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Do Campo Ao Campus - Feira Agroecológica Na Universidade Federal Rural Do Semi-Árido
Do Campo Ao Campus - Feira Agroecológica Na Universidade Federal Rural Do Semi-Árido
RESUMO
O presente projeto "Do campo ao campus: Feira Agroecológica da Ufersa" significa uma
retomada de uma experiência exitosa que funcionava no campus da Ufersa de Mossoró e
que foi interrompida em virtude da pandemia da COVID 19. Essa iniciativa é um
desdobramento da experiência da Feira Agroecológica de Mossoró, organizada pela
Aprofam (Associação dos Produtores Orgânicos Familiares de Mossoró), funcionando há 15
anos. As feiras agroecológicas possibilitam uma aproximação entre produtores familiares e
consumidores de alimentos orgânicos e se constitui como espaço interativo, justo e solidário
de oferta de alimentos orgânicos, produzidos pela agricultura familiar local, tornando-a uma
novidade e referência quanto à transição agroecológica, produção e consumo alimentar.
Esse processo motivou docentes e discentes da Ufersa realizar a feira na instituição também
como instrumento pedagógico de ensino, pesquisa e extensão em torno das temáticas de
consumo e produção sustentáveis e aproximações campo e cidade, conhecimento científico
e conhecimento empírico.
Palavras-chave: Agroecologia; Economia Rural; Economia Solidária.
ABSTRACT
The present project "From the field to the campus: Ufersa's Agroecological Fair" means a
resumption of a successful experience that operated on the campus of Ufersa Mossoró and
that was interrupted due to the pandemic of COVID 19. This initiative is an offshoot of the
experience of the Mossoró Agroecological Fair, organized by Aprofam (Association of
Organic Family Producers of Mossoró), operating for 15 years. The agroecological fairs
enable an approximation between family producers and consumers of organic food and
constitute an interactive, fair and solidary space of organic food supply, produced by local
family agriculture, making it a novelty and reference regarding the agroecological transition,
food production and consumption. This process motivated Ufersa's teachers and students to
hold the fair at the institution as a pedagogical instrument for teaching, research, and
extension around the themes of sustainable consumption and production and the
approximation of field and city, scientific knowledge and empirical knowledge.
1
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
- Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001
Key-words: Agroecology; Rural Economy; Solidarity Economy.
RESUMEN
El presente proyecto "Del campo al campus: Feria Agroecológica de Ufersa" supone la
reanudación de una experiencia de éxito que funcionó en el campus de Ufersa Mossoró y
que se interrumpió debido a la pandemia de COVID 19. Esta iniciativa es fruto de la
experiencia de la Feria Agroecológica de Mossoró, organizada por Aprofam (Asociación de
Productores Familiares Ecológicos de Mossoró), que funciona desde hace 15 años. Las
ferias agroecológicas posibilitan un acercamiento entre productores familiares y
consumidores de alimentos ecológicos y constituyen un espacio interactivo, justo y solidario
de oferta de alimentos ecológicos, producidos por la agricultura familiar local, convirtiéndose
en una novedad y referencia en cuanto a la transición agroecológica, la producción y el
consumo de alimentos. Este proceso motivó a los profesores y estudiantes de la Ufersa a
realizar la feria en la institución como instrumento pedagógico para la enseñanza,
investigación y extensión en torno a los temas de consumo y producción sustentable y
enfoques de campo y ciudad, conocimiento científico y conocimiento empírico.
Palabras clave: Agroecología; Economía rural; Economía solidaria.
1. Introdução
O processo de modernização da agricultura, a partir do Pós-Guerra e no
Brasil nos anos 1970, foi decisivo para a construção de um sistema agroalimentar
profundamente artificializado em seu processo produtivo, significando uma
agricultura altamente dependente de insumos exógenos, provocando uma perda de
autonomia dos agricultores. Porém, essa corrosão em termos de autonomia se
alarga também para a dinâmica de comercialização dos produtos agropecuários, já
que se encontram monopolizados de diferentes formas, seja por atravessadores ou
por formatos de produção integrados à indústria alimentar e redes de
supermercados em que os agricultores e consumidores constituem-se como os elos
frágeis desse sistema agroalimentar.
