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Filosofia do Direito Fundamentacao do Direito a partir de Kant, Habermas e Rawls OSD cae eet Ree ete eae oo es encarta da part deen Habermas ave Um merce Puen Ac "paste anno Ber Hea Duero OE, a) at Lit rape de Case Bal ‘heim ore nae Uh Bas Fein Mansel ec ciara 3 se Sarge ora PMG re. ost rrao Abra fone UPN Bel) ntl vou ace UY. Coe ‘eons Ont Frere (SESED rt) saree Garman UPOrTO Pra a oc Roane SUP Bead il Bos ir Garman UFR Seal "ae nas ean RN Be cco Statins UNE Aca Stag ut zs Ola Ss COMALTAN Sac) "at cad rar a Bra comms mn soot ‘Sarena aos om 2022 Oommen Td cece ab remo cos cre aig Sorant rican renner ah rere pel Cte Aes Dhism ‘anuzenesrocones atoeroresbgratcan Apresentagao O esclarecimento reclama a busca constante por novas descober- tas. 0 debate continuo e a propositura de novas questées eleva a ‘academia e produz conhecimento amparado no desvelamento, come forma de superacao dos desafios construidos pelo amor ao saber A producao editorial cooperativa esté inserida no contexto da pes- Guisa e desenvolvimento académico, demanda cada vez mais pra. ticada nos programas de pés graduagées no Brasil e em diversos lugares do Mundo, 4 Proposta desse lio se insere em uma continuidede de produgdo cientifica amparada na pesquisa de Filosofia do Direito, vinculeda 2 CAPES/CNPq/UFRN Coordenada pelo Prof. Doutor Jose Orlando. Ribeiro Rosario, Professor Doutor Ricardo Tinoco de Gois @ 0 Pro, fessor Doutor Leonardo Oliveifa Freire. Este livro compila produgées dos alunos do mestrado em Direito, professores e colaboradores do Programa de Pés-graduagao em Direito da UFRN. O conjunto dos trabalhos esto envoltosva fire, lidade do aprimoramento a justica, Os organizadores. REREIA. Carlos And Mai ito: BARROS. Felipe Masel Pk. & essuol o paradigm procedimantal RODRIGUEZ lot Rodin, Cae dciem a corte: para umacrca de dito res ‘Rio de Jansira: Editora FGV, 2013. e into real OSS, Al. Cetera. Tadd de Edson i Rei ria de Alyson Lean ae caro. Bauru: EDIPRO, 2000, “ " STRECK. eo Ls Comprende data -hermenduta i elton 1.0. So Pal Tirant lo Blanch, 2019, lee an STRECK. Lao. Arti Corttcnl harman uma nace ie de Janeiro: Forense, 2004, an STRECK. Lani Luz Verda consent: conti, hemenbts «eras cura, ta Sb asin Sarav cate3008 Fandamentaedo ston parr at Habamose Rate TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E 0 DIREITO BRASILEIRO: UMA JUSFILOSOFIA PARA A EFETIVIDADE DE DIREITOS SOB A EGIDE DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA EDAIGUALDADE DANIEL AUGUSTO DE ALCANIZ SANTOS! LEONARDO OLIVEIRA FREIRE 1.INTRODUGAO idade dos direitos para protegao das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista. Isso nao é por acaso, pois a sociedade tende a se distan- car da aceitagao dos diferentes, Mesmo reconhecendo que, na contemporaneidade, politicas inclusivas passam a vigorar, é fato que estas muitas vezes ficam apenas no plano formal, deixando aspecto material relegado, o que constitui auséncia de efetividade. Assim, 0 desafio para a incluso das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) deste problema: em que as leis existem, mas a norma nao se materializa. Para romper com esse paradigma, é necesséria uma mudanga cultural que se fundamente em teorias jusfilosdticas cuja aplicacao possibilite o aprimoramento da Justi¢a gerando a efetividade dos direitos das pessoas com TEA, Essa mudange da cultura vigente na Administragao Publica passa, necessariamente, pela aplicagao da legislagdo que protege ‘as pessoas com TEA, e pela aplicagdo dos principios constitucio- nals da dignidade da pessoa humana e da igualdade. O primeiro é apresentado pela Excelsa Lei Nacional como um dos fundamentos da nossa Republica, @ 