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Teoria Geral Do Direito Processual
Teoria Geral Do Direito Processual
D I R E I T O PROCESSUAL
I
DIREITO PROCESSUAL:
CONCEITO, DENOMINAÇÃO,
POSIÇÃO ENCICLOPÉDICA E
EVOLUÇÃO CIENTÍFICA
§ l fi CONCEITO D E DIREITO PROCESSUAL
2 Jose Becerra Bautista, Introducción al estúdio dei derecho procesal civil, p. 15.
3 Crisanto Mandrioli, Corso di diritto processuale civile, vol. I, 1995, p. 8. No mesmo sentido
manifesta-se Ferrucio Tomaseo, um dos mais notáveis processualistas italianos da atualidade,
na obra Appunti di diritto processuale civile - nozioni introduttive, p. 9.
4 A influência de Liebman sobre o desenvolvimento do Direito Processual Civil brasileiro é
notável. Discípulo de Chiovenda (considerado o maior processualista de todos os tempos),
Liebman morou no Brasil na época da Segunda Guerra Mundial. Através de sua atuação como
professor na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, Liebman foi o responsável por
uma escola de pensamento, a qual Ficaria conhecida como "Escola Processual de São Paulo",
e que hoje constitui-se num a verdadeira escola brasileira de processo. As principais teorias
defendidas por Liebman foram consagradas no Código de Processo Civil brasileiro, o qual re
sultou de um anteprojeto elaborado pelo mais notável de seus discípulos, o saudoso professor
Alfredo Buzaid. Além disso, Liebman chegou a elaborar obras em português, às quais farei
referência ao longo deste livro.
5 Liebman, Manual de direito processual civil, vol. I, trad. bras. de Cândido Rangel Dinamarco, p. 3.
6 Giovanni Arieta, Francesco de Santis e Luigi Montesano, Corso base di diritto processuale civile,
p. 1.
7 Moacyr Amaral Santos, Primeiras linhas de direito processual civil, vol. I, p. 14.
Direito Processual: Conceito, Denominação, Posição Enciclopédica e Evolução Científica 7
pelo Estado-juiz, da ação pelo dem andante e da defesa pelo dem andado”.8 Em
obra m oderníssim a, im portante processualista brasileiro afirm ou que o D ireito
Processual Civil é "disciplina que se dedica a estudar, a analisar, a sistematizar a
atuação do próprio Estado, do E stado que, p o r razões perdidas no tem po, m ais
ainda válidas até hoje por força das opções políticas feitas pela C onstituição
Federal de 5 de outu b ro de 1988, tem o dever de p restar tu te la estatal de direitos
naqueles casos em que os destinatários das norm as, desde o plano m aterial,
não as acatam devidam ente, não as cum prem e, consequentem ente, frustram
legítim as expectativas das outras pessoas”.9
D essas lições transcritas acima, proferidas por alguns dos m ais im por
tantes processualistas brasileiros e estrangeiros, pode-se ver que não é fácil
chegar a um conceito preciso de D ireito Processual, sendo certo que m uitas
das definições apresentadas "chovem no m olhado”, definindo o D ireito Pro
cessual com o o conjunto de norm as que regem o processo. Parece, todavia,
que essas definições não são adequadas, data venia, para que se com preenda
exatam ente n o que consiste esse ram o do D ireito. A m eu juízo, o D ireito Pro
cessual pode ser definido com o o ramo da ciência jurídica que estuda e regulamenta
o exercício, pelo Estado, da função jurisdicional
Em p rim eiro lugar, há q u e se explicar que, ao falar em ram o da ciência
jurídica q u e estuda e regulamenta, te n h o por objetivo d em o n strar q u e o D ireito
Processual, com o q u alq u er o u tro ram o da ciência jurídica, deve ser exam i
nado em dois sentidos: com o ciência e com o d ireito positivo. A m eu sentir,
a análise de q u alq u er ram o do D ireito apenas com o d ireito positivo, ou seja,
com o um co njunto de norm as, é insuficiente, assim com o o é a análise de
tais ram os do D ireito apenas com o ciência, e desligados da legislação. Todos
os ram os do d ireito devem ser exam inados em su a in teireza p ara q u e p o s
sam ser bem com preendidos. A C iência d o D ireito não tem vida p ró p ria se
distanciada das norm as jurídicas, da m esm a form a que a análise das norm as
jurídicas é im possível sem q u e se conheça a ciência. O D ireito Processual é,
pois, ciência e norm a, e assim deve se r estudado.
Deve-se esclarecer, ainda, qu an to ao conceito de D ireito Processual por
m im exposto, que o objeto central dos estudos realizados n esta o b ra é a ju
risdição (o que levou boa d o u trin a a sugerir a m udança da denom inação da
disciplina para D ireito Jurisdicional),10 a qual, com o se sabe - e será visto m ais
adiante em detalhes - , é um a das funções exercidas pelo E stado com o m anifes
tação do seu Poder Soberano. A jurisdição, porém , para ser exercida depende
de um a série de o u tro s in stitu to s a ela ligados, com o a ação, o processo, a sen
8 Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria
geral do processo, p. 40.
9 Cássio Scarpinella Bueno, Curso sistematizado de direito processual civil, vol. 1, p. 9.
10 Juan Montero Aroca, Evolución y futuro dei derecho procesal, p. 71.
8 Lições de Direito Processual Civil • Câmara
tença, os recursos, a coisa julgada (só para citar alguns). A ssim é q u e se com
preendem no universo do D ireito Processual não só a jurisdição, m as tam bém
todos os dem ais in stitu to s jurídicos que a ela se ligam com o fim de viabilizar
seu exercício adequado pelo Estado.
É por essas razões que conceituo o D ireito Processual, com o visto, com o
o ram o da ciência jurídica que estu d a e regulam enta o exercício, pelo Estado,
da função jurisdicional.
§ 2 Q DENO M IN A ÇÃO
11 Francisco de Paula Baptista, Teoria e prática do processo civil e comerciai Paula Baptista, lente
de Processo Civil na Faculdade de Direito de Pernambuco, lecionou naquela casa entre 1835 e
1881 e pode ser considerado o ancestral de todos os processualistas brasileiros, tendo defendido
posições doutrinárias que só seriam aceitas como verdadeiras na Europa anos (às vezes décadas)
depois.
12 Lodovico Mortara, Istituzioni di procedura civile.
13 João Mendes de Almeida Júnior, Direito judiciário brasileiro.
14 Giuseppe Chiovenda, maior processualista de todos os tempos, foi professor da Universi
dade de Roma, sendo autor, entre outras obras fundamentais, das Instituições de direito processual
civil, trad. bras. de J. Guimarães Menegale.
15 Manual de direito processual civil.
16 Corso di diritto processuale civile.
17 Primeiras linhas de direito processual civil.
18 Humberto Theodoro Júnior, Curso de direito processual civil.
19 Vicente Greco Filho, Direito processual civil brasileiro.
Direito Processual: Conceito, Denominação, Posição Enciclopédica e Evolução Científica 9
grave defeito: o nom e D ireito Processual passa a falsa ideia de que o proces
so (e não a jurisdição) é o conceito central e m ais im portante d esta ciência,
quando na verdade o processo é m eram ente um m eio de que se vale o Estado
para exercer a função jurisdicional. Por essa razão, com o já m encionado, o
ju rista espanhol Juan Montero Aroca defende a adoção de nova denom inação:
D ireito Jurisdicional.20 Se p o r um lado as razões do notável professor espanhol
parecem convincentes, a sugerir a aceitação de sua sugestão no sentido de se
defender u m a nova denom inação, não se deve deixar de p onderar no sentido
de que a nom enclatura atual, em bora não seja perfeita (como não seria n en h u
m a outra), tem um a grande vantagem . Em razão de su a im ensa aceitação, a
denom inação D ireito Processual perm ite que, ao m ero enunciar das palavras
que a form am , todos os que a ouvem pensem em um m esm o ram o do D ireito,
com lim ites m u ito precisos, inexistindo qualquer dúvida possível q u an to ao
alcance da expressão. Por esse m otivo, e aplicando a m áxim a segundo a qual
"em tim e que está ganhando não se m exe”, é que opto aqui p o r utilizar esta
que, apesar das críticas procedentes que lhe são dirigidas, ainda é a m ais aceita
denom inação da disciplina jurídica de que se ocupa este livro.
A ssim é que, em bora utilize com o fonte de denom inação o processo,
m ero in stru m en to posto pelo sistem a a serviço da jurisdição, e não esta úl
tim a, verdadeiro conceito central e essencial desse ram o da ciência jurídica,
continuarei em pregando, ao longo deste livro, o nom e consagrado: D ireito
Processual. É preciso te r claro, porém , que aqui se trata, apenas, do Direito Pro
cessual Jurisdicional, e não de o u tro s (como o D ireito Processual A dm inistrativo,
por exem plo), ainda q u e ali tam bém se esteja diante de verdadeiros processos.
§ 3* POSIÇÃO ENCICLOPÉDICA
21 Montero Aroca, p. 5.
Direito Processual: Conceito, Denominação, Posição Enciclopédica e Evolução Científica 11
22 Sobre a primeira etapa da reforma do Código de Processo Civil, consulte-se Alexandre Frei
tas Câmara, Lineamentos do novo processo civil.
23 Dentre os mais importantes processualistas estrangeiros que embasam algumas de suas afir
mações nas lições dos autores brasileiros podem ser citados o argentino Augusto Mario Morello
e o italiano Elio Fazzalari.
II
A EXISTÊNCIA DE UMA
TEORIA GERAL DO DIREITO
PROCESSUAL
C ostum a-se dividir o D ireito Processual em pelo m enos dois grandes
ram os, o D ireito Processual Civil e o D ireito Processual Penal. Além desses,
outros ram os podem ser identificados, com o o D ireito Processual do Trabalho,
o D ireito Processual Eleitoral e o D ireito Processual A dm inistrativo. Tal divi
são, porém , se faz com o fim de atender a critérios exclusivam ente didáticos e
de facilitação da atividade legislativa. N a verdade, o D ireito Processual é único,
não com portando verdadeiras divisões. Essa afirm ação resu lta na adm issão da
existência de um a teoria geral do D ireito Processual, o u seja, um a parte geral
da ciência, aplicável a todos os "ram os” que a integrem .
N ão é pacífica em sede doutrinária a existência de um a teoria geral do
D ireito Processual. A resistência inicial à existência de tal teoria, porém , foi
sendo gradualm ente vencida, até que tal teoria chegasse m esm o a ser apresen
tada com o cadeira autônom a nos cursos de graduação em D ireito de inúm eras
faculdades de nosso país.
N ão parece possível o oferecim ento de qualquer contestação à existência
da teoria geral do D ireito Processual. É inegável o im enso n ú m ero de in stitu
tos afins a todos os ram os do D ireito Processual, podendo servir com o exem
plo do que acaba de ser afirm ado o fato de que todos os citados "ram os” têm
um a base com um , form ada pela "trilogia estru tu ral do D ireito Processual”, a
qual é form ada pela jurisdição, pela ação e pelo processo.
A lém desses três conceitos, porém , o u tro s há, com uns a todos os ram os
do D ireito Processual, com o os conceitos de preclusão, ato processual, ônus
16 Lições de Direito Processual Civil • Câmara
sim ples, sem som bra de dúvida, a elaboração de leis q u e regem cada um desses
ram os do D ireito Processual separadam ente. É certo que alguns poucos países
tentaram um a experiência diversa, elaborando Códigos que reunissem os pre
ceitos de D ireito Processual Civil e Penal, com o se fez, por exem plo, na Suécia.
Essa experiência, porém , não foi levada adiante n a m aioria dos países, sendo
bastan te m ais freqüente a existência de Códigos separados, com o no Brasil, em
que há um Código de Processo Civil e um Código de Processo Penal.
A consciência, p o r p arte d o estudioso do D ireito Processual, de que exis
te um a teoria geral desse ram o do conhecim ento jurídico é essencial para a
adequada com preensão dos m eandros e detalhes que o com põem . A quele que
conhece bem a teoria geral do D ireito Processual pode, sem n en h u m a dúvida,
"navegar” pelo D ireito Processual (civil ou penal) sem grandes dificuldades,
sendo certo, de o u tro lado, que aquele que ignora os conceitos genéricos da
disciplina terá im ensa dificuldade em bem apreender o D ireito Processual Civil
(ou qualquer o u tro ram o do D ireito Processual).
III
FONTES, INTERPRETAÇÃO
E APLICAÇÃO NO ESPAÇO
E N O TEMPO DO DIREITO
PROCESSUAL CIVIL
§ l fi FO NTES D O DIREITO PROCESSUAL CIVIL
riais. Fontes form ais são aquelas que possuem força vinculante, sendo, por
tanto, obrigatórias para todos. São as responsáveis pela criação do direito p o
sitivo. Já as fontes m ateriais não têm força vinculante, servindo apenas para
esclarecer o verdadeiro sentido das fontes form ais.
Fonte form al do D ireito Processual Civil é a lei. Fala-se aqui, porém , em
lei lato sensu, a significar no rm a jurídica. Diversas são as form as de expressão
da norm a jurídica que podem originar preceitos de D ireito Processual: a C ons
tituição Federal, a lei federal ordinária, a lei estadual, os tratad o s internacio
nais e os regim entos in tern o s dos Tribunais.
A ssim é que, antes de qualquer outra, a C onstituição da República é
fonte formal do D ireito Processual Civil, ali sendo encontradas regras das m ais
relevantes en tre as que com põem esse ram o do D ireito. As norm as contidas na
C onstituição e que dizem respeito ao D ireito Processual podem ser divididas
em dois grupos: o D ireito C onstitucional Processual e o D ireito Processual
Constitucional.
A ntes de m ais nada, h á que se afirm ar que estes não são dois novos
ram os do D ireito Processual, m as tão som ente conjuntos de norm as jurídicas
sem autonom ia científica (e aqui lem bro o q u e já foi afirm ado anteriorm ente:
qualquer ram o do D ireito só tem auto n o m ia se p u d er ser visto ao m esm o tem
po com o conjunto de norm as positivas e com o ciência).
O D ireito C onstitucional Processual é o conjunto de norm as de índole
constitucional cuja finalidade é garantir o processo, assegurando que este seja,
tan to quan to possível, um processo justo. C om põem o D ireito C onstitucional
Processual os cham ados "princípios gerais do D ireito Processual”, que serão
alvo de atenção m ais adiante, en tre os quais se incluem o princípio do devido
processo legal, o do contraditório e o da isonom ia.
Já o D ireito Processual C onstitucional é o conjunto de norm as de índole
processual que se encontram n a C onstituição com o fim de garantir a aplicação
e a suprem acia hierárquica da C arta Magna. Aqui são encontradas as norm as
que regulam , en tre o utros, o m andado de segurança, o recurso extraordinário
e o m andado de injunção.
A lém (e abaixo, de acordo com a "pirâm ide da hierarquia das norm as
jurídicas”) da C onstituição da República, outras form as de expressão das nor
m as jurídicas tam bém são fontes form ais do D ireito Processual Civil. Entre
elas destaca-se, sem dúvida, a lei ordinária federal. Basta dizer que o Código
de Processo Civil, a m ais im portante das leis processuais brasileiras, é um a lei
ordinária federal, a Lei n Q5.869/1973.
H á que se frisar, porém , que apenas a lei ordinária, e não a lei com ple
m entar, é fonte formal do D ireito Processual. Com o se sabe, a lei com plem entar
só é adequada às hipóteses em que for expressam ente exigida pela C onstituição
da República. N o mais, a lei ordinária é que se faz adequada à regulam entação
de preceitos jurídicos.
Fontes, Interpretação e Aplicação no Espaço e no Tempo do Direito Processual Civil 21
propriam ente dito. Podem os E stados legislar sobre processo nos juizados de
pequenas causas, in stitu in d o , por exem plo, regras quan to à assistência ju d i
ciária pela D efensoria Pública, ou a form as de se realizar a execução perante
aqueles órgãos, desde que não sejam tais norm as contrárias às gerais, editadas
pela U nião e que, com o notório, encontram -se reunidas n a Lei n ô 9 .0 9 9 /1 995.5
Ao lado da lei federal ordinária e da lei estadual, tam bém podem ser
incluídos en tre as fontes form ais do D ireito Processual os tratados in tern a
cionais. Aqui, porém , h á que se analisar um problem a de grande im portância,
qual seja, o conflito que possa existir en tre um tratad o internacional e um a lei
in tern a que tratem do m esm o tem a. Exem plifiquem os com a hipótese do art.
90 do CPC, segundo o qual a existência de dem anda p en d en te diante de juízo
estrangeiro não im pede a pro p ositu ra de dem anda idêntica no Brasil, o que se
põe em confronto com o disposto no art. 394 do Código de B ustam ante, trata
do internacional de que o Brasil é um dos Estados contratantes. É certo que a
boa d outrin a considera que, n a hipótese do exem plo apresentado, deve incidir
o tratad o se a dem anda estiver pendente perante juízo estrangeiro de país que
tam bém seja co n tratan te do Código de B ustam ante, incidindo o CPC apenas
em relação aos países que não sejam partes daquele tratad o .6 Parece, porém ,
preferível en ten d er que o tratad o internacional e a lei interna encontram -se em
paridade hierárquica, e assim sendo a lei in tern a p o sterio r é capaz de revogar
o tratad o anterior, prevalecendo assim a m ais recente expressão de vontade do
legislador.7 A ssim sendo, deve-se en ten d er que o disposto no art. 90 do CPC
prevalece sobre o art. 394 do Código de B ustam ante, já que a lei federal é, no
caso, posterior ao tratado internacional.
E videntem ente, esse raciocínio não se aplica aos tratados internacionais
que, por força do disposto no art. 5Q, § 3Q, da C onstituição da República, ali
incluído pela E m enda C onstitucional n° 4 5/2004, têm status de em enda cons
titucional, o que os põe em posição hierárquica superior à da lei. N em todo
tratado internacional, porém , tem aquele status.
Por fim, são fontes form ais do D ireito Processual os regim entos internos
dos tribunais. Estes são conjuntos de norm as que regem o funcionam ento
interno do tribunal, dispondo, por exem plo, sobre sua com posição. Tais regi
m entos, porém , podem conter (e efetivam ente contêm ) norm as processuais,
com o, por exem plo, as regras contidas nos regim entos internos do Suprem o
5 Sobre o microssistema processual dos Juizados Especiais, seja permitido remeter o leitor a
Alexandre Freitas Câmara, Juizados especiais cíveis estaduais e federais - uma abordagem crítica.
6 Assim pensam, entre outros, Greco Filho, Direito processual civil brasileiro, vol. I, p. 191, e Celso
Agrícola Barbi, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, p. 245.
7 José Francisco Rezek, Direito internacional público (curso elementar), p. 106. Noticia ainda o
referido autor, ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, que o Pretório Excelso adotou esse
entendimento no julgamento do Recurso Extraordinário n° 80.004.
24 Lições de Direito Processual Civil • Câmara
anunciando apenas que pretendem produzir "todos os m eios de prova adm is
síveis em direito". Por força disso, surgiu um costum e dos juizes de, após o
encerram ento da fase postulatória, d eterm in ar que as partes especifiquem as
provas que pretendem produzir.8
A doutrina, isto é, o conjunto de lições dos jurisconsultos acerca do Di
reito Processual Civil, tam bém se constitui em fonte do D ireito Processual
Civil. É certo q u e a própria d o u trin a diverge q u an to a te r ou não essa quali
dade, havendo autores que negam sua inclusão en tre as fontes do D ireito.9
Parece-me, porém , que as lições doutrinárias são essenciais para que se pos
sa conhecer, com precisão, o q u e é o D ireito. Todos os que estudam D ireito
conhecem a força de argum entos de autoridade e a im portância que se dá à
fundam entação do u trin ária das opiniões m anifestadas por todos aqueles que
de algum a form a operam o D ireito. Advogados, m agistrados, m em bros do Mi
nistério Público, professores, todos fazem questão de m o strar que a opinião
que defendem encontra respaldo d o utrinário e, m uitas vezes, buscam m uito
m ais na d o u trin a do que na própria lei a fundam entação para suas afirm ações.
Isso m o stra a necessidade de se incluir a d o u trin a en tre as fontes do D ireito
(não só do Processual Civil).
Por fim, é tam bém fonte m aterial do D ireito Processual Civil a ju risp ru
dência. Valem aqui, em princípio, as m esm as afirm ações feitas para justificar
a inclusão da d o u trin a en tre as fontes do D ireito Processual Civil. É inegável a
força das súm ulas da jurisprudência dom inante dos tribunais, principalm ente
dos tribunais superiores.
É certo que, em nosso sistem a, a jurisprudência não tem eficácia vincu-
lante, com o tem , por exem plo, no sistem a da commom law, im perante nos E sta
dos U nidos da América. A atribuição de eficácia vinculante à ju risprudência te
ria com o conseqüência incluí-la en tre as fontes form ais do D ireito, o que não é
freqüente nos ordenam entos jurídicos que seguem o sistem a do ius scriptum ou
da civil law, de origem rom ano-germ ânica, e ao qual se filia o D ireito brasileiro.
H á entre nós a intenção, m anifestada de público p o r juristas, m agistrados e
políticos, de atrib u ir eficácia vinculante - em algum as situações, e preenchidos
certos requisitos - à jurisprudência, através de um a m udança no sistem a do
incidente de uniform ização de jurisprudência (CPC, arts. 4 7 6 /4 7 9 ). Sobre tal
projeto, já m e m anifestei an teriorm ente em o u tra o b ra,10 e a ele voltarei q u an
8 Esse costume é noticiado também por Cândido Rangel Dinamarco, A reforma do Código de
Processo Civil, p. 107.
9 Nega à doutrina a qualidade de fonte do Direito, entre outros, Miguel Reale, Lições preliminares
de direito, p. 176. Em sentido contrário - e, portanto, de acordo com o texto -, consulte-se, por
todos, Limongi França, Hermenêutica jurídica, p. 109; José de Albuquerque Rocha, Teoria geral do
processo, p. 34.
10 Freitas Câmara, Lineamentos do novo processo civil, p. 225.
26 Lições de Direito Processual Civil • Câmara
In terp retar a lei é fixar seu significado e d elim itar seu alcance. Em outras
palavras, a atividade de interpretação da lei tem por finalidade não só descobrir
o que a lei q u er dizer, m as ainda precisar em q u e casos a lei se aplica, e em
quais não. Trata-se de atividade essencial para o jurista, sendo certo que todas
as norm as jurídicas (e, para dizer a verdade, todos os atos jurídicos) devem ser
interpretadas, até m esm o as m ais claras. A ideia, p o r m u ito tem po consagrada,
de que a clareza da lei dispensa a interpretação é errada, m esm o porque só se
sabe que a lei é clara depois de se interpretá-la.
A interpretação da lei processual, com o não poderia deixar de ser, segue
os m esm os critérios e pode alcançar os m esm os resultados que a interpretação
das leis em geral. É preciso, assim , ap resen tar os m étodos de interpretação da
lei processual e, em seguida, en u m erar os possíveis resultados da atividade
interpretativa.
São cinco os m étodos de interpretação d a lei processual: literal ou gram a
tical, lógico-sistem ático, histórico, com parativo e teleológico. A ntes de apreciá-
-los separadam ente, é preciso se afirm ar que nenhum deles é suficiente para
determ inar a verdadeira vontade da lei, sendo essencial a utilização de todos.
11 No sentido do texto, entendendo-se que o verdadeiro sentido da lei é o que se encontra com
a alteração da posição da vírgula, J. E. Carreira Alvim, Código de Processo Civil reformado, p. 274.
Fontes, Interpretação e Aplicação no Espaço e no Tempo do Direito Processual Civil 29
2 .3 M étod o H istórico
12 Nesse sentido José Raimundo Gomes da Cruz, Estudos sobre o processo e a Constituição de 1988,
p. 166; Alexandre Freitas Câmara, “Atos processuais", Livro de estudos jurídicos, vol. X, coord. de
James Tbbenchlak e Ricardo Bustamante, p. 18. Contra, entendendo que o parágrafo único do
art. 155 é aplicável a todos os processos, sem exceção, José Carlos Barbosa Moreira, “Processo
civil e direito à preservação da intimidade”, Temas de direito processual, Segunda série, p. 19.
30 Lições de Direito Processual Civil • Câmara
que nas apelações em geral, sendo com unicado da interposição d o recurso para
que pudesse, no prazo de 15 dias, im pugná-lo. O corre que essa não é a inter
pretação adequada, sendo certo que, nesse recurso, não h á oportunidade para
m anifestação do recorrido. Tal conclusão decorre do fato de a redação anterior
à vigente do art. 296 (e parágrafos) ser expressa em d eterm in ar a citação do
réu, n a hipótese, para acom panhar o recurso. O fato de te r sido a lei reform ada
para que do novo texto se om itisse a referência à m anifestação do réu leva à
conclusão de que este não deve se m anifestar.13
O m étodo histórico, nunca é dem ais repetir, é insuficiente para perm itir
a adequada interpretação da lei, assim com o o são todos os dem ais m étodos,
sendo im periosa a utilização conjunta de todos eles.
