Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Coletânea Dos Saberes - Unisc
Coletânea Dos Saberes - Unisc
Autores
Porto Alegre
OABRS
2019
Copyright © 2019 by Ordem dos Advogados do Brasil
Todos os direitos reservados
REITORA
Carmen Lúcia de Lima Helfer
Vice-Reitor
Rafael Frederico Henn
PRÓ-REITORA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
Andréia Rosane de Moura Valim
COORDENADORA DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
Denise Bittencourt Friedrich
Capa
Carlos Pivetta
C658
Coletânea dos Saberes: O direito sob a perspectiva da Advocacia / Rosângela Maria
Herzer dos Santos [et al.] (Organizadores). – Porto Alegre: OABRS. 2019. 242p.
ISBN: 978-85-62896-18-7
DIRETORIA/GESTÃO 2019/2021
CONSELHO PEDAGÓGICO
CORREGEDORIA
Corregedores Adjuntos
Maria Ercília Hostyn Gralha,
Josana Rosolen Rivoli,
Regina Pereira Soares
OABPrev
COOABCred-RS
do Projeto More Legal busca-se demonstrar seus efeitos práticos, aliando a isso ass inúmeras
situações de moradias irregulares ou clandestinas existentes no país.
Giselle Borghetti Velho e Elia Denise Hammes destacam a temática relativa ao
contrato de arrendamento rural e as suas implicações jurídicas na fixação do preço em
produto, oriundo do contrato particular, destacando que tal fixação de preço é contrária à
previsão legal, visto que a legislação não admite essa possibilidade de pagamento do
contrato.
Além disso, na quinta etapa são analisados temas relacionados ao Direito eleitoral, o
qual se subdivide em dois. Destarte, André Emílio Pereira Linck e Cássio Alberto Arend
centram-se na temática relacionada a Justiça Eleitoral moderna, destacando a necessidade
da jurisdição especializada nos casos interna corporis dos partidos políticos. Desse modo,
os autores ressaltam a autonomia dos partidos políticos em face à Justiça Eleitoral,
especialmente no que concerne à jurisdição dos conflitos interno dos mesmos.
Já Carhla de Oliveira Alves e Denise Friedrich discorrem sobre o empoderamento
feminino na política brasileira, ressaltando que lugar de mulher também é na política, ou
seja, as autoras se propõem a abordar os obstáculos e a importância do empoderamento
feminino na política, tendo em vista que a participação da mulher brasileira nos espaços
públicos, além de mudanças legais, depende também de mudanças culturais.
Por fim, a última divisão centra-se na temática do Direito Penal. Nesse sentido,
Juliana Beatriz de Paula e Patricia Thomas Reusch analisam o estado de coisas
inconstitucionais (ECI) e a falência do sistema penitenciário brasileiro, tendo como base
aArguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), nº 347, no Supremo
Tribunal Federal. Portanto, as autoras buscam identificar o que é e quais são os pressupostos
do referido instituto, relacionando-o ao sistema penitenciário brasileiro como uma nova
ferramenta para a tutela dos direitos fundamentais dos presos que cumprem penas de prisão
no país.
Certa de que a presente coletânea de artigos, com temática de diversas área do direito
possa contribuir com advocacia além de destacar aos ilustres autores, os quais desejamos
todo o êxito que merecem, desejamos uma excelente leitura.
Ferreira Breier, presidente da OAB/RS, e da Dra. Rosângela Herzer dos Santos, Diretora da
ESA/RS, grandes idealizadores e entusiastas do projeto.
Espero com a primeira obra contendo a síntese dos melhores trabalhos de
especialização dos cursos de Direito Eleitoral; Advocacia Trabalhista e Previdenciária;
Advocacia Imobiliária, Urbanística, Registral e Notarial; Direito Processual Civil; e
Advocacia Criminal, encorajando, os já corajosos envolvidos, a enxergar este ato como o
primeiro de muitas outras ações de perseverança, contrariando assim o mundo líquido,
carente de valores sólidos, que despreza o exemplo de ambiciosos projetos que demandaram,
e continuarão demandando, bases sólidas. Sem isso, os sonhos jamais se tornarão realidade.
Certamente os obstáculos não foram poucos para os advogados alunos das especializações
acima citadas. Mas, contrariando a modernidade líquida, perseveram e atingiram seus
objetivos e viram seus sonhos se tornarem realidade. Sejam assim exemplos para os
próximos.
SUMÁRIO
I NOVOS TRATAMENTOS NO
ÂMBITO DO DIREITO DO TRABALHO
14
RESUMO
INTRODUÇÃO
1 Advogado, Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Especialista em Advocacia Trabalhista e Previdenciária pela Universidade de Santa Cruz do Sul. E-mail:
pberia@msn.com
2 Mestra em Direito pelo Programa de Pós-graduação Mestrado e Doutorado da Universidade de Santa Cruz
do Sul – UNISC. Linha de pesquisa Políticas Públicas de Inclusão Social. Conceito Capes 5. Pós-graduada
em Direito do Trabalho, Previdenciário e Processo do Trabalho – UNISC. Graduada em Direito – UNISC.
E-mail: patriciareusch@gmail.com
15
informações obtidas nos tópicos anteriores, será capaz de indicar uma direção de resposta ao
problema de pesquisa.
Contudo, essa tese resta superada pela constatação de que a provisoriedade não é
atributo da execução, mas sim do título sob o qual esta se funda, uma vez que os seus atos
são processados da mesma forma que os da execução definitiva (artigo 520 do Código de
Processo Civil de 2015).
Dentro dessa proposta, Assis (2010, p. 364) aduz que, embora de uso corrente, a
palavra provisório não representa adequadamente o fenômeno, visto que provisório é o
título, não a execução, a qual se processa da mesma forma que a definitiva, dividindo o ônus
do tempo do recurso e desestimulando a interposição de recursos com o propósito de protelar
o andamento do feito.
“Se é o título que é provisório, pode existir, em tese, execução completa e incompleta
fundada em título provisório” (MARINONI, 2011, p. 205), bastando, para evidenciar o
equívoco da doutrina anterior, que a execução provisória de despejo (Lei 8.245/91) sempre
foi uma execução completa.
Ao cabo, provisoriedade só pode expressar não definitividade, ou seja, inexistência
de coisa julgada no processo.
Execução provisória (rectius, execução pautada em título provisório), portanto, é a
atividade judicial pautada em cognição exauriente, alcançada por intermédio de decisão
atacada mediante recurso recebido sem efeito suspensivo, que objetiva a satisfação –
completa ou incompleta – do direito do credor antes do trânsito em julgado da decisão
recorrida.
A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 769, refere que, nos casos
omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho,
desde que compatível com o regramento celetista.
Pela visão clássica, o critério da omissão exerce a função instrumental de proteção
contra a inserção do formalismo imperante no processo comum, espelhado pela tese de que
o regramento procedimental específico atenderia de melhor maneira às necessidades do
direito laboral, conforme aduz Barbosa (2010, p. 20).
Não obstante, ao passo que o processo do trabalho seguiu estagnado, acumulando a
poeira da história, o processo civil passou por sucessivas modificações legislativas ao longo
21
CONCLUSÃO
importar o moderno instituto previsto no artigo 520 do Código de Processo Civil, dada a sua
total compatibilidade com os princípios e regras do processo do trabalho.
Aliás, os princípios constitucionais que pregam uma maior efetividade e celeridade
da prestação jurisdicional, bem como o princípio da proteção oriundo do direito do trabalho,
exigem que o aplicador do direito construa o seu raciocínio no sentido aqui proposto.
Sendo, então, a novel execução provisória civil aplicável ao processo do trabalho,
inexistem óbices ao cabimento da execução provisória trabalhista satisfativa,
independentemente da espécie de obrigação contida no título, e ao recebimento do crédito
do reclamante em etapa anterior ao trânsito em julgado da decisão de mérito, devendo o
julgador, diante do caso concreto, verificar se a hipótese demanda ou não a dispensa da
caução.
Elimina-se, com isso, uma insuportável contradição do sistema, pois, até então,
apenas o credor alimentício sujeito ao procedimento civilista é que podia pleitear a satisfação
do que lhe era devido enquanto pendente o julgamento de recurso desprovido de efeito
suspensivo.
Com a elevação do direito à razoável duração do processo ao plano dos direitos
fundamentais, a tese aqui disposta se impõe, não podendo o ônus do tempo do recurso ser
suportado apenas pelo recorrido, o qual já tem a seu favor uma decisão fundada em cognição
exauriente e prolatada por julgador competente.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Cândido Mendes de. Ordenações Filipinas. 14ª edição. Rio de Janeiro: Typ. do
Instituto Philomathico, 1870. Disponível em:
<http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/242 733>. Acesso em: 18.02.2019.
ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 13ª edição. São Paulo: RT, 2010.
BARBOSA, Andrea Carla. A Nova Execução Trabalhista de Sentença. São Paulo: LTr, 2010.
BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial da União.
Rio de Janeiro, 24.02.1891. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao91.htm> Acesso em:
18.02.2019.
27
______. Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro,
10.11.1937. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao37.htm> Acesso em:
18.02.2019.
______. Decreto-Lei nº 1.608, de 18.09.1939. Coleção das Leis da República dos Estados
Unidos do Brasil. Vol. VII. Rio de Janeiro, 1939, p. 311-438. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937-1946/Del1608.htm>. Acesso em:
18.02.2019.
______. Lei nº 5.869, de 11.01.1973. Diário Oficial da União. Brasília, 17.01.1973. p. 01,
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm>. Acesso em:
18.02.2019.
______. Lei nº 10.352, de 26.12.2001. Diário Oficial da União. Brasília, 27.12.2001. p. 01,
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10352.htm>.
Acesso em: 18.02.2019.
______. Lei nº 10.358, de 27.12.2001. Diário Oficial da União. Brasília, 28.12.2001. p. 05,
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LEIS_2001/L10358.htm>.
Acesso em: 18.02.2019.
______. Lei nº 10.444, de 07.05.2002. Diário Oficial da União. Brasília, 08.05.2002, p. 01.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10444.htm>. Acesso
em: 18.02.2019.
______. Lei nº 11.232, de 22.12.2005. Diário Oficial da União. Brasília, 23.12.2005, p. 01.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-
2006/2005/Lei/L11232.htm>. Acesso em: 18.02.2019.
______. Lei nº 13.105, de 16.03.2015. Diário Oficial da União. Brasília, 17.03.2015, p. 01.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 18.02.2019.
DINIZ, Maria Helena. As Lacunas no Direito. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2000.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 8ª edição. São
Paulo: LTr, 2010.
MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação de Tutela. 12ª edição. São Paulo: RT, 2011.
RIBAS, Conselheiro Dr. Antônio Joaquim. Consolidação das Leis do Processo Civil. 3ª
edição. Rio de Janeiro: Jacinto Ribeiro dos Santos, 1915. Disponível em:
<hhttp://www.stf.jus.br/bibliotecadigital/DominioPublico/10594/pdf/10594.pdf> Acesso
em: 18.02.2019.
SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. 7ª edição. São Paulo: LTr,
2014.
29
RESUMO
INTRODUÇÃO
3
Especialista em Advocacia Trabalhista e Previdenciária pela UNISC/ENA. Graduado em Direito pelo Centro
Universitário de Brasília – UniCEUB. Integrante do Grupo de Pesquisa “Trabalho & Capital” vinculado à
UFRGS/USP/CNPQ/FEMARGS. Advogado. E-mail: rafaelmadeira.adv@gmail.com.
4
Doutoranda em Direito pela PUCPR. Mestre em Direito pela UNISC. Especialista em Direito Público - Centro
Universitário Leonardo da Vinci. Graduada em Direito - Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC).
Advogada. E-mail: cjuruena@gmail.com
30
seletiva formal é diretamente responsável por apenas, 0,7%, 17,7%, 7,5% e 10,4%,
respectivamente (GODECKE, 2014, p. 02).
A partir dos dados apresentados chega-se ao seguinte universo sobre os catadores de
materiais recicláveis: “em sua grande maioria, migraram do campo para cidade em busca de
novas oportunidades, e, estando excluídos do mercado formal de emprego no contexto
urbano, encontraram condições de geração de renda por meio de coleta, triagem e venda de
materiais passíveis de serem reciclados, principalmente papel, plástico, alumínio e ferro.”
(ALVES, 2016, p. 52). Frisa-se que o trabalho desenvolvido pelos catadores é caracterizado
por uma contradição central, de um lado, trabalhadores em condições precaríssimas de
trabalho, em condições extremamente perigosas e insalubres sob risco de acidentes e
adoecimentos, de outro, empresas reconhecidas como socialmente recuperadoras do
ambiente pela utilização de materiais descartados e sobrantes que servem de matéria-prima
para novos produtos comercializáveis (IPEA, 2016, p. 170).
O acompanhamento da “experiência de organização de processos socioprodutivos com
catadores de materiais recicláveis” possibilitou verificar a alienação do catador no processo
produtivo, seja como fornecedor e agregador de valor de determinadas matérias primas, seja
quanto a um sujeito necessário, mas propositalmente invisível para a indústria, ou seja, “as
empresas o desconhecem como partícipe do seu processo de trabalho, embora o integre ao
processo geral de produção dos reciclados.” (MOTA, 2002, p. 10 apud BORTOLI, 2009, p.
111).
Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios
indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade
avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem
dependiam economicamente.” (BRASIL, 1991).
