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A divisio de Poderes eo constitucionalismo brasileiro José pe Partas Tavares Professor e Coordenador do Curso de Ditetto da Universidade Regions! do ‘Nordeste. SUMARIO APRESENTAGAO Capitulo | — Voutrina 1.1. Origem histérica 1,2. Fundamentes Caphiute W — Dirolte Allonigona 2.1. Sistema inglés 2.2, Sistema amoricano 2.3. Outros sisternas Capitulo I! — Direlto Brasitelro Consideragées preliminares A Gonstitulgio Imperial A prietra Outhulyay va RepCulloa . A segunda Gonstitulgén Republicana — 1934 A Constitulglio de 1997 . A Constituigso do 1946 . A Constituigao de 1967 Conclusées Bibllografia Monografia apresentada para o Ourso de Especlalizagao em Teorla do Diretto e do Estado, a nivel de pés-graduagao, na Universidade Regional do Nordeste, em Campina Grande — Paraiba, aprovada com a nota maxima, R tof, fegial. Grosilia o, 17 a. 68 jon./mor. 1980 33 APRESENTACAO Este trabalho despretensioso @ sucinto versard sobre o tema “A diviean de Paderes 9 © constitucionalismo bracileiro” o cord anilice répida do Direita Constitucional positive sob 0 ponto de vista puramente Juridico-formal, sem conotagdo critica. © desenvolvimento dar-se-4 em trés capitulos: 1 — Doutrina; 2 — Direito alienigena; 3 — Direito brasileiro. No primeiro tentaremos examinar, de passagem ligeira, a trajetérla histérica e os fundamentos doutrinarios com referéncias as principais obras consultadas. No segundo, contemplando 0 Direito comparado, teremos de. em razao da exigilidade do exercicio, limitar-nos ao exame dos textos constitucionais. Para isso selecionaremos alguns Diplomas Constitucionais dos mais significativos que consagram o regime da democracia representativa, tomando-o5 come protétipos. Estudaremos, dentro desses parametros, no Direlto alienigena, 0 mo- delo inglés de monarquia constitucional parlamentarista e a Constituicéo dos Estados Unidos da América, paradigma das republicas presidencia- istas, como os mais antigos e sdlidos monumentos juridicos em plena vigéncia. Procuraremos analisar as experiéncias recentes advindas da mu- danga politica pés-guerra, tais como a Constituigéo do Japao (1947), Im- pério constituclonal parlamentar; as Cartas Magnas Republicanas da Ita- lia (1947), nitidamenty parlameularista; da Franga (1988), mlsto presiden- cialista/partamentarista; da Alemanha Federal (1949), parlamentarismo com caracteristicas proprias, € Portugal (1976) com definigdo sui generis de “Estado democratico em transigdo para o soclalismo”, e por Ultimo a Carta Politica da Espanha (1078) monarquia parlamentarista do tipo es- pecial. Quante ao Direito brasileiro, anotaremos a colocagao da teoria nas Cartas Politicas de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967, além des hiatos dos estados Ge excegad de 193U/1984 e 1964/19 /8. Por fim sintetizaremos nosso estudo com a abservagdo de que a dou- trina da diviséo de poderes com os consectarios freios e contrapesos in- serida nas Constituicdes das democracias representativas 6 melo de ga- rantir 0 homem face ao Estado. CAPITULO | — DOUTRINA 1.1. Origem hiatérica A formulacao da doutrina da divisdo de poderes deve-se aos pensa- dores da época moderna e a MONTESQUIEU, especialmente. Mas nao se 54 R, Inf. legial pode deixar de reconhecer o trabalha crlative da seus antecessores, Den- tre eles avulta, naluralmente, ARISTOTELES, que anteviu a tripartic¢ao do poder como forma assecuratéria do bom governo. As trés partes desse governo do bem comum “,,. quando elas sao bem constituidas, 0 gover- no & forgosamente bom” (2) pela funclonatidade, pols enquante a primei- ra 6 “encarregada de deliberar sobre os negécios piiblicos” (*), a outra exerce os misteres de provedora das necessidades coletivas, @ a ultima Se reserva a ministrar justiga, aplicando o direito aos casos concretos nos conflitos de interesses que eclodem em qualquer sociedade. A habitual diviséo de atribigdes em Atenas, enire arcontes e supre- mos magistrados em colegiado, bem como o consulado a dois em Roma, com © seu Senado, e as assembi¢ias em forma de cirias, centirias e tr+ bos, 0 que os romanos denominavam consensus populi, 6 tida hoje por alguns estudiosos como contrapesos, embara precursoramente sutis, e que nao existiram na Idade Média por varios motivos, dentre os quais €) “a sumaria divisao entre Papas e [mperadores”’, e, sobretudo, pela tm- plantagdéo do feudalismo. Ainda na sociedade antiga, a célebre concep¢ao do governo misto do POLIBIA 4, sogunde PINTO FERREIRA (8), delinaamanta da douttrina. A primeira tentativa, na cultura ocidental, de instrumentalizagdo na- cional da discriminagao de poderes temperada com @ nog&o do equilibrio deve-se a CROMWELL, com o Instrument of Government, de 1653, sequida do JAMES HARRINGTON om 1666, Londroo, The Commonwealth of Oeoan (} e 0 idealizado complexo sistema de freios € contrapesos. Este por sua vez foi desenvolvido por LOCKE nos seus livros Two Treatises con- cerning Government e Treatise of Civil Government, 0’ ponto mais alto dasses astidas foi. porém. ROLINGBROKE (©). no que PINTO FERREIRA classifica como “trabalhos decisivos” tais como Dissertation upon Parties, (1734) e Idea of a Patriot King (1738), e justifica sua assertiva transcre- vendo de SCHMITT expressive trecho: “.., 9 autor efetive da dautrina tanrdtien-ennstitininnal do equiliorio de poderes... as expresses empregadas por ele sdo: freias reciprocos, controles reciprocos, “‘reteng6es” é “reservas reciprocas” etc. PINTO PENREIAA ("} conolul que oo termes emprogades por BOLING. BROKE: “to check”, “to control”, "to counterwork”, "to arrest" “to res- irain” revivem o seu predecessor espiritual JOHN LOCKE com a frase “checks and controls”. TA ARISTOTELES — in poutes — CL. e¥ Gap. x1, pag. Zou, Had. NeSICY oUVEA Liaves —~ EC. UUTO lio, 1965. (2) older, (8) YAMIREH CHACON — Io @ Novo Parlamenterna, Gedeinoe Pollieas ~ F- Mifon Campos, Bras, (4) PINTS, FERREIRA, Ul — Prigeploe Garaie de Dutta Conetivelonsl Madera, toms ll. 4 edict a ‘aul — (8) Iotdem. {8} teidom, (7) PINTO FERREIRA, Lulz — op. clt,, tomo It ~ pdos. 422 @ 423. R, Ing, legisl. Brasilia a. 17 1. 65 fan./mor, 1980 a5 Essa a insplragéo mais proxima de MONTESQUIEU, motivado de ma- neira mais pragmatica com a observacdo in loco da vida politica encon- trada na sua visita & Inglaterra. Ali o regime de tiberdades publicas convi- via (rangdlla 6 eficazmerie com as garanlas dus diveltus Individuals wa plue ralidade das fungées estaiais. Langou MONTESQUIEU o coroamento da doutrina definida com a férmula do “le pouvoir arréta le pouvoir”, sintese de sua obra de ciéncia potitica De lEsprit des Lois, na Franga de 1743. Ainda hoje faz cscola o permancee aencagrade nga textes conetitucionais de grande parie do mundo. E digna de transcrigaéo aqui esta marcante passagem (*): “Quandv na mesnia pe2ava ou nv meamo corpe de magis- tratura, 0 Poder Legistativo esta reunido ao Poder Executivo, nao existe liberdade pais pade-se temer que o mesmo menarca au @ mesmo Senado apenas estabelegam teis tiranicas para executa- lac tiranicamonto. Nao havera também liberdade se o poder de juigar nao esti- ver separado do Poder Legislative e do Executive. Se estivesse ligado ao Poder Legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidaddos seria arbitrario, pois o juiz seria legislador. Se estivesse figado ao Poder Executive, o juiz poderia ter a forga de um opressor. Tudo estaria perdidy se 9 mesimne homenr ou o mesmo corpo dos principais, au dos nabres, au da povo, exercesse esses tras poderes: o de fazer ieis, o de execular as resolugées publicas, e 0 de julgar os crimes au as divergéncias dos individuos.” 1.2, Fundamentos A ciéncia politica busca o equilibrio entre 0 poder, a ordem e a li- hardade, fantra do santayta da soherania nacional. a a teoria de MON- TESQUIEU pretende dar a solugdo com a formula constitucional de uni- dade do poder estatal e sua diviséo intema. A técnica empregada tem sido a divisdo funcional de poderes do Estado, que se destina a controtar e moderar a ago dos diversos segmentas da mesma e una soberania, ou seja, a especializagdo de fungées fimitada constitucionalmente. PINTO FERREIRA (°}, referinda-se a opiniao de MUNRO e SCHMITT sobre a impropriedade da expresséo “separagdo de poderes”, concorda oom a@ oritica ¢ propée a cubetitulgiie peta ceguinto: “dietingdo do podo- res”, por Ndo acorrer exatamente separagdo absoluta, estanque, indife- rente, do poder singular do Estado, mas, divis&o interna, distingao entre as fungdes dos diversos érgdos que compdem a organismo estatal. (oe) WONTEAUUIEU — uo capes ok ca = Lica RIL Lagruica t= Wdugse a8 TERIWANUGY EN RIQUE CARDOSO 9 LEONGIO MARTINS RODRIGUES — Gldtsleas Gemier — Oltuste Eurcndla do Uveo ~ S80 Paulo — 2082 — pig. 181. (9) PINTO FERREWRA — Op. cit, pda. 421. 