Você está na página 1de 8
| ‘ 1s, minaretes: pores, TN do saber wr “tebe como tecido sob? ei tmedieval” © mito das “trevas” medievais — os lon- ‘em que o mundo teria estado imerso no 408 tio © ignorfincia — tem sido abalado pe- fects sobre a chamada Idade Média, realizados ss sis eccios. Essa imagem toma-se tanto os Meoleta quando passamos a analisar © perfodo le Média sob uma perspectiva nfio eu- Entre luz € luz 0 obscuro meio. Um meio de éez séculos. Um meio de miiltiplas faces. Um meio onde se escondem muitas das mais fntimas izes de nossa modernidade. Ser& este o meio, 2 média, 0 inermezzo, a noite que se inter- pée entre o pleno dia da época cléssica ¢ 0 al- vorecer renascentista? Que multiplicidade se esconde por detrés dos preconceitos humanis- ‘ws, do desprezo iluminista e das fantasias 10- nénticas a eclipsar 0 que posteriori de ‘Idade Média’? Ainda que tenha 20a o aparente marasmo a recobrir Garant © Ocidente europeu, podemos falar nu- "a Idade Média no mundo chinés ou hindu? O dizer ento do mundo 4rabe que entre oS faite VIII e XIII viveria seu maior esplen- cent tltimo caso (que de fato tem side 0 fang, & stenco de nossas pesquisas), pode ~ on a eae ous desinedioyelioa ee em relagao a outros: " deverfamos assim defini-to.- poderia existit — *steorsdaPUC-SP, 33 na “‘Casa da Sabedoria” Al-Mamun. (786-833) com seus ego Califa }0 peso havia sido €m ouro € cujos tradutores recebiam mais heres aoe do que um rei? (Garaudy, 1987). Aqueles que gostam de imagi cobrindo © mundo conhecide apés a decadéncia do Sagrado Império Romano no Ocidente, sem pre poderiam contra-argumentar usando do ca- Titer lendério com que as proezas orientais atin- giam 0 imaginério do Ocidente durante os sé6- culos ditos de trevas. De fato, uma vez que os mapas medievais — essas aproximagées entre suposicfio e expectativa — colocavam o paraiso terrestre do lado oriental, € possfvel entender as palavras de Hugo de Sao Vitor: “o curso dos acontecimentos tem lentamente se movido na dirego ocidental, tendo atingido agora o fim da terra a partir do que teremos que enfrentar 0 fato de que estamos nos aproximando do fim do mundo” (apud Wright, 1925, p. 234). Esse quase vatic{nio escrito no século XII paseia-se em trabalhos de estudiosos que desde (© século IV observavam o caminhar do conhe- cimento do poderio oriental tomando a rota do ‘ocidente. E como temessem ou admirassem ¢s- ses ‘‘saberes” amorfos, porque voltavam suas cabegas expectantes para © Oriente (ibid., p. 402 et sea.)- Revista da SBHC, V- 5; P- 33-40, 1991 Ana Mi ravilhas € dos temores” avin roaig proxieas Jee se delta Sais do 96c000 20 frentad das 0 gS rabatho de traducdo dos textos clssicoss oe Go com tanto ardor no mundo Srabe apés © século VIII, na verdade fazia parte dc Wel ty grama intensivo de pesquisa. mam Gram traduzidos para que um estudo profundo viesse a se desenvolver sobre 0 tema — servindo assim como base para esse estudo — 0 que in- cluia, logicamente, novas idéias e desdobra- mentos deste. R. Rashed, reconbecido arabista ¢ historiador da ciéncia, nos prova que o estudo dos mateméticos drabes desde 0 século IX, nfio aria Goldfarb pabticos por quase todo o mundo fabe (aay, ta, 1987)- ‘Apologia do saber frabe?" Nosiay smaravithoso” destruido pela reticula * do Nien apenas a tentativa de resgatar quizqc i? seria chamada “‘Idade Média”. E para gedit a posstvel, por se tratar de uma forma qa? see mento “no ocidental”, tentamog jihcs nhechmnarras “orientalistas” que o sécyp la impés, e fora das quais, decididamen setencia” ¢ a cultura Grabes dos séculog > & chegam a nos ofuscar a vista. A, Bleng ; Gioso da ciéncia 4rabe no perfodo otg,c flerta para o fato de que ainda no princh século XVI os herdeiros do Isla, Ponti? to pressionados com a ciéncia ocidental (qyeq,"™ tia... nossa historia da ciéncia j& a consi ny pindculo nessa €poca) e com a balanca ogy” cial em bons termos, olhavam com superigns” de para © que consideravam entio a‘ rida. Europa” capaz de produzir bem apenas tec Jogia bélica. Tinham, todavia, 0 reparo, 2 pe” cupagfio (que insistentemente repetiam ene” difrios) de imaginar que dinheiro produsy pelas riquezas das novas terras descobertas a. basse por dar-lhes um poder de fogo que ne tia se tornar fatal ao Isla... no que prudents. mente, temos que reconhecer, estavam compis. tamente certos (Elena, 1989). iuavs ae. primeira vista noe dealon bramos com os “saberes” frabes, dios mei vais, temos que nos acautelar com uma sétie de problemas que seu estudo pode ae on aquele que pensa que, hom ee , OU Seja,-com um programa ¢ um objet: vo bastante palpaveis, so, na verdade, proto ot pré-formulacées da ciéncia moderna. E se asin © aparentam em sua forma, isso nfo ¢ veri TO No que conceme a seu contetido. Estes saberes sfo, na verdade, entrelagai abrangentes, totalizantes. Se tomarms, PY exemplo, um pequeno trecho da farmscole) encontraremos sua estrutura reproduzida, uae outra vez, nos tratados de agricultura, ca, medicina, alquimia, e quem sabe a= 1, Chamamos os conhecimentos ¢ a culturt rss fees 9 as fltimas definigBes de estudiosos como Rs RAT ps ranores, cimitarras, minaretes: cultura frabe como tecido do saber sob F B0b 0 cfu “mediev: = fo 6 de nosso velho e conhecido mo- fo sy de que estamos falando, desse mundo © iileu, Kepler ¢ Newton lan- ee es Sos coe a mi), Entender este entrelagamento ji. cosmologin Srabes pode ser dx citnelt ' quase impossivel, por estar ele m outra dimensao do pensamento, apa~ wseima, mas infinitamente afastada mate Ha agua, pelo olhar, pelo aroma, sirara. E, D0 entanito, impecével ¢ intacta culmiropria racionalidade © isofismével oe, SYfavez melhor que mil imagens abstratas | nest exemplo elogiente, fndice de toda uma seit ntura que entre os séculos VIII e XIII per- con com exclusividade a0 Isls A/-Razes, 2 e po a = ALRazes, o homem de Rayyi Crisis, tenazes, alambiques, cadinhos e uanores descritos com uma preciso quase-mo- dema, instrumentos da orquestragao alquimica que, no Livro dos Segredos (ou 0 Segredo dos »,,nos fazem lembrar manuais quimicos 4 ssculo XVII. Abu Bakr Muhammed ibn Za- iariyya, AlRazi, de Rayyi, na Pérsia (c. 854-925) — 0 Razes dos latinos — serd o autor desta que foi uma das poucas obras a chegar 20s nossos dias, dentre as intimeras que o Fi- jist Ihe atribuiu. Efetivamente, o “segredo”” suposto neste compéndio parece estar bem mais 1no titulo do que em seu conterido. Ao lado da igdo primorosa dos hos de laborats- rio, encontramos ordenadas ¢ relativamente bem explicadas as etapas do processo ico, bem como alguns dos produtos possivelmente encontrados nestas — dependendo de quais te- de tais materiais, surpreendente, que os classifica em trés reinos, a saber: mine- tal, vegetal e animal, divisio esta que mais tar- de se tomaria cléssica na Hist6ria Natural. E, além disso, por conter uma quarta divisio, 2 qual denomina ‘‘derivados”, onde estariam aquelas subsiZncias conseguidas artificialmente, das quais, 20 longo do tratado, ir oferecer as Teceitas! © motivo para tal admiragéo esté no fato de que a distingao entre o que se conside- va um produto natural ¢ um artificial no se enquadra dentro dos moldes da alquimia, por Ser esta uma forma abreviada (no tempo © no spaco) de reproduzir a Natureza. Ainda dentro tabela de classificagdes, a 35 uma subdivistio dos : soltiveis dos 8 no sold dessas subdivistes so cocina, ordem pritica, reza a utilizac&o € descri¢&o de certo: riais até ento nfo muito bem identificados no contexto te6rico i ane, da alquimia. O petréleo, duto bastante explorado para fins militares até entio, 6 um bom ; fiatiato exemplo disso. Razes indica 0 uso da “nafta” cujo “destilado branco” serviria para amolecer ou desagregar certas substiincias sOlidas. Além de recomendar a utilizagéo da “nafta’” como bom substitutivo dos dleos vege- tais em lmpadas usadas para 0 aquecimento suave de certos materiais no laborat6rio.