0 segundo como um direito fundamental. Na verdade, ambos sao fundamentos do préprio Estado Democriitico de Direito, visto que, sem o reconhecimento irrestrito da dignidade ue em todos reside ou da igualdade que a natureza impoe sobre a humanidade, nao existe justiga. Assim, 0 presente estudo tem como objetivo apresentar a situagao pela qual tém passado as pessoas com TEA, no tocante & "Bachare om Bris plaUnivorsdode Federal oR Grande do Nore (UFRNL Pés-eraduodo en Dito Gontitacina eTibutariopela Unies Poinsr Une) Advogod, OABIN 236 101 ausencia de efetividade dos seus direitos, assim como demonstrar que politicas publicas com vistas a incluir essas pessoas na vida em sociedade, especialmente quanto a garantia do direito a educagéo, eo estabelecimento de um tratamento diferenciado, na medida das suas necessidades, ndo 6 s6 necessério, mas um imperativo para o cumprimento dos mencionados princfpios constitucionsis. Analisaremos, para tanto, a evolugao histérica do que hoje se chama de dignidade humana, tragaremos um panorama sobre 0 Transtorno do Espectro Autista, assim como apresentaremos os avancos legislativos alcancados no tocante ao reconhecimento de direitos das pessoas que dele sofrem. Por fim, mostraremos coro esses direitos ainda nao t8m sido efetivados pelo Poder Publico ¢ ‘como um tratamento diferenciado direcionado aos seus sujeitos, de acordo com as necessidades que o TEA impoe, significa 0 atin- gimento do objetivo de promover a todos uma vida digna e igual. 2. AFUNDAMENTACAO E UMA NOGAO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ATRAVES DAHISTORIA 2.1 NOS PRIMORDIOS: 0 SURGIMENTO DA NOGAO DE DIGNIDADE HUMANA Para termos uma nogao-e apenas uma nogao, jé que nao cabe- ria neste trabalho o debrugar sobre a definicao da sua extenséio juridico-constitucional -do que significa o Principio da Dignidade da Pessoa Humana, previsto no art. 1, Il, da Constituigao Federal, como um dos fundamentos da Repiblica, deve-se saber qual 0 pressuposto da expressao. A dignidade, em seu sentido atual, esté baseada sobre o pres- suposto de que todo ser humano tem valor intrinseco, e é um fim ‘em si mesmo. Essa nogao, no entanto, ndo surgiu na contempo- raneidade (1789-), sendo tratada, de forma implicita ou expl através dos séculos, no Ocidente. O valor da dignidade humana surgiu a partir do pensamento religioso judaico-cristao. Tanto o Velho Testamento, quanto 0 Novo Testamento, trazem, de forma implicita ou nao, uma posicao espe- cial do ser humana na Terra em relagdo &s outras criaturas. Desde @ ogo de Imago De®, passando pelos deveres morais estabelecidos Frraa-ae de iia de que os humana foam eta 3 imagar 9 somethanes de Deus, om ‘contest com os outs ananaisconfrme express pa Bla, om Gents -20-8. Anaratha por Deus*, aos ensinamentos de Cristo e do Novo Testamento*, fica claro oestabelecimento do ser humano como um fim em simesmo. 2.2 NOGOES DE DIGNIDADE NA ANTIGUIDADE: 0 PENSAMENTO ESTOICO NA CONTRAMAO DO SEU TEMPO No Antiguidade Classica, porém, era majoritério.o pensamento de que a dignidade humana néo era inerente ou em mesmo grau para todas as pessoas. Tratavam-se pessoas e pessoas como se umas fossem mais dignas que outras, e tal dignidade ~consubs- tanciada no termo dignitas -era varidvel de acordo com a posigao social ou cargo ocupado pelo individuo. Sobre isso, ensina o prof. Ingo Sarlet® [1 verifica-se que a dignidade (dignitas) da ‘pessoa humana dizia, em regra, com a posic&o social ocupada pelo individuo @ o seu grau de reconhecimento pelos demais membros da ‘comunidad, dai poder falar-se emuma quanti- icagao e modulacao da dignidade, no sentido de ‘so admitir a existéncia de pessoas mais dignas ‘ou menos digas. Tal ensinamento é