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século XX. Tais movimentos vao alimentar idéias ¢ forgas que, neste relagao capital-trabalho, O que parece fundamental esteve ma a montagem de novas Nosso século, travario outros embates na a destacar é que o culo XIX » pelos movimentos de mas correlagio de forcas se dominante o mesmo modo instaurado no século XVIII. ‘io individual, ele se reproduz a conjugacao de uma série de fenomenos: o processo de deslocamento do campo para a cidade iniciado nos séculos anteriores; 0 aumento demografico; a gradativa expropriagio dos meios de produgao dos trabalhadores; a Revolugio Industrial; a difusio das idéias iluministas, racionalistas, liberais em todos os campos da organizagio sociopolitica. c ado, de forma especi Isso significou uma mud existente. Apesar di langa é entao Oo, Mantev de subjetivagaio que se havi Como um modo de subjetivag como resultado d: A massa ser4 um conjunto de individuos, ainda que, quando reunidos, eles apresentem certas caracteristicas peculiares. Tais caracteristicas serao vistas por alguns como distorgdes da natureza individual, por outros como forga fundamental para a transformagio para uma sociedade mais justa. De qualquer modo, o individuo ainda ser 0 foco de acio: o incentivo incidira sobre sua unidade, como garantia de identidade. O QUE SAO AS MASSAS? A concepgio de publico, formulada por Tarde, parece-nos especialmente interessante de se destacar, porque ela escapa da designagio politica estrita de sua época. Publico é 0 espago de encontros ¢ confrontos das opinides, é 0 espago de relagio social da massa. A opiniao publica éa opiniao partilhada, Segundo Tarde, © coletivo nao seria algo que existiria fora ou acima dos e piritos individuais (Tarde, G., 1992, p.25), mas aquilo que atrave os n Digitalizado com CamScanner individuos, conformando-os e, 20 mesmo tempo, neles fazendo outras conexGes que retornariam ao ptblico. Precisando melhor, dirfamos que o publico nao seria o espaco de relagao social da massa, mas a forma de relagio social da massa, A massa, ainda que aparega em muitos de seus textos como algo desordenado ¢ intolerante, ao ser relacionada a nogio de piblico abre uma perspectiva de multiplicidade: a massa nao é apenas exaltada e irrascivel, ela também estabelece diversas relagées sociais, cuja efetuagio constitui o publico. Canetti ([1960], 1983) fez também um importante estudo a respeito das massas. Para ele, frente ao medo do estranho, o homem se insere em uma massa, pois, quando ele ai se encontra, pode escapar do medo em relagao ao contato. As massas, para Canetti, s6 existem a partir da descarga, momento no qual todos se despojam de suas diferengas e sentem-se iguais. O autor destaca quatro caracteristicas das massas: a massa sempre quer crescer; no interior da massa reina a igualdade; a massa ama a densidade; a massa necessita de uma dire¢ao. Tais caracteristicas estariam presentes sempre que uma massa se formasse. Entretanto, o arranjo destas caracteristicas variaria, conformando massas diferenciadas. As massas podem ser abertas ou fechadas, ritmicas ou estancadas, invisiveis ou visiveis. Elas ainda podem ser classificadas segundo seu contetido afetivo: massas de perseguicgio, de fuga, de proibicao, de inversio, de festa. Como os exemplos trazidos de movimentos de massa no século XIX foram, em geral, de greves destacarei a massa de proibicio, para detalha-la um pouco mais, ja que, segundo Canetti, a greve é seu melhor exemplo: Muitos, €M conjunto, nio querem continuat fazendo © que até entio faziam como individues: Todos se negam a fj espera deles... A exterior rer o que o mundo exter te A pa ncia & o elemento 4 72 Digitalizado com CamScanner i ZA: a proibigio representa um limite e um dique... Quando suspendem o trabalho, todos . A responsabilidade que cada um tem em relagio A greve faz com que se tore um bem comum... (Canetti, E., [1960], 1983, p. 59/60). O que chama a atengio na descrigéo de Canetti é a pluralidade de formas e composigées