36 R. Inf. legist. Brasilia a. 17 m. 65 jan./mar. 1980 ROSCOE POUND ('*), ao analisar a cientiticidade da diviséo de pode- res do século XVili, diz, para mostrar o inter-relacionamento, que ++. “0 Orgdo Legistative fez ay teis. O Executive adininis- trou-as. O Judicidrio apticou-as nas decisées de controvérsias ou Sitfgios,” para logo em seauida arrematar: “.,. tal como a interpretagdo, de um lado, se entrosa com a legistacdo, assim a fungdo judicial penetra na fungde legis~ lativa; de outro tado, a interpretagdo invade o terreno da apti- cagde, ¢ asaim @ fungdo judicial ontrosa-ce com a administra- tiva ou executiva.” Com isto afirma que a agao estatal especializada nao pode ser iso- lada, mas em conex4o, visando evitar a exorbitancia de aigum dos po- deres am atividade. A ago politica deve ser balisada pelos dois marcos maiores da cons- tituigdo democratica: a garantia dos dirsitos basicos do homem e do ci- dadaa, ea Inerente divisdo de paderes que asseaure — cada qual na sua orbita — tais direitos. E como pensa CARL J. FRIEDRICH (!) quando afirma: “Os direitos bdésicos definem uma esfera em tormos gerais, Ra qual ao autoridades governamentais, incluinds o Legielati- vo, nao podem de maneira alguma penetrar, ou s6 em condigées muito especiais. A separagde de poderes impede a qualquer um ou a qualquer grupo, em tal ordem constitucional, que concentre ‘ade © poder ou mesmo grande varie dele em suas prdprias méos,” E incisivo: “A sanaragdo da padares tem a intengao de impedir a qual- quer um que se torne soberano,” Disso tiramos duas conclusdes: a} que 0 utes no discute a terminologia — separagao, distingao, di- visde de poderes’ b) também ele sustenta, do ponto de vista da filosofia do direito, que 6 a formula pratica eficaz para prevenir-se a ditadura. A classic Lipartigau de puderes (Leyislativa — Executive ~ Judicié- io) tem prosperada ao lango destes trés séculos, sequida sempre pelos estudiosos do sistema de democracia representativa sob inspiracdo do modelo inglés ou do norte-americano, os protétipos mais estaveis. Raras so as excegSes, ealve naturais variantes para cada pavn em determina- {10} ROSCOE POUND — Infrodugtio & Filouolis de Dlraita — Ed. Zar — Ro, 1965. (07) FRIEDRICH, Carl J, — Parspectiva Hinbrica da osolla do Direito, Ed. Zaar —- Alo, 1865. Treducho de Alvaro Cabra! — pig. 242. R. Inf, fegisl, Brasilia o, 27 n. 65 jam./mar, 1980 37 do tempo, que n&éo chegam a desfigurar os paradigmas. Dentre tais va- riantes 6 de notar-se a do chamado PODER NEUTRO, que BENJAMIM CONSTANT pragava na Franca idealizando-o acima dos outros trés pode- Tes esiatals, destinado especiticamenté a absorver as lens6es da COeXIS- téncia dos classicos Legislativo x Executive x Judiciario, Surge o PODER MODERADOR, adotade em algumas Constituigées, inclusive no Brasil imperial, experiéncias quase sempre mafogradas, pois 0 quarto poder tem-s¢ revelado um apéndice do Executive na maioria daa situagdes. Leve-se em conta a analise de AFONSO ARINOS DE MELO FRANCO (?} a respeito da doutrina de MONTESQUIEU. A comegar pela constata- Go de que, As interpretagdes tém variado enormemente, com evidentes lesvios da idéia central do Espirito das Leis que é a da unidade da sobe- rania do Estado ndo significando a untdade do poder do Estado. E ox- plica que aquela, a soberania estatal, é singular, una, indivisivel, enquan- to este, o poder estatal, é funcionaimente plural, divisivel em varios “poderes”, OU, auglando-se a ferminvloyla Uv inoderny Direito Constitu clonal, em “drgdos e funedes”, Uma observagdo que o propria ARINOS tachou de importante e que vale transcrever: “., ao escrever as linhas famosas sobre a separagdo de poderes, Montesquieu empregou a palavra putssance (grifado) & nao a palavra pouvoir (grifado) de que se serve varias vezes. Ora, em francés, puissance (grifado}, no sentide empregado por Montesquieu, significa mais capacidade (grifado) do que poder.” Nao ha que se confundir peder-soberania com poderes-fungées, que sao plirimos. © principio da distribuigao dos poderes-tuncdes do poder nacional ficou logo estabelecide na obra de MONTESQUIEU. Vé-se ciara- mente a inviabilidade de um governo funcionar fracionado em poderes: absolutamente separados, bem como a necessidade de controle do poder para ndo degenerar em abuso. Disso é que se evolui da idéia de separagao para a idéia de limitagao. Diriamos melhor, da interlimitagao. Sahe-se que a tandéncia do poder 4 expandir-se e o fendmena se d& sempre inexoravelmente em detrimento da liberdade, Por isso, a cons- tataedo do pensador francés de que a tentagdo do abuso do poder, sendo inerente & ambigéo humana, sé pode ser barrada por um obstdculo da mesma forga. E a conclusdo gue se tornou axiomatica: um poder so é contido per outro poder igual. © que temos observado na vida constitucional dos poves & ora um, ora outro, algum dos trés poderes em ascendéncia sobre os demais. As cosicdes tém variado em questdes de tempo ¢ Jugar, segundo as conjun- turas politico-soclais. Toleravel @ até certo panto razoavel, mas, se de- genera, da-se a ruptura do Estado de Direlto e a sociedade desequili- brada cal no regime de forga. © mecanismo de defesa de cada poder em face dos outros é o que 0s constitucionalistas elaboraram e vém aperfeigoando através de freios (12 ARINOS, Monge A. Molo Franea —- Teoria da Conaiftulgdo, As ConsiituigSea do Brasil — Forensa, Rio, 1976, paga, 137/142 58 R, Inf, tegisf. Brasilia a. 17 n, 65 jan./mor, 1980 e contrapesos que FIDES OMATT! atribui aos legisladores e juristas norte- amerticanos (14), pelo menos quanto a sistematizagao, Mesmo ali, nunca so ragistra uma simotria porfeita dosea divieko. Observa-se na vida politica daquele povo momentos de preponderancia de um ou de outro dos seus poderes: ora 6 a Suprema Corte que prevalece, ara o Congresso assume importancia maior nas decisdes cabais, as ve- Zes 0 Poder Executivo nas mos de um Presidente carismatico alca-se em ascendéncia sobre 0 canjunte do poder estatal, segundo as circunstancias. Note-se, entretanto, que nos Estados Unidos bem como em qualquer outro Estado de Direito a oscilagéo no equilibrio dos poderes jamais ultrapassou as marcas coniunturais nem extraoolou as linhas da demo- cracia representativa. O divisor de aguas é inafastavelmente a garantia do homem. Esta sé 6 assegurada plenamente no mecanismo de freios ¢ contrapesos, onde nado prevalega despoticamenie a vontade de uma so pessoa ou de um s6 grupo enquisiado em qualquer dos seamentos do poder que a sociedade criou e estabeleceu com fungées definidas para © seu bem-estar, Se nao se tem um fiel de balanga de precisdo absoluta, tem-se, pelo menos, um aparelho requlador das atividades do poder publico que dis- tribui opartunidades de contengdo de erros e abusos de alguma autoridade. De fato, embora consignada na Constituigao a divisio de poderes, se nao houvesse os meios de interligagdo, 0 peso de um contra o peso de outro, se eles nao necessitassem uns dos outros para complementa- rem-se e reciprocamente ajudarem-se, 0 exercicio das fungdes de cada um estaria fatalmente desequitibrado em prejuizo da sociedade que eles conjuntamente estao a gerir. Se, por axemplo, apecar de dividides fermalmente, oo Poderoo do Estado estivessem subjugados: Executivo e Judiclério ao Poder Legis- lativo, como o queria LOCKE (34), romper-se-ia o equilibrio. A adminis- tragtio executiva, atada, calria no caos, enquanto os interesses coletivos ou particulares nao teriam a tutela eficaz de um Poder Judicidrio real- mente forte para impor suas decis6es na interpretagao das Jeis, muitas vezes contrdrias a Lei Maior — a Constituigao que o povo adotou. N&o se desconhece que o Legislativo, o poder constitufde e/ou cons- fituinte, & érgaa fundamental do Estade 2 no regime representative le gitimo tem ele a competéncia normativa geral, Essa competéncia geral, entretanto, nao 6 exclusiva, nem o monopélio da legislag¢ao pode perten- cer-Ihe, como n&o pode pertencer a nenhum outro, isoladamente. Té-la-a que exercer cooperantemente com os demais Poderes estatais. A adverténcia de THOMAS JEFFERSON (!5) a ALEXANDER HAMIL- TON, as vésperas da posse do Presidente GEORGE WASHINGTON — “a (19) FIDES OMATT) — "Dos frolca 9 cantrapasos enite os soderot do Estado”. in Revista de Informagfo Leoliletinn no 5S — iul/ant/ia7? — céon AS/7H, Rraslia — Amnacla. Pasa Ea. Peenicas, (14) JOSAPHAT MARINHO bros9s6 — Senado Fé (13) VAMIREH CHAGON — op. t'vo” — In Revista de Informagto Loglefativa, 0.2 11, sotem- 12 de Informecao Leglstetiva — pég. 5. 