As Leis nº 8.212/1991 e nº 8.231/1991, nos artigos 11 e 9º, respectivamente,
apresentam o rol de segurados obrigatórios, entre eles, o Segurado Especial. Este possui uma
conceituação específica na Constituição Federal, conforme art. 195, §8º, “O produtor, o
parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais e o pescador artesanal, bem como os respectivos
cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados
permanentes” (BRASIL, 1988). Sendo que a contribuição para esse segurado se realiza
mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção.
A partir do texto constitucional percebe-se uma preocupação com o trabalhador ou
grupos, inclusive constituídos pelos seus núcleos familiares, que laboram por conta e risco e
em regime de economia familiar, tendo como principal objetivo a subsistência, sendo
economicamente pequena a produção de excedente. Tais atividades ainda que propiciem
renda para os trabalhadores e suas famílias têm como característica a instabilidade,
impedindo uma constância nominal no valor do fruto do trabalho (ALVES, 2017, p. 03)
Uma importante alteração da LBPS pela Lei nº 11.718/2008, com relação ao Segurado
Especial, diz respeito ao emprego de pessoas estranhas ao grupo familiar, mudança possível
por não haver vedação constitucional quanto ao auxílio eventual, apenas para contratações
permanentes (ALVES, 2017, p. 04). Ainda existem outras modificações ocorridas, que não
descaracterizam a condição de Segurado Especial, permitindo que diversifique sua atividade
laboral a fim de incrementar sua renda e até mesmo aumentar sua contribuição
previdenciária.
Um dos elementos caracterizadores da categoria tratada é a existência de atividade
voltada para a subsistência da família, sendo vedada a proteção legal para aqueles que
auferem renda de outras fontes, sejam elas atividades rurais, mas voltadas para o comércio
e lucro. Existem exceções que com fim de incrementar a renda desse segurado, que fica
suscetível as alterações climáticas e períodos de safra.
A contribuição do Segurado Especial, para o custeio da cobertura previdenciária está
vinculada ao produto da comercialização do excedente da sua produção, não sendo exigida
a contribuição mensal típica dos demais segurados da Previdência Social. Ademais, válido
frisar, que na qualidade de trabalhadores rurais, não se exige a contribuição para a concessão
35
Executivo Federal (SILVA, 2013, p. 208). Em 2012, por iniciativa do Senador Rodrigo
Rollemberg (PSB/DF) foi apresentado um Projeto de Lei - PL que acrescentava ao art. 12,
inciso VII, da Lei nº 8.212/1991, ao art. 11, inciso VII, da Lei nº 8.213/ 1991 e ao art. 9º,
inciso VII, do Decreto nº 3. 048/1999, uma nova alínea incluindo o catador de material
reciclável, sendo aprovado sem nenhuma emenda e encaminhado para a Câmara dos
Deputados, onde recebeu a nomenclatura de PL nº 3.997/2012. Na Câmara dos Deputados,
o Projeto relatado pela Deputada Érika Kokay (PT/DF), teve uma pequena alteração na
redação da alínea “c” a ser acrescida ao art. 12 da Lei de Custeio, a fim especificar que a
qualidade de Segurado Especial seria oferecida ao catador com atuação em qualquer uma
das etapas da reciclagem – catação, triagem ou processamento dos materiais – sendo essa
atividade sua profissão habitual ou principal fonte de renda.
Por fim, em setembro de 2013, o Deputado Federal Padre João (PT/MG) propôs uma
emenda constitucional para alterar o § 8º do art. 195 da Constituição Federal, para dispor
sobre a contribuição para a seguridade social do catador de material reciclável que exerça
suas atividades em regime de economia familiar. Essa proposição foi denominada PEC nº
309/2013 e, após um pouco mais de um ano de tramitação, aguarda desde 10 de dezembro
de 2014, sua apreciação em Plenário.
Tendo em vista que a Deputada Érika Kokay (PT/DF) é uma das proponentes da PEC
nº 309/2013, acredita-se que o PL nº 3.997/2012 possa estar aguardando a tramitação e
aprovação da proposta de emenda à constituição. Assim, as alterações nas leis federais da
Previdência Social seriam obrigatórias em virtude da nova redação das regras
constitucionais, impedindo qualquer alegação de inconstitucionalidade em plenário.
5
O estudo está analisando o potencial econômico da reciclagem de aço, alumínio, celulose, plástico e vidro.
40
CONCLUSÃO
A PEC nº 309/2013 tem o mérito de ser uma iniciativa dos próprios sujeitos que serão
beneficiados da institucionalização de uma modalidade própria de contribuição
previdenciária e consequentemente da cobertura da Seguridade Social. A ampliação da
cobertura previdenciária de catadores de materiais recicláveis justifica-se pela quantidade de
benefícios que essa ocupação tem gerado para a sociedade brasileira: ambientalmente, ao
reduzir os resíduos sólidos destinado aos “lixões” ou aterros e diminuindo impactos
42
REFERÊNCIAS
ALVES, Adriana Silva. Formação “de catador para catador”: o movimento nacional dos
catadores na construção de sua autonomia político pedagógica. 2016. 139 f. Programa de
Pós-Graduação em Educação (Mestrado). Universidade de Brasília, Brasília, 2016.
GODECKE, Marcos Vinicius. Uma análise de mercado dos principais recicláveis no Brasil.
EcoDebate: 2014. Disponível em: https://www.ecodebate.com.br/2014/03/11/uma-analise-
de-mercado-dos-principais-reciclaveis-no-brasil-artigo-de-marcos-vinicius-godecke/
Acessado em: 13 ago. 2017.
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Situação Social das Catadoras e dos
Catadores de Material Reciclável e Reutilizável. Brasília: IPEA, 2013.
___. Relatório de Pesquisa: pesquisa sobre pagamento por serviços ambientais urbanos para
gestão de resíduos sólidos. Brasília: IPEA, 2010.
JOÃO, Padre. Proposta de Emenda à Constituição nº 309/2013. Altera o §8º do art. 195 da
Constituição Federal. Câmara dos Deputados, 10 set. 2013. Disponível em:
44
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1129278&filena
me=PEC+309/2013. Acesso em: 13 ago. 2017.
KOKAY, Erika. Parecer ao Projeto de Lei nº 3.997. Altera as Leis nºs 8.212, e 8.213, de 24
de julho de 1991. Câmara dos Deputados. 2013. Disponível em:
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1139172&filena
me=Tramitacao-PL+3997/2012. Acesso em: 13 ago. 2017.
SOUZA, Jessé. A ralé brasileira: quem é e como vive. 1ª ed. 1ª reimpr. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2009.
45
RESUMO
O presente estudo teve como objetivo a análise do dano moral coletivo como finalidade de
salvaguardar os direitos trabalhistas vilipendiados em caso de ocorrência de dumping. Para
isto, a pesquisa observa, primeiramente, a formação e evolução do Direito do Trabalho no
Brasil, bem como sua influência na sociedade atual. Não obstante, analisa os princípios
Constitucionais balizadores do Direito do Trabalho que conferem proteção ao trabalhador.
Prosseguiu a reflexão, no sentido de explicitar o dumping social, para então adentrar no dano
moral coletivo e sua configuração, para tanto necessário apontar também as partes legitimas
para propor a Ação Civil Pública, ação pertinente em casos de dumping, destacando-se
jurisprudências com o intuito de demonstrar os entendimentos dos nossos tribunais
atualmente. Por fim, necessário refletir acerca dos pressupostos essenciais a serem
ponderados pelos julgadores quanto à fixação do quantum indenizatório cabível e sua
destinação em caso de dano moral coletivo por decorrência de dumping, buscando não
apenas compensar o dano à sociedade, mas estimular o agressor a não cometer outro dano
desta natureza para a coletividade.
INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como objetivo propor uma reflexão acerca do dumping social
nas relações trabalhistas, bem como os conflitos gerados por esta prática na sociedade,
ponderando-se a respeito de sua ilegalidade e da possibilidade de incidência de dano moral
coletivo como forma de resguardar os citados direitos sociais.
Para tanto o estudo discorrerá, primeiramente, a respeito da evolução história do
direito do trabalho em âmbito nacional e a respeito dos princípios constitucionais correlatos
à proteção do trabalho e do trabalhador.
6
Especialista em Advocacia Trabalhista e Previdenciária - UNISC. Graduada em Direito UCS. Endereço de
e-mail: julianascholante@gmail.com
7
Mestra em Direito pelo Programa de Pós-graduação Mestrado e Doutorado da Universidade Santa Cruz do
Sul - UNISC. Linha de pesquisa Políticas Públicas de Inclusão Social. Conceito Capes 5. Especialista em
Direito do Trabalho, Previdenciário e Processo do Trabalho - UNISC. Graduada em Direito UNISC.
Endereço de e-mail: patríciareusch@gmail.com
46
O trabalho sempre existiu ao longo da história, no entanto, não com a sua atual
conjuntura. No início das civilizações a escravidão era o único trabalho que havia, e, apesar
deste modelo de trabalho ter se modificado constantemente, é possível afirmar através dos
registros históricos que a escravidão nos acompanhou até o século XIX. A criação da
máquina a vapor e a Revolução Industrial geraram uma verdadeira transformação nas
relações trabalhistas, a busca pelo lucro e as condições precárias que eram impostas aos
trabalhadores ensejaram a luta pela proteção ao trabalhador e melhores condições de
trabalho. Assim, o trabalho ganhou status e proteção Constitucional.
Nesta senda, discorrer-se-á sobre a evolução do direito do Trabalho no Brasil, bem
como os princípios constitucionais norteadores do Direito do Trabalho vigentes em nosso
país.
No Brasil houve um largo período onde a economia era fundamentalmente agrícola,
com sua base firmada nas relações escravistas de trabalho, logo, não há o que se falar em
Direito do Trabalho, visto que apesar do trabalho ser desenvolvido não há uma relação de
emprego, propriamente dita, para que o Direito pudesse regular.
Nesta trajetória, Delgado (2009, p. 99 -100) atribui especial relevância a abolição da
escravidão, através da Lei Áurea, para as relações trabalhistas. Inclusive a utiliza como
47
trabalho como direito social, no artigo 7º de seu texto, pode se observar que a Carta Magna
traz em seus incisos numerosas garantias mínimas nas relações trabalhistas, tanto para
trabalhadores urbanos como para os rurais.
Neste sentido, os direitos que abarcam a dignidade humana estão elencados “no rol
dos direitos da personalidade, bem como ancorados no conjunto dos direitos fundamentais”,
assim ocorre uma proteção especial ao direito a vida, a integridade psicofísica e moral do ser
humano, visando impedir que a mesmas sejam violadas. (MELLO E MOREIRA, 2015, p.
100)
É necessário observar a importância da proteção destinada ao trabalho humano bem
como o valor social atribuído a ele, considerando que ao desrespeitar tal proteção o
empregador contende com a dignidade da pessoa humana e, por consequência, com os
direitos fundamentais e o mínimo existencial, visto que este é pressuposto essencial para
concretização dos mesmos.
Os artigos que compõe nossa Constituição, voltados ao Direito do Trabalho, buscam
proteger a condição natural do trabalhador, assim como a liberdade laboral, e, em especial,
o de possuir um trabalho digno.
Considerando que o mercado de trabalho no qual a força de trabalho é oferecida
possui um excesso de oferta de mão de obra e, não obstante, a concentração de renda induz
grande parte das pessoas a oferecer sua força de trabalho, a intervenção do Estado se faz
necessária para colocar limites no empregador, visando garantir o caráter social do trabalho,
e não a sua diminuição a simples mão-de-obra. Isto posto, é possível vislumbrar o caráter de
direito fundamental social presente no Direito do Trabalho, uma vez que garante as
melhorias para o trabalhador nivelando as desigualdades entre o Estado e o capital, e
possibilitando a intervenção positiva do Estado perante as relações trabalhistas.
Para tanto, nossa Carta Magna compõe princípios que visam a efetividade desta
equiparação no âmbito trabalhista. Como o princípio da proteção, que tem por objetivo
equilibrar a desigualdade existente na relação de emprego, assim, “se deve proporcionar uma
forma de compensar a superioridade econômica do empregador em relação ao empregado,
dando a este último superioridade econômica. ” (MARTINS, 2008, p. 61)
O princípio da primazia da realidade no Direito Trabalhista possui a pretensão de
proteger o empregado na relação de trabalho, considerando que muitas vezes a realidade se
dá de forma diferente da que fora pactuada no momento da admissão ou, não obstante, visa
49
também, de um modo geral, garantir que direitos que não foram pactuados sejam
legitimados, fundamentando-se em outros tipos de prova que não a documental.
No que tange o princípio da indisponibilidade ou irrenunciabilidade dos direitos
trabalhistas é necessário ponderar sobre a condição de subordinação atribuída ao trabalhador
através do contrato de trabalho, pela hipossuficiência no qual se encontra o trabalhador em
relação ao empregador, foi vedada qualquer transação que levasse o trabalhador a dispor de
seus direitos, podendo esta ser passível de nulidade (absoluta) ou anulabilidade (relativa), ou
seja, faz se necessário o crivo do judiciário uma vez que o empregador busque a
flexibilização da norma, no escopo de garantir efetividade às previsões legais. (VECHI,
2009, p. 328)
Entretanto, necessário frisar que é possível flexibilizar determinadas normas, aliás, o
próprio texto da lei já traz em seu corpo algumas exceções, contudo, não sem passar pelo
crivo do judiciário, no escopo de garantir efetividade às previsões legais.