2 .4 M étod o C om parativo
13 Consulte-se, sobre o tema, Freitas Câmara, Lineamentos do novo processo civil, p. 49; Dina-
marco, A reforma do Código de Processo Civil, p. 81. O Supremo Tribunal Federal enfrentou essa
questão, e decidiu no sentido sustentado no texto, no acórdão proferido no AI-AgR 423590/RS,
rei. Min. Marco Aurélio, j. em 29.6.2005.
14 No Direito Processual Civil, destacam-se, pela quantidade, as citações de autores como Giu
seppe Chiovenda, Enrico Tbllio Liebman e Francesco Carnelutti, entre muitos outros notáveis
juristas que, com suas obras, influenciaram decisivamente a formação do pensamento jurídico
nacional.
15 Sobre as semelhanças entre a “ação monitória” do Direito brasileiro e o procedimento mo-
nitório italiano, consulte-se Humberto Theodoro Júnior, A s inovações no Código de Processo Civil,
p. 74.
Fontes, Interpretação e Aplicação no Espaço e no Tempo do Direito Processual Civil 31
com o é o o u tro ordenam ento é verificar, através da com paração en tre diversos
ordenam entos, quais são as tendências m ais m odernas, buscando-se d eter
m inar se um dado ordenam ento (aquele de q u e p arte o estudioso) está em
consonância com tais tendências.16
2 .5 M étod o T eleológico
a) Resultado Declarativo
16 Sobre o ponto, seja-me permitido fazer referência à palestra do processualista alemão Pe-
ter Gilles no XIII Congresso Mundial de Direito Processual, realizado em Salvador, Bahia, em
setembro de 2007, proferida em inglês, de que se publicou uma versão em alemão nos anais
do referido congresso (Peter Gilles, Prozessrechtsvergleichung - Comparative procedural law, in Ada
Pellegrini Grinover e Petrônio Calmon (org.), Direito processual comparado - XIII World congress o f
procedural law, p. 826 e seguintes. Há, também, uma versão em inglês do texto, publicada in Fre-
die Didier Jr. e Eduardo Ferreira Jordão (coord.), Teoria do processo - panorama doutrinário mundial,
p. 809 e seguintes.
32 Lições de Direito Processual Civil • Câmara
b) Resultado Restritivo
Esse é o resu ltad o alcançado quando, na exegese da lei, o in térp rete des
cobre que a lei disse m ais do q u e o seu real significado, tendo, portanto, um
alcance inferior ao que aparenta ter. Diz-se, nessa hipótese, que a lei dixit plus
quaxn voluit. Também não são raros os casos em que o legislador m anifesta sua
im precisão de linguagem , dando à lei um a redação que aparenta um a am pli
tu d e que, em verdade, não existe. Basta olhar, por exem plo, para o art. 522
do CPC, segundo o qual "das decisões interlocutórias caberá agravo”, o que
levaria o in térp rete desavisado a concluir que o recurso de agravo é cabível
contra toda e qualquer decisão interlocutória que viesse a ser proferida em um
processo, o que não corresponde à verdade. Cite-se, p o r exem plo, o disposto
no art. 519, parágrafo único, do CPC, a fim de se d em o n strar a existência de
decisões interlocutórias irrecorríveis, o que com prova q u e o art. 522 não tem
na verdade um alcance tão am plo q u an to aparenta.
c) Resultado Extensivo
d) Resultado Ab-rogante
18 No mesmo sentido, considerando que a nova sistemática do art. 331 revogou o art. 451
do CPC por ser com ele incompatível, Dinamarco, A reforma do Código de Processo Civil, p. 134.
Observe-se que a redação do art. 331 foi, posteriormente, alterada pela Lei n° 10.444/2002, o
que não altera o conteúdo do que se sustenta no texto.
CAPÍT U LO 2
Normas fundamentais
do processo civil
Sumário • 1 . Direito Processual Funda mental - 2. Pri ncípios: 2 . 1 . Princípio do devido processo lega l; 2.1 . 1 .
Considerações gerais; 2.1 .2. Conteúdo; 2.1 .3. Devido processo legal formal e devido processo legal substancial;
2.1 .4. Devido processo legal e relações jurídicas privadas; 2.2. Princípio da dignidade da pessoa humana; 2.3.
Princípio do contraditório: 2.3 . 1 . Generalidades e a regra da proibição de decisão-surpresa; 2.3.2. Dever de o
juiz zelar pelo efetivo contraditório; 2.4. Princípio da ampla defesa; 2.5. Princípio da publicidade; 2.6. Princípio
da duração razoável do processo; 2.7. Princípio da igualdade processual (paridade de a rmas); 2.8. Princípio
da eficiência; 2.9. Princípio da boa-fé processual: 2.9. 1 . General idades; 2.9.2. Fundamento constitucional
do princípio da boa-fé processual; 2.9.3. Destinatário da norma; 2.9.4. Concretização do princípio da boa-fé
processual; 2 . 1 0. Princípio da efetividade; 2.1 1 . Princípio da adequação (legal, jurisdicional e negociai) do
processo: 2.1 1 . 1 . Generalidades; 2.1 1 .2. Critérios de adequação; 2.1 1 .3. Adequação jurisdicional do processo;
2.1 1 .4. Adequação negociai do processo; 2.12. Princípio da cooperação e o modelo do processo civil b rasileiro:
2 . 1 2 . 1 . Nota introdutória; 2.1 2.2. "Princípios" dispositivo e inquisitivo. Modelos tradicionais de organização
do processo: adversarial e inquisitorial; 2.12.3. Processo cooperativo: um terceiro modelo de organização do
processo. Princípios e regras de cooperação. Eficácia do princípio da cooperação; 2.1 2.4. Dever de o juiz zelar
pelo efetivo contraditório, princípio da cooperação e dever de auxílio; 2 . 1 3 . Princípio do respeito ao autorre
gramento da vontade no processo; 2 . 1 4. Princípio da primazia da decisão de mérito; 2.15. Princípio da prote
ção da confiança: 2 . 1 5 . 1 . Proteção da confiança e seg u rança jurídica; 2.1 5.2. Pressupostos para a proteção da
confiança; 2.1 5.3. Princípio da proteção da confiança e o direito processual civil - 3. Regras: 3.1 . Regras da
instauração do processo por iniciativa da parte e de desenvolvimento do processo por impulso oficial: 3.1 . 1 .
Instauração d o processo por iniciativa d a parte; 3.1 .2. Desenvolvimento d o processo por impu lso oficial; 3.2.
Regra da obediência à ordem cronológica de conclusão: 3.2. 1 . General idades; 3.2.2. Regras que excetuam o
dever de respeito à ordem cronológica de conclusão; 3.2.3. Calendário processual e dever de observância; da
ordem cronológica de conclusão; 3.2.4. Consequências do descumpri mento da regra; 3.2.5. Extensão da regra
à atuação do escrivão ou chefe de secretaria; 3 .2.6. Direito transitório - 4. Norma fundamental de interpreta
ção do Código de Processo Civil: o postu lado hermenêutica da unidade do Código.
61
FREDIE DIOIER JR.
U m a parte dessas n o rmas fu n da m e ntais d eco rre d i retam ente d a Constit u i ção
Fed e ral - é o q u e se pode chamar d e D i reito P rocessual F u ndame ntal C o n stituc i o n a l .
A outra parte deco rre da legi s l ação i nfraco n stituci o n al, m a i s especifica m e nte
d o Código d e P rocesso Civi l, q u e d e d i ca um capít u l o i ntei ro a essas n o rmas (arts.
10 a 1 2, CPC).
Esse capítulo re p ro d u z algu n s e n u n ciados n o rm ativos constitucionais (art. 3o,
caput, p . ex., que p rati cam ente re p roduz o i n ciso XXXV d o art. so da CF/1 988) - e,
n esse sentido, não i n ova.
Mas o capítulo tam bém traz n ovos e n u n ciados n o r m ativos, sem p revisão ex
p ressa na Constitu i ção, e m bora todos eles possam e n co n t rar nela algu m f u n da
m e nto.
O ro l desse capít u l o n ão é, porém, exaustivo.
H á outras n o rmas f u n d a m e ntais do p rocesso civi l b ras i l e i ro q u e n ão estão
con sagradas exp ressa m e nte nos d oze p ri m e i ros artigos do CPC. H á n o rmas fu n da
m e ntais n a Constit u i ção - devido p rocesso legal, j u i z n atu ral, p ro i b i ção de p rova
i lícita; há n o rm as f u n d a m e ntais espal hadas no p ró p ri o CPC, como o p r i n cípio d e
res peito ao auto rregra m ento da vontade n o p rocesso e o d ever de observância dos
p recedentes j u d iciais (arts. 926-927, CPC). H á, portanto, esq ueci m e ntos i n com p re
e nsívei s - n ão seria exage ro dizer que os arts. 1 90 e 926 e 927 são p i l ares do n ovo
s i ste m a do p rocesso civi l b rasilei ro -, além de ao m e n o s um exagero: a o bservância
da o rd e m c ro n o lógica d a d ecisão, e m bora real m e nte seja i m portante, n ão m e recia
o sta tus d e entrar n o rol das n o rm as f u n d a m e ntais d o p rocesso civi l . Mas, n o par
t i c u lar, legem habemus.
É p reciso co m p re e n d e r este capít u l o como se ao seu fi nal h o uvesse
uma cláu s u l a n o r m ativa q u e d i ssesse: "O ro l d e n o rmas fu n d a m e n
t a i s p revisto n este capít u l o não exc l u i outras n o rmas fundame ntais
p revi stas n a Constituição d a R e p ú b l i ca, nos tratados i nternaci o n ais,
n este Código o u e m l e i " à semel hança d o que já oco rre com os
-
1. LI MA, Rafael Bellem d e . Re3ras na teoria dos princípios. São Paulo: M a l h e i ros, 2 0 1 4, p. 5 2 .
62
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
2. PRI NCrPIOS
2. 1 . 1. Considerações gerais
O i n ciso LIV do art. so da Co n stit u i ção Fed e ral p revê q u e " n i nguém será p rivado
d a l i berdade o u d e seus b e n s sem o d evido p rocesso lega l " .
A locução "devi d o p rocesso l egal" corres p o n d e à t rad u ção para o p o rtuguês
d a exp ressão i n gl esa "due process of law" . Law, p o ré m , sign ifica Direito, e n ão lei
("sta tute law") . A observação é i m po rtante: o p rocesso há de estar em confo r m i da·
d e com o Direito com o um todo, e n ão apenas e m conso n â n cia com a l e i . " Legal",
e n tão, é adjetivo que re m ete a " D i reito", e não a Lei .
H á outras trad uções da exp ressão i n glesa. Os portugueses o ptaram
por " p rocesso e q u itativo"; os italianos, por p rocesso 3iusto. Na E u ro
pa util iza-se m u ito tam bém a expressão fair trial.
63
FREDIE DIDIER JR.
Pode-se falar, tam bém, e m n o r m as j u ríd icas parti c u l a res, criadas pe
los i n d ivíd uos a partir do exe rcício d e seu poder d e autorregram e nto,
d i reito fu n d a m e ntal conteúdo do d i reito à l i berdade. N este sentido,
exi ge-se também o res peito ao devido processo le3al no âmbito das
relações particulares. O tema s e rá exa m i nado com mais vagar adiante.
2. 1 .2. Conteúdo
2. De acordo com p rofu n d a pesqu isa h i stórica de STUBBS, Wi l l i a m . Germany i n t h e Early Middle Ages (476- 1 250).
N ew Yo rk: Lo ngmans, Green, a n d Co., 1 908, p. 1 46- 1 47 . Relaci o n a n d o o decreto de Con rado 1 1 ao devido p roces
so legal, P E R E I RA, R u ite m be rg N u nes. O princípio do devido processo lesai substan tivo. Rio de j a n e i ro : Renovar,
2005, p. 1 8· 2 7 .
3- STU BBS, W i l l i a m . Germany in the Early Middle Ases (476- 1 2 50), cit., p. 1 47 .
4. COKE, Edward. The second part of the lnstitutes of the law of England. Lon d res: E. and R. Brooke, 1 797, p.
50. D i s p o n ível e m http://books.google.eo m . b r/books?d q =Edward+Coke+ The+Seco n d + PArtl:t pri ntsec= frontcoverl:t
sig=-i Ez) M RLXQqCdCa 1 6f587 r5PYI BYéte i= n) FLSrXcEov7tgfD U 9 G b D Qétct= res u ltétid =WCgzAAAAIAA)étots= 1 kYi9 YD D 56.
Consulta em o1 .07. 2009, 1 3 h5o.
5. Sobre o tema, com i n ú m e ras refe rê ncias, P E R E I RA, Ruite m b e rg N u nes. O princípio d o devido processo legal
substan tivo, cit., p . 29-45.
64
N o R M A l F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
6. VIGORITI, Vi ncenzo. Garanzie costituzionali de/ processo civile. M i lão: Giuffre, 1 97 3 , p. 3 5 e 38-39.
7- FERRAJ O L I , Luigi. Direito e razão - teoria seral do saran tismo penal. São Paulo: RT, 2002, p. 472.
8. CANOTI LHO, José Joaq u i m Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6• ed. Coi m b ra: Almedi na,
2002, 339-340; SARLET, l n go Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 1 0• ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogad o, 2009, p . 433 e segs.
9- "Ao i n stitu i r esses eleme ntos, a Constitu ição term i n o u por tornar o b rigató rio aq u i l o q u e poderia ser avaliado
como adeq uado e necessário conforme as circ u n stâncias de cada caso concreto e, com isso, eventual m e nte
afastado. E n q uanto no utros sistemas, como o estad u n i d e n se, os eleme ntos do devido p rocesso legal são
65
FREDIE DIDIER JR.
É p reciso o bservar o con traditório e a ampla defesa (art. so, LV, CF/1 988) e dar
tratame nto paritári o às partes d o p rocesso (art. so, I , CF I 1 988); p roíbe m -se p rovas
i l ícitas (art. so, LVI , CF/ 1 988); o p rocesso há de ser p ú b l i co (art. so, LX, CF/ 1 988);
garante-se o j u iz n atu ral (art. so, XXXV I I e Ll l l , CF/1 988); as decisões h ão d e ser
motivadas (art. 93, IX, CF/1 988); o p rocesso d eve ter uma d u ração razoável (art. so,
LX XVI I I , CF/1 988); o acesso à j ustiça é garantido (art. so, XXXV, CF/1 988) etc. Todas
essas n o rmas ( p ri n cípios e regras) são co n c retizações do d evido p rocesso l egal e
com põem o seu co nteúdo mín i m o .
Co m o se vê, o devido p rocesso l egal é u m d i reito f u n damental de conteúdo
co m p lexo.
Por isso, "tanto se pode refe ri r ao d i reito f u n dame ntal ao p rocesso devi do,
como um d i reito fu n d a m e ntal d otado de um conteúdo co m p l exo, co m o tam bém é
possível refe ri r-se a cada u m a das exigê ncias a n i n h adas nesse conte ú d o com p l exo
c o m o co n stitu i n do um d i reito f u n d a m e ntal . (. .. ) A vantage m e m se i d e n tificar cada
u m a dessas exigê ncias e d e n o m i ná-las i n divi d u a l m e nte é a de facil itar a sua o p e ra
cional ização pelo i ntérprete, isto é, auxi liá-lo na s o l u ção de q uestões relaci o n adas
com a concretização d e tais val o res". 1 0
Sucede q ue esse conteúdo mínimo do devido processo lesai, co n struído após
séculos d e a p l i cação dessa cláusu la, não é suficiente para a s o l u ção dos p ro b l e mas
conte m p o râneos. Esse l o ngo período h i stórico não esvaz i o u a cláusula seral do de
vido processo lesai, q ue perman ece úti l e em vigo r.
A construção do processo devido é obra eternamen te em prosresso.
Essa cláusula geral exe rce u e exe rce p l e n a m e nte a sua f u n ção d e permitir a
m o b i l idade e a abert u ra d o siste m a j u ríd ico, co m o u m a "garanzia plastica e fless i b i
l e d i giustizia n e l processo" , . É p o r i s s o q u e o texto n o r m ativo perman ece o m e s m o
h á tanto tem po, já te n d o sido i n corporado a o s tratados i nternacionais de d i reitos
h u manos e a i n ú meras constituições. A ge n e rali dade desse texto normativo gara n
ti u a sua l o n gevidad e . Trata-se d e u m a proteção contra a ti ra n i a (co ntra a p rod u ção
t i râ n i ca d e n o rmas j u ríd i cas, em níveis legislativo, ad m i n istrativo, j u risdicional e
p rivado). As palavras de Wi n sto n C h u rc h i l l s o b re a Magna Carta aplicam-se inclusive
e principa lmen te ao devido processo lesai: "E q uando, nas i dades s u bseq u e ntes,
o Estado, d i l atado com sua próp ria autoridade, tentou i m po r sua t i ra n i a sobre os
66
N O RMAS F U N DA M E N T A I S D O PROCESSO C I V I l
1 2. C H U RC H I LL, Winston S. História dos povos de lín3ua in3fesa. Ayda n o Arruda (trad .). São Paulo: ! B RASA, 1 960, v.
1 (o be rço da I n glaterra), p . 2 2 5 .
1 3. ÁVI LA, H u m be rto. "O q u e é 'devido processo legal'?", c i t . , p. 5 7 ·
1 4 . ÁVI LA, H u m berto. Teoria dos p r i n cípios. 1 2• ed. S ã o Pau l o : M a l h e i ros, 201 1 , p . 1 26.
67
FREDIE DIDIER JR.
N o s EUA, desenvo lve u-se a d i m e n são substancia l d o devido p rocesso lega l ' s .
U m p rocesso d evido n ão é ape n as aq uele e m q u e se observam exigê ncias fo rmais:
d evi do é o p rocesso que gera decisões jurídicas s u bstan cialm ente devi das.
A experi ên cia j u ríd i ca bras i l e i ra assi m i l o u a d i m e n são su bstancial do devido
processo le3al de u m m o d o bem pec u liar, co n s i d e ran d o - l h e o f u n d a m e nto cons
titucional das máximas da proporciona lidade (postu lad o ' 6, p ri n cípio'7 o u regra da
p ro p o rci o n a l i dade'8, conforme sej a o pensame nto do utri nário que se adotar) e da
razoab i l i dade . A j u ri s p ru d ê n cia do S u p re m o Tri b u nal Federal extrai da cláus u l a geral
d o d evi d o p rocesso legal os deve res de p ro p o rci o n a l i dade o u razoa b i l idade. Convém
transcreve r trecho da deci são p rofe ri da pelo M i n . Celso de M e l lo, no R E n . 3 7 4 . 9 8 1 ,
e m 28.03 . 2005 , p u b l icada n o I nfo rmativo d o STF n . 3 8 1 :
" N ão se pode perder de perspectiva, n este ponto, em face do co n
teúdo evi d e n t e m e nte arbitrário d a exi g ê n c i a estatal o ra q u estio n ada
n a p resente sede rec u rsal, o fato d e q u e, especial m e nte q u ando se
t ratar de m atéria t ri b utária, i m põe-se, ao Estado, n o p rocesso de e la
bo ração das leis, a observânc i a do n ecessário coefi c i e n te de razoa
b i l idade, pois, como se sabe, todas as n o r m as e m a n adas do Poder
Pú blico deve m aj u star-se à cláusula que consagra, e m s u a d i m e n são
material, o p ri n cípio do 'substan tive due process of law' (CF, art. so,
LIV), eis q u e, no tema em q u estão, o post u lado da proporci o n a l i dade
q u alifi ca-se como parâmetro de afe rição da p ró p ri a c o n stituci o n a l i da
de m aterial dos atos estatais, consoante tem proclamado a j u ri s p r u ·
d ê n cia do S u p re m o Tri b u nal Federal (RTJ 1 60/ 1 40- 1 4 1 - RTJ 1 78/2 2- 24,
v.3.) : 'O Estado n ão pode l egislar a b u sivamente. A ativi dade legis
l ativa está n ecessariame nte sujeita à rígida observân cia de d i retriz
f u n dame ntal, q u e, e n co n t rando s u p o rte teórico n o p ri n cípio da p ro
porc i o n ali dade, veda os excessos n o r m ativos e as p rescrições i rrazo
áveis do Poder P ú b l i co. O p ri n cípio da proporci o n a l i dade - que extrai
a sua j u stifi cação dogmática de dive rsas cláusu las con stit u c i o n ais,
n otadamente daq ue l a que vei c u l a a garantia do substan tive due pro
cess of /aw - acha-se vocaci o n ado a i n i bi r e a n e utralizar os abu sos
do Poder P ú b lico n o exercício de suas f u n ções, q u alificando-se como
parâmetro d e afe ri ção da própria c o n stit u c i o n a l i dade m aterial dos
atos estatais. A n o rma estatal, que n ão vei c u l a q u a l q u e r conteúdo d e
1 5 . Sobre essa evo l u ção, a m p l a m ente, MATTOS, Sérgio Luís Wetze l d e . Devido processo legal e proteção d e direitos.
Po rto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 29-90.
1 6. ÁVI LA, H u m berto. Teoria dos princípios. 5' ed., cit., p. 1 48 e segs.
1 7 . BO NAV I D ES, Pau l o . Curso de Direito Cons titucional. 7' ed. São Paulo: M a l h e i ros Ed., 1 998; G U ERRA F I LHO, Wi l l i s
Santiago. " P r i n cípios da i s o n o m i a e da p ro p o rcional idade e p rivilégios p rocessuais da Fazenda P ú blica". Revis
ta de Processo. São Pa u l o : RT, 1 996, n. 82; GÓ ES, Gisele. O Princípio da Proporciona lidade no Processo Civil. São
Paulo: Sa raiva, 2004.
1 8. SI LVA, Virgílio Afo nso da. Direitos fundamentais - con teúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo: M a l h e i ros
Ed., 2009, p . 1 68 - 1 69.
68
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 9. M E N D ES, G i l m a r Ferrei ra. Direitos fundamen tais e con trole de constitucionalidade. 3' ed. São Pau lo: Saraiva,
2004, p . 46 e segs.; CASTRO, Carlos Roberto S i q u e i ra. O devido processo leg a l e os princípios da razoabilidade
e da proporcionalidade. Rio de janeiro : Forense, 2005, passim; LI MA, Maria Rosynete Olive i ra. Devido Processo
Legal. Po rto Alegre: Sérgio Anto n i o Fabris, 1 999, p. 274; F E R RAZ )r., Té rcio Sampaio. "Do amálgama entre razoa
b i lidade e p roporcional idade n a doutrina e n a j u ri s p rudência b rasi l e i ras e seu f u ndamento n o devido p rocesso
legal s u bstantivo". Direito constitucional. Barueri: Maneie, 2007, p . 37-46; LUCON, Pau lo H e n r i q u e dos Santos.
" D evido p rocesso legal su bstan cial". Leituras complementares de processo civil. Fredie D i d i e r ) r. (org.) 7' ed.
Salvador: Editora Jus Podivm, 2009, p. 382; ASSIS, Carlos Augusto de. An tecipação da tutela. São Paulo: M a l h e i
r o s , 200 1 , p . 63; BRAGA, Pau la S a r n o . Aplicação do Devido Processo Legal nas Relações Privadas. Salvador: j u s
Podivm, 2008, p. 1 88 segs.; FERNAN DES, D a n i e l A n d ré. Os princípios d a razoabilidade e d a ampla defesa. R i o
de Janeiro: Editora L u m e n j u ris, 2003, p . 4 1 - 4 2 ; BARROS, Suzana de To ledo. O princípio da proporciona lidade e
o controle de constitucionalidade das leis res tritivas de direitos fundamen tais. 3' ed. B rasíl ia: B rasíl ia j u rídi ca,
2003, p. 9 1 - 1 00.
20. ASSIS, Carlos Augusto de. A n tecipação da tu tela, cit., p. 64-65.
69
FREDIE DIDIER JR.
i m p u gnado afigu ra-se adeq uado (isto é , apto a p roduzi r o res u ltado
desej ado), n ecessário (i sto é, i n s u b stituíve l por outro meio m e n o s
gravoso e igu a l m ente efi caz) e pro p o rci o n a l e m s e n t i d o estrito (ou
seja, se estabelece u m a relação ponderada e ntre o grau d e rest rição
d e um pri n cípio e o grau de realização do princípio contraposto)"' " .