corroborado pelo prof. Luls Roberto Barroso® Em sua origem historica, aidela de dignidade, dignitas, esteve associada & de status, posic30 social ou a determinadas fungdes publicas. Dela decorriam certos deveres de tratamento. Dignidade, portanto, tina uma conotacaa aris- tocrética ou de poder, identificando a condigao ‘raza cringe dos ain aston, doo sbe ‘voles shows espacial equal no tal contra ao reste da Grogta Anogso de meg De ‘epetida no Antigo Testament sm duss ques cessoes, oes ores ito. 3&0) 55 o Desdlogo, mpreso erm Exes 20°17 «a5 precedes moras eclturafs da Loco pe desta trabaha «principio de espero 9 ier 15) @ odor sor enti ere "SARLET LV DIGMIDADE DA PESSOA HUMANA E DIRETTOS FUNDAMENTAIS NA CONS. TITUIGAG DE 1988 Pesta Alngre:Lvrerao Advogade, 2006 4 oo 20. "BARROSO, LR. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO DIREITO CONSTITUCIONAL CCONTEMPGRANEO:natureza juries, conteados lms ecitros do aplcagao, Vore20 Drovasa para dabece pillleo. Mimengralada dezemb do 2010, Deporwel em https! [Uirabertaboresacom 1)up-contertvuploeds/2016/06/Dgriéade texto base TtdeeZ010 pa Acoso ene 052/202. superior de certas pessoas ou dos ocupantes de doterminados cargos. Apesar de tal pensamento ser a regra no periodo histérico mencionado, a filosofia estdica trata a dignidade como algo intrin- seco a0 ser humano. Em sua célebre obra De Officlis (Dos Deveres), Marco Tilio Cicero sustenta que dignidade humana 6 decorrente da sua condicao superior & dos animais que povoam a Terra, espe- cialmente no tocante a racionalidade que naquele reside, masnao estes. Ensina o mestre e jurisconsulto romano’: “Quanto 20s deveres, 6 precisolembrar-se quea naturezadothomem ésuperir& dos anima, Os animals 96 so sencivels aos prazeres docornoe ‘se comportam imetvasamente; mas o esp hhumano se nutre de instrugdo; sua mente est sempre em ago, 20 prazer de vere entender 6 atragao continue. [-} {lombro:s0 que a natureza nos deu dupa por- sonalidade: uma, camum a todos nés, qulnhdo de rezdo edignidade que nos eleva acima dos animal, principio de todos os nossos deveres, {ede onde derivam aque se chama de dignidade {dectncie; a auto, répria de cada um de nds. ‘Temos com isso que Cicero reconhece, em seu escrito, uma espécie de proto-dignidade -levando em consideracao a evolugao do conceito através dos Séculos-—intrinseca ao ser humano*. Ve-se que 0 Senador desenvolveu uma teoria de dignidade na qual ela é compreendida de forma separada de cargo ou posigae social. Isso Porque, como foi dito anteriormente, todo ser humano, na visio estéica, embora seja parte da natureza, ocupa nela uma posigao elevada. Pertence, portanto, ao ser humano a capacidade de elaboracao de fala, de manipulacao da matéria e dela dispor de acordo com as suas necessidades, mas, principalmente, por possuir razdo. Essa FESR Sees tether srt ‘aa ees rater sree sie deter eect ene oem erence keer nomenon erence iGreen irae etree Soieiiaadeeamnrittacctoct immune Sie tieaemeerstpenerarennarees ea 104 FundonertcSa de Orato prise Kant. aterm razlo nos dé a capacidade de equilibrar nossas ages em face aos instintos e a nés confere a liberdade. Sendo todos os humanos ‘acionais, todos possuem a mesma liberdade e a mesma capaci- dade de agao; sendo essa a grande caracteristica que diferencia todos nés de todos os outros animais, significando, com isso, que todos os homens sao iguais. Essa nogao de racionalidade e de igualdade estsica desem- boca na execucao das leis. Cicero via a dispensacdo da justica de forma equanime como um dever, ensinando que “os magistrados devem compenetrar-se da ideia de que representam a republica e de que lhes cabe sustentar a dignidade, manter as leis, distribuir Justiga e ter presente tudo o mais do que s4o depositérios”, Ainda ue os homens tivessem entre si qualidades que diferenciassem ‘um dos outros, uma prevalecia sobre todas: todo homem é racional; Porque é racional, é livre para agir de acordo com a sua realidade; Porque todos sao livres, todos so iguais. 