8
4. “DUMPING SOCIAL”. DANO À SOCIEDADE. INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR. As agressões
reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois com tal prática
desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado social e do próprio modelo capitalista com a obtenção
de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido “dumping social”,
motivando a necessária reação do Judiciário trabalhista para corrigi-la. O dano à sociedade configura ato
ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos
dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. Encontra-se no art. 404, parágrafo único do Código Civil, o
fundamento de ordem positiva para impingir ao agressor contumaz uma indenização suplementar,
como, aliás, já previam os artigos 652, d, e 832, § 1º, da CLT. (grifo nosso)
51
conceitua como “a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a
violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos”.
Silva (2008) afirma que “enquanto no dano social a vítima é a sociedade; o dano
moral coletivo tem como vítimas titulares de direitos individuais homogêneos, coletivos ou
difusos”.
Contudo, impende destacar, as lesões decorrentes do dumping social são de caráter
patrimonial à coletividade dos trabalhadores e concomitantemente afetam a ordem
econômica, enquanto no dano moral coletivo, as lesões são de índole extrapatrimonial.
Nessa acepção instruem Souto Maior, Moreira e Severo (2012, p. 44) que o “dano
moral coletivo, que tem natureza jurídica de dano extrapatrimonial coletivo causado pelo ato
ilícito; e o “dumping social”, que tem natureza jurídica do dano material coletivo
(mensurável ou não) ”, ambos provêm de ato ilícito e seriam cumuláveis.
É de suma importância esclarecer que a coletividade possui bens de natureza
extrapatrimonial, admitidos e amparados pelo Direito Constitucional e infraconstitucional,
passíveis de defesa pelos instrumentos processuais adequados à tutela jurisdicional coletiva.
Assim, considerando a natureza subjetiva do dano extrapatrimonial, na área dos
direitos metaindividuais, importa somente a ocorrência de lesão a um direito ou interesse
juridicamente protegido, se caracteriza pela sua presunção, ou seja, quando constatada a
ofensa ao bem jurídico tutelado há necessidade de compensação mediante pagamento de
indenização à coletividade (dano in re ipsa) , com exceção das pessoas jurídicas, as quais
necessitam provas o dano efetivo a sua personalidade para configuração de dano moral
coletivo. (Pinto Junior, 2012)
Feitas tais observações, no sentido de auxiliar a compreensão da configuração do
dano moral por dumping social trabalhista, dá-se continuação ao assunto expondo decisões
dos Tribunais do nosso país referente ao dano moral coletivo em situações em que é cabível
dentro do direito do trabalho. Por conseguinte, faremos considerações acerca das partes que
detém legitimidade para propor ações de indenização coletiva em decorrência da prática de
dumping social, para, finalmente, avaliarmos o quantum indenizatório e os meios para
calcular sua justa dimensão.
53
9
Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade
por danos morais e patrimoniais causados: (Redação dada pela Lei nº 12.529, de 2011).
(...)
IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo. (Incluído pela Lei nº 8.078 de 1990)
(...)
10
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de
natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de
natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte
contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.
(grifo nosso)
11
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANO MORAL COLETIVO. TRABALHO FORÇADO OU
EM CONDIÇÕES DEGRADANTES. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. I
– Alegada a utilização de mão-de-obra obtida de forma ilegal e aviltante, sujeitando o trabalhador a condições
degradantes de trabalho, a trabalho forçado ou a jornada exaustiva, cabe Ação Civil Pública de reparação por
54
Rocha (2002, p. 280) explica que “no meio ambiente do trabalho, em especial, a
tutela à segurança e à saúde do trabalhador carrega caracteres essencialmente difusos e
coletivos”.
O Enunciado nº 4 da ANAMATRA prevê a possibilidade de o magistrado conceder
indenização suplementar extra petita, quando observar a configuração de dumping de
maneira reiterada pelo empregador. Embora louváveis as determinações contidas no referido
enunciado, buscando a defesa da garantia de efetividade dos direitos fundamentais, as
disposições contidas nos artigos do Código de Processo civil precisam ser observadas. Não
obstante, é imperativo destacar a ausência de legitimidade da parte para pleitear, em nome
próprio, direito da coletividade.
Neste viés tem-se uma decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 1º Região, em
sede de Recurso Ordinários sob o nº 00000317020135010241, este aponta as ações coletivas
como meio de mitigar o dano moral coletivo pela prática de dumping social, pois entende
que a titularidade de tais direitos é da coletividade, e por este motivo não poderia ser
postulado ou deferido em ação individual.
Corroborando tal entendimento analisar-se-á um julgado do Tribunal Regional do
Trabalho da 2º Região onde, em primeira instância, a Caixa Econômica Federal foi
condenada a pagar a soma de um milhão de reais a título de dumping social, contudo, em
segunda instância (RO: 00012362120135020302) a condenação foi reformada sob o
arrazoado da ausência de pedido neste sentido impede que o juiz o conceda de oficio, com a
justificativa de que obsta os princípios constitucionais do devido processo legal,
contraditório e ampla defesa.
Contudo, contrariando as decisões acima dispostas, transcreve-se abaixo a decisão
do Tribunal Regional da 4º Região, onde, em sede recursal (RO: 00009839420125040663),
manteve a condenação por dumping social de oficio prolatada ainda em 1º instância, ao
ponderar que as demandadas vinham desrespeitando a ordem jurídica trabalhista de maneira
reiterada, visto o número expressivo de ações que tramitavam naquela vara com o mesmo
polo passivo, assim, entendeu ser pertinente a fixação de indenização de ofício pelo
magistrado, “para proteção da coletividade e da ordem jurídica, em virtude de seu
compromisso ético com a proteção da dignidade da pessoa humana e do trabalho.”
dano moral coletivo. II – Legitimidade do Ministério Público do Trabalho para o ajuizamento da ação civil
pública na tutela de interesses coletivos e difusos, uma vez que a referida prática põe em risco, coletivamente,
trabalhadores indefinidamente considerados.
55
Sobre o escopo da aplicação de sanção por dumping social, elucida que “seu
propósito é inibir a repetição do ilícito; anular o lucro obtido pelo réu com a atitude de
agressão ao ordenamento; e fazer crer a todos os demais empregadores, concorrentes do réu,
que o respeito à ordem jurídica não lhes representa um prejuízo concorrencial. ” Souto Maior
(2007)
Feitas as reflexões referentes ao dano moral coletivo, bem como os requisitos
necessários para sua caracterização, é necessário tecer algumas considerações sobre a
fixação do quantum indenizatório. Nesse sentido, Sérgio Gabriel (2004, p. 259) traz em rol
taxativo a classificação dos critérios para fixação da indenização por dano moral:
Assim, poderíamos dividir os critérios para fixação da indenização por danos
morais em positivos e negativos.
Nos positivos, deveria ser observado: condição econômica, pessoal e social do
ofendido; condição econômica do ofensor; grau de culpa; gravidade e
intensidade do dano; hipótese de reincidência; compensação pela dor sofrida
pelo ofendido; desestímulo da prática delituosa.
Nos negativos, observar-se-ia: enriquecimento do ofendido; viabilidade
econômica do ofensor.
De qualquer forma, além da observação desses critérios, a aplicação deve ser
norteada pelos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e equidade.
CONCLUSÃO
Considerando que o trabalho é uma das práticas mais antigas do mundo, e que a
sociedade ao longo da história manteve-se em constante mudança e evolução, é natural que
estas transformações se refletissem no âmbito social.
Foi no início do século XIX que começaram a instituírem-se regramentos para o
trabalho humano, a partir deste momento, lentamente, difundiu-se cada vez mais direitos aos
trabalhadores, a ascensão do comunismo e do fascismo, a criação do Ministério do Trabalho,
a elaboração das Constituições da Alemanha e México e a Declaração dos Direitos Humanos
58
foram o ápice da conquista de direitos e trouxeram seus efeitos para o Brasil, a partir de
1930, no governo de Getúlio Vargas começou a surgir uma política trabalhista, que culminou
em 1943 na criação da Consolidação das Leis Trabalhistas.
Com o advento da Constituição Federal em 1988 o trabalho ganhou especial
proteção, a Constituição trouxe consigo inúmeras transformações, especialmente no Direito
do Trabalho, elevando o trabalho a preceito fundamental em nosso ordenamento jurídico,
elemento primordial para a concretização da Dignidade da Pessoa Humana.
A Constituição trouxe consigo diversos princípios a serem analisados com o intuito
de proteger o trabalho e o trabalhador, tido como hipossuficiente na relação laboral, buscou
assim, estabelecer regras mínimas para o trabalhador, e, neste mesmo viés, estabelecer
garantias à condição social do mesmo.
Contudo, a globalização ganhava espaço no âmbito internacional e nacional e, apesar
das garantias advindas da Constituição iniciou-se um processo de aviltamento dos direitos
trabalhistas, o capitalismo e a busca por lucro culminou no aparecimento de casos de
dumping social, aonde, reiteradamente, empresas deixaram de cumprir as normas mínimas
de trabalho determinadas pela Constituição.
Assim, como meio de obstar tal prática, nosso ordenamento passou a admitir a
indenização por dano moral coletivo, visto que considera a afronta reiterada aos direitos
trabalhistas uma agressão não apenas a direitos fundamentais garantidos em nossa Carta
Magna, mas também a toda a sociedade, visto que contribui para o desequilíbrio da ordem
econômica e social. Esta novidade trouxe consigo complicações, por se tratar de um dano
não material, com base na doutrina e dos julgados nesta seara pode-se fazer uma compilação
dos requisitos necessários para a caracterização desta espécie de dano.
Ao avaliarmos a jurisprudência em específico, sobre a possibilidade de dano moral
coletivo nos casos de dumping, percebe-se que a simples prática de desrespeito aos direitos
trabalhistas, por si só, não configura dano moral coletivo, é preciso que esta conduta aconteça
reiteradas vezes, assim como o pleito por dano moral coletivo deve ocorrer através de Ação
Civil Pública, por intermédio dos órgãos legitimados para propor a referida ação. A
condenação, nestes casos, de acordo com grande parte dos julgados analisados, não pode
ocorrer extra petita ou ex officio pelo magistrado, entretanto tal entendimento ainda não se
encontra consolidado.
Por fim, buscamos os pressupostos necessários para fixar o quantum indenizatório
porquanto a grande dificuldade encontrada pelos magistrados em dirimir tal questão, uma
59
vez que a doutrina apresenta parâmetros, sem, no entanto, estabelecer limites. A destinação
da indenização devida à coletividade, em casos de condenação em decorrência de dumping
social trabalhista deve ser encaminhada para o Fundo de Amparo ao Trabalhador, como
determina a Lei n.º 7.347/85, em seu artigo 13.
Concluindo, a legislação ainda não se encontra consolidada, assim como há diversos
posicionamentos divergentes na jurisprudência no que tange a configuração do dano moral
coletivo como consequência da prática de dumping. Por tratar-se de dois temas polêmicos e
em constante evolução impossível extrair conclusões absolutas sobre o assunto, sendo este
trabalho um apanhado de ideias, princípios e conceitos com o objetivo de auxiliar na reflexão
sobre o tema.
REFERÊNCIAS
BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico
brasileiro. In: AUGUSTIN, Sérgio. Dano moral e sua quantificação. 3.ed. rev. e ampl.
Caxias do Sul, RS: Plenum, 2005.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. – 8. Ed. – São Paulo: LTr.
2009.
GABRIEL, Sérgio. Dano moral e indenização. In AUGUSTIN, Sérgio. Dano Moral e sua
Quantificação. Caxias do Sul, RS: Editora Plenum, 2004.
NOGUEIRA LEI, Juliana Cardoso. O dano moral coletivo trabalhista. 2014. Disponível
em:< http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI183545,91041-
Dano+moral+coletivo+trabalhista > Acesso em: 12 mai.2017.
PINTO JUNIOR, Amaury Rodrigues. A função social dissuasória da indenização por dano
moral coletivo e sua incompatibilidade com a responsabilidade civil objetiva. Rev. Trib.
Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 56, n. 86, p. 37-52, jul. dez. 2012. Disponível em: <
http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_86/amaury_rodrigues_pinto_junior.pdf
>. Acesso em: 13 mai. 2017.
REIS, Clayton. Avaliação do Dano Moral. 2 ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 1999.
SILVA, Flávio Murilo Tartuce. Reflexões sobre o dano social. Âmbito Jurídico, Rio Grande,
XI, n. 59, nov. 2008. Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=3537> Acesso em
10 de maio de 2017.
SOUTO MAIOR, J. L.; MOREIRA, R. M.; SEVERO, V. S. Dumping Social nas Relações
de Trabalho. 2 Ed., São Paulo: LTr, 2014.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. O dano social e sua reparação. Revista LTr, v.71, p.1317 -
1323, 2007. Disponível em: <
http://www.calvo.pro.br/media/file/colaboradores/jorge_luiz_souto_maior/jorge_luiz_sout
o_maior_o_dano_moral.pdf> Acesso em 12 de maio de 2017.
II ASPECTOS RELEVANTES DO
DIREITO PREVIDENCIÁRIO NO
INSTITUTO DA APOSENTADORIA
63
RESUMO
INTRODUÇÃO
12
Pós-Graduando em Direito do Trabalho e Previdenciário na Universidade de Santa Cruz do Sul
(UNISC)/Escola Nacional da Advocacia/ Conselho Federal da OAB (ENA/CFOAB). Graduado em Direito
pelo Centro Universitário Cenecsita de Osório (UNICNEC). Advogado. E-mail: lc.dadda@gmail.com.
