direito de superficie sobre 0 espago e a conseguinte posse configuram 0 direito real de gozo protegido pelo art 412.° do CPC; 2. No processo principal que, entretanto, j4 corre seus tramites legais, a Ora Recorrente defende a prevaléncia do contrato de direito de superficie em detrimento do simulado contrato de empreitada celebrado pelo Sr. QDs a favor da Trolhas, Lda, A Recorrente naquele Processo apresenta como fundamento, dentre outros, o facto de na celebragao do contrato de empreitada o Governo da Provincia de Benguela ter desrespeitado 0 contrato de direito de superficie, violando assim 0 art. 406.° do CC. Demais a mais, o falado contrato de empreitada, nos termos da lei 20/2010, de 7 de Setembro estava sujeito a concurso puiblico, mas 0 Governo de Benguela violou aquela lei pois, no realizou tal concurso, portanto, 0 contrato em questéo sera irremediavelmente anulado no processo principal; 3. On 1 do 412° do CPC prescreve que aquele que se julgue ofendido no seu direito singular ou outro direito real de gozo ou a sua posse, em consequéncia da obra, trabalho ou servigo novo que Ihe cause ou ameace causar prejuizo, pode requerer ao tribunal que a obra, trabalho ou servigo seja mandado suspender imediatamente; 4. Nos termos do art.° 2.° do CPC, as providéncias cautelares tem como fim assegurar 0 efeito util do proceso principal. Ora, 0 Meritissimo Juiz, ao autorizar a Trolhas, Lda., como se sabe, os processos declarativos observam uma tramitagao bastante lenta. Logo, mantendo a deciséo do Meritissimo Juiz proferida nos presentes autos, de que servira a sentenga do processo principal caso a Transforma, Lda., venha ganhar a causa? Portanto, havia de se acautelar o periculum in mora, 0 que o juiz n&o fez. Por isso, pensamos que a deciséo recorrida efectivamente ofende o direito real de gozo da Transforma, Lda. 5. A Lei 20/2010 ja citada também prescreve que qualquer obra pliblica a ser realizada pelo Governo deve ser previamente cabimentada. Porém, a obra que o Meritissimo Juiz autorizou a realizar no espaco ora 8 REPUBLICA DE ANGOLA. TRIBUNAL SUPREMO controvertido nunca foi cabimentada. Com efeito, nao se trata de obra publica ao contrario do que alega o Meritissimo Juiz, pelo que em situagéo normal teria mantido a suspensao da obra até decisao final do proceso principal, pois, s6 assim se poderd assegurar o efeito util da acgo principal. Portanto, a sentenga ora recorrida _violou grosseiramente os art.°s 2.°, 412 e 668.° todos do CPC; Terminou pedindo provimento ao recurso e, em consequéncia, seja revogada a deciséo recorrida para que possa prevalecer a suspensao da obra: Remetidos os autos ao M.P., este veio apresentar o seguinte parecer (fis. 174): “Atenta a sentenga proferida nos presentes autos (fis. 82 a 88), uma vez que 0 M°P.° é parte, em obediéncia ao disposto no art.° 707.° do CPC, abstenho-me de emitir qualquer pronunciamento’. Correram os vistos legais (fis. 175v e 176). Tudo visto, cumpre apreciar e decidir. I= QUESTAO PREVIA O processo judicial civil 6 uma luta dialética das partes em que elas procuram a seu favou a melhor solugao da causa, e 0 poder judiciario poe a disposicao das partes a possibilidade de impugnar as decis6es judiciais a fim de garantir a justiga e a seguranga juridica junto de instancias judicias superiores. O recurso é “o meio processual que a lei coloca @ disposigéio das partes, do Ministério Pablico e de um terceiro, a viabilizar, dentro da mesma relagéio Juridica processual, a anulagéo, a reforma, a integragéio ou o aclaramento da deciséo judicial impugnada’. (Nery Junior, Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 6* ed., Sdo Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, n.31, pag. 212, cfr. também Castro Mendes, Direito Processual Ill, AAFDL, 1980). O recurso de apelagao 6 © recurso que se interpde das sentengas dos juizes de primeira instancia para levar a causa ao reexame dos tribunais do segunda instancia ou tribunais superiores, visando a obter uma reforma total ou parcial da decisao impugnada, 9 REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO l /\ ou fnesmo sua invalidagao (Cfr. Theodoro Jinior, Humberto, Curso de Direito Processual Civil, vol. |, 45 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, pag. 646). Do ponto de vista legal, a apelacéo é uma espécie de recurso ordinario, nos termos do art? 676.