2 1 . MATTOS, Sérgio Luís Wetzel de. Devido processo le!Jal e proteção d e direitos. Po rto Alegre: Livraria do Advogado,
2009, p . 97. Confi ra-se, a i n da, a sistematização do posici o n a m e nto do STF sobre o tema, elaborada pelo autor
nas p . 92-96.
22. G U ERRA F I LHO, Wi l l i s Santiago. "Pri ncípios da isonomia e da proporcionalidade e privilégios processuais da
fazenda p ú bl i ca". Revista de Processo, n .82, São Paulo: RT, 1 996, n . 82, p . 6 1 ; G Ó ES, Gisele Santos Fernandes. O
Princípio da Proporciona lidade no Processo Civil, cit., p. n; SANTOS, G ustavo Ferrei ra. O princípio da propor·
ciona lidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federa l. Li m ites e possi b i l i dades. Rio de janeiro : Editora
L u m e n j u ris, 2004, p. 1 1 5 .
2 3 . BONAV I D ES, Pau l o . Curso de Direito Constitucional. 1 2• ed. rev. a m p . São Pau lo: Ma l h e i ros Ed., 20o2, p. 395;
G U ERRA F I LHO, W i l l i s Santiago. "Princípios da isonomia e da proporcionalidade e p rivilégios processuais da fa·
zenda p ú bl i ca". Revista de Processo, n .82, São Pau lo: RT, 1 996, n . 82, p . 75; ÁVI LA, H u m berto. "O que é 'devido
processo legal ?". Revista de Processo. São Pau lo: RT, 2008, n . 1 63, p. 56; SZA N I AWSKI, E l i m a r. "Apontame ntos
so bre o p ri n cípio da p roporcionalidade-igualdade" . Revista Trimestra l de Direito Civil. R i o d e j a n e i ro : Pad m a,
2000, v. 5, p. 7 1 .
24. ÁVI LA, H u m berto. " O q u e é 'devido processo legal' ?", cit., p . 56.
2 5 . ÁVI LA, H u m berto. "O q u e é 'devido processo legal' ?", cit., p . 56.
26. ÁV I LA, H u m berto. "O q u e é 'devido processo legal' ?", cit., p . 56.
70
N O RMAS F U N DA M E N T A I S D O PROCESSO C I V I L
2 7 . CANARIS, Claus-Wi l h e l m . Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. I nt rod u ção e
Tradução por A. M enezes Cordeiro. 2• ed. Lisboa: F u ndação Calouste G u l b e n kian, 1 996, p. 90.
28. "A promiscuidade do princípio do devido p rocesso legal, do ponto de vista funcional, com os postulados da
razoa b i l i dade e da proporcionalidade parece ser peculiar ao d i reito bras i l e i ro". ( MATTOS, Sérgio Luís Wetzel de.
Devido processo legal e proteção de direitos, cit., p. 1 2 1 .)
29. Como pensa ÁVI LA, H u m berto. " O q u e é 'devido processo legal' ?", cit., p. 56.
30. ÁVI LA, H u m berto. "O q u e é 'devido processo legal' ?", cit., p. 5 7 .
71
FREDIE DIDIER JR.
O d evid o p rocesso l egal a p l i ca-se, tam bém, às re lações j u ríd icas p rivadas . Na
verdade, q ualq u e r d i reito fundame ntal pode a p l i car-se ao â m b ito das relações jurí
dicas privadas, e o devi do p rocesso l egal é u m deles. A palavra " p rocesso", aq ui,
d eve ser co m p reendida e m seu sentido am p lo, conforme já visto: q ualq u e r modo de
p ro d u ção de n o rmas j u ríd i cas (j u risdicio nal, ad m i n i strativo, legis lativo o u n egociai).
Antes de exp l i car o te m a, convém frisar a discussão s o b re a apli cação da teoria
dos d i reitos f u n dame ntais n o âm bito p rivad o . Trata-se de estudar a chamada eficá
cia horizontal dos direitos fundamentais33 •
Na do utri na estrange i ra a q u estão é bastante controve rtida. Existe m , basi ca
m e nte, três teorias q ue tentam exp l i car o ass u nto: a) a teoria do sta te action, q u e
n ega a eficácia dos d i reitos f u n d a m e ntais nas re lações p rivadas, p o r entender q u e o
ú n ico sujeito passivo daq u eles d i reitos seria o Estado (é a q ue p revalece n o d i reito
n o rte-americano e p revalecia, até pouco tem po, n o d i reito suíço34); b) a teoria da
eficácia i n d i reta e mediata dos d i reitos fu n d a m e ntais na esfe ra p rivada, pela q ual
3 1 . MATTOS, Sérgio Luís Wetzel de. Devido processo lesai e pro teção de direitos, cit., p . 1 1 9.
3 2 . Sobre o tema, am plame nte, BRAGA, Pau l a Sarno. Ap licação do devido processo legal às relações privadas.
Salvad or: jus Podivm, 2008.
33- Sobre o tema, CANARIS, Claus-Wi l h e l m . Direitos fundamentais e direito privado. SARLET, l n go Wolfgang e PI NTO,
Paulo Mota (trad .). Coi m b ra: Almedi na, 2003; SARM ENTO, Daniel. "A v i n c u lação dos particu lares aos d i reitos
fu ndam entais no d i reito com parado e no Brasi l " . Leituras complementares de processo civil. 5 ed. Salvad or:
Ed itora j u s Podivm, 2005; A nova interpretação constitucional. Rio de janeiro: Ren ovar, 2003, p. 1 9 3-284; Direi
tos fundamentais e relações privadas. Rio de j a n e i ro: L u m e n j u ris, 2004; ALEXY, Robert. Teoría de los derechos
fundamen tales. Madrid: CEPC. 2002, p . 506- 523; AN DRADE, josé Carlos Viei ra de. Os direitos fundamen tais na
Constituição Portuguesa de 1 976. 2 ed. Coi m b ra: Almedi na, 200 1 ; SARLET, l n go. A eficácia dos direitos funda
mentais. 3• ed. Po rto Alegre: Livraria do Advogado, 2003; __ . (org.) Constituição, direitos fundamen tais e
direito privado. Po rto Alegre: Livraria do Advogado, 2003; STE I N M ETZ, Wi l s o n . A vinculação dos particu lares a
direitos fundamen tais. São Paulo: M a l h e i ros Ed., 2004; TORRES, Ricardo Lobo (org.). Teoria dos direitos funda
mentais. 2• ed. Rio de janeiro: Ren ovar, 200 1 ; S I LVA, Vi rgílio Afo nso da. A constituciona lização do direito. Os
direitos fundamen tais nas relações en tre particulares. São Paulo: M a l h e i ros Ed., 2005; S O M B RA, Th iago Luis
Santos. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. 2• ed. São Paulo: Atlas, 201 1 .
34- De acordo com a i n form ação d e Vi rgíl i o Afo nso da Si lva (A constitucionalização do direito - os direitos funda
mentais nas relações en tre particulares. São Paulo: M a l h e i ros, 200 5 . p. 8 1 -83), a Suíça não adota a teoria do
state action, pois, após a refo rma constitucional de 1 999, a constitu ição suíça passou a conter um artigo q u e
expressamente p revê a eficácia d o s d i reitos f u n damentais n a s relações p rivadas (art. 3 5 , 3 ) : "As autoridades
p ú b licas devem cu idar para que os d i reitos f u n damentais, na medida e m que sejam aptos para tanto, tenham
72
N o R M A l F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
eficácia também na relação entre p rivados". Segu ndo o autor, a Suíça adota o modelo da eficácia i n d i reta dos
d i reitos f u n d ame ntais.
35. SARM ENTO, D an ie l . "A v i n c u l ação dos particu lares aos d i reitos f u n damentais no d i reito com parado e no B rasi l " .
I n Leituras complementares de processo civil. 7' ed. Salvador: Editora j u s P o d i v m , 2009; tam bém em A nova
interpretação constitucional. Rio de j a n e i ro : Ren ovar, 2003, p. 1 93 - 284.
36. SARMENTO, Dan i e l . A vinculação dos particulares aos direitos fundamen tais no direito comparado e no Brasil, cit.
73
FREDIE DIDIER JR.
ad m i ssível h ave ndo j u sta causa, ass i m reco n h ecida e m p roced i m e nto q u e assegu re
d i reito de d efesa e de recu rso, nos termos p revistos no estatuto".
O S u p re m o Tri b u nal Federal j á adotara ente n d i m ento s e m e l h ante, e m bora sem
fazer refe rência à p o l ê m i ca do utri n ária da eficácia h o rizontal dos d i reitos fu n da
m e n tais. Veja esse j u lgado do S u p re m o Tri b u n a l Federal: "COOPE RATIVA - EXCLUS Ã O
D E ASSOCIADO - CARÁTER P U N ITIVO - D EVIDO PROCESSO LEGAL. Na h i pótese de exc l u
s ã o de associado deco rre nte de cond uta contrária a o s estatutos, i m põe-se a obser
vância d o devido p rocesso legal, viab i l izando o exe rcíci o da a m p l a d efesa" . (STF, 2a
T., R E n . 1 58 . 2 1 5 - 4/RS, rei . M i n . Marco A u ré l i o, p u b l icado n o DJ d e 07.06 . 1 997).
Ass i m , tam bém n ão é lícito, no âm bito das re lações p rivadas, restri ngir q ual
q ue r d i reito sem a observância d o devido processo le8al.
74
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I l
O art. 8° d o CPC i m põe q u e o ó rgão j u lgado r, no p rocesso civi l b rasi l e i ro, " res
guarde e p ro m ova" a d i g n i dade d a pessoa h u m a n a . O d i s p ositivo é aparenteme nte
d e s n ecessário, pois a d i g n i dade d a pessoa h u m a n a j á é um dos f u n d a m e n tos d a
Re p ú b l i ca (art. 1 °, 1 1 1 , CF/1 988) - n esse s e n t i d o , possui a n at u reza d e n o r m a j u rí
d i ca - e é um d i reito fu n da m e ntal - n esse sentido, poss u i a n atu reza d e situação
j u ríd i ca ativa.
A d i g n i dade da pessoa h u mana pode ser considerada como sobre p ri n cípio
c o n stitu cional, d o q ual todos os p ri n cípios e regras re lativas aos d i reitos fu n dam e n
tais seriam d e rivação, a i n d a q u e c o m i ntensidade variáveP7•
A d i g n i dade da pessoa h u m ana pode ser considerada um d i reito fu n damental
d e conte ú d o co m plexo, formado pelo conj u nto d e todos os d i reitos fu n dame ntais,
p revistos ou n ão n o texto constituc i o n a l .
A eficácia vertical d a s n ormas relativas a o s d i reitos f u n dame ntais d i rige-se à
reg u l ação da relação do Estado com o i n d ivíd u o . O exe rcício d a fu n ção j u risdicional
é exe rcíci o d e f u n ção estatal . Por isso o CPC i m põe ao j u iz que o bserve esse co m a n
d o constit u c i o n a l .
O ó rgão j u lgador p rese nta o Estado e , n essa ci rcu n stância, deve " resguardar"
a dign idade da pessoa h u mana; resguardar, nesse contexto, é, de um lado, a p l i car
corretame nte a norma j u ríd ica " p roteção d a d i g n i dade d a pessoa h u m a n a" e, d e
outro, n ão violar a d i g n i dade (por exe m p lo, n a co n d u ção d o d e po i m e nto d a parte) .
O ó rgão j u lgad o r tam bém d eve " p ro m ove r" a d i g n idade d a pessoa h u mana.
H á, n o verbo p ro m ove r, a exigê n cia de um co m po rtam e n to mais ativo do ma
gistrado . I sso sign ifica q ue, e m algu m as situações, o juiz poderá tomar, até m e s m o
d e ofício, m e d idas para efetivar a d i g n i dade d a pessoa h u mana, além d e p o d e r
val e r-se da cláusula geral de ati p i cidade (art. 5 36, § 1 o) para a execução do d i reito
f u n damental à digni dade.
Dois exemplos: a) exigência de res peito à o rd e m cro n o l ógica d e concl u são (art.
1 2); n o caso d e grave violação à d i g n i dade d a pessoa h u m a n a, q u e n ão se en caixe
em um dos i n cisos q u e exce pci o n a m a regra d e o bservância d a cro n o l ogia da c o n
c l u são; poderia o j u i z "fu rar a fi la", para pro m over a d i g n i dade d a pessoa h u m an a;
b) p ri o ridad e n a tramitação p rocess ual; pessoa q u e seja p o rtad o ra d e d o e n ça grave,
m as q u e não esteja no ro l do art. 1 .048, I; para p ro m over a dignidade de pessoa
h u m ana, o j u i z poderia dete r m i n a r o p rocessam e nto p ri o ritário .
3 7 . Sobre o assunto, SARLET, l ngo. Disnidade d a pessoa humana e direitos fundamentais. 2 • ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2002, p . 89 e segs.
75
FREDIE DIDIER JR.
38. Sobre a última parte, SARLET, l ngo. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. 2' ed., cit., p. 90
39. SARLET, l n go. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. 2' ed., cit., p . 1 1 0 e segs.
76
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
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FREDIE DIOIER JR.
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N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
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FREOIE DIOIER JR.
Tam bé m deve s e r assi m a apli cação d a m u lta do art. 7 7 , § 2°, CPC. Deve rá o
m agistrado, ao expedi r a o rd e m o u o m andado para cu m p ri m e nto da d i l igên cia, p ro
videnciar adve rti r esses sujeitos (partes ou tercei ros) d e q u e o seu co m po rtam e nto
recalcitrante poderá res u ltar na a p l i cação da m e n ci o n ada m u lta. Sem essa com u n i
cação/adve rtê ncia p révia, a m u lta porventu ra a p l i cada é i nválida, p o r desrespeito
ao p ri n cípio do contrad itóri o . O res p o n sável p recisa saber das possíve is con seq u ê n
cias de s u a co n d uta, até m e s m o para d e m o n strar a o m agi strado a s razões pelas
q uais não c u m p ri u a ordem, o u n ão a fez c u m p ri r, o u até m e s m o para d e m o n strar
q u e a c u m p ri u ou não cri o u q ualq u e r o bstác u l o para o seu c u m pri m e nto. Afi nal, o
contraditório se pe rfaz com a i nfo rmação e o ofereci m e nto d e oport u n i dade para
i nf l u e n ciar n o conte ú d o da deci são; participação e poder de i nf l u ê n cia são as pala
vras-chave para a co m p reen são desse princípio constitucional. Esse dever de adve r
tência foi exp ressam e nte con sagrado no § 1 o do art. 77 do CPC.
Correta tam bém a s o l u ção encontrada pelo S u peri o r Tri b u nal de j u sti ça, n o j u l
gam e nto do Rec u rso Especial n . 250. 7 8 1 /SP, re i . M i n . J o s é De lgado, D J d e 1 9 .06. 2000:
" P rocess ual civi l . Litigância de m á-fé. Req u i s itos para s u a configu ração . 1 . Para
a c o n d e n ação em l itigância de má-fé, faz-se n ecessári o o p ree n c h i m e n to de três
req u i sitos, q uais sej a m : q u e a c o n d uta da parte se s u b s u m a a uma das h i póteses
taxativa m e nte e l e n cadas n o art. 1 7, do C PC; q ue à parte te n h a sido ofe recida o p o r
t u n idade de d efesa (CF/1 988, art. 5°, LV); e q u e da s u a c o n d uta res u lte p rej uízo
p rocessual à parte adve rsa."
A d i m e n são su bstancial do contraditório é o f u n dame nto para que se consi
d e re co m o f u n damental o d i reito a ser aco m pan h ado p o r u m advogado . O aco m pa
n h a m e nto téc n i co é i m po rtantíssi m o, ao m e n o s como regra, para a efetivação d o
d i reito a o contraditó ri o . Com põe, por i s s o m e s m o, o conteúdo mín i m o d o p ri n cípio
do devi d o p rocesso legal.
A parti r destas ideias, podemos avançar u m po uco mais.
Vejamos a q uestão da fo rm ação dos p ro n u n ciame ntos j u diciais e o p ri n cípio
d o contraditó ri o .
Os p ro n u n ciame ntos j u diciais pautam -se, o bviamente, e m q u estões de fato e
de d i reito. O j u iz exa m i n a a q u estão de fato e, e m seguida, exam i n a a q u estão de
d i reito, para poder deci d i r.
o juiz pode basear-se em fa to que não foi ale3ado pelas partes. O art. 493 do
CPC determ i n a que "se, depois da p ro positu ra da ação, algum fato con stitutivo,
m odificativo ou exti ntivo do di reito i nf l u i r n o j u lgam ento do m é rito, caberá ao ó rgão
j u risdicional tomá-lo em consideração, de ofíci o ou a req u e ri m e nto da parte, no mo
m e nto de p rofe ri r a decisão . " O juiz pode, portanto, levar e m consideração ex otficio
fato s u p e rve n i e nte re l evante para a s o l u ção da causa. S u cede q ue, para observar o
80
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
contraditório, d eve antes o uvi r a s partes sobre esse fato - é, aliás, o q ue dete rm i n a
o par. ú n . desse m e s m o art. 493.
Esse d i s p ositivo concretiza a regra geral p revista n o art. 10 do CPC, tam bém
ela con sagrado ra do p ri n cípio do contraditório: "O j u iz n ão pode decid i r, e m grau
alg u m de j u risdição, com base e m f u n d a m e nto a res peito do q ual não se ten h a
d a d o à s partes o p o rt u n i dade de se man ifestar, a i n d a q ue se trate de m atéria sobre
a q ual deva deci d i r de ofício". O deve r é refo rçad o pelo art. 9 3 3 , CPC, q u e d i sci p l i n a
o p rocesso e m tri b u n ais.
H á q u estões fáticas que podem ser apreciadas pelo m agi strado ex ofticio. O
j u i z pode con hecer d e fatos q u e n ão te n h am sido alegados. Ele pode trazer, ele
pode aportar fatos ao p rocesso. M as o ó rgão j u risdicional não pode l evar e m con
s i d e ração u m fato de ofício, sem que as partes t e n h a m tido a o p o rt u n idade de se
man ifestare m a res peito.
I m agi n e a segui nte situação : A e B estão l itigando, cada um argu m e nta o q ue
q u is e o j u iz, n o m o m e nto d a sente n ça, baseia-se e m u m fato q u e não foi alegado
pelas partes, n ão foi discutido por elas, mas está p rovado nos autos. O j u i z n ão
pode faze r isso sem s u b m eter esse fato ao p révio de bate entre as partes. Isso fe ri
ria, escan caradame nte, o contraditó ri o . A decisão fo rmar-se-ia com base e m q ues
tão de fato s o b re a q ual as partes não falaram, e, p o rtanto, basear-se-ia e m q uestão
a res peito da q ual as partes não p u d e ram ter exercitado o " poder d e i n f l u ê ncia",
não p u d e ra m dizer se o fato aco nteceu o u n ão aco ntece u, o u aco ntece u daq uela
o u d e outra fo rma.
E, aq u i , entra uma d i sti n ção que é m u ito útil, mas pouco lem b rada. Uma c i r
c u n stância é o j u iz poder co n h ecer de ofício, poder agi r de ofício, sem p rovocação
da parte. O u t ra c i rcu n stância, bem d ifere n te, é poder o ó rgão j u risdicional agi r sem
ouvi r p reviamente as partes. Poder asir de ofício é poder asir sem provocação; não
é o mesmo que asir sem ouvir as partes, q u e n ão l h e é permitido.
Vam o s exam i nar o te m a e m re lação às q uestões de direito.
Há um ve l h o brocardo iura novit curia (do D i reito c u i d a a corte) . H á, ai n d a,
o u t ro da mihi factum dabo tibi ius (dá- m e os fatos, q ue e u te darei o d i reito).
N ão pode o ó rgão j u risdicional deci d i r com base e m um arg u m e nto, uma q ues
tão j u ríd ica o u uma q u estão de fato não postos pelas partes n o p rocesso. Pe rce ba:
o ó rgão j u risdicio nal, por exe m plo, verifica q u e a lei é i n constituci o n a l . N i nguém
al ego u q u e a lei é i n c o n stituci o n a l . O autor ped i u com base e m u m a dete rm i n ad a
lei, a outra parte alega q ue essa lei n ão se a p l i cava ao caso . O j u i z entende de o u
tra manei ra, a i n d a n ã o ave ntada pelas partes: " Essa l e i apo ntada pelo autor co m o
fu n damento do s e u ped i d o é i n co n stitucio n a l . Po rtanto, j u lgo i m p rocedente a de
m a n da". O ó rgão j u risdicional pode fazer isso, m as d eve antes s u b m eter essa n ova
abordage m à discussão das partes.
81
FREDIE DIDIER )R.
4 3 . OLIVE I RA, Carlos Al b e rto Alvaro d e . " Po d e res d o j u iz e visão coope rativa d o p rocesso". Revis ta d e Direito
Pro cessual Civil. Cu rit i ba: G ê n esis, 2003, n. 27, p. 28-29; D I D I E R ] r., Fred i e . " Princípio do contraditório: as
pectos práticos". Revis ta de Direito Processua l Civil. C u ritiba: Gênesis, 2003, n. 29, p. 5 1 0; B E DAQ U E, ]osé
Roberto dos Santos. "Os e l e m e ntos o bj etivos da demanda exa m i nados à l u z do contrad itó rio". Causa de
pedir e pedido no p ro cesso civil (q ues tões po lêmicas). José Roberto dos Santos Bedaq u e e José Rogério
Cruz e Tucci (coord . ) . São Pau l o : RT, 2002, p . 39-42; G RECO, Leonardo. "O p r i n cípio do contrad itório". Revis ta
Dia lética de Direito Processual. São Pau l o : D ialética, 2005, n. 24, p . 76- n; CABRAL, A n t ô n i o do Passo. "O
contrad itório como dever e a boa-fé processual o bjetiva". Revis ta de Processo. São Pau l o : RT, 2005, n. 1 26;
CABRAL, Anto n i o do. "11 p r i n c i p i o dei contradd itto rio come d i ritto d ' i n f l u e nza e dovere d i d i battito" . Rivis ta
Di Diritto Processua le. M i la n o : CEDAM, 2005, v. 2, n. 2, p . 449-464; ZAN ETI ] R., H e r m e s . A cons tituciona lização
do processo. O modelo cons titucion a l da jus tiça brasileira e as relações en tre processo e constituição. 2• e d .
revista, a m p l i ada, alterada. São Pau l o : Atlas, 20 1 4, p . 1 80; N U N ES, D i e r l e ]osé Coe l h o . Processo jurisdicion a l
democrático. C u ritiba: ] u ruá, 2008, p . 224-2 3 1 ; M I T I D I ERO, D a n i e l . Co laboração no processo civil. São Pau l o :
RT, 2009; C U N HA, Leonardo Carn e i ro da. A a tendibilidade d o s fa tos supervenientes no processo civil: u m a
análise compara tiva en tre o sistema portusuês e o brasileiro. Coi m b ra: A l m e d i n a, 20 1 2, p . 6 1 ; BARREI ROS,
Lor e n a M i randa. Fundamentos cons titucionais do princípio da cooperação processual. Salvado r : E d i t o ra j u s
Podivm, 201 3, p . 1 98 - 1 99; CAVA N I , Renzo. "Contra as ' n u l i dades- s u r p resa': o d i reito f u n d a m ental a o contra
d itório d i ante da n u l i dade p rocess u a l " . Revista de Processo. São Pau l o : RT, 20 1 3, n . 2 1 8, p . 6 5-80; MALLET,
Estevão . " N otas s o b re o p r o b l e m a da chamada 'decisão- s u r p resa"'. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2 0 1 4,
n. 233, p . 4 3 - 6 3 .
82
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I l
4 4 . O LIVEI RA, Carlos A l b e rto Alvaro d e . "Garantia d o Contrad itóri o " . Garan tias Cons titucionais d o Processo Civil.
]osé Rogé rio Cruz e Tucci (coord.). São Pau l o : RT, 1 999, p. 1 47 - 1 48 .
83
FREDIE DIDIER JR.
A parte final d o art. 7o do CPC i m põe ao ó rgão j u lgad o r o dever de zelar pelo
efetivo contraditóri o . C o m o se já não bastasse, o art. 1 3 9, I , ratifica: "O juiz d i rigi rá
o p rocesso conform e as d i s posições d este Código, i n c u m b i n d o - l h e : I assegu rar às -
4 5 . Expressão mais conte m porân ea, relacio n ada à igualdade m aterial (ABREU, Rafael Sirangelo Bel m o nte d e . lsual·
dade e processo civil - perfis conceitual, funcional e estrutural do direito fundamen tal à isonomia no processo
civil do Estado Constitucional. Disse rtação de m estrad o. Programa de Pós-grad uação em D i reito da U n iversida
de Fede ral do Rio Grande do Sul. Po rto Al egre, 201 4).