possiveis nas massas. Ainda que mapeando caracteristicas gerais sobre elas, no exemplo acima a massa é apresentada com sentido de dignidade e responsabilidade, ao contrario do modo habitual com que sao apresentadas, ou seja, como selvagens e destrutivas. Entretanto, aqui, ainda estamos tomando a massa no sentido usual que lhe é atribuido, seu sentido molar (representagao da realidade tal como est constituida; representagao que define grandes conjuntos). Deste ponto de vista, o da macropolitica, poderiamos dizer que as massas operaram, no século XIX, movimentos de acumulagao de algumas conquistas. Isso nao implicou, no entanto, uma problematizagio dos modos de subjetivagdo que estavam em curso quando tais operagdes se processavam. Pensar a transformagao social como processo paralelo ao da transformagio dos modos de subjetivagao manteve a dualizagio entre os processos. Assim, mesmo em um século em que os movimentos de massa trouxeram importantes conquistas para os trabalhadores, tendo criado, em especial, propostas de sistemas politicos aliados aos seus interesses — uma sociedade mais justa e igual para todos —, permaneceu o modo individual como o predominante na produgio das subjetividades. Se acompanharmos Deleuze e Guattari ([1980], 1988) em seu artigo 1933 — Micropolitica e segmentaridade, teremos uma outra visio destes Ambitos em sua relagio com a transformagio Digitalizado com CamScanner social. Para estes autores, tanto a sociedade quanto o individuo sio atravessados, a0 mesmo tempo, por duas ordens de segmentaridade: uma molar ¢ outra molecular. Esta idéia de simultaneidade ou coex entre tais ordens aponta para o fato de que tudo é, ao mesmo tempo, macro e micropolitica. Assim, em uma organizagio molar, de segmentaridade dura, ha, ao mesmo tempo, segmentagGes finas, afetos inconscientes que operam de outro jeito. Tomando o exemplo das classes sociais sténcia ou 0 dos sexos, 0 que se vé é que para além (ou aquém) das divisdes visiveis em que so incluidos, tanto nas classes sociais quanto na divisio entre os sexos, introduzem-se agenciamentos moleculares, invisiveis. os dois sexos remetem a multiplas combinagées moleculares, que colocam em jogo nao sé o homem na mulher ¢ a mulher no homem, masa relacio de cada um no outro com o animal, a planta etc: mil pequenos sexos. E as classes sociais remetem a “massas” que nfo tém o mesmo movimento, a mesma distribuicao, nem os mesmos objetivos nem as mesmas maneiras de lutar. As tentativas de distinguir massa ¢ classes tendem efetivamente para o seguinte limite: que a nogio de massa é uma no¢io molecular, que procede por um tipo de segmentacio irredutivel A segmentaridade molar de classe. Sem dtivida, as classes estio talhadas nas massas, as cristalizam, E as massas 10 cessam de fluir, de se escapar das classes (Ibidem, p. 218) pr Estamos aqui diante de uma defini ja que traz os movimentos flexiveis (© de massa pouco ustith e que se efetuam ent 4 Digitalizado com CamScanner anizagdes are: r organizacoes molares, Orelevo dado por Deleuze ¢ Guatt: para a indissociabilidade d d para a diferen: Visto por ‘ari é tanto las duas ordens de segmentaridade, quanto de nature: a, escala ¢ fungio entre ambas. ae et ¢ Angulo, ousarfamos afirmar que, ainda que o nha . le subjetivagao em curso no século XIX tenha sido 0 modo individuo, algumas linhas foram tragadas pelos movimentos das massas — tomados aqui em sua segmentaridade flexivel - ¢ isso pode resultar em possibilidades de constituigio de outros modos de subjetivagao. As contribuicdes tedricas de Marx e Engels na luta por condigées coletivizadas do viver, relativas, na maioria das vezes, a0 nivel molar, na verdade também estavam atravessadas pela segmentaridade molecular. E 0 que nos mostram Deleuze e Guattari. Segundo estes autores, Marx e Engels destacaram a organizacio e a exploracao das classes - segmentagio do tipo molar -, dizendo que estas remetem a massas que tém objetivos € movimentos diferentes. As massas nao param de se cristalizar ¢ de se escoar, fluindo