5 jen /mer. 1980 59 tirania do Legislativo é realmente o perigo mais temivel” — deve ser entendida com 0 complemento: “Ja atirania do Executivo vird, por sua vez, porém numa fase mais distante."" Porém, quando 0 mesmo JEFFERSON pedia a Suprema Corte a cassagéo de um Ministro seu, SAMUEL CHASE, recebeu altiva resposta do Presidente daquele Poder Judi iario: “© princfpio do Parlamentarismo Mondérquico de que o Rel no podo arrar, poie o Roi roina mas nae geverna, nao co aplioa ao Presidencialismo, capaz de sofrer impeachments pelo Judi- clario © pelo Legislative.” N&o aceitamos, por igual, a téo discutida “ditadura do Judicidrio” vu v fudiclarisiny, que @ uma extrapolacao do poger jurisdicional, @ tWa- Zemos a colagado informagaéo de PAULINO JACQUES (!°) sobre os extre- mos de tal discussdo nos Estados Unidos: O jurista BRANDEIS dizia que a Suprema Corte “nao era uma superlegislatura’” enquanto HOLMES pregava quo “o limita do pedor da Suproma Corts 6 o oéu”. Houve até quem, como o Procurador-Geral JAMES BECK, perante a Corte de Cas- sacdo de Paris, em conferéncia em 1922, talando sobre "A Constituigao dos Estados Unidos da América”, dissesse enfaticamente; “os doutores da Suprema Corte padam sar cansideradns cama aatadn anima do Porer Legistativo e do Poder Executive”, E ainda o que disse mais tarde o Pre- sidente daquela poderosa Suprema Corte, HUGUES, para enfatizar a po- sigéo do Poder Judiciario sem contrateito perante os outros poderes, o Executivo 2 o Legislativo: “A Constituigfo 6 0 que os juizes dizem que ela Repelida tal primazia, por descabida a um poder como 0 Judiciario justamente instituido para contrabalangar judiciosamente os demats, re- jeitamns iquatmenta a validade de uma ditadura da Poder Fxenutivo, sob qualquer forma. O arbitrio néo pode conviver com a ordem juridica. Se a moderna administragao néo pode ficar manietada por intrincado processo legisla- tive que embaraga a agéo de Govorno, 6 do 20 quoror uma roformulagdo desse processo. Deve-se torna-lo mais célere, mais dinamico, mais atuan- te, mals simples e mais objetivo. Ha uma tendéncia no mundo atual para a preponderancia do Poder Executivo. Tendéncia, até certo ponto acel- tavel. Para evitar os seus excessos. convém que se institucionalizem a figura jurfdica das leis delegadas e a permissdo para decretos-leis so para certos e delerminados assuntos com delineamentos que garantam as liberdades e os demais direitos do homem e do cidadao, além, obvia- mente, do resquardo ao interesse publico, o que, de resto, deve presidir a todo ato politico. Us excessos de autoridade que 0 governante pratica como se 9 tilular de um Poder, como o Executivo, se arrogasse a tutela da sociedade, rompe o equilibria do sisiema democratico dos freios e contrapesos entre os poderes constituidos, e destroi o Estado de Direito mais facilmento do quo noo cases do ditadura doo juizos ou deo logicla dores. E, de fato, a pior ditadura 6 a de um homem sd. (16) PAULINO JACQUES Legistatna — no “Aspectos do Poder Judtcidrlo Americano @ Brasllelro" in Rovleta de Informacto. . cutfdez, 1968, Ag. 15. Senado Federel — Dirotorle Ya Intormagao Legisiativa 60 R. Inf. tegisl. Brasilia a. 17 n. 65 jan./mar. 1980 A titulo do necessério teforgo do Poder Executive, em tace das cir cunstancias atuais, diz MACHADO PAUPERIO (17), ndo se pode justificar a institunianalivagain da ditadura. Governo forte ndo 6 a mesma coisa que governe arbitrario. E o que tem a sua forga técnica democraticamente baseada na Constltuigdo, en- quanto o gaverno de excegdo, agindo a margem da lei, 6, isto sim, a ditadura. Ae Excoutivo ¢ plauoivel rounir maiores poderca sobre deter- minados assunios, em certas épocas, mas, se esta sob controle do Par- lamento, tanto do ponto de vista da legistacdo como da tiscatizagae, e se cumpre as decisdes judiciérias que Ihe contrariem, mantém-se 0 equili- hrin demnerasicn, © 0 Eetade & um Estato de Diraite. Ao que A MACHA- DO PAUPERIO (2) acrescenta: ""., nA de ser nao sé simples Estado de Direito, mas Es- tado Etico”. A velatividade do principio da separagao de poderes aluaimenie que J& ndo & mais defendido como reatmente de separagao, mas, limitagao OU, Como preferimos, interlimitagdo, a prdtica politica de hoje, por quase toda parte, esta transformando-o em sistema de colaboragdo de poderes. Sao Tantas as vuces Caleguiizadas gos mesues do Direto Custsutuctu- ral no Brasil e no mundo que sustentam a tese, que nado ha mais o que procurar para justificd-la. AGESTA (1°), quando estuda a estrutura do po« der, diz que a ordenagado deste em uma comunidade politica enseja a identificagdo de “momentos osengiatcs” no proocose de atuagéo juri- dica do poder estatal, que sao os momentos de “funciones del Estado” e enumera: 19 — proposicao ou Iniciativa de legislagao de normas juridicas; 2° — deliberagdo e aprovagdo de normas juridicas, ou seja, o pro- cess legislative propriamente dito; 39 ~— execugéo @ aplicagao das narmas juridicas legisladas; e, 49 ~~ ajuizamento ov aplicagéo contenciosa do Direito para resta- belecer @ paz Juridica na sociedada regida peta tei. Acrescenta que tais momentos séo conhecidos respectivamente: “gobierno” quando da ini- ciativa da proposigdo de ‘ei; “legisiacién’, quando se processa a delibe- Tagdo e aprovagao de normas; “administracion” que 6 a ocasiao da atua- G40 do Direito tegisiado; e “justicia” nos conflitos de interesses resolvi- dos através da prestagao jurisdicional. Ete maama reduz, na enumeragao, para trés os momentos da fungao estatal correspondendo aos trés clas- sices tipos ds stymento do peder cotatal, oo té5 podcres diferenciades, harménicos, interdependentes, coordenados entre si. Reine na fungéio “executiva”’ a governo @ a administragao, isto é, os momentos de inicta- (17) A. MACHADO PAUPERy =O Poder Executivo" In Revise informagho Legiatatia, 1.0 64, pap. 06 (18) A. MACHADO PAUPERIO ~ op, elt, fg, 85. (99) AGESTA, Luiz Sanchaz ~ Curso do Derecho Canstiwctoral Comparads — Sexte odiclén, rovieada — Univoslad de Madrid — Faculte de Corecho — Seccidn dy Publcacones — Neciid, 1278, olzs. R, inf. fegisl, Brasilia e, 17 m, 65 jom/mar. 1980 51 tiva de lei e o da aplicagao da norma administrativamente, ou seja, 0 cha- mado Poder Exacutivo; a fungdo “legislativa” que configura a existéncia do Poder Legislador por exceléncia, e finalmente a funcdo “judicial” exercida pelo Poder Judicidrio no trato contencioso da norma. Ssto cor responde & estrutura bésica do Estado Constitucional moderno, que tem sempre, para a desempenho de suas atribuigdes de soberania. © Governe (Prosidente, no rogimo procidancialicta, au Progidonte o Gabinete ou Monarca e Gabinete nos regimes parlamentaristas republica- nos ou mondrquicos) & Srgdo executive da administracdo; os parlamen- tos (cdmaras, assembléias, congressos) constituem o 6rgao deliberante, 0 61040 legislative. 8, enfim, os juizes (ou juizes @ tribunais), camphem a Grgao judiciario. O constitucionatista espanho! (?°} classifica a divisio de poderes (pa- fa manterse a terminalogia consagrada) em duas classes: a) divisdo formas, ou divisdo imprépria; 6) divisdo material, ou diviséo propria. A primeira eslabelece a diferenca de tals orga08 segundo suas fun- géas, dé-lhes nome, tixa a regime juridica-potitice @ traga regras para a sua atuagao na vida social. Dentra de suas respectivas competéncias, o érgao intitulado Poder Executive deve, segundo a Constituigao, exercer © governo é a administracaéo piblica por designacéo do Chete do Estado ou por aprovagao do Parlamento, contorme seja a caso. U orgao inte tulado Poder Legislative 6 instifuido na forma que a {ei fundamental de- termina, com a composigdo unicameral ou bicameral, modalidade de elei- Gao, nimero de membros, categorias « denominagées, Sob o titule Poder dudiciérie hd a orgenizagdée dos juizes ¢ tribuncis, deatinades a cvapeck ficos exercicios juridicionais. Estabelece regras de responsabilidade po- iitica dos que ocupam as fungdes de governo, a temporariedade dos man-~ datos elstivos, as prerrogativas da magistratura, enfim, toda uma gama Ae narmas funrinnais que dé vida an organiama astatal. A segunda, ou seja, a divisdo material ou propria, é a que define a legitimidade do po- der do Esiado segundo os fundamentos polificos que he deram vida: numa monarquia parlamentar, por exempio, 0 Governo representa a au- taridade do Rei, a Parlamento exerce a poder que emana do povo e 0 dudicidrio atue com a autoridade do Direito, ou seja, autoridade e forca da Constituigao. A coordenagdo do poder daé-se, ainda segundo AGESTA (), no fe- admena da divisda alassica. sab duas térmulas: 42 — a denominada colaboragde sucessiva no ato de poder, tal co- mo ocorre, por exemplo, quando o Rei ou Presidente nomeia ministros de sua tivte escoina; porém, a iniciativa da legistagéo a respeita deve cor aprovada pole Parlamante ¢, por cua vez, a lei votada polo Parla mento deve ser aplicada pelo Governo em fazendo tal nomeacao; (20) AGESTA — ap. et, pag. 85. (2) AGESTA ~- op, cit, pag. 87. 