46. ABREU, Rafael S i rangelo B e l m o nte de. lsua ldade e processo civil - perfis conceitual, funcional e estrutural do
direito fundamental à isonomia no processo civil do Estado Constitucional, p . 1 02.
84
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
47. M E N DONÇA ) r., Delosmar. Princípios d a ampla defesa e d a efetividade no processo civil brasileiro. S ã o Pau lo:
M a l h e i ros Ed., 200 1 , p . 55.
48. M E N DONÇA ) r., Delosmar. Princípios da ampla defesa e da efetividade no processo civil brasileiro, p . 5 7 .
85
FREDIE DIDIER JR.
H á gran de preocu pação e m reafi rmar essa garantia c o n stituci o n a l . O CPC re pe
te a exigê ncia n o art. 1 89.
O art. 1 89 determ i n a que alg u n s p rocessos devem tram itar e m segredo d e
j u stiça: 1 - e m q ue o exija o i nteresse p ú b l i co o u social; 1 1 - q u e ve rs e m sobre casa
m e nto, separação d e corpos, d ivórcio, separação, u n ião estável, fi l i ação, a l i m e ntos
e guarda d e crian ças e ado l escentes; 1 1 1 - e m q u e constem dados p rotegidos pelo
d i reito constitucio n a l à i nt i m i d ad e; IV - q ue versem s o b re arbitrage m , i n cl usive
s o b re c u m p ri m e nto d e carta arbitral, desde q ue a confi d e n cial idade est i p u lada n a
49. Sobre a s d uas fu nções d a p u b licidade p rocessual, ABDO, Helena. Mídia e processo. São Pau l o : Saraiva, 201 1 . p .
48· 5 5 -
86
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
so. Há u m a aparente p revalência do d i reito à i nformação e m relação à p roteção da i ntim idade. Este eventual
confl ito d e d i reitos fundamentais não pode ser resolvido a priori, como a redação do i nciso dá a entender;
somente à l u z do caso concreto, aplicado o pri n cípio da proporcionalidade, será possível verificar q ual dos dois
d everá prevalecer. O juízo de p o n d e ração é, sem p re, a posteriori, e feito pelo magistrado. A n d ré Ramos Tavares
adverte que a colisão e ntre a p u blicidade e a i n t i m idade não é a ú n ica q u e pode aco ntecer: "Há i n ú m e ros
out ros que podem e ntrar e m cena, em cada caso concreto (no respectivo p rocesso), tais como: dignidade
da pessoa h u mana, privacidade, h o n ra e d i reito à i m agem". (Reforma do judiciário no Brasil Pós-88 - (Des)
estruturando a justiça. São Pau l o : Saraiva, 2005, p. 34).
5 1 . Nesse sentido, e n u n ciado n . 15 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "As arbitragen s que e nvolvem
a Ad m i n istração P ú b lica respeitarão o p r i n cípio da p u b l i cidade, observadas as exceções legais (vid e art. 2•, §
3•, do Projeto n• 406/20 1 3)".
87
FREDIE DIDIER JR.
o rigem n egociai. Caso desej e m o p rocesso sigil oso, a s partes deve m e n cam i n h ar-se
para a arbitrage m .
H á u m a íntima relação entre o p ri n cíp i o da p u b l i cidade e a regra d a motivação
das decisões j ud i ciais, na medida em q ue a p u b l ici dade torna efetiva a partici pação
no controle dessas m e s m as decisões. A p u b l icidade é i n st ru m e nto d e efi cácia da
garantia da m otivação.
E m um sistema d e p recede ntes o b ri gatórios, co m o o b ras i l e i ro, a p u b l ici dade
gan h a contornos a i n d a mais p e c u l i a res e i m po rtantes . Todo p rocesso passa a ser
d e i nteresse d e várias pessoais, pois dele pode res u ltar um p recedente a p l i cáve l a
casos atuais e fut u ros.
É p o r isso q u e, ao regu lar a divulgação dos p recede n tes fi rmados em j u lga
m e nto de casos re petitivos, o CPC determ i n o u (art. 979, §§ 1 °, 2°, e 3°): "§ 1 ° Os t ri b u
n a i s manterão banco eletrô n ico de dados atualizados com i n formações específicas
s o b re q u estões de d i reito s u b m etidas ao i n ci d e nte, co m u n i cando-o i m ed iatame nte
ao C o n se l h o Nacional de j u stiça para i n cl u são n o cadastro. § 2° Para possi b i l itar a
i d e n tifi cação dos p rocessos a b rangidos pela deci são d o i n ci d ente, o regi stro ele
t rô n ico das teses j u ríd i cas co n stantes do cadastro conterá, n o mín i m o, os f u n da
m e ntos d ete rm i nantes d a deci são e os d i s positivos n o rm ativos a ela relac i o n ados.
§ 3o A p l i ca-se o d i s posto n este artigo ao j u lgame nto d e recu rsos re p etitivos e da
re p e rcu ssão geral e m recu rso extrao rd i n ári o " .
N o B ras i l , há a tra n s m issão ao vivo, pela televisão, de j u lgame ntos do S u p re
m o Tri b u nal Federa l . Ao q u e nos con sta, é exp e ri ê n ci a i n éd ita n o m u n d o . Trata-se,
i n d uvidosamente, d e uma téc n i ca d e co n c retização da d i m e n são exte rna do d i reito
f u n dam e ntal à p u b l i ci dade p rocess u a l . o fe n ô m e n o tem, como q uase t u d o, as pec
tos positivos (disse m i n ação da i nfo rmação j u rídi ca, s o b retudo do posici o n a m e nto
do STF5') e n egativos (es petac u l a ri zação das sessões e o enfraq ueci m e n to da cole
giali dade do j u lga m e n to53) . Os as pectos n egativos parecem ser p roduto da falta de
5 2 . "Ao ângulo p rático, a s tran s m i ssões d o s j u lgame ntos t ê m produzido resu ltados i nteressantes. Não é desprezí·
vel a visi b i l idade q u e grandes q u estões nacionais gan h a ram q uando exa m i n adas pelo S u p re m o . O j u lgamento
do m e n salão, a q u estão das pesqui sas com célu las-tro n co, o p ro b l e m a do antisse m itismo como racismo e a
garantia de te rras às popu lações i n díge nas são casos e l o q uentes de m o b i l i zação da sociedade em torno de
sérios problemas do país. Para dizer o m í n i m o . nossa s u p rema corte é hoje u m fóru m de discussão demo
crática mais relevante e respeitado do q u e o próprio Congresso Nacional. Todo esse p rocesso de con strução
i n stitucional do Poder j udiciário foi pote ncializado pela TV j u stiça e, e m particular, pelo televisioname nto das
sessões do STF. A re percussão dos j u lgamentos desperta a cidadania e estabelece um diálogo profícuo com as
demais autoridades políticas. Os gan hos e m termos de transparência e legiti mação das decisões têm c o m p e n
sado, plenamente, eventuais desgastes. A o fim e a o c a b o , discussões deste m peradas p o d e m ser evitadas c o m
o a p e l o ao velho bom senso. N e m t o d a ideia o riginal é b o a , assi m como n e m t o d a boa ideia é original. Mas
isso não i m pe d i u q u e o Bras i l desse u m a ideia boa e original ao m u n d o " . ( B I N E N BOj M, G ustavo. "A j u stiça na
TV" . Fo lha de S ã o Paulo, 02.05. 2009, p. 3).
53. S o b re esse ú lti m o aspecto, convém transcrever o que d i s seram Vi rg i l i o Afo n s o da Si lva e C o n rado H ü b n e r,
m otivados p o r séria refrega e n t re dois m i n i st ros do STF, t ra n s m itida ao vivo pela TV j u stiça: "Com m a i o r
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N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
m atu ridade n o uso da tec n o l ogia, q u e potencial iza a tran s parê n cia d o exe rcício d a
f u n ção j u ri s d i c i o n a l . O c o n t r o l e pela o p i n i ão p ú b l i ca, p ri n ci pa l m e nte pela i ntelectu
ali dade acad ê m i ca e pelos demais o p e rado res d o D i reito, é o p ri n ci pal i n stru mento
d e p reve n ção e com bate a essas d i storções, e m b u sca d o a m ad u reci m e nto i n stitu
cional. O certo é q u e n ão se pode retroceder n o particu lar, com s o l u ção que vete o u
restrinja a tran s m i ssão dos j u lgam entos.
A p u b l ici dade em p rocessos eletrô n i cos tem as suas pecu l i aridades. Com o ob
j etivo de dar efetividade ao § 6° do art. 1 1 da Lei n. 1 1 .4 1 9/2006, o Co n se l h o Naci o nal
de j ustiça editou a Reso l u ção n. 1 2 1 /201 0, com redação alte rada pela Reso l u ção n .
1 43/20 1 1 , cuja t ran scri ção é reco m e n dável :
O PRES I D ENTE DO CONSELHO NAC I O NAL D E J U STI ÇA, n o u s o de s u as
atri b u ições conferi das pela Constituição da Re p ú b l ica, es pecial m e nte
o d i s p osto n o i n ciso I, §4o, art. 1 03 - B .
fre q u ê n cia, o que se pode i d e ntificar nesse e m a ran hado de decisões, d i s p o n íveis às vezes q uase e m te m po
real, é tão-so m e nte a s o m a de 1 1 decisões i n d iv i d u ais, q u e não têm a m e n o r p retensão de constru i r u m a
posição i n stitucional consistente. A i n d a q u e a d i s s i d ê n c i a i nterna possa s e r sau dável, e l a n ã o p o d e i m p l icar
uma falta d e c o m p ro m i s s o com uma posição i n stitucional. O d e bate s o b re a forma de deci são n o S u p re m o,
s o b re a a u s ê n c i a de u m a voz i n stitucional em gra n d e parte causada pela i n s istê ncia em p rivilegiar as vozes
i n dividuais de seus m i n i stros-, é o que mais i m p o rta. E, se consistência decisória é uma das m a i o res con
tri b u ições que u m t r i b u n a l c o m o o STF poderia dar a uma d e m o c racia, pode-se dizer que e l e tem fal hado
nessa tarefa. E m b o ra a t ra n s m i ssão ao vivo d e suas sessões não seja a causa dessa falta d e u n idade i n st i t u
cional, não é i m p l a u síve l especular q u e ela a i n t e n sifiq u e . Se descobrirmos q u e é isso o q u e oco rre, há q u e
p e n s a r a sério e m alternativas. Todos t e m o s p a l p i tes a res peito, m a s a resposta não é ó bvia e exige m a i s
estudo. Saber se a d i scu ssão e n t re os m i n i stros G i l m a r M e n des e J o aq u i m B a r b o s a f e r e a i m agem d o t r i b u
nal n ão é t ã o rel evante q u anto o si ntoma q u e esse e p i s ó d i o pode representar: alguns m i n istros c o m e ç a m a
a p roveitar o " m o m e n t u m " televisivo para d i rigi r-se excl usivamente ao p ú b l i c o externo, em vez de i n terag i r
e n t re si, n o m e l h o r espírito d e u m a d e l i b e ração colegiada. To r n a m- s e c e l e b ridades, o q u e é p e rigoso. Talvez
estejam p rod u z i n d o, a tít u l o d e uma sedutora transparê n c i a de s u perfície, um i n d esejável p o p u l i s m o j u d i
c i a l . O t ri b u nal v e n d e u m a e e n t rega o o utro. E n ã o perc e b e m o s " . ( S I LVA, Virgí l i o Afonso, H Ü B N ER, Con rad o .
"O S T F e o p o p u l i s m o j u d i ci a l " . Fo lha d e São Pa ulo, 1 1 .05. 2009, p . 3). E m l i n h a b e m parecida, M arce l o Neves:
" Parece-me, porém, q u e a tran s m issão ao vivo dessas sessões, na forma atual, serve m e n o s à transparência
do q u e à es petacularização . Além disso, a p rática i n stitucional de votos longuíssimos lidos perante as câm e ras
televisivas sob recarrega tem poral m e nte um ó rgão já exposto a u m a extrema p ressão tem poral. Não se trata
de uma sessão de trabal ho p rod utiva e eficiente, m as antes de u m a boa dive rsão para o p ú b lico. Por f i m , o
próprio custo da TV j u stiça como u m todo deveria ser q u estionado em um país com amplas demandas em áre
as carentes de recurso". ( N EVES, M arce lo. "A 'desrazão' sem d i álogo com a ' razão' : teses p rovocatórias sobre
o STF". Disponível em http://www.conj u r.com . b r/201 4-out - 1 8/des razao-dialogo- razao-teses- p rovocatorias-stf,
consu ltado em 1 7 .02.20 1 5.)
89
fREDIE DIDIER JR.
90
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
M i n i stério da Faze n d a;
IV - n o m es dos advogados;
V - registro j u nto à O rd e m dos Advogados do B ras i l .
§ 1 °. A consu lta ficará restrita à s segu i ntes situações: (Redação dada
pela Reso l u ção n o 1 43, de 30. 1 1 . 201 1 )
I a o i n ciso I d a cabeça d este artigo, nos p rocesso cri m i nais, após o
-
91
FREOIE DIOIER JR.
1 1 1 - se pessoa n at u ral:
a) nacionalidade;
b) estado civi l;
c) n ú m e ros dos docu m entos d e ide ntidade e dos respectivos ó rgãos
exped idores;
d) fi l i ação; e
e) o e n d e reço residencial ou d o m i c i l i ar.
IV - se pessoa j u rídica o u asse m e l h ada, e n d e reço da sede; e
V - a relação dos feitos distri b uídos e m tram itação contendo os n ú
m e ros, s u as classes e o s j uízos d a tramitação o rigi n ária.
§ 1 °. Não s e rá i n c l uído n a relação de que trata o i n ciso V o p rocesso
e m que h o uve r gozo do b e n efício d e s u rsis (art. 1 6 3, § 2° da Lei no.
7 . 2 1 0, de 1 984) o u q ua n d o a pena já tive r sido extinta o u c u m p ri d a,
salvo para i n stru i r p rocesso pela p rática de nova i nfração penal o u
o utros casos exp ressos e m lei (art. 202, d a Lei 7 . 2 1 0, d e 1 984).
§ 20. A ausência de algu n s dos dados n ão i m pedirá a expedi ção da
certidão n egativa se n ão h o uver d úvida q u anto à i d e ntificação fís ica
d a pessoa.
Art. 8o. A certidão j u d icial, cível o u cri m i nal, será n egativa q u a n d o
não h o uve r feito e m tra m itação contra a pessoa a res peito da q ual
foi sol icitada.
92
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
A Conven ção A m e ricana de D i reitos H u man os, Pacto de São j osé da Costa Ri ca,
no a rt. 8, 1 , p revê:
"To d a pessoa tem o d i reito a ser o uvida c o m as devidas garantias e
d e n t ro de u m p razo razoáve l, p o r u m j u iz o u t ri b u n a l c o m pete nte,
93
FREOIE DtDIER JR.
54. Tam bé m ass i m , o Tratado de Roma: "Toda pessoa tem d i reito a q u e s u a causa seja exa m i n ada e q u itativa e
p u blicamente n u m p razo razoável, por um t ri b u nal i n de p e n d e nte e i m parcial i nstituído por lei, q u e decid i rá
sobre seus d i reitos e o b rigações civis ou sobre o fundam ento de q u a l q u e r acusação em matéria penal contra
ela d i rigida." (art. 6•, 1 , Convenção E u ropeia para Salvaguarda dos D i reitos do Homem e das Liberdades F u n ·
damentais, s u bscrita e m R o m a n o dia 0 4 de n ovembro d e 1 950).
55. P I OVESAN, Flavia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 4' ed. São Pau lo: Max Li monad, 2000.
p. 79·80.
56. TUCCI, José Rogério Cruz e . "Garantia do p rocesso sem d i lações i n d evidas". Garan tias cons titucionais do
processo civil. São Paulo: RT, 1 999, p. 2 59-260.
94
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
(. . .)
P o r o u t ro lado, não p o d e rão s e r taxadas de ' i n d evidas' as d i l ações
p r o p o rc i o nadas pela atuação dolosa da d efesa, q u e, e m algu mas oca
s i ões, d á azo a i n ci d e ntes p rocessuais tota l m e nte i m p e rt i n entes e
i rrelevantes.
5 7 . TUCCI, ]osé Rogério Cruz e. "Garantia do processo sem dilações i n d evidas". Garan tias constitucionais do proces
so civil. São Pau lo: RT, 1 999, p. 2 39; A N N O N I , Danielle. A responsabilidade do Estado pela demora na prestação
jurisdicional. Rio de janeiro: Fore nse, 2003, p. 85; GARCIA, ]osé Antonio Tom é . Pro tección procesal de los dere
chos humanos ante los tribunales ordinários. Madri: Montecorvo, 1 987, p. 1 1 9.
58. TUCCI, José Rogério Cruz e. "Garantia do p rocesso sem d i l ações i n d evidas". Garan tias constitucionais do pro
cesso civil. São Pau l o : RT, 1 999, p. 2 39-240.
95
FREDIE DIDIER JR.
O par. ú n . do art. 7o da Lei n. 4 . 7 1 7/1 965 (Lei da Ação Po p u lar) tam bé m poss u i
regra q ue s e rve a esse d i reito f u n dam ental: "O p roferi m e nto d a sentença a l é m d o
p razo estabelecido p rivará o j u iz da i nc l u são e m l i sta de m e reci m e nto para p ro
m oção, d u rante 2 (dois) an os, e acarretará a pe rda, para efeito de p ro m oção por
antigüidade, d e tantos d i as q u antos forem os d o retardame n to, salvo m otivo j u sto,
decli nado nos autos e co m p rovado perante o ó rgão d i sci p l i nar com pete nte".
É p reciso, poré m , fazer uma refl exão final co m o c ontraponto.
Não existe um princípio da celeridade. O p rocesso n ão tem d e s e r ráp i do/
cé l e re: o p rocesso deve demorar o tempo necessário e adequado à solução do caso
submetido ao ór3ão jurisdicional.
Bem p e n sadas as coi sas, co n q u i stou -se, ao l o n go da h i stó ri a, u m d i reito à
d e m o ra n a s o l u ção dos conflitos. A partir do m o m e nto e m q u e se reco n h ece a exi s
tência de um direito fundamen tal ao devido processo, está-se reco n h ecendo, i m p l i
cita m e n te, o d i reito de q u e a s o l u ção do caso deve c u m p ri r, n ecessari a m e nte, u m a
série de atos o b ri gató rios, q u e com põem o conteúdo m ín i m o desse d i reito. A exi
gência d o contraditório, os d i reitos à p rod u ção de p rovas e aos recu rsos certa m e nte
atravan cam a celeridade, mas são garantias q u e não podem ser desco n s i d e radas
o u m i n i m i zadas . É p reciso fazer o alerta, para evitar d i s c u rsos auto ritários, q u e
p regam a celeri dade c o m o val o r. Os p rocessos da I n q u i s i ção poderiam s e r rápi d o s .
Não parece, porém, q u e se si nta saudade del es60•
59- CABRAL, Antonio do Passo. "A d u ração razoável do processo e a gestão do tempo n o projeto de novo Código
de Processo Civi l". Novas Tendências do Processo Civil - estudos sobre o projeto do Novo Códi30 de Processo
Civil. Alexa n d re Frei re; B r u n o Dantas; D i e rle N u n es; Fredie D i d i e r j r.; josé M i g u e l Garcia M e d i n a; Luiz Fux; Luiz
H e n r i q u e Vo lpe Camargo; Ped ro M i randa de O l iveira (org.). Salvador: Editora j u s Podivm, 20 1 3, p . 85-87.
6o. Com p reocu pação s e m e l hante, mais recentemente, CABRAL, Anto n i o do Passo. "A d u ração razoável do p roces
so e a gestão do tempo n o p rojeto de novo Código de P rocesso Civil", cit., p . 8 1 -84; THEODORO ] r., H u m berto;
96
N O R M A S F U N OA M E N T A I S 00 PROCESSO CIVIL
O art. so, caput, da CF/1 988, é a fonte n o rm ativa d o p r i n cípio da igual dade
p rocessu a l .
Da p ri m e i ra parte d o art. 7o d o C PC6' deco rre, d i reta m e n te, e m u m p l a n o i n
fraco n stit u c i o nal, o p ri n cí p i o d a igualdade p rocess u a l . A redação é prol ixa, mas o
p ro pósito é s i m ples: as partes devem s e r tratadas com igualdade.
A igualdade p rocess ual deve o bs e rvar q uat ro aspectos:
a) i m parcialidade d o j u iz (eq u i d i stância e m relação às partes);
b) igualdade n o acesso à j u sti ça, sem d i s c ri m i n ação (gê n e ro, o ri e n tação sex u
al, raça, naci o n a l i dade etc.);
N U N ES, D i e rle; BAH IA, Alexand re; PEDRON, Flávio Q u i n a u d . Novo CPC - fundamentos e sistema tização . Rio de
j a n e i ro: Forense, 201 s. p . 1 42- 1 43 .
6 1 . Art. 7' do C P C : " É assegu rada às partes paridade de tratamento e m relação ao exercício de d i reitos e fac u l da·
des processuais, aos meios de defesa, aos ôn us, aos deveres e à aplicação de sanções p rocessuais, com pe·
tindo ao j u iz zelar pelo efetivo contraditório". Claramente i n s p i rado no art. 3'-A do Código de Processo Civil
português: "O tri b u nal deve assegurar, ao l o n go de todo o p rocesso, u m estat uto de igualdade su bstancial das
partes, designadamente no exercício de facu ldades, no uso de meios de defesa e na aplicação de comi nações
o u de sanções p rocessuais".
62. "Como explica C h i avario, essa paridade de armas e ntre as partes não i m p l i ca u m a identidade absol uta entre
os poderes reco n h ecidos às partes de u m m e s m o p rocesso e n e m , necessari amente, u m a s i m etria perfeita de
d i reitos e o b rigações. O que conta é q u e as difere n ças eve ntuais de tratamento sejam j u stificáveis racional
m ente, à l u z de critérios de reci p rocidade, e de modo a evitar, seja como for, que haja u m deseq u i líbrio global
e m prej uízo de uma das partes". (MARI N O N I , Luiz G u i lh e r m e . Novas Linhas do Processo Civil, 1 999, p . 256.) Ao
i m por a criação de u m a série de regras p rocess uais adeq uadas às particu laridades de cada s uj eito do p rocesso
a igualdade p rocessual confu n d e-se com a ade q u ação s u bjetiva do processo, exam i n ada e m item segu i nte
sobre o pri ncípio da adeq uação.
63. S o b re essas q u atro man ifestações da igualdade p rocessual, A N D R EWS, N e i l . En3 lish Civil Procedure. Fundamen
tais of the New Civil ]ustice System. Oxford: Oxford Press, 2003, p. 1 1 4- 1 1 6.
97
FREDIE DIDIER JR.
98
N O R M A S F U N DA M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
6 7 . ÁVI LA, H u m b e rto. " M o ralidade, razoabilidade e eficiência n a atividade ad m i n i strativa". Revista Eletrônica de
Direito do Estado. Salvado r, I n stituto de D i reito P ú b l ico da Bah i a, n . 4, 2005, p . 24. Disponível e m www. d i reito·
doestado .co m . b r, acesso e m 2 2 . 1 2.201 2, às o6h29. N esse sentido, COSTA, E d uardo ]osé da Fon seca. "As noções
j u rídico- p rocessuais de eficácia, efetividade e eficiência". Revista de Processo. São Pau lo: RT 2005, n . 1 2 1 , item
6, p . 292·296.
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1 00
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
68. CAD I ET, Lok, J E U LAND, E m m a n u e l . Oroit }udiciaire Privé. 7 ' e d . Paris: LexisNexis, 201 1 , p. 3 5 e 38; CAPO N I , Remo.
"O princípio da proporcionalidade na j u stiça civi l : pri m e i ras n otas siste máticas". Revista de Processo. São
Pau l o : RT, 201 1 , n. 1 9 2, p. 400-40 1 .
69. A N D RADE, Érico. "As novas perspectivas do gere nciamento e da 'co ntratual ização' do processo". Revis ta de
Processo. São Pau l o : RT, 201 1 , n . 1 9 3, p. 1 7 3 .
7 0 . A eficiência c o m o u m a q ualidade q u e conte m p o raneamente se b u sca atri b u i r à atividade a d m i n i strativa - q u e
se p reten d e u m a ad m i n i stração gere n cial - f o i bem percebida por C U N HA, Leo nardo Carn e i ro d a . "A p revisão do
princípio da eficiência n o p rojeto do novo Código de Processo Civil b ras i l e i ro". Revista de Processo. São Pau l o :
RT, 201 4, n . 2 3 3 , p. 69-74.