° n.° 2 do CPC, conjugado com o art.° 45° n.° 1 da Lei 20/88 de 31 de Dezembro, que compete da sentenga final e do despacho saneador que conhecam do mérito da causa, bem como das sentengas ou despachos que decidem sobre a procedéncia de alguma excepgao peremptoria, que nao seja 0 caso julgado (art.° 691.° n.%s 1 e 2 do CPC). Quanto aos efeitos, a apelagéo pode ser devolutivo ou suspensivo. Na apelagao com efeito devolutive “vigora 0 brocardo “tantum devolutum quantum appellatum’, ou seja, 0 efeito devolutivo transfere ao Tribunal a reapreciagao da matéria impugnada pela parte vencida, fazendo-se um novo julgamento, Entretanto, o Tribunal deverd decidir apenas de acordo com o pedido da parte vencida e restringir-se apenas a matéria impugnada. O efeito suspensivo, este tem a ver com eficdcia ou resultado da sentenga recorrida, pois enquanto o recurso estiver sendo processado, este suspende a eficdcia da sentenga, o que n&o acontece com o efeito devolutivo (art. 47.° do CPC). Outrossim, ocorre que o regime regra para o recurso de apelagao ¢ 0 efeito suspensivo (art.” 692.°, n.° 1 € 2, primeira parte, do CPC). Todavia, a apelagao nao sera suspensivo quando se trate de decis6es proferidas em acgdes relativas letra, livranga, cheque, vale, factura conferida; sentenga que ordene demoligées, reparages ou outras providéncias urgentes; sentenga que arbitre alimentos ou fixe a contribuigéo do cOnjuge para as despesas domésticas ou quando a suspenséo da execugdo seja susceptivel de causar a parte vencedora prejuizo consideravel (als. a),b),c), ¢ d) do n° 2 do art.° 692.° do cPc. No caso sub judice, a Embargante requereu 0 recurso de apelag4o com efeito suspensivo, efeito negado pelo Tribunal “a quo” no despacho de admisséo do recurso. Assim, o presente recurso tem efeito meramente devolutivo nos termos e para efeitos do disposto na al. b) do n.° 2 do art.° 692. do CPC, porque a decisao recorrida ordenou uma providéncia urgentes e interposto do Tribunal Provincial de Benguela. 10 REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO Desta feita, 0 efeito devolutivo transfere ao Tribunal “ad quem” a reapreciagao da decisdo recorrida, podendo examinar 0 pedido do Apelante através das questdes suscitadas e discutidas em primeira instancia, bem como aquelas questées que nao tenham sido decididas na sentenga recorrida, por forga do art. 715.° do CPC. Portanto, 0 recurso em causa seria de agravo e nao de apelagdo por se tratar de uma providencia cautelar ( ). No entanto, nao tendo sido posta em causa 0 direito das partes, tal falha, nesta fase do proceso torna-se inécua. 10 OBJECTO DO RECURSO Sendo 0 Ambito e © objecto do recurso delimitados, (para além das meras razées de direito e das questées de conhecimento oficioso), pelas conclusdes formuladas pela Recorrente, arts. 660.°, n.° 2., 664.°, 684.°, 690.9, n° 1en.°3e 691.°, n.° 1 en.° 3, todos do CPC, emerge, “in casu", como objecto do recurso, saber se: 1. Violou ou n&o a sentenga ora recorrida os art.°s 2.°, 412.° e 668.° todos do CPC eo art.° 406.° do CC; 2. Deve ou no ser suspensa a execugéo do embargo de obra nova decretado pelo Tribunal “a quo"; FUNDAMENTACAO Da sentenga recorrida, resultam provados os seguintes factos: 1. “A Trolhas, Lda., 6 empreiteira de uma obra publica cujo dono da obra é 0 Governo da Provincia de Benguela; 2. Os referidos trabalhos levados a cabo pela Trolha, Lda., se circunscrevem na colocagao de aterro numa parte do mar, 3. O Governo Provincial pretendia construir uma estrada; 4. Como resultado do servigo de aterro executado pela Trolha, Lda., surgiu alguns lotes de terreno; 11 REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO 5. Nao. ficou provado que o representante da 1» tivesse instaurado providéncia cautelar convicto de que néo tinha qualquer fundamento”. IV - APRECIANDO 41. Violou ou nao a sentenga ora recorrida os art.