62 R. inf. fegish. Brasilia ©. 17 m. 65 jan./mar, 1980 2° — a chamada colaboragao na fungao, que 6 o caso da nomeagao, verbi gratia, de um Governo (regime parlamentarista) indicado pelo Chefe do Estado, porém sob aprovagdo do Parlamento que controla a atividade desse Governo, derrubando-o segundo as faculdades da lei. CAPITULO Il — DIREITO ALIENIGENA 2.1, Sistema inglés Ja vimos que foi observando o saudavel funcionamento do regime inglés de liberdades pUblicas e garantias dos direitos individuais pelo mecanismo de coordenagdo de alguns érgdos do Estado — freando uns frente aos outros, que MONTESQUIEU formulou a doutrina da diviséo de poderes ja visiumbrada por iiustres predecessores. Como 0 Direito Constitucional na Inglaterra ¢ essencialmente consue- tudinario e serviu como fonte de inspiragao dos politicélogos da maior parte do munda, famas que valver ao passado para melhor entendimento da evolugao do sistema a partir da conteng¢ao do poder do Estado para garantir a liberdade do homem. £ volvermos mesmo a fase que poderia- mos chamar de pré-historia da divisdo de poderes, pois os grandes mo- mentos que a precederam merecem observagaa. Sabemos que, ja no século XIII, existia ali um Parlamentum que funcionava em duas cAmaras — o Conselho dos Nobres e o Conselho do Rei, e que este chegava a ser ultima instancia como tribunal para apelacdo das parles vencidas em sentencas de juizes civis. A Carta Magna de 1215 foi o grande frelo ao despotismo de Jodo sem Terra, primeira limitagéo formal e juridica da Monarquia (@). O Es- tatuto de Westminster, em 1275, regulando @ convocagao do Parlamento, foi mais um passa rumo & democratizagaa do pader. Mas significativn foi © avango dado em 1628 com Petition of Rights com que o recurso a Justiga criava garantia concreta ao cidaddo. Participacao da Justiga na vida politica do seu povo que ja houvera dado em um rumoroso caso referido por PINTO FERREIRA (2°) e encontrado na Judicial Review do CORWIN, na sentenga de Lorde Coke, em 1610, como juiz do “King’s Bench”, decretando limitagdo dos atos do Parlamento. O que demonstra rejeigaéo da “onipoténcia parlamentar’, como a advogavam eminentes tratadistas, dentre os quals BRYCE, que proclamava que “as decisées do paramemo Ingles serlam de clue Instanta, podendy aie abull @ lyre ja, a Camara dos Lordes, a Coroa e a si mesmo” (#4). Ao que JELLINEK retrucava: “Apesar da coag4o politica, se o Rei negasse a uma lei o seu assentimento real, nenhum poder do mundo poderia obrigé-lo juridica- mente. Som o caneurea da eita vantado, se paralisaria tada a mAéquina legislativa’ (25). O aumento de poderes dos julzes teve de ocorrer con- seqiientemente ao aumento de direitos individuais, & Itberdade de ir e vir normatizada no Habeas Corpus Act. A forga do Parlamento cresceu 25 GROOT, YAMINER — wp, oi was 1 123} PINTO FEAREIRA — op. cit, tome |, pag. 81. {28 Ibidem = pag. 02 (28) Idem — pg. 98. R. Inf, legis. Drustliu a, 17 1. 63 jon 62 em legitimidade com o Bill of Rights de 1689 que tornou suas eleigdes livres, livres os sous debates e deliberagées ¢ a prerrogativa de autori- zagao para as despesas do Governo (até mesmo as destinadas as for- Gas armadas em tempos de paz), legislagao fiscal, penal (inclusive com a instituigéo do tribunal do juri). Com a ascensdo do Logislativo chega- ram os ingleses em 1714 ao Governo de Gabinete que passou a exercer © Poder Executivo retirado do Rei. Os dois principios que DICEY (**) via na estrutura da Constituigaéo inglesa eram a soberania do Parlamento € o governo do Direito. O que foj definido como “el poder de hacerlo todo, salva um hombre de una mujer y una mujer de un hombre”, conceito revisado mais tarde pelo proprio DICEY. Reconheceu ele as limitagées do Parlamento a comegar pela existéncia da Commonwealth, a figura do Premier e da delegagdo de legislagao (leis delegadas) e, por ultimo, a participagao na Comunida- de Européia, com transferéncia até mesmo transacional de poderes sobre alrettos Tiscals, @ o ConWele Malur do referendum popular. Quanto aos poderes especiais delegados ao Executivo, tem-se na Inglaterra © precedente do Defense of the Realm Act, de 27 de novem- bro de 1914, que autorizava o Rei a, em Conselho, legislar por sua ini- ciativa 66 em assuntos de bem-estar publico e de defesa do Reino, du- rante a | Guerra Mundial; delegacdo de poderes que foi também dada por ocasiao da Il Guerra Mundial de 1939/1945 através, dentre outros, do Emergency Powers Defense Aci. Desta vez, mais amplos, pois permitia ao Hel legisiar sobre Seguranga publica, orem publica, aetesa do Reino, guerra e requisigao de pessoas dos seus siiditos, seus servigos e pro- priedades privadas. © admiravel eauilibrio dos poderes estatais dos ingleses atualmente firma-se no funcionamento simulténeo, harménico e cooperante dos seus 6rgaos fundamentais: a Coroa, o Parlamento @ o aparelho judicial. A Corea, exemplo tinico no mundo, é um érgao em si mesmo complexo, pois se constitui de: 19 — o Rei; 2? — 0 Gabinete. Abstraindo-se a fi- gura do Gonselno Privado que Ja teve atripulgoes de assessoramento co Rei e hoje é apenas honorifico, o chamado “Servigo Civil”, o Gabinete é a parte precisamente executiva da administragaéo plblica sob 0 co- mando da Coroa. O Rei faz parte do Gabinete ¢ este faz parte do Poder Legiolative, polo, apooar do cor o Promior dovignado polo Roi, dove cor aprovado pelo Parlamento e, por vote de desconfianga deste, destituido. De tal forma est&o interligados — Rei e Gabinete perfazendo a Coroa —, que o Poder Executivo nfo pode ser delineado com preciséo entre as duas figuras de um mesmo corpo politico. O Rei é Chefe do Estado, e o Primeiro-Ministro, Chefe do Governo, ambos com fungdes constitt cionais de gerir a coisa pUblica, cabendo a este, na pratica, a mi tr atividade. Também o Parlamento 6 um 6rgao complexo, ainda mais por- que bicameral — Camara dos Lordes e Camara dos Comuns; dele par- tclpa como seu Integrante 9 proprio Rei. As fungées do Parlamento — criagdo, modificagao ou derrogagao do direito — sao exercidas com a (28) AGESTA — op. elt, pégs. 121/22, 64 R. Inf. legisl. Brosilio a, 17 n. 65 jon./mar. 1980 participagao inclusive do Gabinete que tem a iniciativa das leis; o Rei, além de participar do processo legislativo, como componente do Gabinete, san- ciona a lei. Nao se omita a grande fungao fiscalizadora da Camara dos Ci muns sobre 08 atos do Gabinete, jé que atualmente aquela Casa Legi: lativa detém a maior forga politica e Juridica de sistema. O controle é& efetivado par meio de cinco principais métodos: 19 — interpelago dos deputados aos homens do Governo; 22 — pedidos de Informagées sobre o andamento da administragéo publica; 3? — emendas ou desaprovagao dos projetos legislativos do Go- verno (embora este tenha o pader de fixar prazas para a pro- Nunciamento parlamentar); 42 — controle financeiro com a fixagaéo de despesas publicas; e 5° — revisdo de norma delegada. Nao existe, eniretanto, especificamente enumerado entre os poderes do Estado, 0 que nds conhecemos como Poder Judicidrio, Existe um aparelho estatal acionado por juizes que se encarregam de assegurar 0 ragima das liberdadas priblieas, snb a tradicional rule of law, 6 cuja forga decorre do respeito que todos devem, inclusive os que compdem © Governo e o Parlamento, aos limites dos direitos individuais, e ao es- tado de bem-estar geral. As decis6es séo sempre a base de “preceden- tes" para tixagdo do direito consuetudindrio — os cases of law — e da tutela que a-lei da a todos os sdditos de Sua Majestade. Nao se pode, assim, dizer que ocupa um espaco na estrutura constitucional como um Poder em faixa propria, pois a tradigao é de que a justica ¢ administrada em nome da Coroa, embora esta nao controle as atividades dos juizes e Tribunals, que sao Independenies. Esies se submetem somente ao Direito proveniente do Parlamento e da Coroa ou consagrado pelos cos- tumes. 