7 1 . E m sentido d iverso, Eduardo José da Fon seca Costa: "O postulado d a eficiência p rocessual é norma sobre
a produção de outras n o rmas, é norma de seg u n d o grau, n o r m a q u e i m p uta ao juiz o dever estrutu ral de
arq u itetar criativame nte regras p roced i m e ntais i n d ividuais e concretas q ue, uma vez efetivadas, produzam o
estado fático desejado pelos princípios q u e as i n s p i ram. Já o pri ncípio da eco n o m ia p rocessual é norma de
com portam e nto, é norma de p r i m e i ro grau, é n o r m a q u e fixa como fim p rático desejado u m processo civil e m
q u e se o b t é m o máximo de proveito c o m o mín i m o de atividade dos sujeitos e nvolvidos. É bem verdade q ue
a doutrina hodierna vem tentando dar ao princípio da eco n o m i a p rocess ual u m n ovo apelido, chamando-o de
" p r i n cípio da eficiência". Trata-se de modernice dispensável, poré m . A i n ovação term i n o lógica tão-so m ente se
j u stifica se o i n ovador estiver cônscio da grave distinção e ntre " p r i n cípio da eficiên cia" e " postu lado da efici
ê n cia". Tod avia, a semelhança entre estas locuções só traz mais pertu rbações, m otivo pelo q ual a anti q u ada
"eco n o m i a p rocessual" a i n d a é preferível à "eficiência" para designar o princípio". (COSTA, E d uardo José da
Fonseca. "As noções j u rídico- p rocessuais de eficácia, efetividade e eficiên cia", cit., p. 294.) A relação entre
eco n o m i a e eficiência é tão íntima, q u e n ão foi por acaso q u e a Associação I nternacional de D i reito Processual
promoveu, na Lituân ia, e m maio de 20 1 3, o s e m i nário "Te n d ê n cias Recentes sobre Eco n o m i a e Eficiência n o
Processo Civi l " . M e rece leitura a res e n h a do eve nto feita por CÂMARA, Alexa n d re F reitas . "Se m i nário 'Te n d ê n
c i a s Recentes sobre Eco n o m i a e Eficiência n o Processo Civi l ' " . Revista d e Processo. São Pau l o : RT, 20 1 3, n . 2 2 3 ,
p. 4 6 3 e segs.
1 01
FREDIE DIDIER JR.
iii) Exatam e nte p o r co nta d i sso, pode-se s i ntetizar a "efi c i ê n cia", m eta a s e r
alcançada por esse p ri n cípio, c o m o o res u ltado d e u m a atu ação q u e o b s e rvou d o i s
d everes: a ) o d e o b t e r o m áxi m o de u m fi m com o mín i m o de rec u rsos (efficiency);
b) o de, com u m meio, ati n g i r o fi m ao máxi m o (effectiveness)72•
Eficien te é a atuação q u e p ro m ove os fi n s do p rocesso d e modo sati sfató rio em
termos q uantitativos, q ual itativos e p robabi lísticos. O u seja, na esco l h a dos meios
a serem e m p regados para a obte n ção dos fi n s, o ó rgão j u risdicional d eve esco l h e r
m e i o s q u e os p ro m ovam d e m o d o m i n i m a m ente i ntenso (q uantidade - n ão se pode
esco l h e r um m e i o que p ro m ova res u ltados i n sign ifi cantes) e certo ( p ro ba b i l i dade -
n ão se pode esco l h e r u m m e i o d e res u ltado d uvidoso), n ão sendo lícita a esco l h a
do p i o r d o s m e i os para i s s o (q uali dade - n ão se p o d e esco l h e r u m m e i o q u e p ro
d uza m u itos efeitos n egativos paralelamente ao res u ltado b uscado)73• A eficiência é
algo q u e so m e nte se con stata a posteriori: n ão se pode avaliar a priori se a cond uta
é ou não efi c i e nte.
Ass i m como o p ri n cípio da ade q u ação, o p ri n cípio da eficiência i m põe ao ó r
gão j u ri s d i c i o n a l o d eve r d e adaptar o u "arq u i tetar", n a exp ressão d e E d uardo j osé
d a Fon seca Costa, regras p rocessuais, com o p ro p ósito d e ati n g i r a efi c i ê n cia. M as
e n q uanto a ade q u ação é atri b uto das regras e d o p roced i m e nto, a eficiência é uma
qualidade que se pode a tribuir apenas ao procedimento - e n carado co m o ato74•
E m bora se c o n ceba um p roced i m e n to a priori (em tese) ade q u ado - um p ro ce d i
m e nto d efi n i d o pelo legislador, com a o bservância dos crité rios o bj etivo, s u bjetivo e
teleológico, exa m i n ados e m item à fre n te -, u m p roced i m e n to eficie nte é i n co n ce
bíve l a priori: a efi c i ê n c i a res u lta d e u m j uízo a posteriori, como se d isse, sem p re
retrospectivo .
N ote q u e, ass i m , podemos d i sti n g u i r eficiência e efetividade.
7 2 . ÁVI LA, H u m berto. " M o ralidade, razoab i l idade e eficiência na atividade ad m i n i strativa", cit., p . 1 9 .
7 3 - ÁVI LA, H u m berto. " M o ralidade, razoabi lidade e eficiência n a atividade ad m i n i strativa", cit., p . 23-24.
74. E m sentido dive rso, E d u ardo José da Fonseca Costa, para q u e m a efi c i ê n c i a é u m at ributo das regras. O
autor e n t e n d e q u e não existe u m p r i n cí p i o da efi c i ê n cia, mas, s i m , u m post u l ado; esse post u lado " n ão
i m põe o dever j u rídico de p ro m over-se u m f i m , mas estrutu ra, mediante a produção de regras j u rídicas, a
a p l i cação do dever de p ro m over-se os f i n s q u e as i n f u n d i ra m . Não prescreve d i reta m e nte u m c o m p o rta
m ento, m as sim u m a m a n e i ra d e e l a b o ração das regras, em q u e se c o n corda ao m áxi m o o conteúdo d e l as
com os valores q ue l h e j u stificaram a produ ção e q u e devem estar nelas i m b ricados. E n f i m , o postulado da
efici ê n c i a é u m dever d e estrutu ração, que estabelece uma v i n c u lação e n t re pri n cípios e regras j u rídi cas
e q u e estabel ece uma relação d e oti m ização n o p rocesso d e c o n c retização dos pri n cí p i o s pelas regras.
D ef i n itiva m e nte, q uanto mais a criação d u m a regra estive r centrada n a f i n a l idade que d á s u p o rte ao seu
criad o r, o u nos princípios que lhe devam estar s u bjacentes, tanto mais eficiente será essa regra". (COSTA,
E d uardo José da Fonseca. "As noções j u rídico - p roces s u a i s de eficácia, efetividade e efi c i ê n cia", cit., p. 2 9 3 . )
N essa l i n ha, é d ifíc i l d e m arcar as áreas de i n ci d ê n c i a dos p r i n cípios d a adeq u ação - s o b retudo a adeq ua
ção teleo lógica - e da efi c i ê ncia, que acabam por confu n d i r-se. O próprio E d u a rdo José da Fon seca Costa
e n t e n d e que o postu lado da efi c i ê n c i a o p e ra s o b re a criação d e regras j u rídicas a i n d a n ão existentes (cit.,
p . 293) - exatam e nte o que aq u i se defe n d e pelo nome d e p r i n cípio da adeq u ação. Essa é m a i s uma razão
para relac i o n a r m o s a efi c i ê n c i a à eco n o m i a p rocess u a l .
1 02
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
fi m " realização d o d i reito" d e m o d o i n satisfató rio (co m m u itos res u ltados n egativos
colaterais e/ou excessiva d e m o ra, por exe m plo). M as jamais poderá ser considerado
eficiente sem ter sido efetivo: a n ão real i zação de u m d i reito reco n h ecido j u d icial
m ente é q uanto basta para a d e m o n stração d a i n eficiência d o p rocesso75•
Estabelecidas as p re m issas, podemos, ago ra, visual i zar algu mas aplicações do
princípio da eficiência no processo .
I ) O dever d e eficiência i m põe-se n a esco l h a d o meio a ser util izado para a exe
cu ção da sente n ça (art. 5 36, § 1 °, CPC). O meio executivo d eve p ro m over a execução
d e modo satisfató rio, nos termos m e n ci o nados aci ma.
11) O p ri n cípio da eficiência exerce u m a função i nterp retativa. Os e n u n ciados
n o rm ativos da legislação p rocessual d evem ser i nterpretados d e modo a observar
a eficiência. Dispositivos relacionados à suspensão do p rocesso, por exe m plo, q u e
i m põem u m l i m ite tem po ral máxi m o para a suspensão (art. 3 1 3, §4°, CPC), devem
ser i nterpretados com tem peramento: e m certas situações, o p rosseg u i m e nto do p ro
cesso, após o vencimento do p razo máxi m o de suspensão, é medida que pode reve
lar-se extremamente i n eficiente, sob o po nto de vista da ad m i n istração do p rocesso.
1 1 1) Do p r i n cípio d a efi c i ê n cia pode-se ext rai r a permissão d e o ó rgão j u risdicio
nal estabe l ecer u m a espécie de "con exão p ro bató ria" e ntre causas p e n d e ntes, d e
m o d o a u n ificar a atividade i n strutó ria, como fo rma de red u ção de custos, m e s m o
q u e i s s o n ão i m p l i q u e a n ecessidade d e j u lga m e nto s i m u ltâneo de todas elas.
I m ag i n e-se o caso e m que um mesmo fato é afi rmado e m várias causas p e n
d e ntes - n ocividade de u m d ete r m i nado p rod uto, p o r exe m p l o -, q ue não p o d e m s e r
reu n idas para j u lgam ento s i m u ltâneo, p o rq u e cada u m a delas poss u i , a i n da, s u as
p ró p rias p ec u l iaridades fáticas. Pode o ó rgão j u risd i c i o n al, n este caso, d eterm i n ar
uma períci a ú n i ca, cujos c u stos seriam re partidos e n t re os sujeitos i nteressados d e
todos os p rocessos.
IV) O p r i n cípio da efi c i ê n cia é f u n damento para que se perm ita a adoção, pelo
ó rgão j u ri s d i c i o n al, de téc n i cas de gestão do p rocesso, co m o o cale n dário p rocess ual
(defi n i ção d e uma age n d a d e atos p rocessuais, com a p révia i ntimação d e todos os
s uj eitos p rocessuais d e u m a só vez; art. 1 9 1 , C PC)76, o u outro s acordos p rocess uais
7 5 . Adotou esse nosso ente n d i m e nto, expressam e n te, C U N HA, Leonardo Carn e i ro d a . " A p revisão do p r i n cípio d a
eficiência n o p rojeto do n ovo Código de Processo Civil b ras i l e i ro " . Revista d e Processo. S ã o Pau l o : RT, 201 4, n .
2 3 3, p. n
7 6 . Relacionando o calendário processual ao p r i n cípio da eficiência, M Ü LLER, J u li o . "Acordo processual e gestão
com part i l h ada do p roced i m ento". Novas Tendências do Processo Civil - estudos sobre o projeto do Novo Códi3o
1 03
FREDIE DIDIER JR.
2. 9. 1 . Generalidades
d e Processo Civil. Alexa n d re Frei re; B r u n o Dantas; Dierle N u nes; F r e d i e D i d i e r ) r.; J o s é M i gu e l Garcia M e d i na;
Luiz F ux; Luiz H e n ri q u e Vo l p e Camargo; Ped ro M i randa d e O l iveira ( org. ) . Salvador: Ed itora jus Podivm, 20 1 4, v.
3. p . 1 54-
7 7 - Sobre a boa fé como norma d e cond uta, a m plamente, C O R D E I RO, Antó n i o M a n u e l da Rocha e M e n ezes. Da
boa-fé no direito civil. 2• rei m p . Coi m b ra: A l m e d i n a, 200 1 . p . 632 e segs.
1 04
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
78. Cabe, então, m e ncionar algu n s auto res bras i l e i ros q u e expressamente defe n d e m a existência de uma " boa-fé
p rocess ual o bjetiva": NORON HA, Fe rnando de. O direito dos con tra tos e seus princípios fundamentais: auto
nomia privada, boa-fé, justiça contra tual, cit., p . 1 37; CABRAL, Antô n i o do Passo. "O contraditório como dever
e a boa-fé p rocessual o bjetiva", cit., p. 76-78; M IT I D I ERO, Daniel. Co laboração no processo civil, cit., p. 95-96;
_ . Comen tários ao Códiso de Processo Civil. São Paul o : M e m ó ria j u rídica, 2004, t. 1, p. 1 7 3; V I N C E N Z I , Brunela
Vie i ra de. A boa-fé no processo civil, cit., p. 1 69 e segs.; GÓ ES, Gisele. "Defesa do devedor n a execução de tít u l o
extraj u d icial: principiologia e técn icas p rocess uais de efetividade". A leitura. Belém : Escola S u perior d a Magis
tratu ra, 2008. v. 1, p . 32-40; M E D I NA, josé Miguel Garcia, WAM B I E R, Teresa Arruda Alvi m . Parte seral e processo
de conhecimento. São Pau l o : RT, 2009, v. 1. p . 48-50; PRETEL, Mariana Pretel e. A boa-fé objetiva e a lealdade no
processo civil brasileiro. São Pau l o : N ú ria Fabris, 2008; IOCOHAMA, Celso H i ros h i . Litisância de má-fé e lealdade
processual. Cu ritiba: j u ruá, 2006, p. 45; WAM B I ER, Luiz Rodrigues. "Abuso do procedim ento especial". Revista
de Processo. São Paulo: RT, 201 2. n . 204, p. 58-6o; RODR I G U ES, Marco Anto n i o dos Santos. A m odificação do
pedido e da causa de pedir no processo civil. Rio de janeiro: GZ Editora, 20 1 4; T H E O DORO ] r., H u m berto; N U N ES,
D i erle; BAH IA, Alexandre; P EDRON, Flávio Q u i n a u d . Novo CPC - fundamentos e sistematização. Rio de j a n e i ro:
Forense, 20 1 5, p. 1 59-2 1 3 .
79. TAR U FFO, M i c h e l e . "General re port - a b u s e of proce d u ral rights: com parative stan dards of p rocedu ral fai rness",
p. 6; j U N OY, joan Pico i. " E I debido p roceso 'leal'", cit., p . 370-37 1 . Tam b é m reco n h ecendo a grande utilidade
de u m a cláusula seral processual de boa-fé, V I N C E N Z I , Brunela Vie i ra de. A boa-fé no processo civil. São Pau l o :
Atlas, 2003, p . 1 69 e segs.
8o. E m bora exam i n a n d o o i n ciso 11 do art. 14 do CPC/ 1 973, nesse sentido, também, LI MA, Alcides de M e n d o nça.
"Abuso do d i reito de deman dar". Revista de processo. São Pau lo, n . 1 9, 1 980, p . 6 1 . Ass i m , tam bém, CABRAL,
Antônio do Passo. "O contraditório como dever e a boa-fé p rocessual objetiva". Revista de Processo. São Pau l o :
RT, 2005, n . 1 26, p. 6 9 .
8 1 . § 2 4 2 do BGB ( B ü rgerliches Gesetzbuch): " D e r Sch u l d n e r i s t verpfl ichtet, d i e Leistung so zu bewirken, w i e
Treu u n d G l a u b e n m it Rücksicht auf d i e Ve rkeh rssitte es erford e r n " . ("O d evedor está adstrito a realizar a
1 05
FREDIE DIDIER JR.
tam bém a o d i reito p rocessual civi l82 e pen al83• De u m m o d o geral, a d o utri na segu i u
o m e s m o cam i n ho84• N a verdade, a b oa-fé o bj etiva expa n d i u -se para todos o s ramos
d o D i reito, m e s m o os " não civis"85• Sempre que exista um vínculo jurídico, as pesso
as e nvolvidas estão o b rigadas a não frustrar a confiança razoável do o utro, deve n d o
co m po rtar-se como se pode esperar d e u m a pessoa de boa-fé86• Como aco ntece c o m
q ualq u e r relação j u ríd ica, a boa-fé recai tam b é m s o b re a s relações p rocess uais87.
A expansão ao p rocesso civi l n ão se deu sem o b stác u l o s . N a p ró p ri a
A l e m a n h a, n o i n ício do s é c u l o XX, j á se c h egou a d i z e r q u e o d i reito
p rocessual i m p e d e q u a l q u e r apelo à boa-fé o u lealdade e os co m po r
tam e n tos p rocessuais são " l ivres da m o ra l i d ad e "88.
O a rg u m e n to não conve n c e .
p restação tal como o exija a boa fé, com consideração pelos costumes do tráfego", de acordo com a trad u ção
de C O R D E I RO, António M a n u e l da Rocha e M e n ezes. Da boa-fé no direito civil, cit., p. 325). H á outra tradu ção,
bastante con hecida no Bras i l , de Souza D i n i z : "O deved o r está o b rigado a executar a p restação como a boa fé,
e m ate n ção aos usos e costu mes, o exige" (Códi80 Civil A lemão. Rio de l a n e i ro: Record Editora, 1 96o, p . 56)
82. "A sua natu reza i nstr u me ntal perante o D i reito Civi l e uma certa tradi ção literária de escrita s o b re a boa fé
em Processo terão fac i litado a tran sposição". (CORDEI RO, Antó n i o M a n u e l da Rocha e M enezes. Da boa-fé no
direito civil, cit., p. 3 7 5 . )
83. O S T F já decid i u q u e o p rocesso penal também é regido pelo princípio da boa-fé, como f o r m a de i m pe d i r
comportamentos abusivos: STF, 2• T., H C n . 92.01 2/SP, re i . M i n . E l l e n G racie, j . e m 1 0.6.2008.
84. CORDEI RO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil, cit., p. 376, especial mente a nota 437.
85. " Essa expansão é notável e d e n ota a c o m pleição da boa-fé não como u m i n stituto j u rídico com u m , m as como
factor c u l t u ral i m portante, l i gado, de modo estreito, a u m certo e n te n d i m e nto do j u rídico". (CORDEI RO, Antó n i o
M a n u e l da R o c h a e M e n ezes. Da boa-fé no direito civil, c i t . , p. 3 7 1 .)
86. LARENZ, Karl. Derecho civil - parte 8enera l. Miguel lzq u i e rdo y M acías-Picavea (trad .) Madrid: Editorial Revista
de Derech o Privado, 1 978, p . 300.
87. C H I OVEN DA, G i useppe. Princípios de derecho procesal civil. 1osé Casais y Santaló (trad .). Madrid: Réus, 2000,
t. 2, p . 2 1 1 ; J U N OY, joan Pico i. " E I debido proceso 'leal'". Revista Peruana de Derecho Procesal. Li ma: Palestra,
2006, v. 9, p . 366.
88. Sobre o tema, H ESS, Bu rkhard. "Abuse of p roced u re i n Germany and Áustria", cit., p. 1 5 5, i n c l usive as n otas 28
e 29.
89. AROCA, juan M ontero. Los princípios po líticos de la nueva Ley de Enjuiciamiento Civil. Valência: Ti rant lo blanch,
200 1 , p . 1 06 - 1 08.
90. AROCA, j u an M ontero. Los princípios po líticos de la nueva Ley de Enjuiciamiento Civil, cit., p . 1 08 .
1 06
N O R M A S F U N O A M E N TA I S 00 PROCESSO CIVIL
91. G RECO, Leonardo. "Publicismo e privatismo no processo civil". Revista de Processo. São Paulo: RT, 2008, n . 1 64, p. 49.
92. G RECO, Leo nardo. " P u b l i c i s m o e p rivatismo n o p rocesso civil", cit., p . 5 2 .
93. VINCENZI, B r u n e l a Vie i ra de. A boa-fé no processo civil. S ã o Pau l o : Atlas, 2003, p . 1 63 .
94. ROSENVALD, N e l s o n . Di3nidade humana e boa-fé no Códi30 Civil. S ã o Pau l o : Saraiva, 2005, p . 1 86 e segs.; N E
G R E I ROS, Te resa. Fundamentos para uma interpretação constitucional do princípio da boa-fé. Rio de j a n e i ro :
Renovar, 1 998, p . 224-274.
1 07
FREDIE DIDIER JR.
Para M e n ezes Cord e i ro, p o r exe m p lo, a exigê n cia de atu ação de acordo c o m a
boa-fé deco rre d o d i reito f u n dame ntal à isua ldade: "a pessoa q u e confie, legit i m a
m e nte, n u m certo estado d e coi sas não pode s e r vi sta se não tivesse confiado: seria
t ratar o d ife re nte de m o d o igual "95•
Antô n i o do Passo Cabral ente n d e que o fundamento da boa-fé objetiva processu
al é o p ri n cípio do contraditório, q u e n ão é apenas fo nte de d i reitos processuais, mas
tam bé m de deveres. O co ntrad itório não serve apenas para dar aos litigantes o d i reito
de poder i nfl u e n ciar n a decisão, m as tam bém "tem uma finalidade de colabo ração
co m o exe rcício da j u risdição"96• O d i reito ao contraditório não pode ser exe rcido i l i m i
tadamente: o res peito à boa-fé o bjetiva é exatame nte u m desses l i m ites.
Para ]oan Pico i ] u n oy, o p ri n cípio da boa-fé p rocess ual co m põe a c l á u s u l a do
devido processo lesai, l i m itando o exe rcício do d i reito de d efesa, co m o fo rma de
p roteção do d i reito à tutela efetiva97, d o pró p ri o d i reito d e defesa da parte contrária
e do d i reito a um p rocesso com todas as garantias (" p rocesso devido"). Cria, para
tanto, eloq u e nte expressão: o devido processo leal98•
O S u p re m o Tri b u nal Fede ral segue tam bé m essa l i n h a de argu m e n tação, de
m a n e i ra a i n d a mais i n ci siva: a c l á u s u l a do d evi d o p rocesso legal exige um p rocesso
leal e pautado n a boa-fé99• A tran scri ção d o trec h o da f u n d a m e ntação é n ecessária:
"O p ri n cí p i o d o devido p rocesso legal, que l astreia todo o leque d e
gara n t i as c o n st i t u c i o n a i s vo ltadas para a efetividade d o s p rocessos
j u ri s d i c i o n a i s e ad m i n i strativos, ass e g u ra q u e todo j u lgam e n to seja
realizado com a o b s e rvância das regras p roced i m e n t a i s p revi a m e nte
esta b e l e c i d as, e, além, rep resenta uma exigê n c i a d e fair trial, n o s e n
t i d o d e garanti r a parti ci pação eq u ân i m e, j u sta, l e a l , e n f i m , s e m p re
i m b u ída p e l a boa-fé e p e l a ética dos s uj e itos p rocess u a i s .
95 - CORDEI RO, Antó n i o M a n u e l da Rocha e M e n ezes. Litigância d e má-fé, abuso do direito de acção e culpa 'in
agendo '. Coi m b ra: Almedi na, 2006, p. 5 1 . Assi m , tam bém, do mesmo autor, mais longamente, Da boa -fé no
direito civil, cit., p . 1 . 2 7 1 e segs.
96. CABRAL, Antô n i o do Passo. "O contraditório como deve r e a boa-fé p rocessual objetiva", cit., p . 63. Ass i m ,
t a m b é m , V I N C E N Z I , Br u n e l a Vi e i ra de. A boa -fé no processo civil, cit., p . 1 7 2 .
97 - " . . . la efectividad de la t u t e l a j u d i cial i m po n e e l rechazo a la actuación maliciosa o temeraria de l a s partes, o
dicho em otros térmi n os, la mala fé p rocesal p u e d e p e n d e r em pel igro el otorga m i e nto de u m a efectiva tutela
j u dicial. . . " (J U N OY, )oan Pico i . " E I debido p roceso 'leal'", cit., p . 346.)
98. J U N OY, )oan Pico i . "EI debido p roceso 'leal"', cit., p. 345 e segs.
99- STF, 2• T. , RE n . 464.96 3-2-GO, re i . Min. G i l m a r M e ndes, j . e m 1 4.02.2006, p u b l icado n o DJ d e 30.06. 2006. Com
f u n da m e ntação semel hante, STF, 2• T., AI n . 5 2 9 . 7 3 3 · 1 - RS, rei. M i n . Gilmar M e n des, j . e m 1 7 . 1 0. 2006, p u b l icado
n o DJ d e 0 1 . 1 2. 2006. Repercutiu e aplaudiu essas decisões, mais rece nteme nte, MACÊDO, Lucas Buril d e . "A
concretização d i reta da cláusula geral do devido p rocesso legal p rocessual n o S u p remo Tri b u nal Federal e no
Superior Tri b u nal de j u stiça", cit., p . 395-396.