e gerando outras composi¢des. Em O Anti-Edipo: capitalismo e esquizofrenia (Deleuze, G. & Guattari, F. [1972], 1976), os autores colocam que ja em O capital Marx mostra o encontro, de um lado, do trabalhador desterritorializado, tornado livre para vender sua forca de trabalho do dinheiro decodificado, tornado capital pronto para A anilise de Marx, segundo eles, teria possibilitado ncontro desses dois fluxos, fazendo-nos melhor processo de desterritorializagio do capitalismo. e, de outro, compra-la. pensar 0 ¢! compreender 0 Compreende-se ainda melhor porque 0 capitalismo nao cessa de reterritorializar o que cle desterritori em O capital que Marx analisa a verdadeira razio do duplo movimento: por um Jado o capitalisme °° em primeira mao. FE Digitalizado com CamScanner pode proceder, de envolvendo incessantemente aesséncia subjetiva da riqueza abstrata, produzir por produzir, isto é, a “produgiio como um fim cm si mesma, o desenvolvimento absoluto da produtividade social do trabalho”; mas, por outro lado, e ao mesmo tempo, ele s6 pode fazé-lo no quadro de sua propria meta limitada, enquanto modo de producio determinada, “produgao para o capital”, valorizagao do capital existente. (op. cit.). A proposta marxista, da propriedade coletiva dos meios de produgao, da producao visando atender as necessidades da maioria, da educacio gratuita para todos, do fim da propriedade privada da terra, procurou deslocar o olhar do individuo para além de si préprio. Na anilise que Deleuze e Guattari fazem das contribuigdes de Marx isso seria possivel porque, na verdade, o modo de subjetivago individualizante, dominante na linha de segmentacao dura no capitalismo, nao consegue se fechar por completo: sempre vasa ou foge alguma coisa. Nio poderiamos caracterizar, entao, o século XIX genericamente como um século das massas porque, como anteriormente afirmamos, nao se pode observar mudangas BB ne oo modo de subjetivagio em curso. O modo-individuo, > u sob novas formas. O que nos parece fazer g A ‘entido € que os movimentos das massas no século XIX se constituira im como contraponto fundamental, como 76 Digitalizado com CamScanner um lugar maldito, a ser expurgado d estar de cada um ede su as ser contraposto a tangalidade a familia, o bem estar individual, reafirmando que na socie lade igualit a de entiio, cada um deve cuidar de seu pedago, que seu justo prémio ¢ estara assegurado, sociedade, em beneficio do bem- amilia. Ao perigo das m : E interessante observar a equivaléncia massa=perigo, muito difundida no século XIX. Se tomamos a leitura proposta por Deleuze ¢ Guattari, poderiamos afirmar que o que se temia era 0 processo de desterritorializacio provocado pelas massas, jd que em seu plano molecular massa é fluxo, que se desloca sem cessar, desmanchando figuras e levando a constituicio de outros modos de subjetivacao. Tal desterritorializagao é fruto do encontro com outros fluxos, é conexio entre fluxos. Esta conexao produz mudangas de estados intensivos € é isso que leva a constituicao de outras figuras. Como as forgas estao sempre em luta, contra as forcas de desterrito- rializagao, outras se opdem: as de reterritorializagao. Uma luta entre forca de homogeneizacio e forca de heterogeneizagao. E nesta tensdo provocada pelos movimentos de massa versus “individuos” que entramos no século XX. Como veremos, outra faceta se produziré como pretensa intermediagio entre os dois pélos ja construidos: o grupo. a a. Século XX: 0 grupo como intermediério” entre o indivivduo e a sociedade ‘A dicotomia individuo-massa atravessa 0 século, mantendo aceso aces estabelecidas entre o individuo e 0 o debate das possiveis re a hhamado campo social (terreno habitado, entre outros, pelas massas). chama Ainda que 0 vocibulo groppo ou gruppo tenha surgido pela ez, no século XVII, como “designagio de uma forma rimeira Vv : gnaga ’ oa i tistica de retratar um conjunto de pessoa”, foi no século XVI art Digitalizado com CamScanner

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