2.3 DA POS-ANTIGUIDADE CLASSICA AO RENASCIMENTO Pessada a Antiguidade Classica, a concepeao judaico-crista ‘comegou a ganhar importancia para além do pioneirismo mile- ‘nar que outrora gozara. Nao obstante ter inaugurado, ainda que somente no Ambito das tribos e reinos judaicos, em um primeiro momento, ¢ em um grupo religioso inicial mente marginalizado, em um segundo, a viséo da pessoa humane como portadora de dig- nidade em si mesma, o pensamento judaico-cristéo somente veio obter relevante espaco a partir da conversao do Imperador romano Constantino | (0 Grande) ¢ da publicagao do Edito de Milo”, Agora sem os grilhdes que thes forjaram, as ideias de digr dade humana igualdade entre os homens perante Deus podiam seespathar pelo Ocidente. O prof. Ingo Sarlet" afirma que “a con- cepeao de inspiracao crista e estéica seguiu sendo sustentada, destacando-se Tomas de Aquino, 0 qual chegou a referir expres. samente 0 termo dignitas humana’, J4 no Renascimento surge uma concepeao antropocéntrica, aindd que inspirada nos tedlogos da lgreja Catdlica Apostdlica CICERO. 06 Gi p79. "0 documento ft pubicado am 13 de juno de 212 través dele foram encorrades os por sguicGes oils inprimidas pel mpario Romano contra rites o sogulderos do outros ‘eleinsno atu tert, garontndo-os expressomonte pana iostiteiberdade ce cule “SARLET- Oh Cit pt Romans, que coloca o homem como ser de destaque na Criagao. Se a pedra angular sobre a qual se baseava a nogao da dignidade da pessoa humana era a Imago Dei, agora a fundamentacao esté na capacidade do homem em se autodeterminar de acordo com ‘a sua prépria vontade. 0 filésofo humanista Pico Della Mirandota defendeu tal pensamento em grande e notério discurso, susten- tando que”: ‘Finalmente, parece: me a mim que compreendi por que homom é 0 animal mais feliz e é, por tanto, digno de toda admiracao; © por citimo, qual o estado que é distribuldo ao homem na ‘sucesséo das coisas, eque 6 capazdedespertar invejanao sénos brutos, mas tambémnasestre- las e mesmo nas mentes além do mundo. [1 ‘Agora, a Altissimo Pai, Dous,o Grande Constru- tor, tinha, polas leis da Sua secreta sabedoria, construido esta casa, este mudo 0 qual vemos, lum grandioso templo da divindade.[.] Porém, tendo terminadoo Sou trabalho, o Artesso dese- jou que houvesse alguém para avaliara razaode trobatho tao grande, para amar a sua beleza, @ para se maravithar da sua grandeze, Consequen- temente, agora que todas as coisas haviem sido completadas, como Moisés o Timeu testificam, Ele por tltima considerou a criagéo do homem. [.-]Portanta, Ele tamou ao homer, um trabatho de forma indeterminada e, colocando-ore meio ddo mundo, falou aele como segue: "Demos a ti, Addo, NBo um assento fixo, nem forma prépriaa ti, nem dom pecullarmente teu, para que pudesses sentir como teu, ter como teu. Possui como teu oassento, forma, os dons que tue ti mesmo desejares. Uma natureza limi tada em outras criaturas 6 confined dentro das {eis eseritas par Nés. Em conformidade com teu livre arbtria, que eu tenho colocade em twas ‘mos, no és confinade por limites, 6 tu fixarés ‘05 limites da natureza por ti mesmo, Eu tenho te ‘colocade ne centiodo mundo, para que de lé tu ppossas mais convenientemente othar ao redor ver tudo quanto ha na mundo, Nem celestial, ZF ARANDOUA,.0.ON THE DIGNITY OF MAN. Tadisto por Paul LW. Miler niananols: achat Publshing Company, 1098. 