1 08
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
O STF confirma que a exigê n c i a d e com p o rtame nto segu n d o a boa-fé ati nge a
todos os s uj eitos p rocessuais, e n ão apenas às partes:
" N esse sentido, tal p r i n cípio p o s s u i u m âm bito de p roteção alargado,
q u e exige o fair trial n ão a p e n as d e ntre aq u e l e s q u e fazem parte d a re
lação p rocessual, o u q u e at uam d i retame nte no p rocesso, m as de todo
o aparato j u ri s d i c i o n al, o q u e ab range todos os s uj e itos, i n stitui ções
e ó rgão, p ú b l icos e p rivados, que exe rce m, d i reta o u i n d i retame nte,
f u n ções q ual ificadas constituci o n a l m e nte como ess e n ciais à j u stiça" .
1 00. HAZARD ) r., Geoffrey C. "Abuse o f p rocedu ral rights: a s u m mary view o f the c o m m o n law systems" . Abuse of
procedural rights: compara tive standards of procedural fairness. M ichele Taruffo (coord). Haia/Lon d res/Boston :
Kluwer Law l nternational, 1 999, p. 38; HAZARD ] r., Geoffrey C. "Abuse o f p roced u ral rights: report f o r t h e U n ited
States". Abuse of procedural rights: compara tive standards of procedural fairness. M ichele Taruffo (coord). Haia/
Lo n d res/Bosto n : Kl uwer Law l nternational, 1 999, p. 43; TARU FFO, M ichele. "General report - abuse of p roced u ral
rights: com parative standards of p rocedu ral fai rn ess", Abuse of procedural rights: compara tive standards of
procedural fairness. Michele Taruffo (coord). Haia/Lo n dres/Bosto n : Kluwer Law l nternational, 1 999, p. 7.
1 09
FREDIE DtDIER JR.
o ó rgão j u risdicional 10' . A observação é i m po rtante, pois parte dos trabalhos doutri ná
rios sobre a boa-fé p rocessual restri nge a abrangê n cia do p ri n cípio às partes102•
A vi n c u lação do Estado-j u i z ao d ever de b oa-fé nada mais é senão o reflexo d o
p r i n cípio d e q u e o Estado, t o u t court, deve agi r d e aco rdo com a boa-fé e , pois, de
m a n e i ra leal e com p roteção à confiança.
1 0 1 . O STF já recon h eceu expressamente a vincu lação do ó rgão j u risdicional a o princípio da boa-fé processual (STF,
HC 1 01 . 1 32. ED/MA, rei. p/ acórdão M i n . Luiz Fux, I nformativo do STF n . 665, 7- 1 2 de maio de 201 2). No mesmo
sentido é o posicionamento do STJ : STJ, 4' T., AgRg n o AREsp n . 9 1 . 3 1 1 - D F, Rei. Min. Anto n i o Carlos Ferrei ra, j .
em 6 . 1 2.20 1 2. p u blicado n o i n formativo 5 1 1 ; STJ, 2• T., R E s p n . 1 .306-463/RS, R e i . M i n . H e r m a n Benjam i n , j . em
04.09.201 2, p u b l i cado no D]e de 1 1 .09.20 1 2. Ass i m , tam bém, TARU FFO, Michele. "General report - abuse of p roce
d u ral rights: com parative stan dards of p roce d u ral fai rness". Abuse of procedura l rights: compara tive standards
of procedural fairness. Michele Taruffo (coord). Haia/Lon d res/Boston : Kluwer Law l nternational, 1 999, p. 1 9; H ESS,
B u rkhard. "Abuse of p roced u re in Germany and Áustria". Abuse of procedura l rights: compara tive standards of
procedural fairness . M ichele Taruffo (coord). H aia/Lond res/Bosto n : Kl uwer Law l nternational, 1 999, p. 1 56.
1 02. Por exe m plo, o monografista d o tema J U NOY, ]oan Pico i . " E I debido p roceso 'leal'". Revista Peruana de Derecho
Procesal. Lima: Palestra, 2006, v. 9, p. 34 1 ; M I LMAN, Fáb i o . Improbidade processual. Rio de J a n e i ro: Fore nse,
2007, p. 8 1 e segs; N E RY ] r., Nelson, N E RY, Rosa. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagan te.
9' ed. São Pau l o : RT, 2006, p . 1 77 - 1 78; B E DAQ U E, ]osé Roberto dos Santos. Código de Processo Civil in terpretado.
2• ed. São Pau l o : Atlas, 2005, p . 84·85.
1 03 . BAU M GÁRTEL, Gottfri e d . "Treu und Glauben i m Zivi l p rozess". Zeitschrift für Zivilprozess, 1 97 3 , n . 86, H eft 3, p .
355; Z E I SS, Walter. f / dolo procesal: aporte a /e precisacion teorica d e u n a prohibicion d e / dolo e n e/ proceso de
cognicion civilistico. To mas A. Banzhaf (trad .). Buenos Aires: Ediciones j u rídicas E u ropa-América, 1 979, passim;
H ESS, B u rkhard. "Abuse of p roce d u re in Germany and Áustria", cit., p . 1 5 3 - 1 54.
1 04. "Das Verbot zu schafen", n o texto original BAU M GARTEL, Gottfri e d . "Treu und Glauben i m Zivi l p rozess". Zeits
chrift für Zivilprozess, cit., p. 3 5 5 .
1 05 . É i m po rtante registrar, especificamente para a aplicação d o art. 8o do CPC, q u e nem todos os casos d e litigân
cia d e m á-fé ali p revistos exigem a " m á-fé s u bjetiva"; h á casos e m que a " má-fé" é exam i n ad a objetivame nte,
como nos casos dos i n cisos V, VI, V I l e VIII d o mesmo artigo. Advert i n d o s o b re esse as pecto, M O R E I RA, ]osé
Carlos Barbosa. "A res p o n s a b i l i dade das partes por dano p rocessual n o d i reito b ras i l e i ro " . Temas de direito
processual. São Pau l o : Saraiva, 1 977, p. 26. Trata-se de um dado relevante para confirmar a existê ncia de u m a
cláus u l a geral d e proteção d a boa-fé o bj etiva.
1 06. "Das Verbot des widersprüchlichen Verhaltens", no original, BAU MGARTE L, Gottfried. "Treu u n d G l a u b e n i m
Zivi l p rozess". Zeitschrift für Zivilprozess, cit. p . 3 5 5 .
110
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
A d o utri n a cost u m a e n u m e rar os segu i ntes p ressu postos para a configu ração
do venire con tra factum proprium c o m o co m po rtame n to i lícito: a) existê ncia d e
d uas co n d utas d e u m a m e s m a pessoa, s e n d o q u e a segu n da contraria a p ri m e i ra;
b) h aj a i d e n tidade de partes, ai n d a q u e por vín c u l o de s u cessão ou re p resentação;
c) a situação contrad itória se p rod uza em u m a mes ma situação j u rídica ou e ntre s i
tuações j u ríd i cas estreita m e nte coligadas; d) a p ri m e i ra c o n d uta (factum proprium)
te n ha um sign ificado social m i n i m a m e nte u n ívoco, a ser ave riguado segu nd o as
ci rcu n stâncias do caso; e) q u e o factum proprium seja s uscetível de criar f u n dada
confiança na parte q u e alega o p rej uízo, confiança essa q u e será ave riguada se
g u n d o as ci rc u n stân cias, os usos aceitos pelo co m é rcio j u ríd i co, a b oa-fé o u o fi m
eco n ô m i co-social do n egócio '07•
Co m o exe m p l o d e a p l i cação da p ro i bição d e venire con tra factum proprium n o
p rocesso civi l : recorre r contra u m a decisão q u e se aceitara (art. 1 .ooo d o CPC) o u
ped i r a i nval i d ação d e ato a cujo d efeito d e u causa (art. 2 7 6 d o C P C b ras i l e i ro), o u
a i m p ug nação da legiti m idade ativa, j á aceita e m p rocesso anterio r108•
Nesses casos, temos concretizações típ i cas da p ro i b i ção de co m po rtam ento
contraditó rio. o p ri n cípio da boa-fé, no entanto, p roíbe a tipicamen te o c o m p o rta
m ento contraditório, q u e, ass i m , passa a ser um ilícito processual a típico.
c) A p ro i b i ção de abuso de d i reitos processuais'09• O a bus o do d i reito é co n d u
t a i lícita; o abuso de u m d i reito p rocessual tam b é m . Q u al q u e r abuso d o d i reito n o
p rocesso é p ro i b i d o pela i n ci d ê n cia d o p ri n cípio d a boa-fé p rocess u a l .
C o m o , por exe m p lo, o a buso d o direito d e defesa, q u e p o d e auto rizar a tutela
p rovisória d e evidência (art. 3 1 1 , I , CPC b ras i l e i ro), o abuso n a esco l h a d o meio exe
c utivo (art. 8os, C PC), ou o abuso do direito de recorrer, q u e é h i pótese exp ressa de
l itigância de m á-fé (art. 8o, V I l , CPC b rasi leiro).
Nesses casos, temos concretizações típi cas d e abuso d e d i reito p roces s u a l .
O p r i n cípio d a boa-fé, n o entanto, p roíbe a tipicamente q ua l q u e r a bus o d e d i reito
p rocess ual, q ue, ass i m , passa a ser um ilícito processual a típico.
d) Verwirkun3 (supressio, de acordo com a s u gestão con sagrada de M e n ezes
Cord e i ro): perda de poderes process uais em razão do seu não-exe rcício por te m po
suficie nte para i n cuti r n o o utro sujeito a confi a n ça l egít i m a d e q u e esse poder n ão
mais seria exerci d o .
1 07 . MART I NS-COSTA, j u dith . " A i l icitude de rivada d o exe rcício contraditório de u m d i reito: o renascer do venire
con tra factum proprium". Revista Forense. Rio de janeiro : Fore nse, 2004, n. 376, p. n o.
1 08. J U N OY, joan Pico i. " E I debido p roceso 'leal"' . Revista Peruana de Derecho Procesal. Lima: Palestra, 2006, v. 9,
p. 357-
1 09 . "Der Missbrauch prozessua ler Befusnisse", n o original, BAU M GÃRTEL, Gottfried. "Treu u n d G l a u b e n i m Zivi l p ro
zess". Zeitschrift für Zivilprozess, cit., p . 3 5 5 .
111
FREDIE DIDIER JR.
n o. "la giustificata aspettativa che i l di ritto stesso n o n sarebbe p i u stato fatto valere". (RAN I E R I , F i l i p po . Rinuncia
ta cita e Verwirkun3. Padova: CEDAM, 1 9 7 1 , p. 1 . )
1 1 1 . CORDEI RO, Antó n i o M a n u e l da Rocha e M e n ezes. Da boa-fé no direito civil. 2• re i m p . Coi m b ra: A l m e d i na, 200 1 .
p. 797-
1 1 2 . Sobre a relação e n t re boa-fé e abuso do d i reito, mais u m a vez CORDEI RO, Antó n i o Manuel da Rocha e M e n ezes.
Da boa-fé no direito civil, cit., p. 861 -902.
112
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
2 . 1 O. Princípio da efetividade
1 1 3 . G U ERRA, Marcelo Lima. Direitos fundamen tais e a proteção d o credor na execução civil, cit., p . 1 02.
1 1 4. MARI N O N I , Luiz G u i l herme. "O d i reito à efetividade da tutela j u risdicional n a perspectiva da teoria dos d i reitos
f u ndamentais". Revista de Direito Processual Civil. Curitiba: G ê n esis, 2003, p . 303.
1 1 5 . G U ERRA, Marcelo Lima. Direitos fundamentais e a proteção do credor na execução civil. São Paulo: RT, 2003, p.
1 02 - 1 0 3 .
113
FREOIE DIDIER JR.
2. 1 1 . 1. Generalidades
O princípio da adequação pode ser visual izado e m três d i m ensões: a) legisla ti
va, co m o i nformad o r da p ro d u ção legislativa d as regras p rocessuais; b) jurisdicional,
perm iti n d o ao j u iz, n o caso co n c reto, adaptar o p roced i m e n to às pecu l iaridades d a
c a u s a q u e l h e é s u b m etid a; c) negociai: o p roced i m ento é adeq uado pelas p ró p ri as
partes, n egocial m e nte. N o segu n d o e n o tercei ro casos, a ade q u ação é feita in con
creto, e m um d eterm i n ado p rocesso; h á q ue m p refi ra, assi m, design a r o fe n ô m e n o
d e adap tabilidade, flexibilidade o u elasticidade d o processo.
I n i cial m e nte, a p ró p ria co n strução legi slativa do p rocesso deve ser feita tendo
-se e m vista a n atu reza e as pecu l iari d ades do seu o bj eto; o legislador d eve ate ntar
para essas ci rcu nstân c i as, pois um p rocesso i n adeq uado ao d i reito m aterial pode
i m po rtar verdad e i ra n egação da tutela j u ri s d i c i o n a l . O p ri n cípio da ade q u ação n ão
se refere ape n as à estrutu ração d o p roced i m e nto. A tutela j u risdicional h á d e ser
adeq uada; o p roced i m e n to é ape n as u m a forma d e e n carar esse fe n ô m e n o " 7 •
O p ri n cípio da i n afasta b i l i dade da j u ri s d i ção (estu dado n o capít u l o s o b re j u ri s
d i ção, n este vol u m e d o Curso) garante u m a t u t e l a ade q u ada à realidad e d e d i reito
m aterial, ou sej a, garante o p roced i m e nto, a espécie d e cog n i ção, a n atu reza do
p rovi m e nto e os meios executórios adeq uados às pecu l iaridades da situação litigio
sa."8 Do p ri n cí p i o da i n afastab i l i dade, é possíve l reti rar o p r i n cípio d a adeq u ação .
Tam bé m é possível reti rá- l o do d i reito f u n d a m e ntal a u m p rocesso d evi d o : p roces-
1 1 6. G U E R RA, Marcelo L i m a . Direitos fundamentais e a pro teção do credor na execução civil, cit., p . 1 03 - 1 04.
1 1 7. A res peito da relação e ntre tutela j u risdicional e p roced i m e nto, YARSH ELL, Flávio Luiz. Tu tela jurisdicional. São
Pau lo: Atlas, 1 999.
1 1 8. MARI N O N I , Luiz G u i l herme. Novas Linhas do processo civil, ob. cit., p . 204.
1 14
N O R M A S F U N DA M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
o p rocesso h á d e ser adeq uado aos sujeitos p rocess uais. As regras p rocessuais
hão, pois, de sere m ade q u adas àq u eles que vão partici par d o p rocesso. Esta é a
adequação subjetiva do processo.
Eis algu m as regras de adequação subjetiva do processo : a) i nterven ção o b ri
gatória d o M i n istério P ú b l i co n o s p rocessos q ue envo lvam i nteresse d e i n capaz
1 1 9. Nesse sentido, também fazendo referência à i n afasta b i l idade d o controle j u risdicional: C U N HA, Leonardo Car·
n e i ro da. A a tendibilidade dos fatos supervenien tes n o processo civil. Coi m b ra: Almed i n a, 20 1 2, p . 8 3 .
1 20. MARI N O N I , Luiz G ui l h e r m e . "O d i reito à efetividade da t u t e l a j u risdicional n a pers pectiva da t e o r i a dos d i reitos
fundamentais " . Revista de Direito Processua l Civil. Cu riti ba: G ê n esis, 2003, p . 304.
1 2 1 . MARI N O N I , Luiz G u i lherme. Novas linhas do processo civil, cit., p . 2 1 4.
1 22 . " I n stru m ento é conceito relativo, q u e p ressu põe um ou mais sujeitos-agentes, um o bjeto s o b re o q ual, me
d i ante aquele, atua o agi r, e u m a finalidad e q u e condiciona a ação." (LACERDA, Galeno. O Códi3o como Sistema
Le3al de adequação do processo, p . 1 64).
115
FREDIE DIDIER JR.
(art. 1 78, 1 1 , C PC); b) d ife re n ciação d e re g ras d e com petê ncia (dom icíl i o d o ali m e n
tando, art. 5 3, 1 1 , C PC; e n tes p ú b l i cos fed e rais, art. 1 09, I , CF/1 988); c) i n capaci
dade p rocessual para liti g ar e m certos p roced i m e ntos (art. 8°, Lei n . 9.099/ 1 995);
d) p razos especiais para e ntes p ú b l i cos (art. 1 83, CPC) etc.
A adequação teleo/Óflica d o p roced i m e nto faz-se de acordo com os d iversos
o bj etivos a q u e ele visa alcan çar. "Claro está q u e o p rocesso de con h ec i m e nto,
p o rq ue visa à defi n i ção d o d i reito, req u e r atos e rito d i sti ntos daq u e l es exigidos
para a execu ção, o n d e se c u i d a da realização coativa d o d i reito declarado, o u para
o p rocesso cautelar, q ue b u sca a se g u rança d o i nteresse e m l i d e " . ' 23 H á adeq uação
teleoló g ica tam bém q ua n d o o p roced i m e nto é adaptado aos o bj etivos preponde
rantes e m cada cas o . Ass i m , p o r exe m p lo, o p roced i m e nto dos j u izados Especiais
é adeq uad o aos propósitos da d u ração razoável d o p rocesso e da efetividade, q u e
p resi d i ram a s u a criação.
116
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
es peciais do man dado d e segu ran ça ( Lei n . 1 2 . 0 1 6/2009) e d a ação m o n itória (arts .
700 e segs ., C PC) e a poss i b i l idade d e tutela p rovi só ria da evi d ê n ci a (art. 3 1 1 , CPC;
art. 562, CPC; art. 59, § 1 °, Lei n. 8 . 245/ 1 99 1 ) .
117
FREDIE DIDIER JR.
Mas o p ri n cípio d a adeq uação d o p rocesso pode atuar diretamen te, sem a
i ntermediação d e q u e regras q u e o con cretize m .
Perm ite-se ao m agistrado q u e co rrija o p roced i m e nto q u e s e reve l e i n co n sti
tucional, p o r fe ri r um d i reito f u n d a m e ntal p rocessual, c o m o o contrad itório (se u m
p rocedi m e nto n ão p revi r o contraditório, d eve o m agi strado d eterm i n á- l o, até m es
mo ex officio, como fo rma d e efetivação desse d i reito f u n d a m e ntal)1 26•
Se a adeq uação d o p roced i m e nto é um d i reito f u n d a m e ntal, cabe ao ó rgão
j u risdicional efetivá-lo, q uando d iante de u ma regra p roced i m e ntal i n ad eq uada às
pec u l i aridades do caso co n cret01 27, q u e i m pede, por exe m p l o, a efetivação d e u m
d i reito f u n dame ntal ( à d efesa, à p rova, à efetividade etc.).
C o m o exa m i n ad o e m i t e m anterior, a parte f i n a l d o art. 7a do C P C
i m p õ e a o j u i z o dever d e z e l a r p e l o efetivo c o n t raditório; e s s e dever
se c u m p re exata m e n t e com a p rom oção d e adeq u ação p roced i m e n tal
feita p e l o j u iz .
É como afi rma H u m b e rto Ávi la, refe ri n d o ao d evi d o p rocesso legal, d o q u al, é
p reciso l e m b rar, se extrai o p ri n cípio d a adeq uação: " N o p l a n o da efi cácia d i reta, os
p ri n cípios exerce m uma função in tegra tiva, n a medida e m q ue j u stificam agregar
e l e m e ntos não previstos em s u b p ri n cípios ou regras . M e s m o q u e um e l e m e nto
i n e re nte ao fi m que d eve ser b uscado não esteja p revisto, ainda ass i m o p ri n cí
p i o i rá garanti - l o . Por exe m plo, se não há regra expressa q u e oport u n ize a d efesa
ou a abert u ra d e p razo para m a n ifestação d a parte no p rocesso - m as e las são
1 25 . Ass i m , considera n do a "fu n ção bloq ueado ra" dos p r i n cípios, " porquanto afastam eleme ntos exp ressam ente
p revistos que sejam i n co m patíveis com o estado ideal de coisas a ser p ro m ovido", ÁVI LA, H u m b e rto . Teoria dos
princípios, cit., p . 98. Ass i m , tam bém, o art. 486•, n. 4 e 5, do CPC português, que preveem regras que articu·
Iam o pri ncípio da ade q u ação j udicial: "4. Ao M i n isté rio P ú b l ico é concedida a p rorrogação do p razo q uando
careça de i nformações q u e n ão possa obter de ntro dele o u q uando ten h a de aguardar resposta a consu lta feita
a i n stância su perior; o pedido deve ser f u n d a m entado e a p rorrogação não pode, e m caso algu m , i r além de
30 dias. 5 . Quando o tri b u nal conside re q u e ocorre motivo p o n d e roso q u e i m peça ou dificu lte anormal m e nte
ao réu o u ao seu mandatário j udicial a o rga n i zação da defesa, poderá, a req uerime nto deste e sem p révia
audição da parte contrária, prorrogar o p razo da contestação, até ao l i m ite m áxi m o de 30 dias".
1 26. Encampando essa ideia e a dese nvolvendo, OLIVEIRA, G u i l h erme Peres de. Adaptabilidade judicia l - a modifi
cação do procedimento pelo juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 201 3 .
1 27 . Por todos, MARI N O N I , Luiz G u i l h erme. Técnica processual e tu tela d o s direitos. S ã o Pau lo: RT, 2004.
118
N O R M A S F U N DA M E N TA I S D O P R O C E S S O C I V I l
n ecessárias -, elas deve rão ser garantidas com b a s e n o p ri n cípio do d evido p rocesso
legal""8•
A flexi b i l idade d o p roced i m e nto às exigê ncias d a causa é, então, f u n d a m e ntal
para q u e se mais faci l m e nte ati njam os fi n s d o p rocesso. Essa visão se coad u na
com téc n i cas d e gere n c i a m e nto p rocessual q u e vêm se n d o i m p lantadas n a E u ro pa,
s o b retu d o em F rança e na l n glate rra"9•
Carlos A l b e rto Alvaro d e O l ivei ra s u ge ria, para uma refo r m a legis lati
va, o estab e l eci m e nto d o p r i n cí p i o d a adaptab i l i d a d e (q u e e l e d e n o
m i n ava d e p r i n cí p i o d a adeq u ação fo r m a l , segu i n d o a t e rm i n o l ogia
d o CPC Port u g u ê s , que c o n t é m e n u n ciado e x p resso n e s s e senti d o ' 30)
c o m o p ri n cípio ge ra l do p rocesso, u m a e s p é c i e de cláusula 3era t de
adequação do processo, "fac u ltando ao j u iz, o b t i d o o acordo das
partes, e s e m p re que a tram itação p ro c e s s u a l p revi sta n a lei n ão s e
adapte p e rfeita m e nte às exigê n cias d a d e m a n d a afo rada, a poss i b i l i
d a d e d e a m o l d a r o p roced i m ento à es pecificidade d a cau sa, p o r m e i o
d a p rática d e atos q u e m e l h o r s e p restem à a p u ração d a verdade e
acerto da d e c i s ão, p resci n d i n d o dos q u e s e reve l e m i n i d ô n e o s para
o fim d o p rocesso " ' l ' .
1 28. ÁVI LA, H u m berto. Teoria dos princípios - d a definição à aplicação dos princípios jurídicos. 5 ed. São Paulo:
M a l h ei ros ED., 2006, p. 97.
1 29. AN DRADE, Érico. "As n ovas perspectivas do gere n ciamento e da 'contratualização' do p rocesso". Revista d e
Processo. São Pau l o : RT, 201 1 , n . 1 93, p . 1 76 e segs.
1 30. Art. 547, do CPC de Portugal: "O j u iz d eve adotar a tram itação p rocessual adequada às es pecificidades da cau
sa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos p rocessuais ao f i m que visam ati n g i r, assegurando u m p rocesso
e q u itativo".
1 3 1 . OLIVEI RA, Carlos Alberto Alvaro de. " Efetividade e P rocesso de C o n h ec i m ento". Revista de Processo. São Pau l o :
RT, 1 999, n . 9 6 , p . 66.
1 19
FREDIE DIDIER JR.
2. 1 2. 1 . Nota introdutória
1 3 2. Sobre o s problemas desta dicotomia, DAMASKA, M i rjan R. The faces o f justice a n d State Authority. N ew Have n :
Vale U n iversity Press, 1 986, p. 3 e segs; CHASE, Oscar G. "A 'exce pcionalidade' a m e ricana e o d i reito p rocessual
com parado". Revista de Processo. São Pau l o : RT, 2003, n . n o, p . 1 22 .
1 20
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 3 3 . J O LOWI CZ, ] . A. "Adversarial an i n q u isitorial a p p roaches to civil litigati o n " . On civil procedure. Cam b ridge: Cam
b ridge U n iversity P ress, 2000, p. 1 77 .