13
Doutoranda em Direito Político e Econômico na Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), com período
sanduíche na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Direitos Sociais e Políticas
Públicas, Graduada em Direito e Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade de Santa Cruz
do Sul (UNISC). Advogada, Professora orientadora da Pós-graduação Lato Sensu em Advocacia Trabalhista
e Previdenciária da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC)/ Escola Nacional da Advocacia/ Conselho
Federal da OAB (ENA/CFOAB). E-mail: taisramos@gmail.com.
64
O Direito está em constante mudança e a seara previdenciária está inclusa nesta esfera.
Desta forma, uma legislação mais antiga acaba por se tornar obsoleta, tendo em vista o
surgimento de novas discussões doutrinárias e jurisprudenciais acerca de fatos jurídicos (e
previdenciários) que vêm surgindo com o passar dos anos. É o caso da reaposentação e da
desaposentação, as quais não possuem previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro.
A questão demonstra-se complexa, já que em determinadas situações o aposentado
continua contribuindo para o sistema (em alguns casos, durante vários anos), o que ensejaria
a ele ter direito a outra aposentadoria, que poderia até ser mais vantajosa do que aquela que
é recebida.
Após muita discussão jurisprudencial, o STF, no ano de 2016, julgou um caso de
repercussão geral acerca da desaposentação, e considerou que a mesma não era
constitucional. E logo na sequência surgiu um novo instituto: a reaposentação, a qual ainda
é relativamente nova no cenário jurídico brasileiro.
A problemática dessa pesquisa é se há a possibilidade de ocorrer a reaposentação,
mesmo com a definição da Suprema Corte Brasileira acerca da inconstitucionalidade da
desaposentação.
Parte-se do pressuposto que existem diferenças entre a reaposentação e a
desaposentação. Uma delas, já mencionada, é que a primeira surgiu apenas após uma
definição jurídica acerca da situação da segunda. Vale dizer que há distinção entre as duas
na hipótese do tempo de contribuição, quer dizer, na contagem para o possível recebimento
de um segundo benefício. Na reaposentação, a contagem seria iniciada apenas no caso das
contribuições feitas após a aposentadoria, o que não é o caso da desaposentação.
Portanto, o objetivo geral deste trabalho é definir a possibilidade da reaposentação e
se ela é viável na justiça brasileira.
Como objetivos específicos, pretende-se conhecer o surgimento da desaposentação e
demonstrar a sua inconstitucionalidade e verificar o nascimento da reaposentação e
identificar a situação atual deste instituto na seara previdenciária brasileira.
Acerca da metodologia empregada, utilizar-se-á o método hitotético-dedutivo, por
meio de pesquisa bibliográfica acerca dos conceitos e institutos; também elaborar-se-á
pesquisa jurisprudencial nos principais tribunais brasileiros, no que tange aos julgados sobre
desaposentação e reaposentação.
A pesquisa foi dividida em dois momentos. No primeiro, fez-se uma abordagem acerca
do surgimento da desaposentação e da sua declaração como inconstitucional, em julgamento
65
realizado pelo STF, após discussão jurisprudencial acerca do assunto. Ademais, conceituou-
se a aposentadoria e as suas quatro espécies (por idade, por invalidez, por contribuição e
especial), e também foi explanado o posicionamento de importantes autores acerca da
possibilidade de desaposentação, os quais analisaram sua viabilidade econômica e jurídica.
No segundo momento, analisou-se o nascimento da reaposentação, pesquisou-se
acerca das suas possibilidades, foram analisadas notícias, bem como julgados recentes sobre
o tema. Também foi feita uma análise da situação atual da reaposentação em nosso país.
Importante ressaltar que a discussão acerca dos institutos é importante, tendo em vista
que, além do aspecto da falta de legislação citado anteriormente, a reaposentação e a
desaposentação estão em constante evidência nos tribunais brasileiros, sendo alvo de
inúmeros debates, pois são assuntos “novos” no cenário jurídico nacional. De modo
particular, principalmente a reaposentação, pois seu seguimento vincula-se a definição de
inconstitucionalidade da desaposentação, ocorrida em 2016 pela Suprema Corte brasileira,
como foi citado anteriormente.
Ademais, ponto importante a destacar é que o debate e as explanações acerca dos dois
institutos demonstram-se de fundamental importância, de forma que o esclarecimento evita
a possibilidade de trazer alguma confusão entre os mesmos. Como vimos brevemente, e
como veremos no decorrer do trabalho, a reaposentação e a desaposentação possuem larga
diferença, principalmente na prática.
Portanto, entende-se que fazendo a distinção, através de exemplos, ficará mais fácil
entender o que ocorre na previdência brasileira atualmente.
Finalmente, tudo isto, vale dizer, deve surgir a fim de que ocorra uma definição ao
aposentado, para que ele receba uma remuneração digna, satisfazendo as suas necessidades
pessoais, independentemente de ser ou não (re)aposentado. Esta é uma das contribuições que
este trabalho pretende fazer.
1 O INSTITUTO DA DESAPOSENTAÇÃO
Portanto, dentro da aposentadoria existem quatro espécies, que valem tanto para
trabalhadores urbanos como para trabalhadores rurais, como rege o princípio da igualdade.
Terão direito a aposentadoria aqueles que efetivarem as respectivas contribuições e se
enquadrarem nos requisitos específicos de cada espécie.
Aspecto importante a ressaltar é que o aposentado pode continuar a laborar, mesmo
após ser concedido o benefício; a exceção ocorre nas hipóteses de aposentadoria por
invalidez (artigos 46 da Lei nº 8.213/199118 e 168 do Decreto nº 3.048/199919) e
14 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 437. Livro em PDF. Disponível em:
<https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
15
Possui previsão legal na Lei nº 8213/1991, é compulsório, quer dizer, obrigatório para todos os trabalhadores
da iniciativa privada (Celetistas, domésticos, trabalhadores rurais, autônomos, empresários, trabalhadores
avulsos, produtores rurais, garimpeiros, entre outros). Também permite a inclusão de segurados facultativos,
atendendo ao princípio da universalidade. CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista.
Manual de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. Livro em PDF. Disponível em:
<https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
16
Os segurados estão vinculados diretamente ao RGPS e dividem-se em dois grupos, quais sejam, os segurados
facultativos (que não desenvolvem atividade laborativa, mas contribuem) e obrigatórios (que contribuem para
o sistema em razão de sua atividade laborativa). Os últimos subdividem-se em cinco espécies, sendo elas o
empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso, segurado especial e contribuinte individual. AMADO,
Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 9. ed. Salvador: JusPodvim, 2017.
17
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social
e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>.
Acesso em: 11 ago 2018.
18
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social
e dá outras providências. Art. 46. O aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá
sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>. Acesso em: 11 ago 2018.
19
BRASIL. Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999. Aprova o Regulamento da Previdência Social, e dá outras
providências. Art. 168. Salvo nos casos de aposentadoria por invalidez ou especial, observado quanto a esta
o disposto no parágrafo único do art. 69, o retorno do aposentado à atividade não prejudica o recebimento de
sua aposentadoria, que será mantida no seu valor integral. (Redação dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003).
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3048.htm>. Acesso em: 11 ago 2018.
67
aposentadoria especial (artigo 57, § 8º, Lei nº 8.213/199120). Neste último caso, o
beneficiário está impedido de trabalhar em ambientes onde há contato com agentes nocivos,
sendo liberado o serviço em outros lugares21.
Por outro lado, a norma legal também refere que o aposentado não poderá receber
outro benefício da Previdência Social, exceto salário-família e reabilitação profissional,
conforme dispõe o artigo 18, § 2º, da Lei nº 8.213/199122.
Ainda no tocante a aposentadoria, explanar-se-á, sucintamente, as quatro espécies
existentes.
A primeira é a aposentadoria por invalidez, possui previsão legal nos artigos 42 a 45
da Lei nº 8.213/1991. O segurado receberá este benefício nas hipóteses de doença ou
acidente e se, após avaliação de exame médico-pericial, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação23. Como já mencionado anteriormente, aquele que foi
aposentado por invalidez não poderá voltar a laborar, caso contrário, terá o seu benefício
cancelado.
O benefício da aposentadoria por idade está previsto nos artigos 201, § 7º, II, da
Constituição Federal, e 48 a 51 da Lei nº 8.213/1991. Prevê que o trabalhador pode requerer
a aposentadoria e receber o benefício ao atingir a idade estipulada pela legislação. No caso
da aposentadoria urbana, é de 65 anos para os homens e 60 anos para as mulheres; com
relação à aposentadoria rural, a lei determina a idade de 60 anos para os homens e 55 anos
para as mulheres24.
20
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social
e dá outras providências. Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida
nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. [...] §
8º. Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício
de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei.
(Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.98). Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>. Acesso em: 11 ago 2018.
21
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2017. p. 438. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-
previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
22
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social
e dá outras providências. Art 18: [...] § 2º. O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS
que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da
Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação
profissional, quando empregado. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>. Acesso em 11 ago 2018.
23
GLASENAPP, Ricardo Bernd. Direito Previdenciário. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2015. p. 74,
75.
24
HORVATH JÚNIOR, Miguel. Direito Previdenciário. Barueri, SP: Manole, 2011. p. 57 e 58.
68
25
HORVATH JÚNIOR, Miguel. Direito Previdenciário. Barueri, SP: Manole, 2011. p. 52.
26
GLASENAPP, Ricardo Bernd. Direito Previdenciário. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2015. p. 76.
27
Previsto no artigo 29, § 7º da Lei nº 8.213/1991. Trata-se de um cálculo efetuado nas aposentadorias por
tempo de contribuição, incluído pela Lei nº 9.876/1999, em razão que havia grande temor acerca do
desequilíbrio financeiro que este tipo de aposentadoria poderia causar ao sistema previdenciário. Este cálculo
leva em consideração a idade e o tempo de contribuição do requerente da aposentadoria, bem como leva em
conta a expectativa de vida que é fixada através da tábua construída pelo IBGE. SANTOS, Marisa Ferreira
dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Livro em PDF. Disponível em:
<https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
28
AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 9. ed. Salvador: JusPodvim, 2017. p. 728,
729.
29
SANTORO, José Jayme de Souza. Manual de Direito Previdenciário. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,
2015. p. 57, 58.
69
Feita esta breve explanação acerca das quatro modalidades de aposentadoria existentes
na seara previdenciária brasileira, passamos a uma análise mais detalhada do instituto da
desaposentação.
1.1 Surgimento
É de grande magnitude trazer a esta pesquisa alguns artigos do texto original da Lei nº
8.213/1991:
Art. 81. Serão devidos pecúlios:
[...]
II - ao segurado aposentado por idade ou por tempo de serviço pelo Regime Geral
de Previdência Social que voltar a exercer atividade abrangida pelo mesmo,
quando dela se afastar;
Art. 82. No caso dos incisos I e II do art. 81, o pecúlio consistirá em pagamento
único de valor correspondente à soma das importâncias relativas às contribuições
do segurado, remuneradas de acordo com o índice de remuneração básica dos
depósitos de poupança com data de aniversário no dia primeiro.30
[...]
Art. 84. O segurado aposentado que receber pecúlio, na forma do art. 82, e voltar
a exercer atividade abrangida pelo Regime Geral de Previdência Social somente
poderá levantar o novo pecúlio após 36 (trinta e seis) meses contados da nova
filiação.31
[...]
Art. 87. O segurado que, tendo direito à aposentadoria por tempo de serviço, optar
pelo prosseguimento na atividade, fará jus ao abono de permanência em
serviço, mensal, correspondendo a 25% (vinte e cinco por cento) dessa
aposentadoria para o segurado com 35 (trinta e cinco) anos ou mais de serviço e
para a segurada com 30 (trinta) anos ou mais de serviço.
Parágrafo único. O abono de permanência em serviço será devido a contar da data
de entrada do requerimento, não variará de acordo com a evolução do salário-de-
contribuição do segurado, será reajustado na forma dos demais benefícios e não se
incorporará, para qualquer efeito, à aposentadoria ou à pensão.32 (grifo do autor).
30
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social
e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>.
Acesso em: 13 ago 2018.
31
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social
e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>.
Acesso em: 13 ago 2018.
32
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social
e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>.
Acesso em: 13 ago 2018.
70
Deste diploma legal extraem-se dois benefícios previdenciários, sendo eles o pecúlio
e o abono de permanência em serviço. Ambos foram extintos após a entrada em vigor da Lei
nº 8.870/1994.
O pecúlio compreendia na devolução, por parte da Previdência Social, de valores de
contribuições que haviam sido feitas pelo aposentado (por idade ou tempo de contribuição),
na hipótese em que o mesmo voltasse a laborar33 após ser jubilado pela autarquia federal.
Já o abono de permanência em serviço consistia em uma porcentagem (25% da
aposentadoria) devida ao segurado que optasse por continuar trabalhando e não se
aposentasse, mesmo tendo alcançado os requisitos mínimos para a aposentadoria por tempo
de serviço, a qual, na época, estipulava a idade 35 anos para o homem e 30 anos para a
mulher34. Vale dizer, esta porcentagem não era incorporada nos valores da aposentadoria
concedida futuramente.
Com o cancelamento destes benefícios, nasceu o argumento de que a Previdência
Social estaria enriquecendo de forma ilícita35 em razão que o aposentado continuaria
contribuindo ao sistema previdenciário brasileiro, apesar de já estar aposentado e, portanto,
não receberia uma contrapartida desse período contributivo vertido.
