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Manuela Carneiro da Cunha Cultura com aspas € outros ensaios COSACNAIFY As outros das condigBes so relativamente mas ficls 1). “Cultura” e cultura: conhecimentos plementadas, desde que se abandone o arraigado paternalismo Jonais e direitos intel is! nialismo interno e a arrogincia da ciéncia ocidental. £ preciso: ee encarar as dificuldades de implementagio, como a de See legaldade (em falar da legiimidade) de contratos com popal dlcionais Um dos problemas que se colocam de sida, com e auséncia nos sistemas costumeiros, de representantes com suo sobre toda a populagio, Nas sociedades indigenas no Brasil, a antes que cada chefe de aldeia tenha algumna autoridade sobre dae qm tend deh si can Com atender ao problema da legalidade de contratos Assocagis Ci ita legitimidade pode ser frequentemente contestada, ' eevee "esas condigées, entende-se que poucasincstrias queiram Games de ida y vue, como guajitas, colombianas e milongas, 0 wm. por as rises para sua imagem pica de e ver confrontadas co nero tradicional do flamenco andaluz desde pelo menos o seulo 0%, sages de biopiratariae que poucoscienistas quciram rer de fran se inieiou aera pés-eoloial do impéioexpanhol. A Espana aacesso e repartigio de beneficios com populagées que, além do. sia do colonialismo quando a maioria dos outros paises ocidentaisin- tomnaram extremamente desconfiadss entre outras coisas pela si ressavar nce: ea sempre esteve adiante de seu tempo. Os canis de ida gimentagio na luta contra a biopirattia, Por sua pare, as sock J vuelegeram proditos coloniais intcoduzidos na Espanha,frutos da tradicionas, bombardeadas que foram por eampankas que as ‘vam contra qualquer pesquisador,suspeito a prior de biopiat vam levadas a alimentar expectativas mutas vezesexcesivas em: ao potencal econdmico de seus conhcimentos tradicionals, exp 1: teens om uma lng si, Cmegos em uma comunicago es Baredona em thon e expan 204 quando fl apresenado como a Conferénels Mare Bloch dx ‘vas que sé fe des Hates Eades en Sects Soils. Sun frm Gil, mito auentada nse jqoe96 podem provodar desapontainehtas taco de pales cra por Mash Salins a Prickly Parade. Esa ima His, fain ston obettenioe s feampoe mom sarc ay Inoue, adda do ings poe earn Pertone Mois, expe forma insta do onstruir novas insituigBes ¢ relagies equitativas com as populagdes tenes Acdem evil er sun referéeias blogic ota de odapé fala de dicionais e seus saberes, estaremos desprezando uma oportanidade i cfr bibliogrfeas me arpa um pouco para dros a0 seu dono eo eto foi Inencions por exten pelo men cx autores mat elevates. fla de nota de odap nme velo aa. De cera manciry o qeem cues gieros act seram ras cabo ined no pipe ten que ve portant iva de digress, "ele rcentemene um astigo de Terence Taaee de 199, surprencme em veL0 tod aatado,e deseobrs converges Ongrantes com minks reflex que me evaram a oar no pape que lees descnpenbado na getasto do meu pro ta Nios ata {nog ds pas ene sue grou espero “ula”. se recurso ioe fovabundantenene ws par sgii iso, dtanciamento on deszament de seta ‘Demin preps einen em sacle 00 olare ona alan 0 hare ve declare” on veut, A alo ses» kao, corp ds pala ingles etm road na lance qe, sed cone, em eas ashocas por estes wenesio dorcwran ear” esa relies. Se fnlment op pelo menos exten "efi jpruma rai espeia: eve eco ipogefico ra mais conssense coe ous dalgiene Teadaptava mas conoid ster metaclal queen queria he imps Cala” ecu 316 310 contscmexros, cuzruRA YcuLTURA" 4 apropriaglo e da transformagio de géneros musicaislamencos pra ads nas colOnias ~as ataais Cuba, Colémba e Argentina. Dai serem conhecdos como cantos de ia e volta. 'A situagio pos-colonial nfo caracteiza apenas as ex-coldnias, F também um trago importante das ex-metedpoles, quando mais no fora porque estas agora tentam conter a onda de imigragio de seus antigns Iiditos. As categoria analiticas ~ ¢ evito aqui de prop6sito 0 altisso= ante “conceito” — fabricadas no centro e exportadas para o resto do mundo também retornam hoje para astombrar aqueles que as produzis am: assim como 0s cantes flamenco, si0 cosas que vio voltam, df= tadas edevolvidas o remetente, Categorias de ida y vuelta. ‘Uma dessa eategoras ¢ "cultura". Nogdes como “raga”, ¢ mais tarde “cultura”, a par de outras como “trabalho”, “dinheito” e “I tiene”, slo todas elas bens (ot mals) exportados. Os povos da peri feria foram levados a adot-las, do mesmo modo que foram levados a comprar mercadorias manufaturadas, Aigumas foram difundidas pelos tnissioniios do séeulo x1X, como em mostraram Jeane John Coma tof, mas num periodo mals recente foram os antropdlogos os principals provedores da idea de “cultura, levanddo-a na bagagem e garantinda Sua viagem de ida. Desde eno, a “cultura” passoua ser adotadae reno vaca na periferia,E tornou-se um argumento central — como observ pela primeira ver Terry Turner ~ nfo s6 nas reivindicagées de era como em todas as demas. 