1 34. DAMASKA, M i rjan R. The faces o f justice a n d State Authority, cit., p . 3 . N o o rigi n a l : " T h e adversarial mode o f
p roceed i n g takes i t s s h a p e f r o m a contest or a d i s p ute: it u nfolds as an e ngage m e nt o f two adversaries before
a relatively passive decision maker whose p r i n c i pal d uty i s to reach a verdict. The n o n adversarial mode is
structu red as an official i n q u i ry. U nder the fi rst system , the two adversaries take charge of m ost p roced u ral
action; under t h e secon d , officials perfo rm m ost activities".
1 35 . M O R E I RA, ]osé Carlos Barbosa. "Os poderes do j u iz na d i reção e n a i n strução do p rocesso". Temas de direito
processual civil - q uarta série. São Pau l o : Saraiva, 1 989, p . 45-46.
1 21
FREDIE DIDIER )R.
1 22
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 38 . J O LOWI CZ, j . A. "Adversarial an i n q u i sitorial a p p roaches to civi l l itigation", cit., p. 1 7 5-1 76.
1 39 . M O R E I RA, José Carlos Barbosa. " Reformas p rocessuais e poderes do j u iz". Temas de direito processua l - 8•
série. São Paulo: Saraiva, 2004.
1 40. BEDAQ U E, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 3' ed. São Pau l o : RT, 200 1 , p . 90.
1 4 1 . Palestra a p resentada nas IX jornadas Bras i l e i ras d e Di reito P rocessual, em 29.08. 201 2, Rio d e j a n e i ro .
1 23
FREDIE DIDIER JR.
1 42 . Sobre essa conce pção, a m p l a m e nte, consu ltar a coletânea AROCA, ]uan M . (org.). Proceso e ideo logía. Val e n cia:
Tirant lo blanch, 2006.
1 43 . M O R E I RA, ]osé Carlos Barbosa. "O neop rivatismo n o processo civi l " . Leituras complemen tares de Processo civil.
7' ed. Salvador: Ed itora J u s Podivm, 2009, p. 309-320.
1 44. AROCA, ] u a n M o ntero. Los princípios po líticos de la nueva Ley de Enjuiciamiento Civil. Val ência: Ti rant lo blanch,
200 1 , p. 1 06 - 1 08; M E N D O N ÇA, Luís Correia de. "O vírus autoritário". julgar. Lisboa: Associ ação s i n d ical dos j uízes
portugueses, 2007, n . 1, p. 86 e segs.
1 45 . G RECO, Leonardo. "Publicismo e p rivatismo n o processo civi l". Revista de Processo. São Paulo: RT, 2008, n. 1 64, p.
49- Ver, a propósito, mais recentemente, contundente ensaio demonstrando a i m p ropriedade da relação entre
autoritari smo e proteção da boa-fé process ual, PICÓ 1 J U N OY, ]oan. " La buona fede processuale: u n a man ifestazio
ne dell 'auto ritarismo giu risdizionale?". Rivista di Diritto Processua/e. M i lano: CEDAM, 201 3, p. 1 7 1 e segs.
1 46 . G RECO, Leonardo. " P u b l i c i s m o e p rivatismo n o processo civil", cit., p. 5 2 .
1 24
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 47 . OLIVEI RA, Carlos Alberto Alvaro d e . "Garantia do Contraditório". Garan tias Constitucionais do Processo Civi l . São
Paulo: RT, 1 999, p . 1 39- 1 40.
1 48. Sobre esse papel do pri n cípio do contraditório, neste contexto h i stóri co, m u ito oportu na a leitura de M IT I D I ERO,
Daniel. Colaboração no processo civil, cit., p . 89-90.
1 49. "Colaboração essa, acentue-se, vivificada por permanente diálogo, com a co m u n i cação das ideias s u b m i
n i stradas por cada um d e l e s [sujeitos p rocess uais]: juízos h i stóricos e valorizações j u rídicas capazes de s e r
e m p regados conve n ientemente n a decisão. Semel hante cooperação, ressalte-se, m a i s a i n d a se justifica pela
complexidade da vida a tual". (OLIVEI RA, Carlos Al berto Alvaro de. "Poderes do j u iz e visão cooperativa do
p rocesso", cit., p . 27, texto entre colchetes e grifo acrescentados.) O autor tam bém defe n d e a existê ncia deste
novo modelo de d i reito p rocessual (cit., p . 28).
1 50. N U N ES, Dierle )osé Coe l h o . Processo jurisdicional democrático. Cu ritiba: ) u ruá, 2008, p . 2 1 5 . Neste m e s m o
s e n t i d o , ZANETI ) r. , H e r m e s . Processo constitucional, c i t . , p . 60-6 1 .
1 5 1 . G REGER, Rein hard. "Coope ração como p ri n cípio p rocessual". Ronaldo Koc h e n (trad .). Revis ta de Processo. São
Paulo: RT, 20 1 2, n. 206, p. 1 25 .
1 52. M IT I D I ERO, D a n i e l . Colaboração no processo civil, cit., p . 1 02- 1 03.
1 25
fREDIE DIDIER )R.
p rocesso i3norando o u minimizando o papel d a s partes n a " d ivisão d o trabal h o " ' 53,
m as, s i m , e m u m a posição paritária, com d iálogo e e q u i líbrio. A coo p e ração, co rre
tame nte co m p re e n d i da, em vez d e " d eterm i nar apenas q u e as partes - cada u m a
para si - d i scutam a gestão ade q uada d o p rocesso p e l o j u iz, faz c o m q u e essas d e l e
partici p e m " ' 54•
N o e n tanto, n ão h á paridade n o m o m e nto da decisão; as partes n ão decid e m
c o m o j u i z; trata-se d e função q ue l h e é exc l u siva. Pode-se d i z e r q u e a decisão
j u d icial é fruto da atividade p rocessual em coo pe ração, é res u ltado das d i scussões
t ravadas ao l o n go d e todo o arco d o p roced i m e nto; a ativi dade cogn itiva é com par
t i l h ada, m as a d ecisão é man ifestação d o poder, q u e é exc l u sivo do ó rgão j u risdicio
nal, e n ão pode ser m i n i m izado. N este m o m e nto, revela-se a n ecessária ass i m etria
e nt re as posições das partes e a d o ó rgão j u risdicional: a d eci são j u risdicional é
essencial m e nte u m ato d e pod e r. E m u m p rocesso auto ritário/i n q u isitorial, h á essa
assi m etria também n a c o n d u ção d o p rocesso'55•
Assimetria, aq u i , n ã o sign ifica q u e o ó rgão j u risdicional está e m u m a
posi ção processual com posta apenas p o r poderes processuais, d i sti nta
da posição p rocessual das partes, recheadas d e ônus e deveres. Os
p r i n cípios do devido processo lezjal e do Estado de D i reito i m p utam ao
j u iz u m a série de d everes (ou deveres-poderes, como se q u ei ra), q u e o
fazem tam bém s uj eito do contraditório, como já se d i s s e . O exe rcício da
f u n ção j u ri s d i c i o n al d eve o bedecer aos l i m ites do devido p rocesso' 56•
Ass i m etria sign ifica apenas q u e o ó rgão j u risdicional tem uma f u n ção
q u e l h e é p ró p ria e q u e é conteúdo d e um poder, q u e l h e é exc l u sivo.
1 5 3 . Expressão consagrada em doutrina: J O LOWICZ, J . A. "Adve rsarial an i n q u isitorial a p p roaches to civil litigati o n " .
On civil procedure. Cam b ridge: Cam b ridge U n ivers ity Press, 2000, p. 1 82; M O R E I RA. J o s é Carlos Barbosa "O
p ro b l e m a da 'd ivisão do trabal ho' entre j u iz e partes: aspectos term i n ológicos". Temas de direito processual.
São Pau l o : Saraiva, 1 989, 4' série, p . 3 5·44·
1 54. G REGER, Rei n h ard. "Cooperação como p r i n cípio p rocessual". Ronaldo Koch e n (trad .). Revista de Processo. São
Paulo: RT, 201 2, n. 206, p . 1 25.
1 55 . " N o modelo assi m étrico, todavia, o m agistrado passa a gozar de amplos poderes de co n d u ção do processo,
ass u m i n d o e m defin itivo a sua di reção" ( M I T I D I ERO, Daniel. Colaboração no processo civil, cit., p . 98 ) .
1 56. Assi m , ZAN ETI ) r., Hermes. Processo constitucional. Rio de J a n e i ro : Lu m e n ) u ris, 2007, p. 1 98 · 1 99.
1 5 7 . CADI ET, Lo'ic. " Los acuerdos p rocesales e n derecho francés: situación actual de la contractualización dei p reces·
so y de la j u sticia e n Francia". Civil Procedure Review, v. 3, n. 3, p . 1 8, d i s p o n ível em www.civi l p rocedu re review.
com, c o n s u ltado em 2 1 .04.201 4.
1 26
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
Para tanto, é p reciso l e m b rar o q uanto se disse n o capít u l o i ntrod utório d este
Curso: o p rocesso é um feixe de relações j u rídi cas, q u e se estabelecem e ntre os
diversos sujeitos p rocessuais, em todas as d i reções. É por isso q ue o art. 6o d o C P C
d ete r m i n a q u e t o d o s os sujeitos p rocess uais d evem cooperar en tre si. Os d everes d e
cooperação s ã o conte ú d o d e todas as relações j u rídicas p rocessuais q u e com põem
o p rocesso: autor-réu, autor-j u iz, j u iz- ré u , autor- réu-ju iz, j u iz- perito, p erito-autor,
p e rito- réu etc. Essa é a p re m i ssa m etodológica i n d i s p e n sáve l para co m p re e n d e r o
conteúdo d ogm ático d o p ri n cípio d a cooperação .
Vamos ad iante.
o princípio da coo peração atua diretamen te, i m p utan d o aos sujeitos do p rocesso
deveres. Ass i m , são ilícitas as cond utas contrárias à o bten ção do "estado d e coisas"
(co m u n idade p rocessual d e trabal ho) q u e o p ri n cípio da cooperação b usca promover.
Essa eficácia normativa independe da existê ncia de regras jurídicas exp ressas.
Se n ão h á regras exp ressas q ue, p o r exe m p lo, i m p utem ao ó rgão j u risdicional o
d ever de manter-se coerente com os seus p ró p rios co m po rtam entos, p rotegen d o
a s partes c o ntra eventual co m po rtam e n to cont rad itório (venire con tra factum pro
prium) do ó rgão j u lgado r, o p ri n cíp i o d a cooperação garanti rá a i m putação deste de
ver ao magistrado . Ao in tegrar o s i stema j u rídi co, o p r i n cípio da coo p e ração garante
o meio (i m putação de uma situação j u ríd ica passiva) n ecessário à o bte n ção do fi m
a l m ejado (o p rocesso coo p e rativo).
Repita-se: o p ri n cípio d a coo peração to rna devidos os c o m p o rtam e ntos n eces
sários à o bten ção de um p rocesso leal e coo p e rativo.
O mais d ifíci l é, rea l m e nte, siste m atizar os d everes p rocessuais q u e d ecorrem
d o p ri n cípi o da cooperação. Para tanto, convém vale r-se d e tudo o q u e j á se co n s
t ru i u a res peito dos deveres d ecorre n tes d o p ri ncípio da boa-fé n o âm bito d o d i reito
p rivad o . O dever de cooperação é um deles. Os d everes d e cooperação podem ser
d ivididos e m d everes d e esclarecimen to, lealdade e de pro teção' 58• Essa s i stemati
zação pode ser a p roveitada para a co m p reen são d o conteúdo dogmático d o p ri n cí
p i o da coo p e ração p rocessu a l ' 59•
1 58. CORDEI RO, Antó n i o M a n u e l da Rocha M e n ezes. Da boa fé no Direito Civil, cit., p. 604; VASCO N CELOS, Pedro Pais.
Con tratos a típicos. Coi m b ra: A l m e d i na, 1 995, p . 405.
1 59. O d iálogo ("conceptual cross-conections") e ntre as teorias é um dos critérios apresentados por Peczen i k para
identificar a coerê n cia (e, ass i m , a consistência) de u m a concepção teórica:"whe n u s i n g a theory to j ustify a
statem ent, o n e s h o u l d see to it that the theory is expressed i n as many concepts s i m i lar to those used i n other
theories as poss i b l e " (PECZEN I K, Alexsan d e r. On law and reason. 2• ed. S p r i n ge r, 2008, p . 1 43). Neste caso,
parece f u n dame ntal dialogar com o que foi construído pela ciência do Direito p rivado em torno da cooperação .
1 27
FREDIE DIDIER JR.
1 60. SOUSA, M i g u e l Teixei ra d e . Estudos sobre o novo processo civil. 2' ed. L i s b o a : Lex, 1 997, p . 6 5 . Ass i m , t a m b é m ,
G RASSI, L ú c i o . "Cognição p rocessual civi l : atividade dialética e cooperação i ntersu bjetiva na bu sca da verdade
real". Revista Dialética de Direito Processual. São Pau l o : Dialética, 2003, n . o6, p . so.
1 6 1 . Art. 7•, 2, do CPC de Portugal: "O juiz pode. e m q ua l q u e r altura do p rocesso, ouvir as partes, seus re p rese n
t a n t e s o u m a n datári o s j u d i c i a i s , c o n v i d a n d o - o s a fo r n e c e r o s e s c l a reci m e ntos s o b re a m a t é r i a d e facto o u d e
d i reito que se afigurem pert i n e ntes e dando-se c o n h e c i m ento à outra parte dos resu ltados da d i l igência".
1 62 . Afi rmando a existência de deveres para o j u iz, i n c l usive o dever de esclarecer as partes, M I RAN DA, Francisco
Cavalcanti Pontes de. " P ró l ogo". Comen tários ao Códi80 de Processo Civil. 2• e d . Rio de j a n e i ro: Forense, 1 958,
t. 1, p . XXI I .
1 28
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 63 . Art. 3', 3, CPC Portugal: "O j u i z deve observar e fazer c u m prir, ao longo de todo o p rocesso, o p r i n cípio do
contrad itório, n ão l h e sendo lícito, salvo caso de man ifesta desnecessidade, decidir q u estões de d i reito o u
de facto, m e s m o q u e de c o n h e c i m e nto ofi cioso, sem q u e as partes tenham tido a possi b i l idade de sobre elas
se p ro n u n ciare m " . Art. 8°, 2, CPC de Macau : " 2 . O juiz pode, e m q ua l q u e r altura do processo, ouvir as partes,
seus representantes ou mandatários j u d iciais, convidando-os a fornecer os esclareci mentos sobre a maté ria
de facto o u de d i reito que se afi g u rem pertine ntes e dando conhecimento à outra parte dos resu ltados da
d i l igência". Art. 16 Novo Código de Processo Civil francês: " Le j u ge doit, e n toutes ci rco n stances, fai re o b
server et observer l u i - m ê m e le principe de la contradict i o n . l i n e peut rete n i r dans sa d é c i s i o n , les moye ns,
les explications et les docu m e nts i nvoq ués ou p roduits par les parties que si cel lesci ont été à m ê m e d ' e n
dé battre contrad i cto i rement. l i n e p e u t fonder sa d é c i s i o n s u r I e m o y e n s de d roit q u ' i l a relevés d ' office s a n s
avo i r au p réalable i n vité les parties à présenter l e u rs observat i o n s " . (na t rad ução de EDUARDO FERREIRA JoRDÃo: " O
j u i z deve, e m todas a s c i rcu n stâncias, fazer observar e observar ele m e s m o o pri n cípio do contraditóri o. E l e
n ã o p o d e considerar, na s u a decisão, as q u estões, as explicações e os d o c u m e n tos i nvocados o u produzidos
pelas partes a m e n o s que estes tenham sido o bjeto de contraditório. Ele n ão pode fundame ntar s u a decisão
e m q u estões de d i reito que suscitou de ofício, sem q u e te n h a, p reviam ente, i n t i m ado as partes a apresentar
suas observações".) Art. 1 0 1 , 2, CPC ital iano, recentemente refo rmado: art. 101 do CPC italiano agora tem um
"2o com ma", com a segu i nte redação: "Se ritiene d i porre a fondamento della decisione una q uestiona rilevata
d ' ufficio, il giud ice riserva la decisione, assegnando alie parti, a pena di n u l l ità, un term i n e, n o n i n feriore a
venti e n o n s u periore a q uaranta giorn i dalla co m u n icazione, per il de posito i n cancelleria di m e m o rie conte
nenti osservazio n i su lla medesima q uestio n e " .
1 64. G RASSO, Eduardo. " La c o l l a b o razi o n e n e l p rocesso civi l e " . Rivis ta d i Diritto Processua le. Padova: C E D A M ,
1 966, n . 4, p . 5 9 1 -592 e 6o8; OLIVE I RA, C a r l o s A l b e rto Alvaro d e . " Poderes d o j u i z e v i s ã o c o o p e rativa do
p rocesso". Revista d e Direito Processual Civil. C u ritiba: G ê n esis, 2003, n . 27, p . 28- 29; B E DAQ U E, José R o b e r
to dos Santos. "Os e l e m e ntos o bj etivos da d e m a n da exam i n ados à l u z do contraditó rio". Causa de pedir
e pedido no processo civil (q ues tões po lêmicas). José R o b e rto dos Santos Bedaq ue e J o s é Rogé rio Cruz e
Tucci (coord .). São Pau l o : RT, 2002, p. 39-42; N U N ES, D i e r l e José Coe l h o . Processo jurisdicio nal democrático.
C u ritiba: J u ruá, 2008, p . 224- 2 3 1
1 29
FREDIE DIDIER JR.
N o d i reito bras i l e i ro, esse dever de p reve n ção está c o n c retizado e m diversos
d i s p ositivos: arts. 76, caput, 3 2 1 , 932, par. ú n ., 1 .0 1 7, § 3o, 1 .029, § 3o, todos do CPC.
O CPC é estrutu rado para refo rçar o dever de prevenção, q u e, espal h ado e re peti do
ao l o n go de todo o texto, reforça o modelo coo p e rativo adotado e m n osso sistema.
O art. 321 é e m b l e m ático; e l e garante ao dema n dante o d i reito d e e m e n dar a
peti ção i n i cial, se o ó rgão j u risdicio n al co n s i d e rar q u e l h e falta alg u m req u i sito; não
é permitido o i n defe ri m e nto da petição i n icial sem que se dê a o p o rt u n i dade d e
correção d o defeito' 67• Não c u m p ri n d o o a u t o r a d i l igência q u e l h e fo ra ordenada, a
peti ção i n i cial será i n d eferida.
N ote, enfi m , q u e h á o princípio da cooperação, q ue se d esti n a a tran sfo rmar o
p rocesso e m u m a " co m u n i dade d e trabal h o " (Arbeits3emeinschaft, comunione de/
/avaro) "e a res ponsabil izar as partes e o t ri b u nal pelos seus res u ltados"'68, e há as
re3ras de cooperação, q u e concretizam esse p ri n cípio (como, p. ex., a q ue exige q ue
o p ro n u n ci a m e n to j u d icial seja claro, i nteligíve l).
H á o u t ras m a n ifestações d a c o n sagração do m o d e l o coope rativo d e
p rocesso n o B ras i l .
1 65. SOUSA, Miguel Teixeira d e . Estudos sobre o novo processo civil. 2 • ed., cit., p. 66. Assim, tam bém, G RASSI, Lúcio.
"Cogni ção processual civi l : atividade dialética e cooperação i ntersu bjetiva n a busca da verdade real", cit., p . 52.
1 66. SOUSA, Miguel Teixeira de. Estudos sobre o novo processo civil. 2• ed., cit., p. 66.
1 67 . G RASSI, Lúcio. "Cognição p rocessual civi l : atividade dialética e coope ração i ntersu bjetiva n a b u sca da verdade
real", cit., p. 5 2 .
1 68. SOUSA, Miguel Teixeira de. Estudos sobre o novo processo civil. 2• ed., c i t . , p . 62.
1 30
N o R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 69. A N D RADE, Érico. "As novas perspectivas d o gere n ciamento e d a 'contratualização' d o processo", cit., p . 1 87·
1 89.
1 70. S O U SA, Miguel Teixeira d e . Estudos sobre o n ovo processo civil. 2• ed. Lisboa: Lex, 1 997, p. 65; BARREI ROS,
Lorena M i randa. Fundamentos constitucionais do princípio da cooperação processual, p . 1 99·20 1 .
1 7 1 . S I LVA, Pau l a Costa e. Acto e processo: o dogma da i rrelevância da vontade na i nterpretação e nos vícios do
acto postu lativo . Coi m b ra: Coi m b ra, 2003, p . 6oo; GO UVEA, Lúcio G rassi d e . Cogn ição p rocessual civi l : atividade
d i alética e coope ração i nters u bjetiva na b u sca da verdade real . In: D I D I E R J Ú N I O R, Fredie (org.). Leituras com
p lemen tares de processo civil. 7' e d . Salvador: jus Podivm, 2009, p. 338; BAR R E I ROS, Lo re n a M i randa. Funda
mentos constitucionais do princípio da cooperação processual, p . 200·20 1 .
131
FREDIE DIDIER JR.
1 72 . GAJARD O N I , Fernando Fon seca. Flexibilização procedimental. São Pau l o : Atlas, 2008, p. 2 1 5 .
1 7 3 . "Afi nal, se o p rocesso j u d icial n ão é apenas coisa das pa rtes, s ã o elas as dest i n atárias da tutela j u risd icional e
são os seus i nteresses q u e a deci são j u dicial d i retamente ati nge, e, através deles, os seus f i n s ú lti mos, em bora
remotos e abst ratos, de tutela do i n te resse geral da coletividade, do bem co m u m e da paz social". (G RECO,
Leo nardo. "Os atos de d i s posição p rocessual - p r ime i ras reflexões". Revis ta Eletrônica de Direito Processual.
Disponível e m www. revistap rocessual.com, 2007, v. 1, p. 8.)
1 74. "Há q u e se trabal har com a auto n o m i a das partes não mais no sentido privatístico clássico, mas, s i m , dentro
de u m a pers pectiva constitucional e de u m a teoria dos d i reitos f u n d a m e ntais q u e auto riza e ao mesmo te m po
i m põe l i m ites às manifestações de vontade" (G O D I N H O, Robson Renault. Reflexões sobre os poderes i n strutó·
rios do j u iz: o p rocesso n ão cabe do " Leito de Procusto". Revis ta de Processo. São Pau lo: RT, 201 4, n . 235, p . 87).
1 32
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I l
1 7 5 . CAPO N I , Remo. "Auto n o m i a p rivata e p rocesso civi le: gli acco rdi p rocess u a l i " . Civil Procedure Review, v. 1, n.
2, 201 0, p. 44, d i s p o níve l e m www.civi l p rocedu re review.com, consu ltado e m 1 6.04.20 1 4; "Auto n o m i a p rivada
e p rocesso civi l : os aco rdos p rocessuais". Ped ro Gomes de Q u e i roz (trad .) Revista de Processo. São Pau lo: RT,
201 4, n . 228, p . 362; CAD I ET, Lo"ic. " Los acuerdos p rocesales e n derecho francés: situaci ó n actual de la contrac
tualización del p rocesso y de la j u sticia e n Francia". Civil Procedure Review, v. 3, n. 3, p. 4-6, disponível em
www.civi l p roced u re review.com, consultado e m 2 1 .04.20 1 4.
1 33
FREDIE DIDIER JR.
1 76 . Sobre o exame d a s l i m itações i n fraconstitucionais aos d i reitos f u n d a m e ntais, S I LVA, Vi rgíl io Afo nso d a . Direitos
fundamen tais - conteúdo essencial, restrições e eficácia. 2• ed. São Paulo: M a l h e i ros, 201 o; N OVAIS, J o rge Reis.
As Restrições aos Direitos Fundamen tais não Expressamente Autorizadas pela Constituição . 2• ed. Coi m b ra:
Coi m b ra Ed ito ra, 201 0.
1 7 7 . A N D RADE, Érico. "As n ovas pers pectivas do gere n ciame nto e da 'contratualização' do processo", cit., p . 1 7 5 .
1 34
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 78. Remo Caponi defe n d e a adoção de solução s e m e l hante (regu lamentação negociai atípica do p rocesso), como
uma " p roposta radical" para o d i reito ital iano (CAP O N I , Remo. "Auto n o m i a p rivata e p rocesso civile: gli acco rdi
p rocess u a l i " . Civil Procedure Review, v. 1, n . 2, 201 0, p . 49, d i s p o n ível em http://www.civi l p rocedu rereview.com/
b usca/baixa_arq u ivo. ph p?id= 1 9m consultado e m 1 6.04. 20 1 4; "Auto n o m i a p rivada e p rocesso civi l : os acordos
p rocess uais". Ped ro Gomes de Q u e i roz (trad .) Revista de Processo. São Pau lo: RT, 2014, n. 228, p. 366.).
1 79 . CAOI ET, Lok. " Los acuerdos p rocesales e n derecho francés: situació n actual de la contractualizació n dei p ro
cesso y de la j u sticia e n Francia", cit., p . 1 8, d i s p o nível e m www.civ i l p rocedu re review.com, consu ltado e m
2 1 .04.20 1 4 .