°s 2.°, 412.° e 668.° todos do CPC e o art.” 406.° do CC? Alega a Recorrente que nos termos do art.° 2.° do CPC, as providéncias cautelares tém como fim assegurar 0 efeito util do processo principal. Ora, 0 Meritissimo Juiz, ao autorizar a Trolhas, Lda., como se sabe, os processos declarativos observam uma tramitagéo bastante lenta. Logo, mantendo a decisao do Meritissimo Juiz proferida nos presentes autos, de que servira a sentenga do processo principal caso a @MBe., venha ganhar a causa? Portanto, havia de se acautelar 0 periculum in mora, 0 que 0 juiz néo fez. Por isso, pensamos que a decisdo recorrida efectivamente ofende o direito real de gozo da Transforma, Lda Alega ainda que a Lei 20/2010 ja citada também prescreve que qualquer obra publica a ser realizada pelo Governo deve ser previamente cabimentada. Porém, a obra que o Meritissimo Juiz autorizou a realizar no espago ora controvertido nunca foi cabimentada. Com efeito, nao se trata de obra publica ao contrario do que alega o Meritissimo Juiz, pelo que em situagao normal teria mantido a suspenséo da obra até decisdo final do processo principal, pois, so assim se podera assegurar 0 efeito Util da acco principal. Portanto, a sentenga ora recorrida violou grosseiramente os art.°s 2.°, 412.° e 688.° todos do CPC. Assistira raz8o ao Recorrente? Vejamos. O art? 2.° do CPC dispde © seguinte: “a fodo o direito, excepto quando a lei determine 0 contrério, corresponde a uma aceéio, destinada a fazé-lo reconhecer em julzo ou realizé-lo coercivamente, bem como as providéncias necessérias para acautelar o efeito util da acgéo". Trata-se de uma previséo legal geral, cuja aplicagao depende do julgamento que se faz dos argumentos e dos facts provados apresentados pelas partes, que poderdo determinar qual dos interesses devem prevalecer. Assim sendo, a procedéncia da oposigao por 2 REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO embargo em nada tem a ver como 0 estatuido no art.” 2.° do CPC, pois se por um lado a todo o direito corresponde a uma acgao e realizd-lo coercitivamente, por outro, o Tribunal nao pode resolver o conflito de interesses sem que a parte contraria deduza oposigao (art.° 3.° do CPC). Além disso, a oposicéo por embargos é um direito que assiste ao Embargado, nos termos do art.” 417.° do CPC. Pelo que, nao assiste razao ao Recorrente neste ponto. Quanto a alegada violagdo do art.° 412.° do CPC, nao nos parece que a decis4o recorrida viola o estatuido no artigo 412.° do CPC, uma vez que as obras em questao se enquadram na previsao do art.” 414.°, n.° 1 do CPC e do art.° 95.° n.° 1 al. f) da CRA. De acordo com o estatuido no art? 414.°, n.° 1, do CPC, “nao pode ser embargadas as obras do Estado em terrenos pubicos nem as obras das autarquias locais nos respectivos terrenos comuns”. A al. f) do n.° 1 do art.° 95 da CRA “prevé que “sao bens de dominio publico: as praias e a zona maritimo-terrestre”. Assim, sendo do Estado e zona maritimo terrestre, a decisao recorrida nao viola o estatuido no art.° 412.° do CPC. © art? 406.° do CC prevé o principio do pacta sunt servanda. Contudo, este princfpio nao é absoluto, porque os contratos podem extinguir-se ou modificar- se nos casos admitidos na lei, como pode ser 0 caso. Alias, no caso sub judice nao trata simplesmente da extingéo de um contrato de constituigéo do direito de superficie, mas que a constituigéo do referido direito nao obedeceu a lei, uma vez que se concedeu um bem de dominio puiblico inalienavel e 0 negécio juridico feriu uma disposigao de caracter imperativo (art.° 95.° do, al. f) do CRA). Pelo que, nos termos do art.” 69.