14 ainda paralelos com itinericiosimprevistos de outras cateyo> sas, O erstanismo, por exemplo, também foi exporado do Ocidente ‘como produto colonial e imposto a grande parte da Africa, Um tania paradoxalmente, porém, 0 crstianismo africano veio a desempentiif tim papel proeminentena resistencia contra as poténcas colonias. Da ‘miu um novo papel como argumento politico e serviu de “arma do reitos intelectuais sobre os conhecimentos dos povos tradicionais 1s no porque “conhecimento” figurasse com destaque na lista que Wit dos patriarcas da anttopologia, Edward ‘Tylor, elaborou para defini “cultura”, e sim porque as questbes de dircitos intelectuas relangaral 0s debates sobre “culeura” com novo vigor. Ha no entanto diferengas significativas na comparagao entre cf tianismo ¢ “cultura”. No séeulo xv1, por mais que se debatesse 80 312 conmmenenvTos, CULTURA “cuLTURA” ‘mesmo modo, a “cultura”, uma ver introduzida no mundo todo, ass fracos”,o que fica particularmente elaro nos debates em torno dos lh vor do Novo Mundo eram as ribo perdi de Israel ou x8 romé teria pregado a Boa Nova nas Amérias, pressupunha-se que os povos pesfericon nto haviam conic a verdadira religizo ou aha- ‘viam perdido até que ela Ihes fosse erazia pelas poténcias coloniais ¢ pela Igreja. Com a “cultura” 0 caso é mais complicado, porque supos- tamente trata-se de algo que esses povosjé previamente teriam e con- servariam, Na linguagem marxista, é como se eles jé tivessem “cultura em si” ainda que talvez nfo tivessem “eultura para si”. De todo modo, no rest diva de que a maori dles adquiri ess ima espécie de “cultura”, a “cultura para si”, e pode agors exibi-ladiante do mundo. Entretano, como virios antropélogos apontaram desde o inal dos anos 1960 (e outros redescobrem com estrépito de tempos em rempos), e353, € uma faca de dois gurpes, ja que obriga seus possuidores a demonstrat performaticamente a “sua cultura”. Acredito firmemente na existéncia de esquemas intriorizados que ‘organizam a percepsio e a agio das pessoas e que garantem um certo gu de comunieacao em grupos sociais, ou se, algo no género do que se costuma chamar de cultura, Mas acredito igualmente que esta diltima no coincide com “cultura”, e que existem disparidades significaivas entre a duas. Isso néio quer dizer que seus conteidos necessatiamente difiam, mas sim que nio pertencem ao mesto wniverso de discurso, ‘9 que tem consequéncias considerives. Em suma, trararei de mostrar aqui que esse & um caso especialmente enganador de “falsos amigos": uma vez que nem sempre percebemos ou observamos 0 uso das a eultura e“eltra” se confndem, 7 Era desse tipo de ida evolia que en fava. Enguanto a antropolo- gia contempordnea, como Marshall Sahlins apontou, vem procurando se desfazer da nogio de cultura, por politcamente incorreta (edeixila 20s euidados dos estudos cultuais),vésios povos estio mais do que nunca celebrando sua “cultura” e utizando-a com sucesso para obter reparagbes por danos politicos. politica académica ca politica étnica ‘eaminham em diregBes contriias. Mas a academia nio pode ignorar ‘que a “cultura” estéressugindo para assombrar a eoria ocidental ‘As aventuras da “eulrura”, contudo, no pram por ai. Asides evol- tas contiouam. E jé que cultura e “cultura” se desencontraram, surge um interessante problema para a pesquisa etnogeifica: quai séo 0s proces- 305, a8 questdes eas transformagiesimplicadas no ajustee na traduso da categoria importada de “culeura” por povos periféricos? Formnulada "Cats" ecutrs 313 com 0 recurso a uma expressdo ¢ uma fértlideia de Marshall Sablins, a questio passa a ser esta: como se dé aindigenizacio da “cultura”? ‘Uma primeira historia (© velho levantoucse, imponente. Othou para o auditirio ¢ disse com indignagfo, em portugués: “Alguém aqui acha que hon & cultura? Bu digo que nfo. Nio é! Honi nfo € cultural”. Estévamos ali, em junho de 2005, discutindo os direitos incelee= tuais indigenas sobre itens euleuras, mais especificamente 0s direitos sobre 0 uso de uma seeregio de ri de que falaremos mais adiante. To- dos os presentes compreenderam imediatamente a mengio do velhio chefe yawanawa a Aoni, que & primeira vista & coisa totalmente diferente, Como essa é uma longa histéria, por ora direi apenas que honi & a pas lavra yawanawa (¢ de varias outras linguas do troneo pano) para ulna bebida alucinégena com base na combinagio de um cip6 ¢ das follias de um arbusto, conhecida no mundo indigena da Amazénia ocidental sob diversos nomes~ tais como ayaheasca,nishi pac, yagé,kagpi—e N0 ‘Acre, de um modo genérico, como “ips”. Desde a década de 1930, pelo ‘menos, a ayahuasea foi incorporada como parte essencial de diversas religides populares nfo indigenas atuantes em localidades urbana do Acre e de Rondénia. A partir do final dos anos 1970, e355 relies conheceram retumbante