1 35
FREDIE DIDIER JR.
1 36
N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 80. SI LVA, AI m i ro do Couto e. "O princípio da segurança jurídica (proteção à confiança) no direito púb lico brasileiro
e o direito da Administração Púb lica de anular seus próprios atos adminis trativos: o prazo decadencial do art.
54 da Lei do Processo Administra tivo da União (lei no 9. 784/7 999)". Revista Eletrônica de Di reito do Estado,
Salvado r, n . 2, 2005. Disponível em: << http://www.di reitodoestado.co m . b r/revista·eletron ica-de-di reito·do-esta·
do>>. Acesso e m 21 de maio de 20 1 2. Neste sentido, tam bém, ARAÚJO, Valter S h u e n q u e n e r de. O princípio da
proteção da confiança Uma Nova Forma de Tu tela do Cidadão Diante do Estado. Rio de j a n e i ro: l m petus, 201 0,
p. 5 5 - 57; CABRAL, Anto n i o do Passo. Coisa julgada e preclusões dinâmicas. Salvador: Editora jus Podivm, 20 1 3,
p. 28 1 , com a m p las referê ncias.
1 8 1 . STF, 2' T., re i . M i n . G i l mar Ferre i ra Mendes. Q uestão de Ordem na Petição ( M C) n . 2.900- RS, j . e m 27.05.2003,
p u b l icado n o DJU de o1 .o8.2003, p. 6.
137
FREDIE DIDIER JR.
1 82 . Sobre o ass u n to, SAR M ENTO, Daniel (org.). In teresses públicos versus in teresses privados. Daniel Sarmento
(org.). Rio de janeiro: Lumen j u ris, 2005.
1 83 . ÁVI LA, H u m berto. sesurança jurídica. Entre permanência, m u dança e real ização n o Di reito Tri butário. São Pau lo:
M a l h e i ros Ed., 201 1 , p . 360.
1 84. ÁVI LA, H u m berto. Sesurança jurídica, cit., 3 6 1 .
1 85. ÁVI LA, H u m berto. sesurança jurídica, cit., p. 36o.
1 38
N O R M A S F U N D A M E N TA I S DO P R O C E S S O C I V I L
( 1 ) Primeiro.
A base da confiança "trad uz-se n as n o rmas q u e servi ram de fu n d a m e nto para
a (i n )ação i n divi d ual". Exige-se a s u a "aptidão para servi r d e f u n d a m e nto para o
exe rcício d e d i re itos d e l i be rdade e p ro p riedade", i n d e p e n d e nte m e nte dos seus
req u i sitos d e val idade.
A base da confi a n ça é o ato n o rmativo - q ua l q u e r ato n o rmativo : lei, deci são
j u d icial ou ato ad m i n istrativo -, q u e serviu d e f u n dame nto para um d ete rm i n ad o
co m po rtam e nto d o sujeito.
O s atos defeituosos podem configu rar-se e m base d e confiança'88• Lei defeituo
sa é espécie de ato j u ríd ico defeitu oso; decisão j u d i cial defeituosa, i d e m .
A base d e co nfiança co nfigu ra-se, n a prese n ça e m maior o u m e n o r grau, o u até
na ausência de algu n s d e les, dos seg u i ntes c ritérios - não há n ecessidade de p re
e n c h i m e nto de t o d o s e l es; os critérios servem c o m o parâm etros para avaliar a base
d a confiança e, ass i m , avaliar se e e m q ue medida a confiança deve ser p rotegida:
(i) grau d e v i n c u l atividade: q u anto maior fo r o grau d e v i n c u lação d o ato n o r
m ativo, m a i o r d eve ser a expectativa d o j u ri s d i c i o n ad o q uanto ao seu c u m p ri m e nto
futu ro, já q u e m e n o r foi o seu poder de esco l h a e m e n o r foi a re partição d e risco
n a to mada da decisão (exe rcício d e l i be rdade - sob a o ri e ntação do p ró p ri o Di reito);
(ii) g rau d e aparência d e l egiti m i dade da base: não se analisa o "grau de
val idade d o ato", mas, s i m , se o ato teve aptidão para ser o bj eto da confiança de
positada pelos s ujeitos (aq u i atua a p res u n ção d e validade dos atos n o rm ativos)'89;
(iii) grau de mod ificab i l idade da base: q uanto mai o r fo r o grau de p rete n são
d e p e rman ê n cia, mai o r deve ser a p roteção da confiança n e l e depositada - n ão se
1 86. CORDEI RO, Antô n i o Menezes. Litigância de má-fé, abuso d o direito de acção e culpa i n agendo. Coi m b ra: A l m e -
d i n a, 2006, p . 5 2 .
1 87 . CORDEI RO, Antô n i o Menezes. Da boa-fé no Direito Civil. A l m e d i n a: Coi m b ra, 2007, p. 1 248.
1 88. ÁVI LA, H u m berto. Segurança jurídica, cit., p. 367-368.
1 89. "Tanto o ato estatal lícito q uanto o ilícito produzem efeitos concretos que não podem ser s i m plesme nte des
considerados: aquele q u e confiou, sem negligência nem c u l pa, e m um ato estatal, em razão do q ual d i s pôs de
m a n e i ra i ntencional e irreversível da sua l i berdade e do seu patri m ô n io, deve ser p rotegi do, pouco i m portando
a i licitude do ato . " (ÁVI LA, H u m berto. Segurança jurídica, cit., p. 3 8 1 )
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N O R M A S F U N D A M E N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
1 41
FREDIE DIDIER JR.
S o m e nte decisões j u d i ciais podem torn ar-se i n d i s c utívei s pela coisa j u lgada. C o m o
visto aci m a, a estabi l i dade do ato n o rmativo q u e serve como base da confiança é
u m dos c ritérios para a aferição da n ecess i dade d e dar a essa confiança a adeq uada
p roteção j u ríd i ca.
Mas não é só: a d ecisão j u ri s d i c i o nal q ual ifica-se tam bém pelo fato d e ter s i d o
p roduzida e m contrad itório, após p rocesso e m q u e se confe re à s partes o poder
d e i nfl u e n ciar n o co nte ú d o da d ecisão (as pecto s u bstancial do contraditó rio) e e m
q u e s ã o garantidos os d i reitos p ró p rios a o d evido p rocesso l egal, como o d i reito a o
rec u rso.
Tu do isso faz com que a deci são j u ri s d i c i o n a l seja um ato nor mativo dos mais
"confiáveis".
A relação, portanto, e n t re o p ri n cípio da p roteção da confiança e o exe rcíc i o do
poder j u ri s d i c i o nal é evid e nte.
CARRAZZA, Roq u e Anto n i o . F E R RAZ )R., Té rcio Sam paio. Efeito e x n u n c e as decisões d o ST]. S ã o Pau lo: M a n e i e ,
2007, passim; WAM B I E R, Teresa A r r u d a Alvi m; M E D I NA, ) o s é M i g u e l Garcia. Parte 3eral e processo de conheci
mento. São Paulo: RT, 2009, v. 1 , p. 47-48; CAB RAL, Anto n i o do Passo. Coisa jul3ada e preclusões dinâmicas.
Salvador: Editora jus Podivm, 20 1 3, p. 1 24, com referê ncias.
1 42
NORMA S F U N D A ME N T A I S DO P ROC E S SO C I V I L
203. WAM B I ER, Te resa Arruda Alvim; M E D I NA, )osé M i g u e l Garcia. Parte seral e processo de conhecimento. São Pau l o :
RT, 2009, v . 1 , p . 47-48.
204. CABRAL, Anto n i o d o Passo. Coisa julsada e preclusões dinâmicas, cit., p . 539 e segs.
205. BARROSO, Luís Roberto. " M u dança da j u ri s p rudência do S u p re m o Tri b u n a l Federal e m matéria trib utária. Segu
rança j u rídica e m o d u l ação dos efeitos t e m p o rais das decisões j u d i ciais". Revista de Direito do Estado. Rio d e
J a n eiro: Ren ovar, 2006, n . 2, p . 267- 269; ARA Ú JO, Valter S h u e n q u e n e r de. O princípio da proteção da confiança
Uma Nova Forma de Tutela do Cidadão Diante do Estado . Rio d e j a n e i ro: l m petus, 20 1 0, p. 1 88 - 1 92; CABRAL, An
tonio do Passo. Coisa julsada e preclusões dinâmicas, cit., p . 542; CAM POS, Art h u r S o m b ra Sales. " M eca n i s m o s
d e proteção d a s expectativas legíti m as n o c a s o d e resci são da c o i s a j u l gada m aterial". Trabal h o d e concl u são
d e c u rso. U n iversidade Fede ral d a Bahia, 20 1 2, p . 82-86.
206. CABRAL, Anto n i o d o Passo. Coisa julsada e preclusões dinâmicas, cit., p . 540.
207. CABRAL, Anto n i o d o Passo. Coisa julsada e preclusões dinâmicas, cit., p . 5 2 1 , com a m p l as refe rê ncias. O autor
arremata: "Com efeito, m u itas decisões d e q u e b ra de esta b i l i dade devem ser aco m p a n h adas por regras d e
transição p a r a evitar u m a r u p t u ra d a s expectativas q u e pudessem ter s i d o criadas e m favor da manutenção
da posição estável, fac i l itando uma adaptação s u ave ao n ovo regram ento. Nesse sentido, a ed ição de regras
d e tra n sição não d eve ser vi sta ape nas como um poder estatal, mas como um dever decorrente da cláusula d o
Estado d e D i reito, com o co rre lato e respectivo d i reito i n d ividual". (CAB RAL, Antonio do P a s s o . Coisa julsada e
preclusões dinâmicas, cit., p. 5 2 1 .)
208. So bre as regras d e tran sição criadas p e l o ó rgão j u risdicional n o caso de q u e b ra da esta b i l i dade, i n d i s p e n sável
a leit u ra d e CAB RAL, Anto n i o d o Passo. Coisa julsada e preclusões dinâmicas, cit., p. 5 20-544.
1 43
FREDIE DIDIER JR.
A i m po rtância disso reve la-se com m u ita clareza nas decisões e m j u risdição
c o n stitucional - e o art. 27 da Lei n. 9.868/ 1 999 corro b o ra essa assertiva209•
Essa téc n i ca tam bé m pode ser uti lizada tam bé m n a m u dança de j u ri s p ru d ê n
cia (overruling).
A possi b i l i dade de o ó rgão j u risdicional i n stitu i r essas regras de tran s 1 çao
parte da p re m i ssa, q u e é a m e s m a d este Curso, q u e a j u ri s d i ção é u m a ativi dade
1 44
NORMAS F U N D A ME N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
3. REGRAS
1 45
FREDIE DIDIER JR.
3.2. 1. Generalidades
2 1 0. CABRAL, Anto n i o do Passo. "A d u ração razoável d o p rocesso e a gestão d o t e m p o no p rojeto de n ovo Código
de Processo Civi l " . Novas Tendências do Processo Civil- estudos sobre o projeto do Novo Códi!Jo de Processo
Civil. Alexa n d re Frei re; B r u n o Dantas; Dierle N u n es; Fredie D i d i e r ] r.; ]osé M i g u e l Garcia M e d i na; Luiz Fux; Luiz
Henrique Vo l pe Camargo; Pedro M i randa de O l ive i ra (org.). Salvad or: Editora jus Podivm, 20 1 3, p . 90-9 1 . Ass i m ,
tam b é m , THEODORO ] r., H u m be rto; N U N ES, D i e rle; BAH IA, Alexand re; P E D R O N , Flávio Q u i n a u d . Novo CPC - fun
damentos e sistematização . Rio de J a n e i ro : Forense, 20 1 5, p . 1 45 .
1 46
NORMA S F U N D A ME N T A I S DO P R O C E S S O CIV I L
nada mais h á para ser feito; por isso, os autos (eletrô n icos o u n ão) são "entregues"
(eletro n i ca m e nte o u n ão) ao gab i n ete d o j u iz, para que e l e p rofi ra a decisão. Pela
regra, o j u iz d eve j u lgar d e acordo co m a o rd e m c ro n o l ógica da conc l u são: o p roces
so q ue p ri m e i ro ficar co n c l uso é o que p ri m e i ro s e rá j u lgad o . A l ista de p rocessos
aptos a j u l ga m e n to d eve rá estar permanenteme nte à d i sposição para c o n s u lta p ú
b l i ca em cartó rio e n a rede m u n d i a l de co m p utado res (art. 1 2, § 1 °, CPC).
A regra a p l i ca-se aos j u ízes e tri b u nais, d e q ua l q u e r i n stân cia, mas s o m e nte
se refe re às decisões finais - senten ças ou acó rdãos fi nais (art. 1 2, caput, CPC).
Ass i m , ficam exc l u ídas as deci sões i nte rlocutó rias ( p roferidas pelo j u iz)2 1 1 e os acór
dãos in terlocutórios (acórdãos q u e não ence rram o p rocesso, como, por exe m plo,
o acó rdão para exa m i n a r pedido de tutela p rovi s ó ri a em ação d i reta d e i n co n stitu
cionalidade).
1 47
FREDIE DIDIER JR.
Pela m e s m a razão, o j u lga m e nto do agravo i nterno, recu rso i nterposto contra
deci são de re lator, fica fo ra do âm bito de i n ci d ê n c i a dessa regra f u n d a m ental . O
caso já foi j u l gado; o ag ravo i n t e r n o l eva a qu estão para a revisão d o co l egiado a
q u e pert e n ce o relato r; ade m ais, c o m o se viu, os casos e m q u e se perm ite a deci são
do relator (art. 932, CPC) estão fo ra da i n cidência da regra de observân cia da o rd e m
c ro n o lógica - n at u ral q u e o j u lgamento do agravo i nterno, verdadei ro p ro l o n gam e n
t o d o ju l ga m e nto feito u n ipess oal m e nte p e l o re lator, tam bé m estivesse.
1 48
NORMAS F U N D A ME N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
Esse i n ciso exce p ci o n a as p refe rên cias legais"', que co m po rão uma l i sta p ró
p ri a (art. 1 2, § 3o, CPC) e as m etas do Conse l h o Nacional de j u sti ça, q ue cost u m a
estabelecer p ri o ridades de j u lgam ento d e processos aj uizados até dete rm i n ad o ano,
por exe m p lo . C o m o o desres peito a m etas d o CNJ pode ser considerado i nfração
disci p l i n ar, o legislad o r h o uve por bem criar mais essa exceção.
fundamen tada.
F i n a l m e nte, certa m e nte p reocu pado com situações excepcionais não reg u ladas
n a exte nsa l i sta d este §2o d o art. 1 2, o legislad o r resolveu estabelecer u m a regra ge
ral excetuadora: s e m p re q u e h o uver u rgên cia, reco n h ecida por decisão f u n d a m e n
tada, p o d e o ó rgão j u risdicio nal j u lgar dete rm i n ado processo, ignora n d o a o rd e m
c ro n o l ógica de co ncl usão. O i n te ressado p o d e req u e re r i s s o a o j u iz, d e m o n stra n d o
a u rgência. Req u e rerá, então, u m a t u t e l a de u rgência, q u e n o caso vi rá co nju nta
m e nte com a sentença (o q u e é possíve l, nos termos do art. 1 .0 1 2, § 1 °, V, CPC). A
decisão q u e n egar esse ped i d o estará, portanto, n egan do u m a tute la de u rgê ncia;
p o r i sso, será i m p ugnável por agravo d e i n stru m e nto (art. 1 .0 1 5, I , CPC).
O §6o d o art. 1 2 estabelece p rocessos prio ritários, que devem "fu rar" a fi la, para
ocu par o p ri m e i ro l ugar da l i sta - perceba, eles "fura m " a fila, mas entram nela. São
eles: a) p rocesso q u e tiver sua sente n ça o u acordão a n u lado, salvo q ua n d o h o uve r
n ecessidade de realização de d i l i gên cia o u de co m p l e m e ntação da i n stru ção; b)
2 1 2 . A p ro pósito, o art. 1 .048 d o CPC: "Te rão p r i o ridade d e tram itação em q ua l q u e r j uízo o u tri b u n a l os p roced i m e n
t o s j udiciais: I - e m q u e figure c o m o parte o u i n t e ressado pessoa com i d a d e i g u a l o u s u p e r i o r a 6o (sessenta)
anos ou p o rtad o ra de doença grave, ass i m co m p reendida q u a l q u e r das e n u m e radas no a rt. 6°, i n ciso XIV, da
Lei no 7 . 7 1 3, de 22 de deze m b ro de 1 988; 11- regu l ados pela Lei no 8.069, de 1 3 de j u l h o de 1 990 (Estatuto da
Criança e do Adolescente). § 1° A pessoa i n t e ressada na o btenção do ben efício, j u ntando p rova de s u a c o n d i
ç ã o , deverá req u e rê-lo à autoridade j u d i ciária com petente p a r a deci d i r o feito, q u e dete r m i n ará ao cartó rio d o
j u ízo a s p rovid ê n cias a serem c u m p ridas. § 2° Deferida a p r i o ri d ade, os a u t o s rece berão identifi cação p r ó p r i a
q u e evi dencie o regi me d e tram itação p r i o ritária. § 3° C o n c e d i d a a prioridade, essa n ã o cessará com a m o rte
do beneficiado, estenden do-se e m favor do cônjuge s u p é rstite o u d o compan h e i ro e m u n ião estáve l . § 4° A t ra
m itação prio ritária i n d e p e n d e d e deferi m e nto p e l o ó rgão j u ri s d i c i o n a l e deverá ser i m e d i atamente concedida
d iante da p rova da condição d e b e n eficiário". Dois outros exemplos. O a rt. 20 da Lei n . 1 2 . 0 1 6/2009 determ i n a
a prioridade d o man dado de segu rança s o b re todos os d e m a i s p rocessos, ressalvado o habeas corpus. O art.
19 da Lei n. 9.507/1 997 dete r m i n a a p r i o ridade d o ha beas data s o b re todos os d e m ais p rocessos, ressalvados
o mandado d e segu rança e o habeas corpus.
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q ua n d o ocorre r a h i pótese do art. 1 .040, i n ciso 1 1 , CPC, para q u e o tri b u nal possa
rea p reciar a causa e a p l i car a tese j u ríd ica fi rmada pelo tri b u nal s u perior.
Co m o forma de evitar co n d uta ard i losa da parte q u e p rete n d a i m pe d i r q u e a
causa sej a j u l gada, q ua l q u e r req u e ri m e nto fo rm u lado, após a i n c l usão do p rocesso
n a l ista, n ão altera a ordem cro n o l ógica para a decisão, exceto q ua n d o i m p l icar a
reabertu ra da i n stru ção o u a co nve rsão do j u l ga m e nto e m d i ligência (art. 1 2, §4o,
CPC). Deci d i d o esse req u e r i m e nto, o p rocesso retornará à m e s m a posi ção em q u e
anterio rm e nte se e n contrava n a l i sta (art. 1 2, § so, CPC).
Qual a con seq u ê n c i a q u e deco rre da i n o bs e rvância desta regra? A q u estão não
é si m p les. N ão parece ser o caso d e n u l i dade da d ecisão - não há real m e nte sentido
e m i nvalidar a deci são n este caso: o desrespeito à ordem c ro n o l ógica n ão p rej u d i ca
n e n h u m a das partes.
o p rej uízo é d e tercei ros, cujo p rocesso estava e m posi ção p ri o ritária n a l i sta.
Esse p rej uízo d o tercei ro não l eva à exi stê ncia d e um " i nteresse j u ríd i co", a j u stifi
car o recu rso d e tercei ro com o p ropósito d e i nvalidar a deci são; essa deci são não
tem por o bj eto q u a l q u e r d i reito d o te rceiro . O tercei ro pode rá, n o e ntanto, re p rese n
tar, perante o respectivo tri b u n al e o Conse l h o N aci o n al de j u stiça contra o j u i z q u e
deso bedeceu a o co m a n d o do art. 1 2, para a t o m ada d e p rovi dênci as de n atu reza
ad m i n i st rativa.
É possíve l, poré m , cogitar a poss i b i l i d ade de u m a das partes, certa m e nte a
p rej u d i cada c o m a deci são, su scitar q u e o desres peito à o rdem cro n o lógica l eva ao
reco n h eci m e n to da s u s p e i ção do j u i z q ue p roferi u a deci são (art. 1 45, IV, CPC). N ão
n o s parece possíve l dizer q u e esse desres peito l eve, por si, à s u s p e i ção; mas e l e
pode ser considerado u m i n dício de s u s pe i ção. Reco n h ecida a suspeição, a decisão
1 50
NORMAS F U N D A ME N T A I S DO P R O C E S S O C I V I L
p rofe rida s e ri a n u la, por esse m otivo, n ão pelo d e s respeito à ord e m c ro n o l ógica
(art. 1 46, §6°, CPC).
Para reg u l a r a tra ns ição entre o regi m e do CPC/ 1 97 3, e m q u e não h avia essa
regra f u n d a m e ntal, e o regi m e atual, o §5o d o art . 1 .046 d eterm i n a que a p ri m e i ra
l i sta d e p rocessos para j u l ga men to e m o rdem cro n o lógica observará a antiguidade
da d i stri b u i ção entre os j á co n c l u sos n a data da e n t rada e m vigor d este Código .
2 1 3. S o b re os postulados h e r m e n ê uticas de um modo geral, ÁV I LA, H u m berto. Teoria dos princípios. 1 2• ed. São
Pau l o : M a l h e i ros Ed., 201 1 , p . 1 3 5- 1 44.
151
FR E D I E D I D I E R J R .
De acordo c o m esse postu lado h e r m e n ê uti ca, a Co nstit u i ção deve s e r i nter
p retada c o m o u m todo n o rmativo, d e modo a serem evitadas anti n o m ias entre as
n o rm as extraídas da p ró p ria C o n stitui ção"4• O d i reito não se i nterpreta e m tiras,
conform e co n h ecida l i ção de E ros Grau"5; m u ito m e n o s a Constit u i ção.
O mesmo se a p l i ca à i nte rpretação do Código de P rocesso Civi l .
O Cód i go d eve s e r i nterpretad o c o m o u m conj u nto de n o rm as o rgâ n i co e coe
re nte. S u rge daí o postulado in terpretativo da unidade do Códi30.
U m exe m plo.
O i n ciso I d o art . 3 3 2 d o CPC fala e m s ú m u la d e tri b u nal s u perior, ao perm iti r a
i m p roced ê n ci a l i m i n a r do ped i d o . S u cede q u e o i n ciso IV d o art. 927 d o CPC deter
m i n a a vi n c u lação d o ó rgão j u ri s d i c i o n a l a p e n as aos e n u n ciados da s ú m u l a d o STF
em m atéria c o n stit u c i o n a l e aos da s ú m u l a d o STJ e m m atéria i n f raco n stit u c i o nal;
essa restri ção n ão aparece, poré m , n o art . 332 d o CPC. Para fim de h a r m o n izar os
d i s positivos do Cód i go, que d eve ser i n terpretado co m o uma u n i dade, s o m e nte
é perm itida a i m p roced ê n c i a l i m i nar do p e d i d o q u e contrariar s ú m u la do STF e m
m atéria co n stituci o n a l e s ú m u l a do STJ e m m atéria i nfraco n stitu c i o n a l (legi s l ação
fed e ral).
H á diversas outras situações e m que esse postu lado terá de ser a p l i cado. Ao
l o n go d o Curso e las aparecerão .
2 1 4. "O p r i n cí p i o da u n idade da c o n stitu i ção gan h a relevo autó n o m o como princípio i nterp retativo q u ando com
e l e se quer sign ificar que a c o n stituição deve s e r i nterp retada de forma a evitar contradições (anti n o m i as,
antago n i s m os) e ntre as s u as n o rmas. Como ' p o nto de orie ntação', 'guia de disc ussão' e 'facto r h e r m e n ê utica
de decisão', o pri ncípio da u n idade o b riga o i ntérprete a consid erar a constitu ição na s u a globali dade e a
p rocu rar harmon izar os es paços de tensão existentes entre as n o rmas constitucionais a con cretizar (. .. ) Daí
que o i ntérprete deva s e m p re c o n s i d e rar as normas constitucionais não como normas isoladas e dispersas,
mas s i m como p receitos i ntegrados n u m sistema interno u n itário de n o rm as e pri n cípios". (CANOTlLHO, )osé
Joaq u i m Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6• ed. Lisboa: A l m e d i n a, 2002, p . 1 . 209- 1 . 2 1 0.)
2 1 5 . G RAU, Eros. Ensaio e discurso sobre a in terpretação/aplicação do direito. 5' e d . São Pau l o : M a l h e i ros Ed., 2009,
p. 1 3 1 - 1 3 2.
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