* _O Segredo dos Segredos (este compéndio muito mais das “surpresas” que dos “segre- dos”) também apresenta uma faceta um tanto quanto singular no que conceme as idéias de Razes a respeito do “elixir”, que em nenhum momento € chamado de “pedra filosofal””. Isto se explica porque o pensador no acreditava na existéncia de um elixir nico (por isso nfo era a “pedra”, o “uno”), mas em varios, talvez quase elixires que dependeriam dos mate~ introduzidos no processo alquftmi- se tivesse vivido no europe (onde ainda podia-se optar entre a quimica ¢ a alquimia), teria optado pela nascente quimica? Esta pergunta, mal-apli- Pada aqui, tem uma provivel resposta negativa. Razes no diz 20.000 vezes em relagdo a que, nem em que tipo de metais, deveriam ser apli- cados seus elixires. E, talvez, na possibilidade fnfindével de combinagées € que resida 0 SS" 7” proposto no titulo. Também pow mo Brena 61a gua crenca ma teoria do enxofre-me- Gario que caracterizou a alquimia frabe © 00 rastro pode ser detectado na passagem desta a0 6 des- “Fiassan & Hill, 1986p» 144-5, onde também Te eameemartabesetaa cit volidago iniial com a “ata” dos campos ku, principalmente para uso militar, Revista da SBHC, V- 5, p- 33-40, 1991 i. oxic cope Mas, a mistura entre © ee o velho” esti sempre presente, oe Bo Razes, pois este algumas vores inti ¢ Sessidade de se introduzir 0 “'sal"” J) aia Cossids” formadora dos metais, idicande diregio da “trfade”” formulada por Para po Teoria esta que oda wi. fez as delicias de t weeniais pensadores que, entre 08 SéCul0$ xvie XVII, enxergaram © cosmo como uma grande obra alquimica. E mais, memente na teoria dos quatro ¢l gua, fogo © ar), apesar de ser um ‘Apesar de ser um “atomista”"? NA mente por ser um atomista é que adsntte mu 5 sibilidade da transmutagéo ge um atomis- macio dos quatro elementos. ja elaboracéo coincida com aquele assu- Razes acreditava fit- lementos (terra, “atomista’”. "Seu atomismo néo €, portanto, do com este, o mundo deveria ter um ponto fixo no tempo para sua criagio, o que justificaria a istncia de princfpios criadores ¢ imuté- veis (criador, alma, matéria, tempo ¢ espaco), garantindo, segundo Razes, a eternidade do cosmo. A matéria, por sua vez, seria constitulda de &tomos extensos (no sentido de nfo serem apenas pontos geométricos) ¢ indivisfveis, que combinados em diferentes proporgdes com 0 ‘vyécuo (que ele considera uma substéncia cons- Neate ce particvins teaaes) poverilienattn multiplicidade da criagéo. Seria pois da combi nago dos dtomos do vacuo de onde surgiriam (0s quatro elementos e mais o elemento etéreo ou celeste, A proposta de Razes, nesse sentido, 6 bastante original, uma vez que Ee Pesce dos epicuristas, considera prioritari . causa eficiente como razio do ap: ee dade, pee "lementos (leveza, peso, opaci- OE ee eae ee ee combinaram Proporgées com ois estuder a 0s &0 visto ~ para $6 de a questo da causa final, ou seja, 3. Sobre alga ‘ alquimia de Razes Multhauf, 1966, 133 et seq. vide Holmyard, 1968, : sare Sa SBHC, V. §,p, 33-40, 1991 da “‘tendéncia” dos elementos. A questic 4 giomismo torna-se presente, na €poca de Razce gigas a uin grupo de pensadores islimicos 2 Shecidos historicamente como mutazilitas, Ese destacavam © papel da responsabilidade humans frente A criagdo, acreditando na liberdade in, vidual e na primazia da razo para se chegar a, Vordadeiro conhecimento. O proprio texto c° grado teria sido obra do