sucesso nas grandes cidades do pais, atraindo imelectusis com preocupagies ecoligicas,atores de Tv, jovens new age «até o que é bastante interessante, ex-guerrilheiros. Algumas dessa religides acabariam sendo exportadas a partic dos anos 1990 para 0s Ii tados Unidos e para a Europa. De volta i cena. Bra 0 segundo dia de um complexo encontro eit Rio Branco, capital do Acre, reunindo representantes de virios grupo étnieos que vinham de um encontro mais amplo em que haviam fll dado uma organizagio indigena abrangendo 0 Acre e parte do Amie ‘nas. O primeico dia havia sido tomado por longas explicagbes de unit advogada do Ministério do Meio Ambiente acerca dos aspectos legalt da reivindicagio de direitos intelectuais sobre conhecimentos ti cionais. No segundo dia teria inicio um debate sobre a repartigio dot ceventuais beneficios. O encontro tinha a ver com um assunto suid dois anos antes, relacionado aos direitos intelectais sobre o us0 dei 514 contecmuxiros, cuuruma x “cuLtuRa™ ND secregio de perereca (ou sja, uma arboricola) conlecida localmente como *vacina de sapo” e que se popularizou no pais com um de seus nomes pano, kam (voltaremos a ess hstéria com pormenores).Po- deriam reivindicar o conhecimento tradicional do uso dasecregio todos 8 grupos indigenas com sufixe~nawa ou ~6o em seus etnOnimos (mais precisament, todos os falantes de linguas pano do interfkivio Ucayali- Jor tanto no Brasil como no Peru, além de alguns de seus virinhos setentrionais), mas somente os Yawanawa, 0s Kaxinawa e os Katukina cstavam ali representados. Alguns Apurin, que no reivindicavam aquele conlecimento especiic, tnhar fieado para assstir ao debate e pareciam bastante intrigados com a diseussio, que provavelmente hes Abra novos horizons. Francisco Piylko, enti secretirio do Estado do Acte para os Povos Indigenas, também estava presente Sua attude ponderadae sua infudnea, e também 0 fato de que desde o inicio des- ‘arta qualquer reivindicagio naquele sentido por parte dos Ashaninka, conferiam-the grande aucoridade moral. Segundo Piyako, embora 0s Ashaninka,falantes de lingua aruaque utilizassem a secregao dar, ha- ‘vam aprendido a fazé-lo com seus Vizinbos de lingua pano. A questo crucial do encontro era chegar a um consenso quanto is formas legsis de encaminhar as negociagBes em torno do conhecimento Higado a0 so do kampé. Os Katukina estavam na origem de toda a mo- Bilizagto tinham angariado o apoio do Minsttio do Meio Ambiente, PPorém, os tréskatukina presentes viram-se numa posiglo desconfort vel, acusados pelos Yawanawa, eem menor medida pelos Kaxinawa, de pretenderem monopolizar um conhecimento que era comum a todos 08 grupos de lingua pano ali presentes. Os Vawanawa e os Katukina uido aos povosndigens do Novo Mundo pela laa pois dee @ smo a. Nese ata ox pos ndigens no eran nerfs no $0 depropriedade inlet, apenas cnhecinenoseaormaytes ua Gila vem, em fram ergs em exemplars sooo mundo exis como anid conta a cbig De cod ca ‘ii, os indos deve ser plano dos movimento coma oc de- Serum hia ema exorbitnte mpi dos dnctos de propre talase a Robert Crumb no pots conta a exter ve serps ts cists autora sobre Mikey Mouse, edeveram sorencse fre dos movimentos con os dros de propredade ile, Segundo tis constr (40 mato) imgnaivos, 0 pov ne aigens 56m dss opgbe ot ccs de propre intel eo lesiva ou um regime de dominio pilin Ambar a epgtesobrigan ov eyimesindigenas ase encacat em lito de Proce, Dist den Aerativaslintads, lo él expat que ospovos indigenes unary Praymatcamenteprefrdo a opeo dominant revindicar dron ines de proprade leva ecomiso fran a eperne eles que os dfeniam, ox eores progress que se oper ss dicciosabsohwosdepropidade inter, Ee hovvesse, ao entantots formas poses de dts so- re coisas entre pesos (edeiigo de propsedae de Macpherson) além daqulsconfiguads a longo dos timos rs sclon? Esco io forum cao de gia booliana? Ee houver mais do que er atv ence “sm ou no"? Tus careterizagbes hinds to apeaa impem uma cama de forgo povs indigenes quanto so move de lr sas evinces, as um apagan serena ene gies. 1 moto mais epee conhecimemoe declare do que upde nos v imagnagio metropolitans, Na serdade, basta leva ogafa a sério para eet todo um etlogs de modosatemnaivs 328 conmecmsnrros, curtuna& Ycutrun “Cutan eculura 329 Para atingir seus objetivos, porém, os povos indigenas precisam se con= ‘expectativas dominantes em veo de contesté-las. Precisam ‘operar cam os conhecimentos e com a cultura tais como sio entendidos [por outros powos, e enfrentar as contradighes que isso possa gerar format Legislagées nacionais, conhecimento tradicional e nacionalismo Em contraste com a ripida proliferago de instrumentoseestudos inter. nacionais acerca da protegio aa conhecimento tradicional e da rept iio de benefcios no contesto do acesso a0s recursos genéticos, demo raram a surgi leis nacionaisespecifieas sobre essas questBes. OS pases ricos