2.2: Sistema americana A primeira Constituigéo formal escrita do mundo moderno subsiste integra com suas poucas emendas, com uma vitalidade incomparavel, ao longo destes dois séculos de incessante vigor, e tida por todos os estudiosos come o arquétipo da democracia representativa — a Consti- tule dos Estados Unidos da América. A construgdo da estrutura juri- dica para um Estado, a comego confederado 2, posteriormente, federado, consubstanciada em um documento tnico que traga o perfil da sua le- galidade. Nos tempos da colénia, quando so buscava a fibertagaéo daqueles povos, exigiu-se, a par das entéo chamadas “Cartas Reais” em que a Coroa Inglesa nomeava seus governadores, a convocagéo de assembléias com poderes ieGisiativos locals, nos tamosos covenants, que eram os pactos das comunidades politicas em organizagao nas terras americanas do norte. R. Ink. fegis!. Brasilia a. 17 nm. 65 jan/mar. 1980 65 A prociamagdo de independéncia pelo Congresso de Filadélfia, em 4 de julho de 1776, estaveleceu a Confederagao e o seu Congresso, que reunia em si as treze colénias como Estados independentes, mas inter- figados para efeitos internacionais, além de swjeigad em comum a Nof- mas comerciais, financeiras e postais. Duro trabatho da canstrugga do edificio da unidade nacional comegou dai e, afinat, em 17 de setembro de 1787, promulgou-se a definitiva Constituigao dos Estados Unidos da América. © modelar cédigo constitucional é conciso. £ esta fol uma das suas virtudes maiores. A Constituigao que traga somente as linhas mestras das esiruturas do Estado detine os limites do poder e@ as aarantias indi- viduais, esiabélece com firmeza 08 marcos das fiberdades piblicas, ha da ser um documento duradsura e que resiste ao tempo, as vicissitudes da evolugao social. Sem casuismos que a tornassem obsoleta, levou a mentalizagao, naquela socledade, © zelo civico pela preservagdo de sua tel Matar. Com redagao feliz pela inteligéncia dos seus poucos artigos, seccdes e jtens e complemantagao de apenas vinte e cinco emendas, uma pega que os estudiosas consideram, sébria e ainda permanece intangivel na esséncia, ensiquecida pela jurisprudéncia ~— a formidavel contribuigdo judicial — a Constituigdo americana tem longevidade pela natureza de sua estrutura simples e de grandes linhas detinidoras da filosofia paliti- ca adotata, que pode ser sintetizada em cinco principios basicos: 19 — forma republicana do Governe (representative, temporal, com poderes emanados do povo); 2° — forma de Estado Federal em que a Unido constitul o organis- Mo da unidade nacional, 3% — sobetania (hoje atenuada) dos Estadoas-Membros, entre si ¢ nas drbitas de suas competéncias; 42 —~ divisao de poderes com fungoes aiterenciadas e interpenetra- G80 operacional como csantengdo da autoridade frente as garantias das iiberdades individuais; 50 — jungle eepecial, dentro do quadro da diviewo da paderas, A cupula do Judicidrio que ¢ a Suprema Corte, tida como guardia da Cons- tituiggo, e que chegou a definir-se, a si prdpria, como @ balanga que man- tem o equilibria entre os poderes dos Estados-Membros e os poderes da Unido. A doutrina de MONTESQUIEU teve af campo fértil para prosperar, e realmente alcancou a melhor aplicagao, melhor mesmo que na sua terra de origem — a Franga, como veremos adiante. A sua aceitagdéo “fue tan extraardinaria que 90 apoyeban en sus argumentos cuantos combatian o defendian ja Constitucién”, como disse AGESTA (*), referindo-se a O (27) AGESTA — ep. elt, pag. 166. 66 R. inf, Sepist, Brositie a, 17 %, 65 jan./mor. 1980 Federalisia de Madison y Hamilton (a quem AFONSO ARINOS (*) junta John Jay). A organizagio do Retade om tre taivae de poder (Unide Fodoral) foi fixada, tendo por baliza o regime democratico de garantias do ho- mem e do cidadao, pela primeira vez formalizada em documento publico, & firmada com a validade de norma juridica. Quisviam vs fundadvies Ua Peverayau asseyurar vu ideal de fiber dade, demarcando os limites de atuagao de cada drgao politico, de tal forma que 6 homem nao ficasse esmagado pela todo-paderosa maquina estatal. Sem embargo disto, em situagdes emergenciais, como nas duas gucrras mundiais, o¢ Presidentos WILSON @ ROOSEVELT obtivaram po- deres extraordinaérios que alguns constitucionalistas julgaram itimitados numa maxima centratizagio em méos do Executivo. De forma simptas ficou estabelecida que o Pader Legislative é exer- sido essencialmante pela Congresso com a colaberagdo do Executive na iniciativa, sangao e veto de leis, ¢ atribuigdes de fiscalizagdo e conten- ¢&o do Executivo, através de concessao de autorizag¢&o para despesas publicas, aprovagao de tratados e convengées internacionais, guerra e paz, centre outras; 0 Poder Executive @ atribuiao ao Presioenie aa Ae- publica, respons4vel perante o Congresso pela administracao publica do organismo estatal e sua representacao externa; o Poder Judiciario é in- cumbido de interpretar a lei e o Direita nos conflitos de interesses @ exer cer o controle da constitucionalidade do ates ¢ normas juridicas. A in- terpenetragdo dos trés érgaos pibticos na vida de cada um ¢ uma cans- tante inarredavel e, por isso, os americanos criaram a teoria dos FREIOS E CONTRAPESOS PARA O EQUILIBRIO DOS TRES PODERES DO ES- TADOQ, 4 een checks and balances. partindn da posicain espenial da Su- prema Corie com 0 poder de controle judicial, desde certo momento de sua vida constitucional. Denire os métodos de irelos e cantrapesos destacam-se o vete (art. 1, secgao 7#, item N} com que o Chefe do Executivo suspende a vi- géncia de uma norma até sua reapreciagao palo Legislative para acel- i4-Ja ou rejeita-la, com quorum especial; veto, como se vé, relative. De- pois, em decorréncia do principio da responsabilidade politica, vem o poder do Legislative deeretar conta o Prevideniy u lau digtulidy ime peachment que, alias, pode ser estendide a quatquer funciondrio civit da adminisiragao, segundo o art. ll, secgdo 49, e que 4 atribuigde priva- tiva do Senado (art. 19, secgado 3%, item Vi). A aprovagao de nomeagao nara certas cargos, que a Gonstitiigin mencinna, & outro made de con- trele que o Legislativo tem a respeito da adminisiragao (art. 29, secgdo 24, item II) @ as nomeacées interinas, permitidas no item ll da secgdo 29 do art. 2°, tam de ser homologadas pelo Senado, apds o recesso, ou a urgéncia do ato. A aprovacao de tratadas internacianais, prevista no item N da secg&o 2% do art. 2°, 6 outro grande freio, embora atualmente esteja em voga, no qué & possivel, a prética do chamado “acordo do Executivo” (28) AFONSO ARINOS ~ op, cit, pip. 20. A. Inf. fegish. Brositia a. 47 n. 65 jon.fmar. 1980 6 sem as formalidades do tyatado, mas com forga vinculativa, para assun~ tos de menor relevéncia. Do Legislative sobre o Poder Judicidrio ha 0 regime de competéncia fart, 33, secotes 14 e 23), criagdo de cargos, condigtes de nomeagao de juizes, promogao e demissdo, saldrios, embora estes sejam irredutiveis, segundo a jurisprudéncia, @ a remogao; até o impeachment, embora ra- ridade, tem sido utilizado contra juizes. Os americanos foram efetivamente os verdadeiros criadores de um Judiciaria como um dos poderes politicos na forma do art. 39, secgao 1? da Canstituigao, estabelecendo o Judicial Power. A pratica do “judi- ciat control” ou “judicial review” tem sido uma constanie desde a deci- $80 roe da Juiz MARSHALL, no famoso caso “Marbury x Madison”, em 1803. PAULINO JACQUES (#) Iranscreve; . 4 linguagem particular da Constituigdo dos Estados Unidos da América confirma e revigora o principio, que se supde essencial a todas as Constituigdes escritas, de que uma Sei con- flitanta com a Constituicéo é nula: @ que as Cortes, como outros. departamentos do Governo, estao jungidas a esse documento” @ adianta que a propria Corte Suprema fixeu a clausula auiolimite para declarar a inconstitucionatidade de lei ou de ato administrativo. Oiga-se de passagem que o exemplo americano irradiou-se para influir na vida constitucional de muitos povos de varios continentes, como veremos mais adiante. 