Neste diapasão, a desaposentação surgiu em meados dos anos 90, após a edição da já
mencionada Lei nº 8.870/1994. Este instituto nada mais é do que a renúncia àquele direito
adquirido pela aposentadoria, de forma que o aposentado utiliza o tempo de contribuição
que já havia sido considerado na concessão do benefício, a fim de efetuar novo cálculo
previdenciário, para, assim, formular um novo pedido de aposentadoria36.
A título de exemplo, supõe-se que um homem aposentou-se por contribuição aos 50
anos, mas seguiu trabalhando e contribuindo até os 65 anos, tendo direito a aposentadoria
por idade. Nesta hipótese, haveria uma renúncia ao primeiro benefício, seriam somados os
tempos de contribuição que ocorreram antes e depois da concessão da aposentadoria e o
cidadão, contando oh tempo total, solicitaria nova aposentadoria, desta vez por idade.
33
AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 9. ed. Salvador: JusPodvim, 2017. p. 960
e 961.
34
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2017. p. 587, 588. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-
previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
35
SARUBO, Vitor André Pereira. Desaposentação no Regime Geral. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 dez.
2012. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.41071&seo=1>. Acesso em: 13
ago 2018.
36
GOES, Hugo. Manual de Direito Previdenciário: teoria e questões. 14. ed. Rio de Janeiro: Ferreira, 2018. p.
358.
71
Para arrematar a explicação feita acima, Marisa Ferreira dos Santos 37 ensina:
Não raro, o aposentado continua a trabalhar e participar do custeio do regime
previdenciário, embora sem direito a nenhuma cobertura em razão dessa nova
filiação (art. 18, § 2º, do PBPS). Acresce ao reduzido valor de sua aposentadoria
o da remuneração pela atividade que passa a exercer, e continua apagar
contribuição previdenciária incidente sobre esse valor (novo salário de
contribuição). Com o passar do tempo, acaba concluindo que não pode mais
trabalhar e, como não tem direito à cobertura previdenciária em razão da atividade
que passou a exercer, arca com a perda desses rendimentos.
37
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p.
425, 426. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>.
Acesso em 07 jul 2018.
38
AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 9. ed. Salvador: JusPodvim, 2017. p. 1021.
39
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2017. p. 483, 484 .Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-
previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
72
40
“A Desaposentação já era tratada em 1996 pelo Prof. Wladimir Novaes Martinez, em um artigo intitulado
‘Direito à Desaposentação’, no 9.º Congresso Brasileiro de Previdência Social, pela editora LTr, em São Paulo,
razão de que sua atual notoriedade no seio social, deve ser compreendida à luz da necessidade premente da
própria sociedade, destinatária da tutela jurídica, em buscar mecanismos que visam a evolução e o
aprimoramento dos direitos sociais insculpidos na Lei das Leis”. SALVADOR, Sérgio Henrique;
AGOSTINHO, Theodoro Vicente. Direito Previdenciário [livro eletrônico]. 4. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2017. Sem paginação. Biblioteca Thomson Reuters ProView. Disponível em:
<https://proview.thomsonreuters.com/library.html?sponsor=UNISC-3>.
41
“Creditam-se ao Professor Wladimir Novaes Martinez os primeiros estudos sobre o tema”. SANTOS, Marisa
Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 426. Livro em PDF.
Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
42
SALVADOR, Sérgio Henrique; AGOSTINHO, Theodoro Vicente. Direito Previdenciário [livro eletrônico].
4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017. Sem paginação. Biblioteca Thomson Reuters ProView.
Disponível em: <https://proview.thomsonreuters.com/library.html?sponsor=UNISC-3>.
43
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2017. p. 485. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-
previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
44
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015. p. 724.
45
AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 9. ed. Salvador: JusPodvim, 2017. p. 1023,
1024.
46
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p.
431. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>.
Acesso em 07 jul 2018.
73
Não há previsão legal referente à desaposentação até o momento, mas é de grande valia
ressaltar que ocorreram movimentações com relação à inclusão do instituto na esfera legal
previdenciária brasileira por algumas vezes. Entretanto, os dispositivos que tratavam acerca
desta possibilidade foram vetados, sendo que a última tentativa ocorreu na edição da Lei nº
13.183/201549.
47
“Os regimes previdenciários públicos no Brasil adotam o sistema de repartição simples, alimentado pela
solidariedade. Reparte-se o todo pelo número de necessitados de proteção social previdenciária.
A desaposentação poderia ser admitida, talvez, se estivéssemos diante de regime de previdência de
capitalização, em que o segurado financia o próprio benefício numa espécie de fundo de administração, cuja
finalidade seria a concessão de um benefício futuro com base em tais contribuições. Entretanto, o constituinte
de 1988 optou por regime de previdência baseado na solidariedade, em que as contribuições são destinadas à
composição de fundo de custeio geral do sistema, e não a compor fundo privado com contas individuais”.
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 428.
Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>. Acesso em
07 jul 2018.
48
“A desaposentação não prejudica o equilíbrio atuarial do sistema, pois as cotizações anteriores à aquisição
do beneficio são atuarialmente imprevistas, não sendo levadas em consideração para a fixação dos requisitos
de elegibilidade do benefício. Se o segurado continua vertendo contribuições após a obtenção do benefício,
não há igualmente vedação atuarial à sua revisão, obedecendo-se assim as premissas jurídicas e atuarias a que
se deve submeter a hermenêutica previdenciária”. IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito
Previdenciário. 20. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015. p. 725.
49
BRASIL. Mensagem nº 464, de 04 de novembro de 2015. A Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, passa a
vigorar com as seguintes alterações: Art. 18. [...] § 2º. O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social
que permanecer em atividade sujeita a esse Regime, ou a ele retornar, não fará jus a outra aposentadoria desse
Regime em consequência do exercício dessa atividade, sendo-lhe assegurado, no entanto, o recálculo de sua
aposentadoria tomando-se por base todo o período contributivo e o valor dos seus salários de contribuição,
respeitando-se o teto máximo pago aos beneficiários do RGPS, de forma a assegurar-lhe a opção pelo valor da
renda mensal que for mais vantajosa.
Art. 25. [...] § 2º. Para requerer o recálculo da renda mensal da aposentadoria, previsto no § 2º do art. 18 desta
Lei, o beneficiário deverá comprovar um período de carência correspondente a, no mínimo, sessenta novas
contribuições mensais.
74
Art. 28-A. O recálculo da renda mensal do benefício do aposentado do Regime Geral de Previdência Social,
previsto no § 2º do art. 18 desta Lei, terá como base o salário de benefício calculado na forma dos arts. 29 e
29-B desta Lei. § 1º. Não será admitido recálculo do valor da renda mensal do benefício para segurado
aposentado por invalidez. § 2º. Para o segurado que tenha obtido aposentadoria especial, não será admitido o
recálculo com base em tempo e salário de contribuição decorrente do exercício de atividade prejudicial à saúde
ou à integridade física. § 3º. O recálculo do valor da renda mensal do benefício limitar-se-á ao cômputo de
tempo de contribuição e salários adicionais, não sendo admitida mudança na categoria do benefício
previamente solicitado.
Art. 54. [...] § 1º. Os aposentados por tempo de contribuição, especial e por idade do Regime Geral de
Previdência Social poderão, a qualquer tempo, ressalvado o período de carência previsto no § 2º do art. 25
desta Lei, renunciar ao benefício, ficando assegurada a contagem do tempo de contribuição que serviu de base
para a concessão do benefício. § 2º. Na hipótese prevista no § 1º deste artigo, não serão devolvidos à
Previdência Social os valores mensais percebidos enquanto vigente a aposentadoria inicialmente concedida.
Art. 96. [...] III - não será contado por um regime previdenciário o tempo de contribuição utilizado para fins de
aposentadoria concedida por outro, salvo na hipótese de renúncia ao benefício, prevista no § 1º do art. 54 desta
Lei. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Msg/VEP-464.htm>.
Acesso em 14 ago 2018.
50
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015. p.724.
51
SANTORO, José Jayme de Souza. Manual de Direito Previdenciário. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,
2015. p. 74.
52
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2017. p. 484. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-
previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
75
53
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível 2000.04.01.079647-2, do Tribunal de
Justiça do Paraná, PR, 06 de outubro de 2015, Sexta Turma, Rel. João Surreaux Chagas. Disponível em:
<https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/imprimir.php?selecionados=%27TRF400078020%27&pp>.
Acesso em: 22 ago 2018.
54
“Em plena percepção acerca desta notória disponibilidade da aposentadoria previdenciária, o Colendo
Superior Tribunal de Justiça já há alguns anos, através de suas ínclitas duas Turmas Julgadoras da matéria, já
assentou acerca deste prisma, ou seja, o Guardião da Legislação Federal, englobando a análise de todos os
diplomas jurídicos previdenciários correlatos, através de vários e reiterados julgados asseverou sobre a
disponibilidade jurídica da prestação previdenciária”. SALVADOR, Sérgio Henrique; AGOSTINHO,
Theodoro Vicente. Direito Previdenciário [livro eletrônico]. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2017. Sem paginação. Biblioteca Thomson Reuters ProView. Disponível em:
<https://proview.thomsonreuters.com/library.html?sponsor=UNISC-3>.
55
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso em Mandado de Segurança 14.624 (2002/0043309-8), do
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, RS, 30 de junho de 2005, Sexta Turma, Rel. Min. Hélio Quaglia
Barbosa. Disponível em:
<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=562867&num_r
egistro=200200433098&data=20050815&formato=HTML>. Acesso em: 22 ago 2018.
56
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 310.884 (2001/0031053-2), do Tribunal de
Regional Federal da 4ª Região, RS, 23 de agosto de 2005, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz. Disponível
em:
<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=573654&num_r
egistro=200100310532&data=20050926&formato=HTML>. Acesso em: 22 ago 2018.
76
57
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial 600.419 (2003/0184621-
1), do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, RS, 29 de novembro de 2005, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton
Carvalhido. Disponível em:
<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=595510&num_r
egistro=200301846211&data=20060206&formato=HTML>. Acesso em: 22 ago 2018.
58
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.334.488 (2012/0146387-1), do Tribunal Regional
federal da 4ª Região, SC, 08 de maio de 2013, S1 – Primeira Seção, Rel Min. Herman Benjamin. Disponível
em:
<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1186178&num
_registro=201201463871&data=20130514&formato=HTML>. Acesso em: 22 ago 2018.
77
Por outro lado, o Ministro Herman Benjamin, em seu voto no julgamento acima
referido, ressaltou que a devolução dos valores era importante, pois, desta forma, a
aposentadoria antiga seria desfeita por completo e, assim, ocorreria um equilíbrio financeiro
na Previdência Social60.
Na esfera da Justiça Federal, assim como o entendimento do ministro, o TRF4 defendia
que os valores da aposentadoria renunciada deveriam ser devolvidos:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. REMESSA
OFICIAL AFASTADA. PEDIDO DE DESAPOSENTAÇÃO NEGADO
ADMINISTRATIVAMENTE. AUSÊNCIA DE NORMA IMPEDITIVA.
DIREITO DISPONÍVEL. DEVOLUÇÃO DOS MONTANTES RECEBIDOS
EM FUNÇÃO DO BENEFÍCIO ANTERIOR NECESSÁRIA.
59
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Informativo nº 0520, de 12 de junho de 2013. Disponível em:
<https://ww2.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo/?acao=pesquisarumaedicao&livre=@cod=%27052
0%27>. Acesso em: 22 ago 2018.
60
Nesse ponto é importante resgatar o tema sobre a possibilidade de renúncia à aposentadoria para afastar a
alegada violação, invocada pelo INSS, do art. 18, § 2º, da Lei 8.213⁄1991. Este dispositivo apenas veda a
concessão de prestação previdenciária aos segurados que estejam em gozo de aposentadoria, não sendo o caso
quando esta deixa de existir pelo seu completo desfazimento. [...] Tal premissa denota o quanto a devolução
dos valores recebidos pela aposentadoria objeto da renúncia está relacionada ao objetivo de obter nova e
posterior aposentação. Primeiramente porque, se o aposentado que volta a trabalhar renuncia a tal benefício e
não devolve os valores que recebeu, não ocorre o desfazimento completo do ato e, por conseguinte, caracteriza-
se a utilização das contribuições para conceder prestação previdenciária não prevista (a nova aposentadoria)
no já mencionado art. 18, § 2º. Além disso, ressalto relevante aspecto no sentido de que o retorno ao estado
inicial das partes envolve também a preservação da harmonia entre o custeio e as coberturas do seguro social.
É princípio básico de manutenção do RGPS o equilíbrio atuarial entre o que é arrecadado e o contexto legal
das prestações previdenciárias. Não é diferente para o benefício de aposentadoria, pois, sob a visão do segurado,
ele contribui por um determinado tempo para custear um salário de benefício proporcional ao valor da base de
cálculo do período contributivo. Evidentemente que o RGPS é solidário e é provido por diversas fontes de
custeio, mas a análise apartada da parte que cabe ao segurado pode caracterizar, por si só, desequilíbrio atuarial.
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.334.488 (2012/0146387-1), do Tribunal Regional
federal da 4ª Região, SC, 08 de maio de 2013, S1 – Primeira Seção, Rel. Min. Herman Benjamin. Disponível
em:
<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1186178&num
_registro=201201463871&data=20130514&formato=HTML>. Acesso em: 22 ago 2018.