3-5, (roca de trac repel ater ‘nem mundano, nem mortal, nem imortal,fizemos Nasa ti grande liberalidade de Dous-Pal © grande fe maravilhosa alegria do homem! E dedo a ele possuiro que escolher e ser eque the aprowver” Para o pensador renascentista italiano, a esséncia da dade humana reside na liberdade dada por Deus ao homem para fazer da sua existéncia o que the aprouver, visto queo homem esté ‘em constante definicao e redefinicao de si mesmo. No entanto, 3 ogo de dignidade humana passaria por uma transformagao com opassar dos Séculos - como ¢ natural com 0 pensamento humano -, deixando de ser algo inspirado em Deus para ser inspirado no préprio ser humano. E 0 que veremos a seguir. 2.4.0 PENSAMENTO KANTIANO E SUA INFLUENCIA ‘Seguindo em caminho diferente ao majoritario desde 0 Século IV, a partir do Século XVII, o pensamento acerca da dignidade humana comecou a passer por um proceso de laicizagao. No entanto, o principio basilar sobre o qual se montou o principio, a saber, a igualdade e a liberdade, manteve-se intacto. Por conseguinte, surge no Século XVIII 0 pensamento de Immanuel Kant, que vai tratar do assunto de forma tal que serve de base para a formulagao das teorias vigentes acerca da digt dade da pessoa humana. Para o filésofo prussiano, “o homem, e, duma maneira geral, todo o ser racional, existe como fim em si ‘mesmo, nao s6 como meio para 0 uso arbitrério desta ou daquela vontade"®, Diferentemente dos seres irracionais, aos quals ¢ atri- buido um vator subjetivo, porque sdo meios para o atingimento de algum fim, considera que o homem tem um valor objetivo, que the 6 atribuido a partir da sua prépria existénci “Todos 08 objetes das inclinagées tem somente um valor condicional, pois, se no existissem as inclinagdes @ as necessidades que nelas se baseiam, o sou objeto seria sem valor. AS préprias inclinacoes, porém, como fontes das ecessidades, estdo tdo longe de ter um valor ‘an FUNDAMENTOS DA METAFISICA DOS COSTUMES, IOs Pensadores. S80 Paul: Abe ull, 1974. 3.228:9 ‘absolute que as torne deseiveis om si mesmas, ‘que, muito pelo contrério, odesejo universal de ‘todos os seres racionais deve ser o de se liber- tar totalmente delas. Portanto,o valor do todos ‘05 objetos que possamos adquirr pelas nos- sas aces & sempre condicional. Os seres cuja ‘existencia depende, néo em verdade da nossa vontade, mas da natureza, tém contudo, se S80 eres irracionais, apenas um valor relativocomo ‘meios epor isso se chamam coisas, a0 nasso que {9 seres racionais se chamam possoas, porque ‘a sua natureza os distingue jé como fins em si ‘mesmos, quer dizer, como algo que nao pode ser ‘ampregedo come simples meio © que, por con: seguinte, limita nessa modida todo o arbitrio(e 6 um objeto do respeitol™. ‘Ao homem, portanto, néo pode ser atribuido um valor subje- tivo, como a um animal, de acordo com o pensamento kantiano. Damos por exemplo: as vacas, cuja funcao milenar é de fornecer o leite @ a carne e 0 couro e tudo mais de si possa ser extraido e aproveitado; aos cachorros, cuja fungao igualmente milenar tem sido a de auxiliar o ser humano na caga e na seguranca do seu lar @, nos dltimos tempos, de companheirismo e de terapia ou auxilio {as pessoas com necessidades especiais; ou aos gatos, cuja pro- ficiencia no controle de pragas roedoras no Egito Antigo era tao ‘excelente que passaram a ser vistos como guardides da vida e da fertilidade®", podem ser atribuidos precos, visto que a existéncia de tais animais e a sua preservagao se prestam ao atingimento de objetivos estabelecidos pela humanidade, a saber: 0 suprimento de necessidades ¢ inclinagdes que nas suas capacidades, espécie a espécie, se baseiam. Se esses animais podem ser trocados por ‘outro da mesma espécie que faga a mesma fungao, e se acada um "WRANT. Ob Gi 9. 