Para Ploeg (2008), esse sistema que denomina de “Impérios Alimentares”
gera uma corrosão na autonomia produtiva e de vida dos agricultores familiares e
uniformiza os hábitos de consumo, tendo como consequência central a
marginalização da agricultura familiar, contribuindo para uma crise da identidade
camponesa (CARVALHO, 2009). Em relação ao consumo, à medida que provoca
uma redução quantitativa dos agricultores locais e distanciamento
produção/consumo, implica em uma erosão nos hábitos alimentares da população
em função da pouca diversidade de oferta de produtos. Esse processo desemboca
em um consumo alimentar, quase que exclusivamente, de produtos processados e
industrializados, comercializados nas redes de supermercados.
A modernização da agricultura, como um pilar do processo da sociedade
industrial moderna, se relaciona com os recursos naturais (solos, água,
biodiversidade, etc) como infinitos e inertes, calcada apenas em uma racionalidade
econômica imediatista, desprezando outras racionalidades como as dimensões
ecológica, cultural e social. É essa nova percepção mais complexa e sistêmica da
sociedade de risco (Beck, 2010) tem provocado uma crescente quebra de confiança
e reflexibilidade em setores significativos da sociedade (Giddens, 1991), que ao
mesmo tempo questiona e mesmo refuta produtos como os de origem transgênicas,
vai contribuindo para o desenho de alternativas, a exemplo da produção
agropecuária orgânica e agroecológica.
Esse cenário hegemônico vem provocando uma crítica consistente que
potencializa desenhos de alternativas que buscam resgatar a importância da
agricultura familiar camponesa como ator relevante para a construção de ações que
coloquem em primeiro plano a produção de alimentos saudáveis, diversificados, que
preserve a cultura alimentar e a biodiversidade, além de diferentes formas de circuito
curtos de comercialização de alimentos, em que as feiras agroecológicas se
encaixam nessa perspectiva conceitual (DAROLT; ROVER, 2021).
As Feiras Agrocológicas integram iniciativas de transição agroecológica: na
produção, na comercialização e no consumo, significando que essa transição
envolve tanto quem produz como também quem consome os alimentos dessa
produção. Portanto, é uma abordagem para além da simples substituição de
insumos, colocando em questão as dimensões política, cultural, ambiental e de
saúde nos atos de produzir e consumir alimentos (GLIESSMAN, 2000).
Nesse sentido, pensar o processo de transição agroecológica significa um
novo enfoque social para a agricultura e o desenvolvimento rural, construindo
aspectos de conservação dos recursos naturais, viabilidade de atividades em
pequena escala e métodos ecológicos modernos. Isso deve levar a uma atividade
produtiva que tenha como ponto de partida o conhecimento e os recursos locais e
que seja, ao mesmo tempo, sustentável e com um grau de produtividade capaz de
gerar produção diversificada, propiciando condições de reprodução social das
famílias e comunidades camponesas.
Essa nova percepção de relacionar de forma articulada a produção e o
consumo alimentar parte do pressuposto do que Araújo et al (2015) define como
Enlace da Sustentabilidade, isto é, o entrelaçamento de forma virtuosa entre a
agricultura familiar de base ecológica e os circuitos curtos de comercialização
alimentar, potencializando um sistema agroalimentar sustentável.
Para Marden et al (2017), nessa nova perspectiva do sistema agroalimentar,
estão presentes três categorias dos Circuitos Curtos Agroalimentares: o primeiro,
definido como "face-a-face", através da venda direta, em que as feiras vem se
constituindo como importante exemplo; o segundo, "intermediário", de maior alcance
de interação, tais como as lojas de produtos regionais, orgânicos e artesanais;
terceiro, que define como “cadeias curtas alongadas” no tempo e no espaço, com
comercialização fora da região produzida, até mesmo internacional.
Para Talamini (2017), existe uma diversificação de consumidores de
alimentos orgânicos, fazendo uma tipificação em duas categorias: os mais antigos, a
exemplo daqueles que frequentam as feiras e os locais produtivos; e os mais
recentes que adquirem seus produtos em supermercados. Na primeira categoria,
está mais presente uma preocupação em potencializar os produtores e locais de
comercialização, pois há um “sentimento de pertencer àquele local, onde acontecem
trocas de informações e socialização, além das transações comerciais”. Já na
segunda categoria, fazem parte de um processo de convencionalização da produção
e comercialização de orgânicos em que de certa forma permanece a estrutura do
sistema de produção e consumo convencional. A confiança e cumplicidade
produção-consumo está mais presente na primeira categoria como as feiras
agroecológicas, quando em comparação àqueles que adquirem produtos em
supermercados.