78
61
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível 2000.71.00.009978-1, da Justiça Federal
do Rio Grande do Sul, RS, 01 de novembro de 2016, Sexta Turma, Rel. João Batista Pinto Silveira. Disponível
em:
<https://www2.trf4.jus.br/trf4/processos/visualizar_documento_gedpro.php?local=trf4&documento=1213654
&hash=9963cbb60717a0e6db957f799ead4fce>. Acesso em: 22 ago 2018.
62
NOTÍCIAS STF. STF considera inviável recálculo de aposentadoria por desaposentação sem previsão em
lei. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=328199>. Acesso
em 19 ago 2018.
79
Sobre a decisão proferida pelo STF, Castro e Lazzari63 referem que “Trata-se de
verdadeira injustiça social com o aposentado que possui benefício de valor muito aquém de
suas necessidades e mesmo comprovando novas contribuições não consegue o
reconhecimento à devida recomposição da sua renda mensal”. Na mesma linha
posicionaram-se Salvador e Agostinho64.
Mas ainda existem debates acerca da devolução dos valores ao INSS por parte
daqueles que foram beneficiados com a desaposentação antes da decisão do STF65, pois a
Suprema Corte não se manifestou na ocasião.
Vale ressaltar que em julho de 2018 a Previdência Social passou a fazer descontos nos
valores das aposentadorias de alguns beneficiários, enquanto outros passaram a receber o
valor da aposentadoria antiga66.
Neste diapasão, Marisa Helena dos Santos67 reitera que “Somente a lei poderá
dispensar o beneficiado da devolução dos proventos recebidos quando aposentado. E, caso
prevaleça a obrigatoriedade da restituição, somente lei poderá estabelecer a forma de
cálculo”.
Após o julgamento de 2016, viu-se o nascimento de um novo instituto no direito
previdenciário brasileiro, a reaposentação, a qual se analisará no próximo capítulo.
63
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2017. p. 485. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-
previdenciario/livros-14/>.
64
“esqueceu o STF que em maio de 2013, o Colendo STJ, no sistema de Recursos Repetitivos, assentou a total
viabilidade da Desaposentação, inclusive registrando acerca da desnecessidade de devolução do que foi até
então auferido, caso esse de grande repercussão no mundo jurídico, quando a 1.ª Corte do Tribunal da
Cidadania apreciou o REsp 1.334.488, de Relatoria do Min. Herman Benjamin. Portanto, a aparente
complexidade da matéria em discussão, ganha contornos jurídicos claros e esclarecedores quando a aplicação
do instituto da Desaposentação é aferida mediante a inserção imprescindível de valores constitucionais, já que
são alvo e razão de existência da proteção previdenciária, merecendo sempre, análise acurada pelo operador
do direito, face aos postulados inseridos na ‘Lei das Leis’, eleitos pelos beneficiários da tutela estatal como
primordiais à consecução dos princípios basilares para a constituição de uma Sociedade Livre, Justa e Solidária,
o que o STF, infelizmente não fez”. SALVADOR, Sérgio Henrique; AGOSTINHO, Theodoro Vicente. Direito
Previdenciário [livro eletrônico]. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017. Sem paginação.
Biblioteca Thomson Reuters ProView. Disponível em:
<https://proview.thomsonreuters.com/library.html?sponsor=UNISC-3>.
65
“Mas um ponto ainda não foi tratado pelo STF nos dias 26 e 27 de outubro de 2016. Trata-se da eficácia da
revogação das antecipações de tutela, se retroativas (o segurado precisará devolver as parcelas percebidas) ou
prospectivas (sem restituição), o que poderá ser deduzido pelas partes em sede de embargos de declaração”.
AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 9. ed. Salvador: JusPodvim, 2017. p. 1027.
66
G1 ECONOMIA. INSS cobra segurados que receberam a desaposentação. Disponível em:
<https://g1.globo.com/economia/noticia/2018/07/20/inss-cobra-segurados-que-receberam-a-
desaposentacao.ghtml>. Acesso em: 21 ago 2018.
67
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p.
431. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>.
Acesso em 07 jul 2018.
80
2 REAPOSENTAÇÃO
68
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Arguição de Inconstitucionalidade 2009.72.00.009007-2,
da Justiça Federal de Santa Catarina, SC, 30 de setembro de 2010, Corte Especial, Rel. Ricardo Teixeira do
Valle Pereira. Disponível em:
<https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=1&documento=4077658>. Acesso em:
05 set 2018.
69
AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 9. ed. Salvador: JusPodvim, 2017. p.
1027,1028.
70
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p.
433, 434. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-previdenciario/livros-14/>.
Acesso em 07 jul 2018.
71
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2017. p. 485. Livro em PDF. Disponível em: <https://forumdeconcursos.com/direito-
previdenciario/livros-14/>. Acesso em 07 jul 2018.
82
72
JORNAL O GLOBO. Após ‘desaposentação’ ser proibida, Justiça dá aval a ‘reaposentação’. Disponível em
<https://oglobo.globo.com/economia/apos-desaposentacao-ser-proibida-justica-da-aval-reaposentacao-
22121491>. Acesso em: 21 ago 2018.
73
VARGAS E NAVARRO ADVOGADOS ASSOCIADOS. Justiça do Rio reconhece direito à reaposentação.
Disponível em: <https://www.vargasenavarro.com.br/single-post/2018/03/08/Justi%C3%A7a-do-Rio-
reconhece-direito-%C3%A0-Reaposenta%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 05 set 2018.
74
GAÚCHAZH. Conheça 13 casos que possibilitam pedir revisão ao INSS para melhorar o valor da
aposentadoria. Disponível em: <https://gauchazh.clicrbs.com.br/economia/dicas-de-
economia/noticia/2018/04/conheca-13-casos-que-possibilitam-pedir-revisao-ao-inss-para-melhorar-o-valor-
da-aposentadoria-cjfk1sa9a055c01phm2i3foyy.html>. Acesso em: 21 ago 2018.
83
75
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível 5007217-74.2016.4.04.9999, da Justiça
Federal do Paraná, PR, juntado aos autos em 12 de junho de 2017, Sexta Turma, Rel. João Batista Pinto
Silveira. Disponível em:
<https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=1&documento=8998752>. Acesso em:
22 ago 2018.
76
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Ação Rescisória 0052367-74.2016.4.01.0000, da Justiça
Federal do Distrito Federal, DF, 30 de maio de 2018, Primeira Seção, Rel. João Luiz de Sousa. . Disponível
em: <https://www2.cjf.jus.br/jurisprudencia/trf1/index.xhtml;jsessionid=C4AUD7KZHAvdPAZG-
84
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
A TRIBUNA. Novo caso de troca de benefício tem sucesso na Justiça. [S.l.]: 11 abr. 2018.
_______. Constituição (1891). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Rio
de Janeiro, RJ: Congresso Nacional Constituinte, 1891.
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; Lazzari, João Batista. Manual de Direito
Previdenciário. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
GAÚCHAZH. Conheça 13 casos que possibilitam pedir revisão ao INSS para melhorar o
valor da aposentadoria. Porto Alegre, RS: 04 abr. 2018.
GOES, Hugo. Manual de Direito Previdenciário: teoria e questões. 14. ed. Rio de Janeiro:
Ferreira, 2018.
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo:
Saraiva, 2016.
SANTORO, José Jayme de Souza. Manual de Direito Previdenciário. 4. ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 2015.
RESUMO
INTRODUÇÃO
79
Especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Universidade de Santa Cruz do Sul
(UNISC)/Escola Nacional da Advocacia/ Conselho Federal da OAB (ENA/CFOAB). Graduada em Direito
pela Universidade de Caxias do Sul (UCS). Advogada. E-mail: d.selau@hotmail.com.
80
Doutoranda em Direito Político e Econômico na Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), com período
sanduíche na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Direitos Sociais e Políticas
Públicas, Graduada em Direito e Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade de Santa Cruz do
Sul (UNISC). Advogada, Professora orientadora da Pós-graduação Lato Sensu em Advocacia Trabalhista e
Previdenciária da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC)/ Escola Nacional da Advocacia/ Conselho
Federal da OAB (ENA/CFOAB). E-mail: taisramos@gmail.com.
90
física, sendo que os requisitos para a concessão desta modalidade de aposentadoria estão
dispostos no artigo 57 da Lei n. 8.213/91 e no artigo 64 do Decreto n. 3.048/99, de onde se
extrai que o segurado deve comprovar, além do tempo de trabalho permanente, não ocasional
nem intermitente, a efetiva exposição a agentes químicos, físicos, biológicos ou associação
de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física pelo período equivalente ao exigido
para a concessão do benefício (15, 20 ou 25 anos).
A Previdência Social possui o entendimento de que somente terá direito a
aposentadoria especial os trabalhadores que comprovem contato habitual e permanente com
pessoas infectadas em hospitais, ou que exerçam suas atividades em ambientes onde haja o
isolamento, ou outras medidas de controle de risco biológico.
Por conta disso, a questão que os tribunais vêm enfrentando diz respeito aos
segurados que exercem suas funções laborais no ambiente hospitalar, independente da
atividade, por tratar-se de local onde comumente estão presentes agentes biológicos nocivos
à saúde.
Portanto, inicialmente, será feita uma análise sobre a aposentadoria especial no
ambiente hospitalar, focando na questão dos agentes biológicos, da habitualidade e
permanência, e da eficácia do uso dos EPIS.
E por fim se analisará a jurisprudência acerca da possibilidade de concessão de
aposentadoria especial aos trabalhadores do ambiente hospitalar, em razão dos agentes
insalubres comumente presentes no ambiente laboral, independente da atividade e do contato
com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas.
81
ROCHA, Daniel Machado da; SAVARIS, José Antonio. Curso de direito previdenciário: fundamentos de
interpretação e aplicação do direito previdenciário. Curitiba: Alteridade, 2014. p. 191
82
Nanobiotecnologia e Segurança Microbiológica: Quais as suas aplicações no Setor da Saúde. Disponível em:
<https://d335luupugsy2.cloudfront.net/cms/files/4325/1494942393T NS_eBook16_Nanobiotecnologia.pdf>.
Acesso em 15 maio 2018.
83
RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim, Aposentadoria Especial de Profissionais da Área da Saúde &
Contribuintes Individuais, Juruá Editora, 2018, p. 116.
84
Aposentadoria especial é direito dos trabalhadores em hospitais. Disponível
em:<https://www.conjur.com.br/2017-ago-14/opiniao-aposentadoria-especial-trabalhadores-hospitais>
Acesso em 17 abril 2018.
92
85
Livro de Direito Previdenciário. Disponível em:
<https://livrodireitoprevidenciario.com/aposentadoria_especial/>. Acesso em 30abril 2018.
86
Biossegurança em saúde. Disponível em: <http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/saude-bem-
estar/biosseguranca -saude.htm>. Acesso em 04 maio2018.
87
Livro de Direito Previdenciário. Disponível em:
<https://livrodireitoprevidenciario.com/aposentadoria_especial/>. Acesso em 30abril 2018.
94
Agente Biológico é definido como aquele que contenha informação genética e seja
capaz de autorreprodução ou de se reproduzir em um sistema biológico. Inclui bactérias,
fungos, vírus, clamídias, riquétsias, micoplasmas, príons, parasitos, linhagens celulares e
outros organismos88.
Os agentes biológicos estão previstos nos códigos 1.3.1 do quadro Anexo do Decreto
nº 53.831/64, 1.3.1 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e 3.0.0 e 3.0.1 do Anexo IV dos
Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99.
Observamos, porém, que o Quadro Anexo do Decreto 53.831/1964, os Anexos I e II
do Decreto 83.080/1979, bem como os Anexos I e II dos Decretos 2.172/1997 e 3.048/1999,
relacionaram como agentes biológicos os trabalhos permanentes expostos ao contato direto
com os germes infecciosos, a exposição ao contato com doentes ou materiais
infectocontagiantes, os trabalhos em que haja contato permanente com doentes ou materiais
infectocontagiantes, e trabalhos em contato com pacientes portadores de doenças
infectocontagiosas ou com manuseio de materiais contaminados89.
Tais agentes são capazes de provocar danos à saúde humana, podendo causar
infecções, efeitos tóxicos, efeitos alergênicos, doenças auto-imunes e a formação de
neoplasias e malformações90.
88
Classificação de riscos dos agentes biológicos. Disponível em:
<www2.fcfar.unesp.br/Home/CIBio/ClassificRiscoBiologico.pdf>. Acesso em 04 maio 2018.
89
RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim, Aposentadoria Especial de Profissionais da Área da Saúde &
Contribuintes Individuais, Juruá Editora, 2018, p. 61
90
Riscos Biológicos. <https://pt.scribd.com/document/93285605/03-APOSTILA-RISCOS-BIOLOGICOS>.
Acesso em: 28 maio 2018.
95
91
Agentes biológicos como fato gerador de atividade especial para fins previdenciários. Disponível em:
<https://jus.com.br/artigos/18182/agentes-biologicos-como-fato-gerador-de-atividade-especial-para-fins-
previdenciarios>. Acesso em: 16 abril 2018.
92
Riscos Biológicos Guia Técnico. Disponível em:
<https://www.unifesp.br/reitoria/dga/images/legislacao/biosseg/guia_tecnico_cs3.pdf >. Acesso em: 19 abril
2018.