220, "Data enatancin do culo deusa Bostot,dousa ogipca da fertkidade da reprodugso da Inds, do Ganga do amor antropomortaeda staves a escla da caberede gata ceorpode tmuer dvindado fol eultuade etre os exibeloe polo meres desde oterceromilenio antes ‘do crsio emboranlamante coms o pects mat suave da douse SokTnetrepresentada ‘oro ume aon jandade sada a aesurtocbileos «4 forcae pote, bora [edums ndoseconfundam,Com temps, esa epresorta 20 modlfeada para uma mulher ‘om onboga de goto, ou um gata no See. X36, Cy BASTET [om nhl Pot Porto Eator,Dlapoivel am . ‘Reosso om 05/2/2021 Tambur GIESTA,€ 1, © BASTETE SEKHMET.sepestos denaturezt ‘Suet Onertador: ols Manel de Araso ios Varandae: 201.188 pDisortato de Mestad “Mostrede em tila Arig da Facldade de Latas de Unwersidae de Lisboa. Lisbos, 209. Dapentel am ehitp/ th nandlaneUIOASI7280>. Acoso en: 05/12/2021 08 Fundemenag doit pare Kt Habermas aw dos espécimes pode ser atribuido um valor de comércio, tem-se que so coisas. Inexistindo tais necessidades, quaisquer que sejam, co valor dessas coisas se esvai, pois séo meios para o suprimento de necessidades, jé que o seu valor é relativo. O contrério ocorre com a humanidade: porque a capacidade de atribuigdo de valor 8s coisas parte da racionalidade intrinseca a0 ser humano, visto que somente através do seu exercicio é que se pode atribuir valor a algo, através da avaliagdo das suas necessi- dades e inclinagdes, tem-se que o ser capaz de tal atividade, que é nica em toda a natureza, 6 insubstituivel e seu valor é imensurdvel, ou objetivo. Torna-se, com isso, um fim em si mesmo. Kant trouxe, ainda, com seu pensamento, um novo aspecto da dignidade da pessoa humana ainda nao explorado: a autono- mia. De acordo com o pensador, a humanidade ¢ capaz de agir em conformidade com a representagdo de certas leis, Faculdade essa que somente pode ser encontrada em seres racionais. Por- que todos os humanos sao racionais, todos tém a capacidade de autodeterminacao, Por isso, concluiu que a autonomiaé o principio supremodamoralidade. + A corrente inaugurada pelo mestre alemao tem sido a mais influenciadora no mundo ocidental até os dias atuais. Apeser de outros autores terem apresentado contrapontos ao seu pensa- mento, tais como Hegel, Marx, Merleau-Ponty etc., a influéncia do pensamento kantiano se faz presente nos ordenamentos juridicos do mundb inteiro. Nela se resume a visdo majoritaria acerca da esséncia da dignidade da pessoa humana: o repidio a utilizagao do ser humane como meio e a sua coisificagao. Por sermos humanos, fins em si mesmos, somos sujeitos de direitos e seus titulares, inde- pendentemente de qualquer circunstancia, e devemos ter esses direitos reconhecidas e respeitados pelo préximo e garantidos e efetivados pelo Estado. 3, SOBRE 0 TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA AA fim de tratar de forma adequada o problema da falta de efetividade dos direitos conferidos aos portadores de TEA, faz-se necessério compreender a condi¢ao desse grupo de pessoas 2, por conseguinte, as suas necessidades frente aos desafios modernos. Floating ito 109 O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é, de acordo como Ministério da Saude”: “L.1 um disturbio do neurodesenvolvimenta caracterizado por desenvolvimento atipico, manifestagdes comportamentais, déficits na ccomuunicagso e na interacao social, padrdes de comportamentos repetitivos e estereotipados, podendo apresentar um repertorio restrito de interesses ¢ atividedes, Profissionais de satide mental tem estudado o TEA hé mais, de cem anos. A primeira elaboracao de um conceito de autisimo foi feita em 1911 pelo psiquiatra alemao Eugen Bleuler para des- crever a fuga da realidad para uma espécie