2.3, Outros sistemas. Numa visio panoramica, superficial e rapida, enfocaremos atgumas outras Constituigdes no tocante a divisdo de. poderes, cooperagao, inter- dependéncia, centengaa, equitfbrio funcional. Partimos da Constituigéo da Franga, que, alids, nistoricamente nao foi a primeira a inscrever os psincipios da separagdo de poderes ali sis- tematizados por MONTESQUIEU, pois 0 pionsirismo coube aos america- nos com sua Carta Constitucional de 1/87, enquanto os franceses s0- mente em 1789, através da célebre Dectaracdo dos Direitos do Homem & do Cidadfo, consagraram a formula monlesquieuniana como garantia da tiberdade conquistada, Ressalte-se, de togo, que as primeiras Conslituigées francesas, as de 1791 e 1795 {bem como o Ato Adicional de 1815) que institviam o Pouvoir Judiciaire nao chegaram & implantacao efetiva do Judicidrio ¢o- mo Poder de fato e de diréito, aut6nomo e forte, pois aqueles estatutos nveram precaria existeucta. AS Callas Corsitulmes pusienores, de 1830, 1848, 1852, nao trataram do Judiciério como Poder Constitucional, e bem (9) Op. eH, pay. 13. 6a Ro Ink. legisl. Brasilia a. 17 0, 65 jon./mor. 1980 assim as Leis Constitucionais de 1875, e mesmo as recentes Constitui- gdes de 1946 e 1958, Estas contemplam a exisiéncia de o que classiticam como Ordre Judiciaire, Conseil de ta Magistrature ou como a atual, que apre o seu Titulo Vil Com a rubitca Da Autoridade Juulicial © prescreve: no art. 64: “Q Presidente da Republica garante a independéncia da autoridade judicial. auxiliado pelo Conselho Superior da Magistratura. Uma lei organica determinaré o estatuta dos magistrados. Os magisitauys olfclaiiuente desiynades seréo inamevi- veis” (%), Adiante-se que, logo no art. 65, estabelece que o Conselho Superior da Magistratura, como argao auxiliar do Presidente da Republica que o 6, @ j& vimos do texto transcrito, sera presidido pelo mesmo Presidente da Republica. € da definigdo do que 60 Tribunal Superior de Justiga (art. 67) vé-se que n&o se trata de érgda de cupula de um Poder Consti- tucional. E de fato veremos adianie que o controle da constitucionalidade gas leis @ alos aammisiranvos nao cave ao Juciciario proprlamente dito, mas a um drgdo misto. © art. 68 diz que o Presidente da Republica ndo respondera perante aquele Tribunal Superior de Justica pelos atos praticados em fungdo da Presidéncia, salvo no caso de “alta traigao". E a respeite da declaragao de Inconstitucionalidade, 6 © assunto privativo do Gonselho Constitucio- nal reguiamentado por Isi orgdnica (arts. 62 e 63). Rolombre-se aqui a tentative de GICYES com o que ele chamava de sénat conservateur, encarregado de controle da constitucionatidade das leis, mas de tal maneira jungido ao Poder Executive segundo as Coneti- tuigdes de 1795 e 1852, que se tarnou peso morto, e fai abandonado nas estruturas canstitucionais seguintas A chamada V Rapblica, com a Constituigdo de 1968, criou um mo- delo que o seu idedlage maior — CHARLES DE GAULLE — classiticou de misto parlamentar-presidencial, explicade assim por JEAN-LOUIS DE- Bre: “Regime parlamentar porqué o Chele do Governo 6 respon- savet peranie o Parlamenio, que vola as leis e o or¢amento, fis- caliza, critica, mas sem o monopdlio da autoridade. Regime pre- sidencial pela aecisad ao Gnele ae Estado Imponao-se a toda o Executivo” (). Leve-se em conta que o poder de legislar cabe ao Parlamento (art. 34). Mas ele delegou ao Executive autoridade para as ordonnances (art. 38), que sho a versdo francesa do decreto-lei; o referendum, como forma (20) Conslitulgfo da Franca — 1958 — Com Emenda de 912, G1} in VAMIREH CHACON — 9p. elt., pig. 37. R. Inf, Ieqist, Brosilia a. 17 n. 65 jan./mar, 1980 69 de controle popular direto previsto no art. 11, 6, na prdtica, um reforgo do poder presidenciat que chega a ser extraordinario na discutidissima disposi¢zo do art. 16, como solugdo pata os casos de crise nacional. O que muitos consideram porta aberta para a Ditadura. Outras critica cdusticas tém sido levantadas conira a hegsmonia do Poder Executivo, tals como as de KARL LOEWENSTEIN (7) sobre a atribuigdo presidencial de dissolver discricionariamente a Assembiéia (art. 12) e a quase irres- ponsabilidade do Presidente da Kepubiica (art. 68). Mesmo o seu Julga- mento por érgde politica, de cuja composigéo participa indiretamente, além dos poderes especiais j4 assinalados (arts. 11, 16, 38). Veia-se que a oportunidade de veto asta no art. 10. sob a forma de devatugao do projeto ao Legislative para nova deliberagao. Interessanta € que a figura do Tribunal de Contas aparece numa Unica reteréncia, na ultima alinea do art, 47, como érgao controlador das finangas publicas do sistema de freios e contrapesos do Legislative sobre o Executive. Republica Federal da Alemanha O proprio preambulo expressa a situagao de transitoriedade da nova ordem em busca da unidade nacional da Alemanha, hoje dividida em dois Estados. Decorre disso a denominagdo de sua Carta Constitucional, que, para nao dar idéia de Constituigdo definitiva, teve o titulo de Lei Funda- mental, datada de Bonn, 1949. Nela, os trés Poderes estaéo estruturadas na linha de autonomla & cooperagdo: Legisiativo, Executive e Judiciario, com um bom mecanis- mo de freios e contrapesos para o equilibrio das fungées estatais e ga- rantia dos direitos individuals. Ha importantes peculiaridades: O Parla- inenty Fedeat, dente vutras atribuiydes copccificas, penetra maa ativi- dades administrativas, exercendo o controle das Forgas Armadas, em assuntos da defesa, por meio de um Comissdrio de Defesa (art. 45, 5). © Chanceler Federal {Primeiro-Ministro) exerce o Governo (art. 62) com os Ministros; sua eleigde se dé pelo Parlamento Federal com pro- posta do Presidente da Republica; pode ser destituido com um voto de desconfianga (art. 67) por esse mesmo Parlamento, o qual, por sua vez, pode ser dissolvido na forma do art. 68, pelo Presidente da Republica. A legisiagéo cabe ao Pariamento, mas 0 Execuliva panicipa do processo com projetos de lei e sancdo ou veto, prevendo-se o “estado de emer- géncia legislativa’, no art. 81, para o caso de rejeigado pela Parlamento de projeto considerado pelo Governo como “‘urgenie”, salvo mocdo de descontianga como faoulta o art. 68, com a diceolugae do Parlamente. Ademais, 0 art. 80 contempla autorizagdo para a “promulgagao de decre- tos" que equivalem aos nossos decretos-leis. Na cipula do Poder Judicidrio (art. 92) esté o Tribunal Constitucio- nal Federal com a atribuigdo {art, 93) de controle da constitucionalidade de leis que pode, em certos casos, ser apreciada por outros tribunais (82) dbigem, péy. 28. 70 R. Inf, legisf, Brasilia a. 17 a. 65 jon./mor. 1980 {art 100) estaduais, sujeifa, entretanto, A decisdo final do Tribunal Gonstl- tucional Federal. Pooledo ouriopa 6 a do Tribunal de Contas: no Capitulo X — intitu. lado ‘Regime Financeiro”, ele figura como érgdo controlador das contas publicas. & a ele que o Governo tem de apresentar sua contabilidade anual e dele receber o parecer sobre a legalidade das operagds conta- heis da administragdo. A prestagdo de contas deve ainda ser apresentada ao Conselho Federal e ao Parlamento (art. 114). Com a expressa inde- pendéncia judicial (art. 114, 2), fora esta, entretanto, dos quadras conven- cionaig de qualquer dos trés Poderes, mas anexo ao Poder Legistativo. Avsuminds, vs amptos “Direitos Fundamontais” (*), eenstantos do primeira Titula da Constituigdéo, estdo sob tutela judicial (art. 19, 4) com as facutdades dos arts. 101 a 104, e sua perda nunca seré determinada pelo Poder Executive, nem mesmo o Legislative, mas, tao-somente, pelo dudicidria, {talia A COSTITUZIONE DELLA REPUBBLICA ITALIANA, de 22 de dezem- bro de 1947, institui a forma de aoverno parlamentarista para a Republica da Italia, em que o Parlamento — Camara dos Deputados e Senado da Reptblica — exerce o Poder Legislative (art. 70) propriamente dito 6 participa ativamente do exercicia da administragdo estatal. Portenee-tho a iniciativa da Isi, como ao Executive & ainda aa prdpris pove (art. 71): “.., Tt popolo esercita Miniziativa delle leggi, mediante fa proposta da parte di almeno cinquantamila slettori, di um pro- geue redauto In aritcol™ (°), O Presidente da Republica participa do processo com a Salgado ou o veto (arts. 73 e 74) e © controle popular pode ser feito por referendum provocade por peti¢do de 500.000 eleitores ou resolugao de cinco Con- selhos Regionals. A delegacdo de poderes legislatives pode ser dada ao governo sob certos critérios e por tempo limitado (art. 76), enquanto o decreto-lei com o nome de ordinanzi di necessita (5) 6 aviorizado no art. 77 para “... casi straordinari di necessita e d’urgenz O Poder Executive 6 exercido pelo Conselho de Ministro, cujo Chee, © Primeiro-Ministro, é nomeado pela Presidente da Reptiblica (que 6 0 Chote do Betade) cob aprovagie do Rarlamento. Reto exorze o controle sobre o Executiva por meio de mocdes de conflanga e desconfianga (art. 94) para nomeagao e deimissdo do Governo. © Poder Judicidrio, se bem que elevado a categoria de peder consti- jucional (Tituie 1¥) ¢ considerande quo “oo juizoo 06 extée ouloitoo & (G0) Let Funtamantat de Aapdblica Faderal da Alemarhe, 1949, BG Constitulpte de Reodblice leliana, 1947, (95) Seiden. R. Inf, legis! Brasilia a. 17 0. 