96
93
Riscos Biológicos Guia Técnico. Disponível em:
<https://www.unifesp.br/reitoria/dga/images/legislacao/biosseg/guia_tecnico_cs3.pdf >. Acesso em: 28 abril
2018.
94
Classificação de riscos dos agentes biológicos. Disponível em:
<http://www2.fcfar.unesp.br/Home/CIBio/ClassificRiscoBiologico.pdf>. Acesso em: 04 maio 2018.
95
Biossegurança em saúde. Disponível em:<http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/saude-bem-
estar/biosseguranca-saude.htm >. Acesso em: 04 maio 2018.
97
No tocante aos agentes biológicos a exposição deve ser avaliada de forma qualitativa,
não sendo condicionada ao tempo diário de exposição do segurado. O objetivo do
96
CAMACHO, Roberto Alexandre Pisa. Detecção de Bactérias no Ar em Ambiente Hospitalar com Recurso
a Técnicas Moleculares. Madeira, PT. 2010.
97
ARRUDA, Vera Lucia. ESTUDO DA QUALIDADE MICROBIOLOGICA DO AR EM AMBIENTE
HOSPITALAR CLIMATIZADO E SUA RELAÇÃO COMO ELEMENTO DE RISCO PARA O AUMENTO
DE INFECÇÕES: ESTUDO DE CASO DO HOSPITAL REGIONAL DE ARARANGUÁ, SC. Criciúma, Sc.
2009.
98
98
SALIBA, Tuffi Messias; CORRÊA, Márcia Angelim Chaves. Insalubridade e periculosidade: aspectos
técnicos e práticos. São Paulo: LTr, 2017. p. 14.
99
SALIBA, Tuffi Messias; CORRÊA, Márcia Angelim Chaves. Insalubridade e periculosidade: aspectos
técnicos e práticos. São Paulo: LTr, 2017. p. 140
100
UFMT. Manual de isolamento e Precauções, 2006. Disponível em:
<http://www.ufmt.br/hujm/arquivos/7e18458a8aa832719641156ccd469de8.pdf> Acesso: 21 abril 2018.
101
SALIBA, Tuffi Messias; CORRÊA, Márcia Angelim Chaves. Insalubridade e periculosidade: aspectos
técnicos e práticos. São Paulo: LTr, 2017. p. 140
99
De acordo com Saliba e Corrêa102 vários aspectos devem ser observados pelo perito
durante a diligência em que verificará a insalubridade
Assim, é importante que o perito analise, durante a diligência, os seguintes itens:
se o local de trabalho do reclamante se localiza no hospital de referência no
tratamento de doenças infectocontagiosas ou hospitais gerais, se existem alas e ou
quartos específicos para tratamento de portadores de doenças infectocontagiosas,
qual o protocolo existente no hospital no caso de atendimento a portadores destas
doenças, qual o percentual de doenças infectocontagiosas atendidas no hospital,
que tipo de isolamento deverá ser adotado para estas doenças, se existe equipe
específica para atendimento destas doenças, deverão também ser consultadas as
notificações compulsórias a vigilância sanitária, lembrando que nem todas as
doenças comunicadas são infectocontagiosas e ne exigem isolamento total. A NR
32 que trata da saúde dos profissionais das áreas de saúde também deverá ser
consultada.
102
SALIBA, Tuffi Messias; CORRÊA, Márcia Angelim Chaves. Insalubridade e periculosidade: aspectos
técnicos e práticos. São Paulo: LTr, 2017. p. 141
103
SALIBA, Tuffi Messias; CORRÊA, Márcia Angelim Chaves. Insalubridade e periculosidade: aspectos
técnicos e práticos. São Paulo: LTr, 2017. p. 144
100
como insalubre devido ao local e a exposição eventual ao agente. Cabe destacar que, de
acordo com a Portaria N.12, de 12.11.1979, o contato permanente com pacientes, animais
ou material infectocontagiante é a prestação de serviço contínuo, decorrente do próprio
contrato de trabalho, com exposição permanente aos agentes insalubres. O contato
intermitente equivale ao permanente para efeitos de caracterização da insalubridade,
conforme entendimento da Súmula n.47 do TST.104
A Instrução Normativa 77, em vigor, editada em 21.01.2015, trata sobre a
aposentadoria especial, dispondo no art. 277:
Art. 277. São consideradas condições especiais que prejudicam a saúde ou a
integridade física, conforme definido no Anexo IV do RPS, a exposição a agentes
nocivos químicos, físicos, biológicos ou à associação de agentes, em concentração
ou intensidade e tempo de exposição que ultrapasse os limites de tolerância
estabelecidos segundo critérios quantitativos, ou que, dependendo do agente, torne
a simples exposição em condição especial prejudicial à saúde, segundo critérios
de avaliação qualitativa. (...)
Art. 278. Para fins da análise de caracterização da atividade exercida em condições
especiais por exposição à agente nocivo, consideram-se: I - nocividade: situação
combinada ou não de substâncias, energias e demais fatores de riscos
reconhecidos, presentes no ambiente de trabalho, capazes de trazer ou ocasionar
danos à saúde ou à integridade física do trabalhador; e (...)
§ 1º Para a apuração do disposto no inc. I do caput, há que se considerar se a
avaliação de riscos e do agente nocivo é:
I - apenas qualitativo, sendo a nocividade presumida e independente de
mensuração, constatada pela simples presença do agente no ambiente de trabalho,
conforme constante nos Anexos 6, 13 e 14 da Norma Regulamentadora 15 – NR-
15 do MTE, e no Anexo IV do RPS, para os agentes iodo e níquel, a qual será
comprovada mediante descrição:
a) das circunstâncias de exposição ocupacional a determinado agente nocivo ou
associação de agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho durante toda a
jornada;
b) de todas as fontes e possibilidades de liberação dos agentes mencionados na
alínea “a”; e
c) dos meios de contato ou exposição dos trabalhadores, as vias de absorção, a
intensidade da exposição, a frequência e a duração do contato.
104
SALIBA, Tuffi Messias; CORRÊA, Márcia Angelim Chaves. Insalubridade e periculosidade: aspectos
técnicos e práticos. São Paulo: LTr, 2017. p. 145
101
105
RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim, Aposentadoria Especial de Profissionais da Área da Saúde &
Contribuintes Individuais, Juruá Editora, 2018, p. 175
102
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Revista da Previdência Social – RPS, 1998, n. 217, p. 1.049-1.055.
106
107
RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim, Aposentadoria Especial de Profissionais da Área da Saúde &
Contribuintes Individuais, Juruá Editora, 2018, p. 178
103
Segundo a autora Maria Helena Carreira Alvim Ribeiro108, “desde a decisão do STF
no julgamento do processo ARE 664.335, flexibilizando o entendimento em relação ao
agente físico ruído, tem sido questionada a neutralização da nocividade da atividade
desempenhada pelo profissional da área da saúde”.
Conforme Wladimir Novaes Martinez109 “o direito ao benefício dispensa, por parte
do interessado, a prova de ter havido tal prejuízo físico, bastando, consoante filosofia da lei,
a mera possibilidade de sua ocorrência”, isto é, a probabilidade do risco”.
De acordo com os autores Tuffi Messias Saliba e Márcia Angelim Chaves Côrrea110
a insalubridade por agentes biológicos é inerente a atividade, isto é, não há eliminação com
medidas aplicadas ao ambiente nem neutralização com o uso de EPI’s. A adoção de sistema
108
RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim, Aposentadoria Especial de Profissionais da Área da Saúde &
Contribuintes Individuais, Juruá Editora, 2018, p. 179.
109
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Questões Atuais Envolvendo a Aposentadoria Especial. Revista de
Previdência Social, n. 217, dez. 1998, p. 1.049-1.055.
110
SALIBA, Tuffi Messias; CORRÊA, Márcia Angelim Chaves. Insalubridade e periculosidade: aspectos
cnicos e práticos. São Paulo: LTr, 2017. p. 146
104
de ventilação e o uso de luvas, máscara e outros equipamentos que evitem o contato com
agentes biológicos podem apenas minimizar o risco.
O Enunciado 21 do CRPS – Conselho de Recursos da Previdência Social, editado
pela Resolução MPS/CRPS 1 das Câmaras do Conselho Pleno das Câmaras Superiores, de
11.11.1999 é nesse sentido: O simples fornecimento de equipamento de proteção individual
de trabalho pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes
nocivos à saúde, devendo ser considerado todo o ambiente de trabalho.
Segundo Maria Helena Carreira Alvim Ribeiro111, a conclusão coerente com a correta
interpretação da doutrina e jurisprudência, tratando-se de exposição a agentes biológicos e à
radiação, a utilização de EPI não é capaz de elidir, de forma absoluta, o risco proveniente do
exercício da atividade.
Em que pese o hospital seja o local adequado para o atendimento de pessoas doentes,
há de se considerar que se trata de um local insalubre, pois os agentes biológicos podem estar
presentes em todos os espaços. Por conta disso, a questão que vem sendo enfrentada pelos
tribunais é se todos os trabalhadores dos hospitais, independente da sua atividade, fazem jus
a aposentadoria especial.
Os agentes biológicos estão previstos nos códigos 1.3.1 do quadro Anexo do Decreto
nº 53.831/64, 1.3.1 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e 3.0.0 e 3.0.1 do Anexo IV dos
Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99. No entanto, a jurisprudência vem entendendo tratar-se
de rol exemplificativo os fatores e situações de risco previstas nos referidos anexos. Assim,
ainda que tais Decretos prevejam a especialidade apenas de atividades em ambiente
hospitalar onde sejam tratados "pacientes portadores de doenças infectocontagiosas",
havendo demonstração, mediante perícia técnica, da efetiva exposição do segurado a agentes
biológicos nocivos à saúde mesmo em ambiente diverso daquele previsto pela norma
regulamentadora, vem sendo reconhecida a natureza especial da atividade.
111
RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim, Aposentadoria Especial de Profissionais da Área da Saúde &
Contribuintes Individuais, Juruá Editora, 2018, p. 179
105
III. Até a edição da Lei 9.032/95 (29.4.95) era suficiente o exercício de atividade
considerada como insalubre ou perigosa, nos termos dos Decretos n° 53.831/64 e
83.080/79. Ainda que se considere meramente exemplificativo o rol de agentes
nocivos e atividades agressivas dos decretos, entende-se que devem, ao menos, ser
apresentados documentos hábeis a comprovar que o trabalho era desempenhado
sob condições perigosas, penosas ou insalubres.
IV. A partir da Lei 9.032/95, com a edição do Decreto 2.172/97 (05.03.97) até a
Lei 9.711/98 (28.05.98), passou-se a exigir que a atividade fosse exercida com
efetiva exposição a agentes nocivos.
V. O Colendo STF, quando do julgamento do ARE 664335-SC, sob regime de
repercussão geral, entendeu que: "o direito à aposentadoria especial pressupõe a
efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o
EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo
constitucional à aposentadoria".
VI. Constatado, através dos documentos colacionados aos autos, PPPs e laudos
técnicos, que o autor exerceu atividade laboral na Casa de Saúde Pedro
Valadares, nas funções de auxiliar de contabilidade, contabilista, diretor
financeiro, auxiliar administrativo, exposto a agentes biológicos (vírus e
bactérias) de forma habitual e permanente, durante mais 25 (vinte e cinco) anos
(03/11/1988 a 12/11/2013), e que o EPI resultou ineficaz, deve ser-lhe concedida
a aposentadoria pleiteada, desde a data do requerimento administrativo.
VII. Conforme entendimento desta Segunda Turma Julgadora, nas causas
previdenciárias, deve ser aplicado, sobre as parcelas devidas, o critério de
atualização, previsto no Manual de Cálculos da Justiça Federal, a contar do débito,
sobre todo o período devido, e juros de mora de 0,5% ao mês, a partir da citação
(Lei nº 9494/97, art. 1-F, dada pela Medida Provisória nº 2180-35, 2001).
VIII. Honorários advocatícios fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre
valor das parcelas vencidas, observando-se o disposto na Súmula nº. 111 do STJ.
IX. Apelação provida. (PROCESSO: 08000996920144058503, AC/SE,
DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE CARVALHO
(CONVOCADO), 2ª Turma, JULGAMENTO: 30/07/2015, PUBLICAÇÃO:)
CONCLUSÃO
O objetivo traçado para a presente pesquisa foi verificar a luz da legislação, doutrina
e jurisprudência a possibilidade de concessão do benefício de aposentadoria especial a todos
os que exercem suas atividades laborais no ambiente hospitalar, independente da função,
considerando o risco de exposição aos agentes biológicos característicos aos ambientes de
trabalho da área da saúde.
A legislação previdenciária permite a concessão do benefício de aposentadoria
especial aos segurados da Previdência Social que comprovem o contato habitual e
permanente com agentes biológicos de natureza infectocontagiosa.
Cinge-se, a controvérsia, em saber se essa benesse se estende aos trabalhadores em
geral da área hospitalar, ou ainda, se procede a compreensão no sentido de que os
trabalhadores que atuam no nosocômio ou ambientes análogos, mesmo que exerçam
atividades de cunho administrativo, estejam igualmente sujeitos aos riscos biológicos do
local.
Os riscos de natureza biológica reclamam análise qualitativa, isso é, o tempo de
exposição ao agente agressivo não guarda relação com o potencial nocivo. Demais disso,
entende-se que no hospital, por ser um local destinado ao tratamento de doentes, convergem
inúmeras doenças, fungos, bactérias, microorganismos, os quais se transmitem pelas vias
cutânea, digestiva e aérea, estando prontos para atacar aqueles que circulam nesse meio.