pensamento humang, apesar de inspirado pela divindade. A idéia qe um cosmo criado sem um plano préestabeleci. do, e constitufdo de vacuo e tomos, gerado por uma divindade unitéria e de atributos insondg. veis para a mente humana, deve ter auxiliado a propulsio das teses intelectualistas que marca. fam o movimento mutazilita, em oposicéo & tra. dicional via da f€ na busca do saber. Nao nos cabe aqui discutir as questées filos6ficas e reli. giosas mais profundas dessa forma de penss- mento, aparentemente contraditérias em relacdo ‘a0 reconhecido fatalismo islémico, sutilmente contornado pela habilidade Idgica dos mutazi- litas. Ou, ainda, determo-nos no complexo ema. ranhado politico por detrés das teses mutazilitas que, durante o reinado de Al-Mamun, levariam este grupo ao poder, de onde deflagariam uma verdadeira ‘‘caca as bruxas” em nome da “ra- cionalidade”. Interessa-nos, na verdade, saber que através dos mutazilitas uma série de discus- s6es sobre cosmologia, tendo por base o ato- mismo € por instrumental o racionalismo, irdo encontrar livre transito entre a intelectualidade do Isl a partir do século IX. Este era apenas mais um dos debates acalorados — cheios de pr6s © contras — daquela época, embora nio o menos importante. A questdo do debate e da reintegragao estar presente mesmo entre aque- les que assumem como correta a ontologia mu- tazilita, e 0 pensamento de Razes insere-se neste marco. Da mesma forma que 0 atomismo fora condicfo necessfria para a cternidade do cosmo criado — seguindo um racioc{nio peculist a Razes ¢ distinto da ciéncia do Kalam assum da pelos mutazilitas — também a questo do r= cionalismo toma uma via propria, apesar & fundante, na cosmologia desse pensador. A* sim, segundo Razes, a alma, um dos principio préexistentes ao cosmo, tenta tomar a matérs * imprimir-Ihe vida, mas, por nao ser um cane pio inteligente, nada consegue com i" 0 que permanece refraté [ae Criador, em sua infinita bondade, Tes0 gendrar 0 mundo dando alma 2 matéris x, cimitarras, minaretes: cultura érabe e ee be COMO tecido do g A 0 saber 506 0 cy see tirar prazer € consolo das for. siador enviaria também parte yes. Chrstancia, © intelecto, para que na i ving Saima seus verdadeiros desig. wsse im além deste mundo material e arvrumano, templo Sagrado da al. ser despertada pelo intelecto e dos entraves materiaic ipeofia. Quando todas as almas hu- Blow atingido a libertagio, © mundo as ONES" matGria perderia suas formas, * gado primordial: Stomos disper. pude: esta P oe psi Sando 2° a o intelecto, a razdo em Razes, Todavit fund platénico, no & algo vol. apesat & Ssimplesmente & Observaco do divi- wo elem ‘ meso etqui, em meio a0 mundo material, na jo mais estrita dos fatos, onde 0 inte~ vwemano deverd fazer sua iniciacdo no sa- De fato, Razes ndo aceitava 0 apelo as “autoridades”, pois dizia que sobre observ iosos de Razes consideram: estes os motivos pelos quais ele teria se dedicado aos trabalhos: alguimicos (contra os quais outros homens do ‘cher islimico levantavam ditvidas, destacando- entre eles os nomes de Al-Kindi e Avicena), © também a principal razdo pela qual teria avan- salo tanto em termos préticos neste ramo do conhecimento, Sem divida, estas mesmas idéias ‘so como pano de fundo em sua obra médica, ‘ma das partes mais destacadas de seu trabalho 4 Alguns. “omentadores identificam essa cosmologia com a da trade pag helenizada de Harran na Sfra, divergen ling nett fundo platénico, daquela adotada pelos mutazi- yo) mut ciéncia do Kalam (em frabe, palavra ou dis~ 1.'m# espécie de sistema I6gico com que esta escola ‘Oxidens E98 Preceitos religiosos, ¢ que poderfamos Vis «a, ftzendo uma vaga analogia, com a forma que 4a cosmo e8eolfstica crist, Sobre os mutazilitas © am, 1953, 8 Vide Sourdel, 