65 jon./mar, 1990 7 lei”, como diz o art. 101, sofre, entretanto, séria ingeréncia do Poder Executivo que, através do Ministério da Justica, administra ‘os servigos judiciais, constituindo isto, na pratica, forte freio politico. O controle da constitucionalidade de leis ¢ atos administrativos 6 feito por 6rgao especial — a Corte Constitucional (art. 137}, orgao misto, em que o Poder Judicidrio ndo tem toda a forca, pela presenga de repre- sentantes dos Poderes essencialmente politicos, como o Legislative e o Executivo. Também as contas publicas, cuja fiscalizagdo sempre controla. a administragao executiva, tém destino para a chamada Corle dei conti que tecnicamento csté na quadro doo érgdes auxiliares do Cxecutivo, embora as disposigdes do art. 100, alfnea final, assegurem a sua inde- pendéncla frente ao Governo. Ha que ver o controle final do Poder Le- gislativo que, fiscalizando, aprovando, julgando o desempenho da re- cella e despesa do Estado, exerce o controle real sobre a administra~ cao em geral. Japao Nu Japau, a supremacia Uo Poder Legislative @ expressamenie con- signada no art. 41 de sua Constituigao atual: “A Dieta seré o mais alto érgdo do poder estatal e ser dotada de fungéo legislativa” (*). E ela composta de duas CAmaras: a dos Representantes 6 a dos Conselheiros, mas a Camara dos Representantes tem evidente ascen- déncia, pois prevalecem suas deliberagdes discordantes da segunda, Nas assuntas politicamente mais importantes. O Poder Executivo é exercido pelo Gabinete (art. 65) e o Imperador 6 o Chefe de Estado, representando a unidade nacional. O Gabinete, chefiado pelo Primeiro-Ministro escolhido entre membros da Diela (art. 67) © por ela aprovade, conta com Ministws de Estado, a inaiuria dus quais deve pertencer & Dieta (art. 68). Com voto de desconfianga 6 de- mitido o Gabinete (art. 169) e, no impasse, é dissolvida a Camara dos Representantes, convocando-se nova eleicao. U Juatciarlo tem a@ categoria de Poder (art. /6) e @ independéncia dos julzes nos altos judiciais 6 garantida. A Corte Suprema 6 competente para declarar a inconstitucionalidade de qualquer lei, ordem, regula- mento ou ato oficial. As contas publicas sao apresentadas ao Conselho Ficeal, quo co accemelha a um Tribunal de Contac, auxiliando a Diota nesse controle. Portugal A Hevolugdo detiagrada em 25 de abril de 1974 pelo Movimento das Forgas Armadas deu lugar & Constituigdéo da Republica Portuguesa, pro- {36} Congtituigdo ¢o Japao, 1947. n R. Inf. legisl. Brasilia a. 17 n. 65 jon./mor. 1980 mulgada em 2 de abril de 1976, Ha nessa Carta singularidades do novo regime portugués que estabeleceu um mecanismo constitucional de cinco poderes (ari. 113), quais sejam: 0 Presidente da Republica, o Conselho da. Revolugae, o Governo (Executive propriamente dite), a Assembldia da Republica {Poder Legislativo} e os Tribunais (Poder Judiciério), com 0 dever de . observar @ separagdo e a interdependéncia estabeleci- daa na Ganatituigée” (art. 144, allnoa 1) (7), N&o seria despropositado reduzir a quatro fais poderes, conside- rando-se um colegiado, o Presidente da Republica como Presidente que & do Gonselho da Revolucaéo e Comandante das Forgas Armadas (art. 123) € 0 proprio Lonselho da Hevolugao, totalmente composto por mili- targs, sous comandades @ que se prociama garante da Constituicdo, {arts, 142 a 144) ao modo de um sui generis “Poder Moderador Castrense.” © Conselho da Revolugao aconseiha o Presidente da Reowblica. seu Presidente e, em deliberacées proprias de um Poder Legislative, concede autorizago tais como: guerra e paz, decretagao de estado de emergéncla ou estado de sitio, auséncia do territésio nacional, vacdncia do cargo tart. 145), podendo ainda “... iazer leis e regulamentos sobre a organi~ Zagao, o funcionamento e a disciplina das Forgas Armadas...” {alinea @, 4, art. 148), competéncia exclusiva por forga do item 2 do mesmo artigo. € bem expressive o disposto no art. 149, quando da atribuigdes ao Con- selho da Revolugdo para editar decreto-lel, de validade idéntica as teis va Avswuilidle Ua Republica vu aus Ueuttustleis Ug Geverne. © Parlamento unicameral — Assembiéia da Republica —, com a sua competéncia consignada no Capitulo I, pode “fazer teis sobre todas as matérias, salvo as reservadas pela Constituigdo ao Conselho da Revolu- ¢&0 ou ao Governo” (art. 164, d). A nomeagao e destituigaéo de Governe ocarre por magées de con- fianga ou desconfianga, e o controle das atividades financeiras da admi- nistragSa eahe-Ihe (art. 168, d) com parecer do Tribuna) de Contas. A delegagdo lagislativa ao Executive esta contida no art. 168, ¢ 2 participacao na elaboracao de leis encontra os fimites do art. 170, que veda aos deputados projetos de lei ou emendas a respeito de aumento de deapesas ou diminuigiie do reccitas do Eotade. © Poder Executivo é exercido pelo Governo chefiado por um Pri- meiyo-Ministto e composte de Ministros de Estado, constituindo o érgao superior da administragao publica, na expresséo mesma do art. 185. De- para-se 0 Executive, a0 foryo do lexty Gonslitucional, com freios e con- frapesos também do Conselho da Revolugdo que desempenha muitas das atividades proprias de um érgdo executivo, além das legistativas e judiciais que Igualmente absorve. Pode o GOverno Editar Gecretos-ieis (art. ZU1}, Como 6 pode o Gon- selho da Revolugdo. 87} Gonstiau'g8o dz Republica Portugues, 1976. R. Inf, lusist, Brositic a. 17 mn, 65 jon./mor. 1980 73 © Poder Judiciario (Titulo Vi} esta posto no lugar de um dos pode- res da soberania nacional. Esta, porém, rebaixado, quando suas decisdes sobre inconstitucionalidade de jeis (art. 207) sdo objeto de revisio pola Comissdo Gonstitucional, érgdo auxillar da Consalho da Revalugao (arts. 284 a 285). Como contengéo do Poder Executive, cabem ao Judiciério o exame 2 2 fiecalizagae das contes publicas, através do uma do sua inctanciac ~~ 0 Tribunal de Contas —, incluido em seus quadros peto art. 212, 2, enquanto o Ministério Ptiblico também Ihe pertence (arts. 224 a 226), Tal 6 a singularidade do sistema constitucional de Portugal, que se prociama (an, 2%) um Esiado democraiico garantidor dos direitos e fibers dades fundamentais e que tem por “objetivo assegurar a transigaéo para o socialismo mediante a criagao de condigdes para o exercicia democra- tico do poder petas classes trabalhadoras” (**). Espanha Com a Constituigéo promulgada em 26 de outubro de 1978, a Espa- nha tornou-se um “Estado Social y Democratico de Derecho...” } em que a forma politica é monarquia parlamentar. O Rei 6 © Chefe de Estado, mas nao apenas isto, porém participe da administragdo, ao lado de Poder propriamente dito, pols 4 arbitro ¢ madaradiar (art 58) do funcionamenta das instituighos. Siras atrinnigAns, previstas no art, 62, ndo sda pouco importantes, sobsessaindo-se a san- gao e promutgagao de leis, convocagao e dissolugao do Parlamento (as Cortes Gerais), convocagdo de eleigtes e de referendum, proposigao e nomeacgéa do Presidente do Governo, expedigdo da decretos através do Conselho de Ministros, nomeagao de funciondrios pubticos, comando supremo das Forgas Armadas, ¢, com autorizacéo das Cortes Gerais, deciaragao de querra e paz. € 0 que se paderia chamar um nowo tins, de fata, de Parer Made- tador. © Poder Executive propriamente dito 6 exercido pelo Governo (Titu- to [¥) chefiada por um Presidente, proposte pela Rei e aprovado por voto ve confianga dos deputades, apés o que & nemeade pole Net; os demaio membros do Governe séo nomeados diretamente pelo Rei. O Governo perde o poder por mogdo de desconfianga parlamentar (arts. 114 @ 101). Os membros do Governo est&o sujeitos ao julgamente do Poder Judicié- rio na instanela do seu Tribunal Supremo, por responsabilidade criminal (art. 102) e quanto & legalidade dos seus atos administrativos (art. 106). Conia com um érgao auxitiar consultiva, que 6 a Conselho de Estado (art. 107). A reeponsabilidado politica do Governa é controlada pela Camara dos Deputados (Gangresso de Deputados), (arts. 108 e 113). Os poderes 198) Consiitulgfo da Reptbiloa Portuguese, 1976, 109) Conottaigho du Espante, 1978 — art. 19 ry R. In€, legist, Brasilia a, 17 0. 