em biodiversidade ainda esto avaliando euidadosamente os efei tos das kis promulgadas por alguns paises mais usados, como Filipinas Costa Rica e Peru. As oNGs que se dedicam a esses temas, tanto nacio~ nis como internacionais, nfo tém wma posigio consensual sobre eles, E-no Brasil, nfo obstante uma proposta de legislagio pioneira langada ‘em 1994 € uma medida provisoria baixada em 2001, ainda hi por parte do yowerno federal muita hestago quanco 3 forma que devera assumie uma regulamentagio (pelo menos até meados de 2009, no momento em me reviso este text). ‘Wi Not tnibitos regional e nacional, as ages um sido no mais dl ‘vez “defensivas”: protesta-se contra aapropriagio ea privatzacio de itens considerados de dominio piblico ou relevantes para a identidade temvtoral. Assim, a India conseguiu invalidar uma patente norte-am cana sobre uso do neems a Coordenadoria das Organizagées Indigena da Bacia Amazinica (CoIcA) contestou 0 registro norte-americano ie suma das plantas com que se produz a ayahuarea; eo governo brasileira contestou com éxito uma marca registrada japonesa de “cupuagu” "Tal estado de coisas, evidentemente, tem toda sorte de efeitos. Ui deles, bastante significativo, éo de eealinhar as sociedades indigent ‘com 08 nacionalsmos de paises latino-americanos. Quaisquer que I= ‘sham sido as poiieas reais desses Estados nacionais para com os pov indigenas, estes nunca deixaram de ocupar posigaa de destaque na ini {ginaglo nacionalista.£ notavel como reaidade e ideologia trilhatal ‘ranguilamente caminhos totalmente independentes e em gel div _gentes. © papel ideoldgieo que os povos indigenas sto chamacdos i sempenhar na autoimagem brasileira varia bastante segundo 0 per 330 CoNMBCINENTOS, CULTURA & cut” bistGrico e conforme os indios em questi estejam vivos ou extintos, sendo estes claramentepreferidos aquees Desde a Independéncia do Brasil, os indios extintos foram repe- tidamente promovidos a elementos fundadores da identidade nacional ‘uss antigasaliangas, ou pelo menos suas ligagdes comezcsi, com por- tugueses, holandesese outras poténcias coloniais foram iavocadas nas dlisputas de fronteira coma Venezucla ea Guiana no inicio do séeulo xx, ‘num movimento que os arreyimentou como parte interessada e como agentes de reivindicagdes brasleiras de soberania terttorial.Jé com telagdo aos povos indigenas da atualidade a hist6ria & outra, ndios es- tabelecidos em seus terit6rios tradicionais foram concebidos desde 0s tempos coloniais como antagtnieos ao progresso, a0 desenvolvimento, a civilizagdo ou sejaIé qual for o termo empregado pata justificar a ex- propriagio de suas teras ou sua escravizasio. Desde meados dos anos 1970, quando foram localizadasricasjazidas minerais em toda a regio amazbnica, povos indigenas estabelecidos sobre o solo esses recursos foram alvo de sucessivas campanlas na midia no sentido de questionar sua lealdade ao Estado nacional. Até os dias de hoje a cobiga por terras tena jogar a opiniao piblica na mesma diregio, haja vista a dificuldade verificada em 2008 na terra indigena Raposa Serra do Sol, em Roraima, para a remosio de arrozeizos — invasores que se alardeavam em porta- dotes de progresso. ‘As questoes interligadas da biodiversidade e do conhecimento tra- dicionalintroduziram uma tendéneia oposta, em que os indigenas so in- corporados a uma nova onda nacionalista. Assim & que em anos recentes {i implantado na Amazdnia, com apoio do governo federal, um projeto desenvolvido por uma onG local sob a denominagio “aldeias vigilantes", ‘mediante 0 qual grupos indigenss so recrutados como aliados nas fren tes de combate & biopirataria. Uma outra questo, particularmente sens vel, provocou indignagio piiblica nacional: a das amostras de sangue de indigenas brasileiros mantidas em instiuigBes estcangeiras, que podem ser utilizadas ou compradas por pesquisadores. Enquanto os Yanomami protestam contra 0 fato de o sangue de seus parentes ser estoeado em ver de destruido por ocasido da morte, como seria devido, a indignagiio nacional transforma a reivindicagio cuturalmente especifica dos Yano~ ‘mami num protesto contra a permanéneia de sangue e Dx de nacivos em instalagdes cientfias fora do Brasil. Em suma, 0 conbecimento © 0 Sangue indigenas foram incorporados a0 patriménio nacional brasileiro “Cala” ecules 33 Fazer parte de tim patriménio nacional, claro esti, é uma facade dois {gumes: se por um lado valoriza o stars simbélico indigena, por outro transforma os povos indigenas em “nossos indios”, uma femal que condensa a ambiguidade inerente i conclgi de indigena Desconfiangas extromas e a ascensdo do conhecimento esotéico Se 0 indigena recuperou um pouco de se valor ideologico no eensrio nacional gragas& repercussio das questGes relativas& biodiversidade € aps conhecimentos tadicionais isso no necessariamente se traduziw em beneficos concretos. Vale lembrar que entre as