1983, p. 72-9; von Grune- 1573, p, 32yP 101 et seq.; Cahen, v. 1, p. 83-5; Piness Sina Ig gee® € Pines, What was original in arabic fer, gg; (Malt do Siempdsio de Histbria da Ciéncia, OX etseq, 37 ‘medi vay © que até © s6, HOS Palses Baines *VE relacio a Galeng. compativel com 80 28 principais 1973), Seu sentidy através de sey ju nee Pp. 725), "ibe raziio 6, aleatéria da Natureza, com aes Segundo ee, foram dotados, que Razes | igualdade, rejeitando og i Sobretudo aqueles inserdow no comer to 80. Tgualdade no poder troca do saber; iglaldnic no ee! material, tornando possivel a transmutacdo, As idéias nag hierérquicas e igualitérias de Razes irdo perar intimeras polémias entre ele ¢ eos. Severas criticas a seu mesmo apés a sua morte, ¢ Al-Binni, 20 com pilar a lista de trabalhos do “homem de Rayyi", diz que seus oponentes o acusavam de desiruir a riqueza das pessoas através da alquimia, sua satide através da medicina, e suas almas pela di- famacio dos profetas (Pines, 1973, p. 3; Parain, 1985, p. 302-3). Mais tarde, tanto Avicena co- mo Maiménides afirmaro que melhor teria sido se Razes ficasse naquilo que dominava bem, ou i ia interessante notarmos que esta- aon eae tum pensador dedicado 2 misica idade, apés 0 que, movido curiosidade, inicia uma carreira en: medi- pela vital de Bagdd, diretor no Hospital . homies ter com estudos de alquimia ¢ filosofia. Tentaremos aqui, resumidamente, colocar algumas das causas que, aparentemente, torna- ram possfvel uma conjuntura aberta 4 oxigena- So cultural, plena de discussdes, debates € no- vas idéias, por vias racionais tio diversas das nossas. Uma das marcas originais do pensamento frabe € a sua construgdo por sobre uma base espaco temporal completamente distinta daquela adotada pela rroderidade ocidental. Tempo e espago fundem-se no ato da existéncia cotidia~ na, formando uma constelacio de momentos que néo pressupde uma duragdo continuada e linear como aquela assumida nas origens da ciéncia modema. A isso subjaz o fatalismo is- Tamico, a determinaco do mundo seré um atri- buto da vontade divina. Aquilo que ocorre no cosmo ser Jn sha Allah (se Deus quiser). A confirmacao de sua peculiar temporalidade esta expressa em suas formas verbais, que se detém mais na aco do que no agente (daf talvez a inexisténcia do verbo ser em sua lingua) ¢ que & configuram num degradé temporal comple- de nosso passado, presente e palgatar que define 0 aca- na configurando aquilo que Be aia erste, Bas if delineado, simtlar e nebuloso . Oamusagbl (Garde, i teferido como . ts Pata 08 arabes ser4 um tempo coinci- 38 ida assimilacio, no Império aeates como a alquimia ~ que nao como depende de tal visio para existir — gg cigncias da vida ~ fundadas na idéia de demais saberes naturais que na €poca esta. Jam tigados 2 idéla do mundo como! tay oan organismo. Poderfamos, inclusive, arriscar um pouco além e dizer que tais condicées de sim, litude entre a visio de cosmo na época e a vist espaco temporal no mundo islémico, teriam, permitido os avancos significativos ocorridos neste diltimo em termos de conhecimentos sobre a Natureza. Mas isto dependeria de uma andlise muito mais aprofundada dos parametros tin. giifsticos e culturais dessa civilizagio, 0 que te. presentaria um cutro estudo. : No momento, alguns poderiam umentar usando uma complexa € arriscada uesifo preseate no fatalismo érabe: iii de Deus agindo alcatoriamente sobre 0 uni no o privaria da possibilidade de leis? Este de. bate, presente desde a antigiiidade classica, ga- nha um caréter préprio no Isla com 0 ataque de alguns grupos de fundamentalistas religiosos as tentativas de teorizagio da Natureza feitas por estudantes laicos. O fato que mais acirrava esse debate, além da contradigao natural representa- da pela busca de desfgnios