Para Marden (2017), os circuitos curtos de comercialização, à exemplo das
feiras agroecológicas, são inovações pelo seu potencial de ressocializar e re-
espacializar o alimento, possibilitando ao consumidor novas valorações dos
alimentos com base no próprio conhecimento adquiridos por meio das vivências e
trocas que essas modalidades propiciam.
O artigo apresenta o projeto "Do campo ao campus: Feira Agroecológica
da UFERSA" fruto de um trabalho de longa data que o Grupo de Pesquisa e
Extensão em Agroecologia (GPEA) vem realizando com a APROFAM, com destaque
para a Feira Agroecológica de Mossoró, funcionando há 15 anos, ao lado do Museu
Municipal. Mesmo no período mais crítico da pandemia da COVID 19, em que pese
uma redução de barracas e público consumidor, a feira continuou funcionando,
respeitando as exigências sanitárias impostas pela pandemia. Atualmente ela vem
retomando a sua dinâmica todos os sábados pela manhã, quando em torno de 300
consumidores semanais visitam e adquirem os diversos alimentos ofertados.
Logo, o objetivo do Projeto consiste em proporcionar o funcionamento da
Feira Agroecológica, no campus sede da Universidade Federal Rural do Semi-Árido
(UFERSA) às quinta-feira pela manhã, como um espaço de comercialização de
alimentos orgânicos à comunidade ufersiana, assim como ambiente de diálogo de
saberes entre universidade e agricultura familiar agroecológica em torno de
temáticas como agricultura orgânica, agroecologia, desenvolvimento rural, sistemas
agroalimentares sustentáveis, circuitos curtos de comercialização de alimentos.
A presente discussão dialoga com o Grupo de Trabalho (GT) proposto em
função da necessidade de reorganização e reinvenção do rural, com vistas a um
maior alcance de consumidores e conhecedores do trabalho dos agricultores rurais
que trabalham com base na agroecologia, configurando em novas formas de
consumo e produção.
Com isso, objetiva também realizar troca de saberes por meio de encontros
entre pesquisadores e agricultores sobre os processos produtivos, assim como os
desafios da produção agroecológica; Realizar encontros com agricultores produtores
da feira e comunidade da Ufersa objetivando outros projetos de pesquisa e
extensão; Fazer sistematização e divulgação dos processos produtivos nos
assentamentos e comunidades rurais, assim como do funcionamento da feira na
Ufersa e, realizar processos formativos no local da feira e nos espaços de vida e
produção das famílias agricultoras.
2. Metodologia
O processo de funcionamento da Feira Agroecológica da Ufersa se dá de
forma dialogada entre o grupo de docentes e discentes que integram o GPEA
(Grupo de Pesquisa e Extensão em Agroecologia) e a APROFAM, refletindo e
decidindo a melhor forma de funcionamento dessa iniciativa. A proposta foi
apresentada para a comunidade da UFERSA, onde objetivou-se discutir o formato
do projeto e quais as demandas dos agricultores participantes.
Figura 1: encontro de apresentação da Feira Agroeoclógica da UFERSA
Fonte: ASSECOM, 2019
A Feira Agroecológica da Ufersa funciona nas quintas-feiras, de 7h às 12h,
em uma parte do estacionamento que se localiza em frente ao prédio da reitoria,
inicialmente com 07 (sete) barracas com os produtos de distintos assentamentos e
comunidades rurais. As barracas utilizadas já são dos produtores, que montam e
desmonta ao longo das atividades. Após o encerramento da feira, essas barracas
são guardadas em um prédio próximo que serve como ponto de apoio para a
vigilância da Ufersa.
Além da comercialização, tem-se mensalmente uma atividade formativa,
denominada “Refletindo a produção e o consumo agroecológico” com a
participação da comunidade universitária, da Aprofam e convidados externos.
Como forma de integração UFERSA-APROFAM, contrapartida e
reconhecimento por parte da Aprofam da importância da Feira na Ufersa, no final de
cada mês, são sorteadas duas cestas agroecológicas, sendo um para a Vila
Masculina e a outra para a Vila Feminina. Essa iniciativa tem também o objetivo de
uma maior divulgação da feira no seio do corpo discente.