° da Lei de Terras, bem como do art.” 294.° do CC, & nulo 0 negécio celebrado contra disposigao legal de caracter imperativo. Por isso, no ha no caso violagao do art.° 406.° do CC. Quanto & alegada violagéio do art.° 668.° ambos do CPC, também nao colhe uma vez que a oposig&o por embargos foi requerido nos termos da al. a) do n° 2 do art.° 417.° do CPC. Nos termos de artigo, pode também o dono da obra deduzir oposigo por meio de embargos, a) quando se verifique 0 caso previsto no art.° 414.° do CPC, sobre obras que néo podem ser embargadas, como ocorreu no caso. Pelo que, nao assiste razéio ao Recorrente. Portanto, sendo um bem de dominio publico do Estado, por ser um bem inalienavel, imprescritivel e impenhoravel (art? 95.° n.° 2 da CRA), e as obras nele a serem construidas incluirem uma estrada é loteamento de terrenos para 13 REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO interesse pubblico, pertencente ao Governo da Provincia de Benguela, icluir-se que a decisdo recorrida no violou os art.°s 2.°, 412.° e 668." todos do CPC e o art.” 406.° do CC. 2. Deve ou no ser suspensa a execugao do embargo de obra nova decretado pelo Tribunal “a quo”. A propésito, alega a Recorrente que o direito de superficie sobre 0 espago e a conseguinte posse configuram 0 direito real de gozo protegido pelo art. 412.° do CPC; Alega ainda que no processo principal que, entretanto, ja corre seus tramites legais, a Ora Recorrente defende a prevaléncia do contrato de direito de superficie em detrimento do simulado contrato de empreitada celebrado pelo Sr. Isaac do Anjos a favor da Trolhas, Lda. A Recorrente naquele processo apresenta como fundamento, dentre outros, 0 facto de na celebragao do contrato de empreitada 0 Governo da Provincia de Benguela ter desrespeitado © contrato de direito de superficie, violando assim o art.° 406.° do CC. Demais a mais, 0 falado contrato de empreitada, nos termos da lei 20/2010, de 7 de Setembro estava sujeito a concurso puiblico, mas 0 Governo de Benguela violou aquela lei pois, no realizou tal concurso, portant, 0 contrato em questao sera irremediavelmente anulado no processo principal. Assistira razaio ao Recorrente? Vejamos. ‘A Embargada levanta questées de fundo retativamente a validade ou nao da empreitada celebrada entre 0 Governo da Provincia de Benguela e a empresa Trolhas, Lda., 0 da prevaléncia do contato de superficie ora em questéo, bem como os direitos que devia usufruir caso 0 terreno em causa fosse entregue na sua esfera juridica. Ora, estas questdes terao a apreciacao adequada na acgao principal, uma vez que importa neste caso a questo de saber se deve ou nao © Tribunal “a quo” executar ou suspender o decretamento da providéncia de embargo de obra nova Quanto a questo suscitada, a resposta deve ser a de suspender a execugao da deciséo que decreta o embargo de obra nova, uma vez que a obra em questao é um bem de dominio pliblico do Estado, nos termos do art.° 95.°, al. f) 14 93 /w REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL SUPREMO do CRA. E as obras que esto a ser executadas no terreno em causa so bens comuns porque visam satisfazer as necessidades publicas. Com efeito, estabelece 0 n.° 2 al. a) do art? 417° do CPC “podem também o dono da obra deduzir oposigao por meio de embargos quando se verifique 0 caso previsto no art 414.°, Sendo o imével em causa um bem pubblico nos termos do art.° 95.° al. f) do CRA, nao deve ser embargada por forga do art. 414 do CPC. Em face do exposto, deve ser considerado improcedente o presente recurso e, em consequéncia, confirmar assim a decisao recorrida. V-DECISAO ae ses 2 fyadettints, cbobdam wo furtes hk fo Greece whe 2 Bin te , Be 8608 Plovrwanh ceo Reeueso «o im 4, “é cubse *, om Consequdacre, Coafamen a oe Me Coden Gul Pole Beecateah 2 fleCuseetic a fara ch Bole Catal ob fvette pur b ee Sy he tore Le fushea Vismach thax Jol Socgevae Rrescr teeta

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