que s6 a divindade pertencem, cra o da utilizacao feita pelos ho- mens das “‘ciéncias” dos antigos saberes pie gos. No século IX, 0 renomado astrénomo AF Balkhi, que em seus anos de juventude fom homem fervoroso, é duramente criticado porte ligivsos que consideravam sua paixéo Pela astronomia, e seu envolvimento com textos classicos, um ato de heresia € afronta ao Isla, Nessa mesma época, em partida, Al-Mamun, como vimos anterio tornara-se um dos maiores mecenas das cias” que a humanidade j4 conheceu. De i forma geral, e com raras excecées, até fi século XI ¢ infcio do século XII, a liber para realizar estudos seculares era fundida por todo territério islamico. 6 #7 dessa época irdo tornar-se mais restrites Bionalizados, devido a perseguigdes 2° oriental,® 6. Vide Goldziher, 1981, p. 196, sobre Al-Balkhil berdade para estudos seculares em territ6ri9 . 204, encontrar 10 : copie pao conseguia se organizar formalmente, temporal, satisfeito com o papel de fidei - nfo buscava desenvolver ou ‘ corpo doutrinério religioso. Desse wntro nasceu a politica do Jai cultural que tanto impressionava 0 Oci- ‘Sem saber, 0 “Isla mudou a cena ‘principalmente por representar uma cons- Pine, embora muitas vezes passiva, ameaca e ‘oferecer-se como um retrato incompreens{- de um mundo totalmente diferente e pré; iciente para se tornar real””.” “impo” e dono das armas — vendeu ao “outro” (mas também sobretudo a si prdprio) do “‘senhor” a ser respeitado por s: ¢o natural, que mesmo nunca tendo estudado légica... requer provas antes de concordar com @ verdade de qualquer proposicao; sua inteli- géncia treinada funciona como parte de um me- enismo...”® Enquanto isso, cantava em verso € [Plosa, ¢ retratava em seus quadros a imagem lasciva, indolente ¢ irracional daquele mesmo Ser oriental que tempos atras despertara espanto € temor... quase como um ritual de vinganga (Kabbani, 1986; Said, 1979). LSTA BIBLIOGRAFICA ARIE, R. Espafia Musulmana (Siglos VIN-XV). Bat- celona: Editorial Labor, 1988. (Col. Historia de Espafa,dirigida por Manuel Tufidn de Lara, V. 3)- . penton Grunebaum, 1953, p. 33; sobre o embate entre 08 Bee ge era vision, iid p. 2- Tiga um alto funciondrio inglés que vivew anos 2 apud Said, 1979, p. 38, 39 AMERICANO DE HISTORIA D; LATINO. DA TECNOLOGIA, 2. Anais, o eeciag GARDET, L. Concepg6es mugulmanas sobre o tempo €.2 hist6ria (Ensaio de tipologiacultufa) In RI- COEUR, P. et al. As Culturas ¢ 0 Tempo, Petr6- 1 1975. Estudos reunidos pela GOLZIHER the attitude of orthodox — Islam toward the ancient science, In; SWARTZ, M. L. Studies on Islam. New York: Oxford Univ. Press, 1981. Press, 1981. Von GRUNEBAUM, G. E. Medieval Islam. A Study in Cultural Orientation, 2. ¢6. Chicago: The Univ. of Chicago Press, 1953. al-HASSAN, A. ¥. HILL, D. R. Islamic technology. ‘An illustrated history. Cambridge: Cambridge Univ. Press, 1986. HITTI, P. K. History of the Arabs. From the earliest times to the present. 10. ed. London: Macmillam, 1970, 1986. HOLT, P. M. et al. (org.). The Central Islamic Lands from pr lamic times to the First World War. Cambridge: Cambridge Univ. Press, 1970, 1988. (Col. The Cambridge History of Islam, V. 1A). . (erg). The Indian sub-continent, South-east Asia, Africa and the Muslim West. Cam bridge: Cambridge Univ. Press, 1970. (Col The Cambridge History of Islam, V. 24). (org). Islamic Society and Civili “ion. Cambridge: Cambridge Univ. Press, 1970, “1986, (Col. The Cambridge History of Islam, V- 2B). HOLMYARD, E. J. Alchemy. Baltimore: Penguin Books, 1957, 1968. a KABBANI, R. Europe's Myths of Orient. Devise ‘Rule, London: Pandor Press, 1986-0 LAPIDUS, I. M. A History of Islamic Societies. Cam- bridge: Cambridge Univ. Press, 1988. IC, V. 5, p- 33-40, i991 Revista da SBE!

Você também pode gostar