grandes inovages da cow estava o reconhecimento da soberania de cada pais sobre seus recursos igenétcos. Para os Estados nacionais, nada mais fil que traduzirsoberae nia como propriedade— radugko que entretanto nada tem de Gbvio e sus citou intensa conseovérsia, uma ver que povos ¢ organigagies indigenas angumentaram que recursos genéticose biodiversidade, se ainda exstam cm terras indigenas, era porque cles agiam como seus guardivies. Deeorre desse argumento que os povos indigenas, bem como os povos tradicio= nais de modo geral,nio podem ser expropriados de algo que 6 subsist as a cle, e que a biodiversidade em terras indigenas no pode ser ciada do chamadlo “conhesimento ecolégico tradicional” ‘Uma evidéncia desse conhecimento tradicional € o notével eo traste das baixastaxas de desmatamento nos terrtGrios indigenas eo as feas altamente desmatadas& sua volta. Outraevidéneia € aqui qu se pode chamar de “cultivo florestalindigena”, particularmente bem documentado pelo etnobidlogo William Balée, que estudou as prticas ecolégicas de vavios grupos indigenas. Segundo Balée, boa parte aqilo que parece mata primsra ¢ lorest hi muito tempo manejada por igenas. A rese da produgio indigena de diversidade bioldgia € espex cialmente convincente quando aplicada & agrobiodiversidade, isto 6 dlversidade biolégica em variedades de plantas domesticadas. E sabi que a hiper sclegio de variedades é uma opeio arriscada,j que uma variedade tinica pode ser dizimada de um sé golpe por uma praga A histéria da Grande Fome na Irlanda entre 1845 ¢ 1849, ura catisirofe «que causou a morte de um milho de pessoas por inaniglo e a diispors cde um outro milhio de ilandeses, um exemplo paradigmatio: as bit tatas, que constitufam a dieta bésica da populaglo pobre, pertenciam & 4332 contfcivevTos, cULTURA x YcuLTURA” ‘uma tnia varedade que foi totalmente destruda por uma praga. Os bbancos de germoplasma conseream hoje em dia um estoque de vareds- des, mas fora de sua fea de origetn estes cultivares no so capares de serarvaredslesresistentesa novas doengas. a que se tmna encial a chamada eonservaio ist on on farm [0 local de provenincia” ot “na roga"], em que as plantas coevoluem com seu meio ambiente. Bsa atividade tem sido realizada hi séculos pelos pequenos agricultores, em ‘sua maioria indigenas que se orgulham da diversidade de seus rogedos, (Os povos tradicionais conservaram ¢ aumentaram a diversidade agri cola nas regibes de origem dos principaisculsigenos: centenas de vatie- dades de batata no Peru, de mandioca no Alto Rio Negro e de arroz. na {ndia, por exemplo, foram conservadas por esses agricultores. ‘A-cps no apenas aribui a soberania sobre recursos genéticos a0s Estados nacionais. Como vimos, também reconhece direitos de indige- nas e comunidades locais ao controle dos seus conliecimentos e & pati cipagio nos beneticios. ‘Com essas normas, paises megadiversos como 0 Brasil so apa- sthados em foyo eruzado. Por um lado, esses paises lutamn nos féruns Jnternaeionais por mecanismos de implementagao da repartigao de be- neficios, enfrentando uma forte resistencia dos paises industializados e dos seus aliados. Por outro, esses mesmos paises tém de lidar interna ‘mente com as reivindicages dos pavos tradicionais sobre seus conhe. 'mentos e recursos genéticos ~ reivindicagBes que apresentam uma des- Concertante semelhanga com as dos proprios Estados nacionais diante de outros Estados. Além disso, a cbs & um insteumento da oN, ¢ 08 povos indigenas se utilizam cada vex mais dos féruns dessa organizagao internacional para encaminhar suas preocupagéese reivindicagbes inde- pendentemente da representagio dos governs de seus paises, criando assim situagBes de constrangimento para cles. Um exemplo paradigmi- tico é a regra da obrigatoriedade de se revelar a origem dos recursos _genéticos em pedidos de patente, um dispositivo que propicia verificar a legalidade de acesso aos recursos yenéticos e pode assim faclitar a repartigfo de beneficios. A implementagio internacional da revelagao obrigatéria € uma importante reivindicagio dos paises megadiversos e portanto do Brasil, tanto no contexto da con como no mbito da ovtc; internamente, porém, embora a declaragio de origem tenba se tornado “obrigatéria no pais, o Instituto de Propriedade Incelectal brasileiro se mostra visivelmente moroso na implementagio da regra. “Cubed” cata 35 Dada a longs historia de politicas colonialistasintesnas em rela- ‘420 a0s povos indigenas, reconhecer-Ihes direitos sobre recursos gen€- ticos e conhecimentos tradieionais no é um passo fécil para a maioria dos paises megadiversos. Quem em que condighes deveria concedes acesso a recursos genéticos nas terras de povos tradicionais? No Brasil, enquanto 0 Ministério do Meio Ambiente tem apoiado as reivin de povos tradicionais, outros ministérios opdem-se a elas. Os brasileios, apoiados pelo Ministério da Ciéneia e ‘Tecnologia, utam pelo acesso livre ou pelo menos simplificado aos recursos genétions na~ cionais, Diante da bioparanoia generalizada em relagio a pesquisadores, cles se ressentem de ser tratados pelos povos indigenas com a mesma suspeitalangada contra seus colegas estrangeiros. Com efeito,o aliciamento de povos indigenas para uma milcia vigilante contra a biopirataria estrangeira gerou extrema desconfianca para com qualquer pesquisador, estrangeiro ou nio, Conlhecimentos tr dlicionais virtualmente se transformaram em segredos de Estado, Nesse contexto, foram também alimentadas expectativas de lucros quase es catol6gicas, com frustragies proporcionais Por fim, como observaram Alcida Ramos e Beth Conklin, tornaram-se esotéricos conhecimentos € priticas que antes eram perfeitamente corriqueitos (discutitemos um ‘exemplo revelador dessa tendéncia mais adiante, na hist6ria da pere reea). Atualmente, quase todos os tipos de conhecimento sio aribuidos ‘0s “nossos xami”, on melhor, aos “nossos pajé”, expresso que dit= cto mais adiante no eontexto do caso krah6. Os encontros indigenas sobre conhecimentos tradicionais sio apresentados como encontros Nit ‘inicos,e impde-se extremo sigilo a seus participantes. Pode no ser ‘mera coincidéncia 0 fato de que as vocagdes xaménicas, apesar das difl- culdades e do alto custo pessoal da carrera, estejam aumentando entre jovens lideres politicos na Amaz6nia. ‘A suspeita é regra em todos os campos, no apenas entre os ie digenas. A indistria farmacéutica multinacional tenta distanciar-se tanto quanto possivel de qualquer conilito potencial, seja aleganda ‘que os atuais testes de atividade biol6gica de moléculas sio tio ell: cazes que tornam irrelevantes quaisquer informagoes que o couliecl mento tradicional venha a oferecer sobre moléculas achadas na i tureza, seja, de forma ainda mais radical, defendendo a opgi0 po rmoléculas exchusivamente sintéicas criadas a0 aeaso, tornand 16 levante a propria natureza. 334 conmmcnvstr0s, cuuruna YouurumA” A intensa mobilizagio internacional e nacional em torn dos co- snhecimentos tradicionais tem muitos outros efeitos, alguns dos quais ‘examinarei a seguir. Contratos, associagaes, projets ‘Tomemos a questo da representagio, por exemple, © acesso ao conhe- cimento tradicional depende crucialmente cla chamada “anuéneia prévia informada": para que se realize qualquer pesquisa acerca de conheci- ‘mentos tradicionais, seus detentores devem ser adequadamente infor- :mados sobre 0 que se trata e dar seu consentimento ao modo como estes conhecimentos sero utilizados, « no caso de ioprospecsao (pesquisa para fins comercias) também 3 forma como thes eaberi receher parte dos eventuais lseros e benelicios. Sem entrarmos aqui nos interessan- tissimos aspectos do processo de obtengio da “anuéncia prévia infor- mada", um problema se coloca de imediato: quem tem autoridade para consentit? Isso nos leva a duas outras questes centais. Que sistema de sepresentacio esti sendo introduzido pelo processo? Qual construgio de representagao legitima estd em jogo e como ela se relaciona com ou- ‘ras estruturas de autoridade? Comecemos pela tltima questio, Contratos e acordos ina verdade produzem aquilo que implicita- ‘mente pressupiem, ou seja, criam suas prOprias condigdes de possibili- ade. Ji abordei a redefiniglo das rlagdes entre pessoas e conhecimento que & produzida por eles. Agora considerarei a questio dos represen- tantes legais para assinar contratos e dar “anuéncia ou consentimento informado”. Participei de uma comissio institufda por uma universi- ‘dade norte-americana para certificar-se de que os consentimentos da- dos aos seus pesquisadores haviam sido obtidos conforme a legislagio dos Estados Unidos, e em meu trabalho de campo no Médio Rio Negro ive a experiéncia de seguir 0 procedimento exigido para a obtengio da sauéncia prévia”. Tenho assim uma rezodvel percepso das miltiplas tradugbes e ficgdes legais necessérias a esse tipo de empreitada. CContratos, enquanto formas de toes (legal, eviam sujeitos(legais), segundo a logica descrita por Mauss e mais tarde por Lévi-Strauss. No Brasil, embora as formas de representagao indigenas sejam legalmente reconhecidas como sujeitos de direito conforme a Constiigio de 1988 (art. 232), de um modo geral encoraja-se a constituiglo de associagoes “Cala” cals 335 da sociedade civil com estatutos aprovados e explicitos como a forma ‘mais conveniente (para todos os envolvidos) de lidar com “projetos”, contratos, bancos, governos e oNGs. Daf que povos indigenas venham adotando navas formas associativas e surjam por toda parte associagbes indjgenas locais com um formato legal que Thes permite alegar repre- sentatividade, ineluindo presidentes e diretores cleitos. © problema, evidentemente, & como ajustar a legalidade & legitimidade. Por vezes ‘essas associagbes se destinam a representar apenas uim determinado