de mundo interior em pacientes esquizofrénicos®, No entanto, o psiquiatra Leo Kanner apresentou o primeiro estudo sistemético acerca do TEA em seu artigo Autistic Disturbances of Affect Contact", O artigo permanece até hoje como um marco para a investigacao cientifica em torno do TEA, Oautismo geralmente comeca a se manifestar em criancas de idade inferior a trés anos, ¢ tende a atingir mais criancas do sexo masculine do que feminino, na proporsao de trés a cinco meninos para cada menina atingida. De acordo com a Sociedade Brasileira do Pediatria®,“trata-se de um transtorno pervasivo e permanente, nao havendo cura, ainda que aintervencao precoce posse alterar 0 prognéstico e suavizar os sintomas”. Seu diagndstico é clinico, ela- borado através de observagdo comportamental da crianca, acom- panhamento com os pais e aplicagao de instrumentos especificos. Aetiologia® do TEA é desconhecida, embora existam evidencias que apontem para fatores genéticos e ambientais”. "°DEFINIGKO-TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA TEA) NA CRIANCA. SAUDEOVER, Disporvet en: shtps/Rinhascecucsco snude.goubr portal transtrne-do-spactroaustal tletnens ter Aeneso ore 0772/2021, Cf EVANS & HOW AUTISN BECAME AUTISKE the radical transformation ofa cantral can cept of chi development in Brita MISTOAY OF THE HUMAN SCIENCES « 26.% 3p 2 20%: Dssponvel ene tpe/wncbartmunis govlprclatces!PMCH7B7O18 Reve om Oranoat "Cpanel ene , Acesto creat. Sar. 3 do Eeatuto da Cringe edo Adolescente, = Atondimanto Esucocional Especiiz860 we Faden do iio pre Kant tara ae do Norte, as diretrizes para a politica estadual de protecao dos direitos da pessoa com Transtorno do Espectro Autista, 4.2 NECESSIDADES ESPECIAIS E 0 PROBLEMA DA EFETIVIDADE ‘DOS DIREITOS DOS PORTADORES DE TEA COMO VIOLAGAO A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA IGUALDADE Conforme foi visto anteriormente, 0 TEA, pela sua natureze, 6 uma forma de deficiéncia intelectual, 0 que acarreta uma série de necessidades especiais que deve ser supridas, ou pelo poder ppdblico, ou por particulares que the facam as vezes. Essa obrigago do é 86 reconhecida pela legistacao patria, mas também pela principiotogia constitucional vigente, especialmente se analisada pelo prisma da dignidade da pessoa humana e da igualdade. sso porque o imperativo da dignidade da pessos humana, con- forme a visao kantiana de que a homem é um fim em si mesmo, 1ndo podendo ser instrumentalizado para qualquer fim, implica ‘em reconhecer nao somente que o principio estabelece limites & atuacéo estatal, mas também que “o Estado devers ter como meta permanente, protegao, promocao e realizagao concreta de uma vida com dignidade para todos”. Assim, todo ato da Administragéo ‘esté vinculado ao mencionado principio. Por causa da natureza do TEA, hé necessidade de tratamento diferenciado ao seu portador. Em relacao ao principio da igualdade, traduzido na mencionada isonomia aristotélica, o professor Calso Antonio Bandeira de Mello nos ensina os critérios para a identifi cago do desrespeito ao principio da isonomia®: *Parece-nos que. reconhecimento das diferen clacdes que ndo podem ser feitas sem quabra da isonomia se divide em tr6s questoes: 1 primeira diz com o elemento tomado como fator de desigualacdo; b] a segunde reporta-se & corrokagao logica abs: trata existenta entre o fator erigido em critério de discrimen @ a disperidade estabelecida no tratamentojuridice diversificado: SGARLET Ob Gr, pita, "ELLO,©.8 8, CONTEDDO JURIDICO DO PRINCIPIO DA IGUALDADE. Sco Poul: Mae 06 2017.3 ed. Fara doDrats 113 )a terceira atina a consonancia desta corre- lagao légica com os interesses absorvidos no sistema constitucional e destarte juridicizados. Esclarecendo