No decorrer da execução do Projeto teremos três encontros entre os
integrantes entre GPEA e APROFAM no sentido de avaliação do funcionamento da
feira que possibilite ações que potencialize o melhor funcionamento da feira. No
aspecto didático e de troca de saberes, a feira está aberta para atividades de caráter
formativo tanto no espaço da feira e na UFERSA como nos locais produtivos dos
alimentos comercializados na feira.
Em síntese, a proposta metodológica se baseia na ideia de fortalecer a
interação UFERSA/APROFAM, resguardando as autonomias tanto da Ufersa como
dos agricultores em todas as fases da execução desse projeto e funcionamento da
feira. Este projeto foi executado em uma versão inicial de agosto a dezembro de
2022.
3. Resultados e Discussões
A feira Agroecológica completará 15 anos e desde o início tem sido uma
espécie de laboratório a céu aberto para alguns docentes desenvolverem suas
ações de ensino, pesquisa e extensão, com destaque para àqueles (as) das áreas
das ciências agrárias, educação e saúde. Na feira, ou através dela, os discentes têm
a oportunidade de estabelecer contatos e vivências com todas as etapas da cadeia
produtiva dos sistemas orgânicos, desde o processo produtivo, passando pelo
beneficiamento, até o processo de comercialização e acesso aos alimentos pelos
consumidores.
Com o intuito dessa experiência ser mais internalizada pela UFERSA, há 03
anos a feira Agroecológica veio para a UFERSA, às quintas-feiras, com grande êxito,
tanto no aspecto estritamente acadêmico, percebido em um profícuo diálogo de
saberes entre docentes, discentes e agricultores(as) como na oferta à comunidade
da Ufersa de alimentos agroecológicos, através de um preço justo que favorece
tanto os consumidores como também as famílias agricultoras, já que melhoram sua
renda, dando possibilidade inclusive de investirem uma parte na melhoria dos seus
processos produtivos.
A Feira Agroecológica da UFERSA foi suspensa em virtude da pandemia e
consequente suspensão das atividades acadêmicas na Instituição. Com a retomada
presencial em 2022.1, a partir do final de julho do ano corrente, a proposta é o seu
retorno a partir de agosto do ano corrente. Portanto, esse projeto tem o intuito de
viabilizar a retomada do funcionamento da Feira Agroecológica da UFERSA como
espaço de comercialização de alimentos agroecológicos, produzidos localmente, ao
mesmo tempo que se constituirá como experiência didática de ensino, pesquisa
extensão.
Através do projeto tem sido possível um encontro semanal entre os
agricultores familiares locais, produtores de alimentos orgânicos, com os estudantes
e pesquisadores dos cursos das ciências agrárias e de outras áreas acadêmicas
interessadas na produção, comercialização e acesso a alimentos sustentáveis.
A dinâmica da feira, além da comercialização, é um encontro que propicia
diálogos em torno dos desafios de processos, manejos e tecnologias adaptadas a
esse de produção agropecuária que rompa com a matriz convencional de produção
e seus sérios problemas socioambiental. Dessa dinâmica de encontro semanal gera
aproximação e possibilidades de atividades acadêmicas de pesquisa, ensino e
extensão.
Dentre as ações realizadas e resultados obtidos, temos uma presença
significativa de consumidores, constituída por por docentes, discentes, técnicos e
trabalhadores contratados da Ufersa. Realização de roda de conversa no espaço da
feira, envolvendo discente, docentes, técnicos e agricultores sobre o processo
produtivo e de comercialização de produtos agroecológicos. A presença semanal de
produtores de alimentos orgânicos na Ufersa, propiciando um diálogo de saber entre
estes e a comunidade da Ufersa. O funcionamento de um espaço de
comercialização de alimentos orgânicos para a comunidade da Ufersa e moradores
vizinho à instituição, e apresentação do funcionamento do Projeto na atividade
organizada pela Pró-reitoria de Assuntos Estudantis (PROAE).
Abaixo apresentamos o quadro 1 que elenca os resultados obtidos nos
aspectos quanti e qualitativos:
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Joaquim et al. (Orgs.) Vivenciando e construindo saberes para o
Enlace da sustentabilidade. EDUFERSA, 2016.
BECK Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: Ed.
34; 2010.