segmento, como 0 dos professores indigenas, cuja influéncia sobre a politica indigena 6 alias crescente. Quando se trata de associagées que pretendem representar a etnia como um todo, rapidamente facydes ou familias indigenas influentes se investem dos cargos de presidente e i= retores, de preferéncia na pessoa de um homem alfabetizado e ligado a clas genealoyticamente ou politicamente. Nesses casos hi uma conve~ niente convergéncia entre chefes de aldeia e presidentes de associagbes No entanto, as associages tendem a representar mais de uma aldeia, (© problema com a maior parte das sociedades indigenas das “Terras Baixas” (como 0s etnélogos costumam chamar a América do Sul no ‘andina) é que cada aldeia é uma unidade politica aurdnoma, de modo «que as disputas politicas entre facgdes no interior de uma aldeia facil- ‘mente se traduzem na criaglo de uma nova aldeia. Mas as associagbes, ‘em prineipio, no seguem a mesma légica de fissio, e logo pode surgi uma forte contradigo entre autoridades tidas como legitimas ¢ 08 re« presentantes legais nas associngdes. ‘Como a norma é a autonomia de cada aldeia, a emergéncia de algo como uma “representaclo étniea” na forma de lideres de associ= {bes é inevitavelmente acompanhada de conflits, jé que nada é mais Jificil do que atsibuir legitimidade a representantes legais. Os elos en~ tne as instituigbes politias que enfatizam a autonomia das aldeias e as instituigGes associativas que visam representar o grupo étnico como tum todo (e que sfo uma fonte de poder econémico e politico) nao sie ‘uma eoisa dada, S6 podem ser construidos e validados i custa de muito csforgo. E podem ser facilmente desfeitos, dando origem a associagies rivals ¢ & troea de acusagdes. Foi o que ocorreu, por exemplo, no caso do contrato entre os Aguaruna, aindtstria farmacéutica Searle €0 Jar ddim Rotinico de Missouri, no Peru, ¢ também com a equipe cheiada por Brent ¢ Elois Berlin para conduzir uma pesquisa sobre a etnomedix cina maia na Guatemala 336 conncnumros, cuurona & “cutmna” ‘Um exemplo particularmente revelador & 0 easo da disputa que en- volveu, no estado do Tocantins, os Krahé ea Escola Paulista de Medicina (enw). A disputa se den nos anos ineiis da déeada de 2000 eteve origem ‘nam projeto de bioprospeegiio: uma doutoranda da sow havia realizado ‘uma pesquisa sobre planeas usadas rirualmente pelos Kraho que atuam sobre o sistema nezvoso central, a partir da qual a zea desenvolveu um projeto para realizar um estudo mais amplo sobre as plantas rerapéuticas| Jkrahd, Para tanto, a instituigio firmou um acordo com uma associagio que abrangia algumas das aldeias krah. Como era de se espetar, porem, uma outra associagio Krahé contestow a representatividade da primeira Apés uma longa conteovérsia, em margo de 2003 chegou-se a um acordo provisério com a rea mediante um documento assinado petos presiden~ tes de quatro associagbes krahé e tamm pelos chefes de dezoito aldeias| kkrah3, Representantes do Ministério Pablico assinaram como testem- tnhas ¢ representantes da Funai assinaram com os indios. Chamo a aten~ pécies Phyllomedasa um peptideo semelhante& ceulina (e ainda mali potent, batiado de flocerulina),além de outros mais. Por volta de to, Monteccuchi eErspamerpublicaram a extrutica da sauvagina peptideo da seorecio de pele da Phylomedasssouvagei (ri da Are Fina e do Cone Sul) com efeitos antidiréticose redaores da presi Sangainea em mamiferos. Ness altura, Erpamerjé havi identical seis anilias de pptidcosem dez epécies de Phyllomedasa. Entre esi pepseos esava a dermorfina, que tem propriedades analgésicos my fos vezes mais poentes que asda morfia ‘Durante a década de 1980, Erspamer emia equipe publicaram di nas deantigs sobre as Pyilomedusa. Em um dles, de 198, xala¥h 0 interesseexcepcional da ple dessa ris: “Seu texido cutineo pale Ser uma mina inesgorivel dssas moleculss[peptideoss “neni tuts pele de anfibio pode compete com a das PAyllomedasa, que 548 conturcmuenros, cunruna x “eusruna” forneceram 23 peptideos pertencentes a pelo menos sere familias dife- rentes". O artigo, que viria a ser amplamente citado, trazia 0 sugesivo titulo "A pele das Piyllomedasa: uma enorme fibrcae armazém de uma variedade de pepteos aivos”. Nele eram comparadas as quanridades, de quatro peptdeos ativos na pee de onze rs Phyllomedasiae, oto das «ais do género Plyllomedasa. Embora os quatzo pepideos estvessem presentes em toda as espéies comparadas, sas quansidades variavam dle modo notivel, sendo a Phyliomeduse bicolor espécie que possuis, de longe, a mais alta concentragio desses peprideos. [As historias dos etndgrafos O primeiro registro inequévaco do uso de kampd por grupos indigenas data de meados dos anos 1920 e provém de Constant ‘Tastevin (1880- 1962), missionério francés da Congregagio do Espirito Santo na regio do Jurud entre 105 € 1926 (nagquele momento de boom da borracha, a {rea da missio