methor: tem-se que investigar, de um lado, aquilo que é adotado come eritério discriminetério; de outro lado, cumpre verificar se hd justificativa racional, isto 6, fundamento \6gico, para. 8 vista do traco desigualador aco- {hido, atribuir o especifico tratamento juridica construido em funcao da desigualdade proc! mada. Finalmente, impende analisar se a cor- ‘elag80 ou fundamento racional abstratamente existente , in concreto, afinade com 0s valores prestigiados no sistema normative constitucio- ral. A dizer: se guarda ou néo hatmonia com les’. Assim, o critério inicial para 0 tratamento diferenciado é a ocorréncia do TEA no individuo. Em segundo lugar, hd justificativa racional para a adocao do critério, tendo em vista que, como foi dito anteriormente, hé a necessidade de tratamento diferenciado a pes- 0a autista, dadas as necessidades que acompanham a sua ocor- réncia. Em terceiro lugar, viu-se que nao hé dignidade da pessoa humana sem a adocao, por parte do Estado, de politicas publicas direcionadas especificamente para esse publico, a luz do pensa- ‘mento kantiano, nem isonémico, & luz do pensamento aristotélico. Por isso, 0 tratamento diferenciado as pessoas autistas se encontra amplamente justificado, eis que coaduna com prinelpios basilares da Constituicdo Federal, impressos nos arts. 1°, Ill; e 5°, caput. Apesar do amplo arcabougo juridico apresentado, que inclui, mas nao se limita as normas mencionadas, o qual reconhece direi- tos e estabolece obrigagdes para o atendimento das necessidades dos portadores de TEA, ainda nao hé um efetivo cumprimento da leie da Constituicdo, especialmente devido & auséncia de politicas publicas para a garantia do seu cumprimento. ‘Tomemos como exemplo o Rio Grande do Norte: Somente no Corrente ano foi promulgada a primeira lei estadual com vistas 0 cadastro de pessoas com TEA", assim como a primeira lei que institu'sse diretrizes para a garantia dos direitos da pessoa com TEA. Nao se sabe, atualmente, sequer quantas sdo as pessoas LelEstadual 7 T0818, de de jererods 2021 com TEA no Estado®. Em verdade, nao hé uma politica publica consolidada para as pessoas com autismo no RN, € 0 mesmo se dé em outros Estados®, Essa auséncia de politicas efetivas por parte do Estado é sin- tomatica de um aparato pablico que ainda nao tem uma cultura que se disponha a cumprir os direitos que ele préprio reconhece a pessoas deficientes. Outrossim, instituigdes privadas nao escapam da falta de estrutura e da auséncia de profissionais capacitados para lidar com criangas com TEA. Algumas escolas ainda recu- sam alunos autistas, apesar das punicdes da lei. Esse problema dificulta sobremaneira a incluso das pessoas com deficiencia na sociedade, assim como 0 seu desenvolvimento enquanto seres humanos, dotados de dignidade. 5. CONCLUSAQ Apés a anélise da problematica apresentada, é perceptivel que ainda falta no Brasil uma cultura efetiva de cumprimento da legistagao nacional acerca dos direitos das pessoas com TEA. E perceptivel, pela auséncia de politicas publicas ou incentivos & rede privada, que ainda estamos no ponto de partida da estrada ‘com destino & concretizagao desses direitos. Nao obstante 2s dificuldades, alguns avangos podem ser per- cebidos. A massificagao da comunicagao com o advento das redes socieis e a consequente facilidade de acesso a informacao que a era digital trouxe 0 espalhamento de informacdes vitais para combater a ignorancia popular sobre o TEA e as pessoas que dele sofrem. A informagao se apresenta nesse contexto como a mais “=TRIGUWA DO NORTE RN TERA CADASTRO PARA PESSOA COM TRANSTORNO DO ESPEC: {RO AUTISTA,TRIBUNA DO NORTE, 2 jn 2021, Dsponivel am:

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