65 jan./mar. 1980 mais fortes do Gaverno esto no art. 116 que lhe faculta declarar por decreto, sob as limitagdes da Constituigao @ das lels, o estado de afarme, 0 estado de excegio ¢ o estado de sitio, em casos de necessidade. O Poder Judicidrio (Titulo VI), com seus magistrados independentes e sujeitos unicamente a lel, engloba o Ministério Publica (art. 124), O Tribunal Supremo pode tomar conhecimento de todo e qualquer assunto de presiagao jurisdicional (art. 123), excegdo Gnica de maténa do con= trole de constitucionalidade de leis @ atos com forga de lei & suas garan- tias que cabe (art. 161} ao Tribunal Constitucional. © Legistativo, que 6 bicameral ¢ tem o nome de Cortes Gerais, com- pde-se de Cangrasso dos Neputades a Senadn. Exearce controle sobre © Executivo, participande da administragao com a aprovagao e destituig&o do Governo, mogao de confianga e de desconfianga, comissdes de in- vestigagdo. A jniciativa da legislagao cabe as Cortes Gerais, ao Governa {art. 87) @ até ao povo, através de proposigio com pelo menos 500.000 firmas recanhecldas, o que, na pratica, naa deve ser facil. A participagao popular pode ser feila também em referendum com consulta sobre deci- sdes politicas de especial importancia (art. 92). © Legislative, através da Tribunal de Gentas fart. 130). fiscaliza e julga todas as contas do Estado. CAPITULO 1!) ~ DIREITO BRASILEIRO 3.1. Consideragées preliminares O constitucionalismo brasileiro nasceu sob a influéncia da escola francesa, na implantagéo do Império. Transmudou-se no figuring norte- americano com a Repiblica de 1891. Por inadaptagao, tem sofrido mudangas ocasionais de diretivas com remodelagées conjunturals, formulas hibridas, 4s vezes contraditorias, @ sempre insatistatérias. As freqlentes tentativas de reorientaggo do nosso ordenamento juridico-fundamental, resultantes de crises institucionais de varidvels ma- tizes, demonstram a instabilidade de um povo que ainda busca, hesilante, a instrumentalizagdo adequada, propriamente sua, da sociedade politica, © trabalho inicial aqui ocorreu, apés a independéncia (abstraindo- seo ensaio colonial de Constituigdo), pela necessidade de estruturagda do Estado brasileiro, com a criagao da Assembiéia Constituinte em que brilharam os nossos mais intetigentes pensadores. Tomou forma com o Projeto de Constituigéo, em que seus autores materializavam os ideais liberais em voga principatmente na Franga, que era entéo a metrépaole cultural do Brasil © quicd de toda a Evropa continental. Pelo menos, em termos de ciéncia politica. Nossos constituintes primitivos foram beber a filosofia do liberalismo nas fontes européias, com a doutrina da divis&o de poderes como garan- tia dos direitos individuais. R. inf. fegial, Brasilia a. 17m. 5 jon./mar, 1980 7985 A dissolugdo da Assembiéia Constituinte, por um ato de forga do imperadar, néo fez ahortar a filosofia liberalista de governo, mas Dom Pedro | resotveu adotaé-la na Carta que outorgou, porém, pragmaticamen- 18, como meio de empatinar duls poderes; o Moderator, conse dete, priva tivamente, e a Executivo que era dele também... 3.2. A Constituigdo Imperial Outorgada por Dom Pedro | a 25 de margo de 1824, nossa primeira Constituigéo como Estado independente, ao deciarar que o Brasil era um Império fast. 19}, estabeleceu logo no art. 3° a forma de governo — mo- narquia constitucional representativa. No Titulo ft proctama: “A diviséo e a harmonia dos poderes politices € 0 principio conservador dos direitos dos cidaddos, e 0 mais seguro meio de fazer efetivas as garantias que a Constituigdo oferece” (*"), para designar no art. 10 os quatro: Poder Legislative, Poder Modera- dor, Poder Executivo e Poder Judicial. Cusiusy & yue @ Independencia du Puder duuivial, j4 iuereite & sua propria categoria de poder politico da Nagao, esi em meio das declara- gées de direitos dos cidadaos, inserida na Inciso XII do art. 179, 4 guisa de garantia etetiva dos referidos direitos. Digno de observagdo o art. 178 que dispunha: “Art. 178 — & s6 constitucionat 0 que diz raspeito aos limi- tes © atribuigées respectivas dos poderes politicos 6 aos direitos politiens @ individuais dos cidadaos. Tuda © qua nao é eonatiti. clonal pode ser alterado, sem as formalidades referidas, pelas legistaturas ordinasias” (+), Era a maneira de lornar a Constituigdo tecnicamente resirita, limita- da, ne concvito do Deputado MARCO MACIEL (#), para diferenciar do tipo expansiva-extensiva, como odutras que, por isso mesmo, caem nas jreqlientes alteragées pos emendas que tumultuam o organismo constitu- cional. NELGON DE GOUBA GAMPAIO diz que, “pola votrutura deo podoros, a Constituigao de 1824 apresenta-nos uma monarquia temperada, que nos lembra o ideal aristotélico de governo misto” (!}; ao tragar paralelo entre os elementos democraticos da Camara dos Deputados e os aristo- craticos do Senado. reconhece. joao adiante, que eva obvia a predomi- nancia da principia mondrquice, muita especialmente em face do Poder Moderador que cabia ao imperador. (40) Gonsiwigds do império do Brasil — 1924 -— an, 9.9 (11) Canatinilade ae tmpset $224 ort 178 (42) O Paneemante Constiucions! Brenlietka — Gamera dos Deputadae — UnWveraidaca ds Brasille, 1978, pip. 17, tet) "2 Poder Louie po Brest" In Revie Postion — Ferdasto Miton Campes ne 6, pig, & — Bre afta, julho/setembro/ 1877. ee 1 R. Inf, fogis!. Brasilia a. 17 n. 65 jon./mor. 1980 Pela ordem de enumeragéo adotada, aparece primeiro 0 Poder Le- gislative, Compunha-se de uma Camara de Deputados — com mandatos temporarios e eleicées, a principio indireias, e posteriormente sufragios diretos, embora em pleltas precarios — e um Senado vnalicio onae - nham assento também os principes de malar idade (25 anos}, reunidas as duas Camaras em um Parlamento denominado Assembiéia Geral, que tinha o poder de legislar ''... com a gangéo do Imperador” (art. 13). A Assembléia Geral tinha o poder de fazer leis, interpreta-las, sus- pendé-las e revogé-las e velar pela guarda da Constituicao, e assim deti- nha © controle da constitucionalidade das teis, sua legitimidade e eficd- cia. Assumia também feigdes de Judiciario quando, pelo Senado, julgava crimes de pessozs Oa FaMm(l(a (mperlal, MinIsiOs ¥ Sucratdilos de Estado, ou seja, membros do Poder Executivo (salvo a pessoa do !mperador}, 6 ainda dos Deputados e dos préprios Senadores (art. 47, | @ I). Em seguida vem o Poder Moderador. Consagrando o pansamento @ as proprias palavras do seu idedlogo-mer, Benjamim Constant, diz no texto (art. 98) que este Poder & a chave de toda a organizagao politica, reservando-o, entretanto, especiosamente, ao imperador. Ora, se o Poder Moderador era de tal magnitude que os analistas 0 enxergavam no dpice da Nlerarquia goveramental, & como era ely privative do lnperador, que cumulativamente era Chefe do Poder Executivo, reunia Sua Majestade, em si mesmo, um superpader de fate, constitu(da par dels paderes de direito, Pela discriminagao das ainbuigoes dd Foter Moderador exercido pelo Imperador (j4 que o Conselho de Estado era um simples drgao con- sultivo, gem poder algum} vé-se, do art. 101, que o Trano acumulava real- mente um superpoder. Basiava-the a atribuigio de nomear senadores vilatioivs (um terga dos mombroa do Genade) como preacrevia o art. 40, para arma-lo de Influéncia decisiva no Parlamento; 9 poder de sangdo ou velo (alé mesmo © veto tacito} aos projetos de lei ou ds Resolugdes da Assembiéia Geral e a intervengao na legislagéo dos Conselhos Provin- ciaia (arts. 84 9 87) para earacterizar a sua penatragfe na sistama de freios e contrapesos dos poderes. As mutagdes do Ato Adicional (Lei n° 18, de 12 de agosto de 1834), transformando os Consethos Provinciais em Assembléias Legislativas Provinciais e dando-lhes mesmo o poder de interpretar a fel (art, 25 de Ato Adicional), nao chegaram a contra- balangar 0 peso especifico maior dos poderes reunidos —~ Moderador e Executivo. Depois, na enumeragdo, o Poder Executive, chefiado pelo impera- dor. titular do Poder Maderador, coma vimas, ¢ que completava a sua fora na adminisiracao publica e comando politico do Império, podendo até no- mear bispos, num Estado de retigiao oficial e numa Nagao de imensa maio- tla de catélicos, elemento sociclégico de tremenda signiticagdo, Nao ha- veria de ser por menos que redundaria em grave abafo nacional a célebre Questao Aeligivsa™ io Tina! do regime monarquico. © Conselho de Estado era um érgiio de assessoramento do Poder Moderador, campasto de homens nemeados pelo Imperador, ¢ assessora- R. Inf, legish, Brasilia o. 17 n. 68 jon./mar. 1986 7

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