era altamente promissora para a coleta comercial, embora ‘muito pouco rentivel na coleta de almas). Inicialmente un missionsrio comum, Tastevin eserevia relatos edficantes para publicagies eatlicas, os hem mais francos & sua congreyacio, Em meados da década de 19:0, porém, Paul River — que em 1935 fundaria o Instituto de Etnologia de Paris junto com Marcel Mauss ¢ Lucien Lévy-Brubl — interessou-se pelo seu conhecimento sobre a Amazénia e sugeriu-lhe {que eserevessem juntos artigos para revistas de linguistica e antropolo- gla. Foi quando ele se reinventou como etnégrafo e gedgrafo, passando ‘4 escrever uma série de importantes artigos sobre a eno mal eonhecida regiio do Alto Jurui, Durante a Segunda Guerra, quando a borracha voltou a ser matéria-prima estratégiea para os Estados Unidos, todos os artigos geogrificos de Tastevin foram traduzidos (mas no publicados) ‘para o inglés para uso dos servigos de informagdo norte-amezicanos. Num artigo publicado na revista Za Géagraphie em 192, Tastevin esereve 0 rio Mura, na bacia do Alto Jura, e relata o.uso de kamps entre os Kaxinawa, Kulina e Kanamari, Afirma ter presenciado uso do kampd entre os Kulina e desereve os procedimentos de extragio e de aplicagio da substncia, bem como os efeitos por ela causados, Segundo cle, os Kaxinawa atribuem a origem do hampd, bem como de muitas ‘outras coisas preciosas, tangiveis e intangiveis, como os machados, a alémn de relaté “Cabra eeature 349 | yahuasea (hon), 0 paticé € mesmo a noite 20s Jaminawa. Mais do qe proprismente um etnénim,jaminawa (literalmente “gente do ma- chado”) denotara, como propBe Barbara Kieffenheim, uma posigio genérica, ade fornecedor de bens: cada grupo indgena pano tem seus r6priosjominawas, Iso constitu uma caacteristia que dscutitemos ‘com mais vagar adiante: a tendéncia indigena de atsibuir bens culs- raise saberesfundamentas a outros grupos, como se a cultura de cada grupo resultasse de apropriagio, de “predagio cultural” 'A segunda mengio inequivaca ao uso indigena do Ramps fot feta «em1955, com referéncia aos Tuna, grupo linguisticamenteisolado no {Ato Solimbes, no Amazonas. Naguee ano, 0 06ogo José Candido de Melo Carvalho publicow as anorages de sua expedigio de 1950 e relat tum uso similar da mesma 2 pelos Tikuna, que a chamam de Bacurura Carvalho foi o primeiro a identifica a 13 como Phyllomeduss bicolor. ‘A primeira mensio em lingua inglesa 20 uso da secregto da pere= reca parece ocorreremn um astigo de 1962 do antropélogo Robert Car neira, do Museu Americano de Histria Natural. Em texto posterior, de 1970, o autor descreve a réticaeomo magia de caga entre os Amabaca de lingua pano do Peru. A descricio da posologia e dos efeitos coincide fem todos os detalhes com as anteriores. Carneiro ndo consegui iden tiffear arf, mas os Amabuaca chamavamna de hamBs, nome bem pts imo do nosso Aampé. Apesar dese indicia, épossivel que ni se tra da mesma expécie, que Carneito a descreve como uma ré pee éenquanto a Phyllomedaa bicolor rem tarnanho respeitvel. ‘Em 1973, 0antropSlogo briinico Stephen Hugh-Jones reisttou uso da secregio entre os Barasana, mas tata-se de um uso um tanto cepcional,j que eses utlzavam-na para obter penas amarelas et pe saros domesticados, procesto conhecido no Brasil eomo tapiragem Si thiram-se varias outras mengdes priticae pererea,paricularmenit entre grupos pano do interthivio er terit6rio brasileiro, como os Mall (Erikson 1996), 08 Matses (Romanof? 1984) e os Marubo (Montage 198, Melati 1985). quando entram em cena dois norte-americanos: Peter Gor viajante ejornalista freelance, e Katherine Milton, antropétogafisiew ‘Universidade da CabifSrna em Berkeley. Peter Gorman escreveu relatos de sua experiéncia com" (Germo do espanol local designando a seereso der, que Ihe fla nistrado por indios Matses do tio Lobo, no Peru, em 1986. 4350 conaecismtos,currona “cuLTURA” [.-] Deiee Pablo queimar me Bago pela segunda v6]. Ele removes «pele qucimada e ent esfegou um ponen de spo sobre at dees expos tat Jntancaneamente meu corpo comesou a eguentar En segundos catava quando por deo earepenido deter deisado qu ele me gpl casse un medicamen sobre gual eu nada sabia. Comecei a su, Mea sangue eclerou. Meu crag dsparow. Adu’ uma percept opuda shen se ccd cada or panda are dar vj ao inertelimpuso do meu sangue. Mew ecto se conrave vomiteviolentamene, Peo conle de minha fangs coporisco~ ‘mectia urna edefecar. Cano chia, Ent, de repent me vi ramando¢ andando de quate, Tive a semagio de gue enimsispassaram por dena te min, rentando se expresar através do meu corpo, Fol uma sensasdo Jfantstce maspassoa depress, «eu sb conseguia pensar na disparada do ‘meu sangue, una sersagio to intense gue ack gu 0 me crag ia es plod Oriemo ose aclerando Figue agoniad Ba ectava sem lego “Aes poucs os baiments foram fandoestves regulars por fim se

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