Os trabalhadores, por sua vez, muitas vezes atuam como vetores de transmissão
desses agentes. Acerca dos requisitos de habitualidade e permanência, vige a compreensão
de que a permanência não é relevante para concessão de aposentadoria especial com
fundamento em exposição a agente biológico, sendo reconhecido que o ambiente hospitalar
e outros similares são insalubres e potencialmente causadores de danos à saúde.
Por conta disso, entende-se que os trabalhadores situados dentro da área hospitalar
estão, indistintamente, expostos a agentes biológicos nocivos à saúde, aplicando-se a
compreensão de que o risco é inerente à atividade-fim do local.
Diante dessa compreensão, fazem jus, igualmente, ao benefício de aposentadoria
especial.
111
REFERÊNCIAS
Agentes biológicos como fato gerador de atividade especial para fins previdenciários.
Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/18182/agentes-biologicos-como-fato-gerador-
de-atividade-especial-para-fins-previdenciarios>. Acesso em: 16 abril. 2018.
KERTZMAN, Ivan. Curso Prático de Direito Previdenciário. 3. ed. Salvador: Jus Podium,
2007.
RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim. Aposentadoria Especial. 4. ed. Curitiba: Juruá,
2011.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
SAVARIS, José Antônio. Direito Processual Previdenciário. 5. ed. rev. atual. Curitiba:
Alteridade, 2014.
VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de Direito Previdenciário. 4. ed. São Paulo: Atlas,
2011.
114
III ABORDAGENS
CONTEMPORÂNEAS NO DIREITO
PROCESSUAL CIVIL
115
Claudia Perrone112
Aline Burin Cella113
RESUMO
INTRODUÇÃO
A realidade social contemporânea, segundo nos ensina Baumann (2001) pode ser
caracterizada como uma modernidade líquida, onde tudo é muito instantâneo e insípido, o
direito, que é essencialmente rígido e formal, precisa encontrar meios de aderir à realidade
social e política. Dentro dessa perspectiva, as garantias e os direitos fundamentais estão em
constante construção e precisam acompanhar a sociedade no espaço e no tempo. Talvez por
isso a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, que instituiu o novo Código de Processo Civil
(CPC/2015), trouxe em seu texto uma série de inovações procedimentais, simplificação dos
ritos e, principalmente, com uma tentativa [...] de se mitigar a adoção, pelo sistema, do
modelo da legalidade das formas procedimentais, permitindo-se ao juiz e às partes, diante
do déficit procedimental, a adaptação dos procedimentos às particularidades objetivas e
subjetivas da causa (flexibilização procedimental) (GAJARDONI, 2011, p.165-6).
Diante desta constatação, pretende-se demonstrar, neste artigo, que a flexibilização
112
Mestra em Direitos Humanos (UniRitter, 2015). Advogada especialista em Direito Empresarial (Unisinos,
2010) e em Direito Processual Civil (UNISC, 2017). Membro do Grupo de Pesquisas “O Processo Civil na
Perspectiva dos Direitos Fundamentais”, PUC/RS. Presidente da Comissão de Direitos e Garantias
Individuais, da Subseção da OAB/NH. E-mail: cperrone06@gmail.com
113
Mestre em Direito. Professora do Departamento de Direito da UNISC na graduação e pós-graduação Lato
Sensu. Especialista em Direito Imobiliário. Coordenadora do Projeto de Extensão Fiscal Aprendiz.
Orientadora de Estágios. Advogada. E-mail: alinecella@unisc.br
116
114
Apenas para exemplificar o que é dito, deve ser considerado que algumas manifestações típicas dos modelos
adversarial e inquisitorial estão expressas no CPC/2015. Manifestações típicas do modelo adversarial, que
dizem com a instauração do processo e as regras de fixação do objeto litigioso, são os artigos 2º do CPC (com
correspondência no artigo 262 CPC/1973), do 141 do CPC (com correspondência no artigo 128 CPC/1973),
e do 492 CPC/2015 (com correspondência no artigo 460 do CPC/1973), que representam expressões do
princípio dispositivo. Por outro lado, proposições típicas do modelo inquisitorial, que dizem com a
investigação probatória, são os artigos 370 do CPC (com correspondência no artigo 130 CPC/1973), do artigo
373, §§1º e 2º do CPC (com correspondência no artigo 333 CPC/1973) manifesta expressão do princípio
inquisitivo.
117
Tal afirmação está diretamente relacionada à premissa formulada por Castanheira Neves
(1993, p.13), de que os pensamentos jurídicos, em suas mais variadas formulações, são
“entidades culturalmente históricas”; ou seja, os valores de cada sociedade, em cada época,
permeiam direito e pensamento jurídico, conformando suas particularidades.
Desde logo deve ser dito que seria um erro tratar cada um dos modelos processuais
aqui analisados como pertencentes a famílias ou tradições jurídicas distintas (civil law e
common law) (BARREIROS, 2013); de fato, o que identifica cada modelo são os
pressupostos sociais, lógicos e éticos, que resultam em diferentes modos de enfrentamento
do problema da divisão de trabalho entre os atores de um processo judicial (MITIDIERO,
2011). O que se destaca é que o objeto dos modelos processuais nada mais é do que a
referência ao papel exercido por cada um dos atores, que terá mais ou menos protagonismo
na instauração, no desenvolvimento ou na conclusão do processo, de acordo com a
predominância do modelo.
Se o que diferencia cada modelo são a organização e a divisão das tarefas e dos
poderes entre os atores, neste estudo não se pretende analisar a polaridade das características
dos modelos adversarial e inquisitorial. Na verdade há, contemporaneamente, uma “[...]
tendência de superação tanto do modelo liberal, de esvaziamento do poder do juiz, quanto
do modelo social autoritativo, de exercício solitário de aplicação compensadora do direito
pelo juiz [...]” (NUNES, 2008, p.212). Nesta perspectiva, busca com um terceiro modelo
(processo colaborativo), se busca suprir este esvaziamento por meio de uma adequada
divisão de tarefas e de poderes entre esses atores (partes e juiz)115 (MARINONI;
MITIDIERO, 2015).
Ao modificar o papel do juiz, o modelo colaborativo de processo impõe uma
modificação na própria estrutura da relação jurídica de direito processual civil, substituindo
a antiga representação triangular, que colocava o estado-juiz acima das demais partes do
processo e a redesenhando em forma de linhas paralelas. Nesta perspectiva o juiz está no
mesmo nível das partes e atua no mesmo sentido que elas; o traço mais característico do
processo colaborativo é que o juiz é inserido como sujeito do contraditório, não possuindo
mais apenas poderes de condução do feito, mas especialmente deveres de cooperação com
115
Aqui, deve ser esclarecido que a colaboração não espera que as partes colaborem entre si; espera que elas
colaborem com o juiz, e o juiz com as partes na divisão equilibrada dos atos e encargos processuais, para a
melhor construção do feito e o aprimoramento da decisão final. Sobretudo porque “[a]s partes não querem
colaborar. [...] As partes não colaboram e não devem colaborar entre si simplesmente porque obedecem a
diferentes interesses no que tange à sorte do litígio” (MARINONI, MITIDIERO, 2015, p.740).
118
115).
Contudo, a colaboração não surge no CPC/2015 apenas como um modelo processual,
por vezes assumindo o papel de modelo processual, com as características já abordadas, e
por vezes assumindo o papel de princípio processual.116 Como princípio, “[...] apesar de não
estar expresso na Constituição Federal, o princípio da cooperação pode ser deduzido de
outros princípios, notadamente, do contraditório, da boa-fé e o do devido processo legal
(direito fundamental ao processo justo)”. (KOPLIN, 2015, p.44). Nesse prisma, a
colaboração impõe um estado de coisas que tem que ser promovido, servindo “[...] de
elemento para a organização de um processo justo idôneo a alcançar decisão justa. Para que
o processo seja organizado de forma justa, os seus participantes devem ter posições jurídicas
equilibradas ao longo do procedimento (MARINONI; MITIDIERO, 2015, p.740).
Posições jurídicas equilibradas são estruturadas a partir do estabelecimento de
preceitos normativos com caráter de regras, “[...] que devem ser seguidas pelo juiz na
condução do processo. O juiz tem os deveres de esclarecimento, de diálogo, de prevenção e
de auxílio para os litigantes. [...] Esses deveres consubstanciam as regras que estão sendo
enunciadas quando se fala em colaboração no processo” (MARINONI; MITIDIERO, 2015,
p.740). Assim, é possível depreender do CPC/2015 a existência de quatro deveres associados
ao princípio da colaboração, correspondentes aos deveres de esclarecimento, de prevenção,
de consulta, e de auxílio. Estes são deveres que possibilitam ao juiz efetivamente
compreender as alegações das partes, consultando-as sobre questões que influenciam nos
rumos do e na solução do processo, prevenindo-as quanto ao risco de que o êxito de seus
pedidos seja frustrado por sua condução inadequada, enfim, auxiliando as partes na
superação de eventuais dificuldades e desequilíbrios que impeçam o exercício de direitos e
o cumprimento de ônus processuais (processo justo) (MARINONI; MITIDIERO, 2015).
O dever de esclarecimento “[...] determina [...] que o juiz esclareça junto às partes os
pontos duvidosos (não claros) de suas postulações, a fim de que se possa prestar
adequadamente jurisdição”. Este dever vem exemplificado por Koplin (2015, p.46-7) com a
116
Adota-se aqui a distinção entre princípios e regras construída por Humberto Ávila, onde “[a]s regras são
normas imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e
abrangência, para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência, sempre centrada na finalidade
que lhes dá suporte ou nos princípios que lhes são axiologicamente sobrejacentes, entre a construção
conceitual da descrição normativa e a construção conceitual dos fatos. Os princípios são normas
imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementariedade e de
parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação de correlação entre o estado de coisas e ser
promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária para à sua promoção” (ÁVILA,
2016, p.102).
120
processuais, como as previsões relativas à dinamização do ônus da prova (artigo 373, §§1º e
2º do CPC/2015) (KOPLIN, 2015).
Diante do que foi dito sobre a colaboração como modelo e como princípio processual,
nesta segunda parte do artigo se pretende demonstrar que a ampliação da flexibilização
procedimental garantida pelo CPC/2015 evidencia a já mencionada predominância da
colaboração, em detrimento dos tradicionais modelos adversarial e inquisitorial. Se o
CPC/1973 caracterizava-se, sobretudo “[...] por um ideal de rigidez procedimental aliado à
plenariedade da cognição, tendo-se por pressuposto para tanto a ideia de que a função
jurisdicional consistiria em declarar o direito com base num juízo de certeza próprio das
matemáticas” (RAATZ, 2017, p.195-7), o CPC/2015 já não se contenta com o contraditório
formal e a rigidez procedimental e a cognição plena e exauriente. É nesse sentido que será
abordada a flexibilização procedimental.
117
Segundo Fazzalari (2006. p.119-21), o que efetivamente caracteriza o processo é “[...] a estrutura dialética
do procedimento, isto é, justamente, o contraditório.” É desta premissa que se cunhou a expressão “processo
122
tutela jurisdicional e para tanto deve ser adequado à situação de direito material que lhe
origina, como única forma de se alcançar a tutela jurisdicional adequada (provimento). Com
isso, supera-se a ideia de que a sentença é ferramenta de concretização do direito, passando
a ser um objeto elaborado de modo adequado à situação concreta (BENAVENTE, 2015). A
flexibilização consequentemente impõe a premissa de que, no desenvolvimento dos atos
processuais (procedimento), “todas as regras são técnicas, que dizer, vêm concebidas em
função de sua utilidade para o processo” (GAJARDONI, 2008, p.84). A técnica, nesse
contexto, corresponde ao emprego “[...] de meios mais ou menos eficiente, organizados para
que o processo possa atingir suas finalidades. [...] A técnica jurídica, portanto, tende a
realizar a síntese entre o sistema e a forma” (ALVARO DE OLIVEIRA, 2010, p.170-1).118
Se o CPC/1973, como já reiterado, era um sistema pautado essencialmente pela
legalidade das formas procedimentais, o CPC/2015 abriu-se em direção a um sistema onde
há liberdade de formas procedimentais diante da tentativa, do legislador, de “[...] permitir
ao juiz e às partes, diante do déficit procedimental, a adaptação dos procedimentos às
particularidades objetivas e subjetivas da causa (flexibilização procedimental)”.119 A
substituição dos procedimentos sumário e ordinário por “[...] uma figura única e híbrida
denominada procedimento comum”, o fim dos procedimentos especiais cautelares e a
extinção de alguns procedimentos especiais são tentativas de buscar uma “simplificação
formal e ritual” do sistema processual assim como de flexibilizar o procedimento diante da
existência de déficit procedimental (GAJARDONI 2011, p.164 e ss.). Segundo Gajardoni
(2008, p.87-8), o sacrifício do valor segurança e a consequente “imprevisibilidade” ou
como procedimento em contraditório”, uma vez que fazendo “ [...] referência à estrutura dialética como a
ratio distinguendi”, e à superação de outros conceitos de processo (que enfatizavam o conflito de interesses
entre partes distintas), tornou possível afirmar que “[...] onde é ausente o contraditório – isto é, onde inexistia
a possibilidade, prevista pela norma, de que ele se realize – não existe processo.”
118
Sobre a instrumentalidade do processo afirma Bedaque (2007, p.26): “A técnica constitui fator essencial à
ideia de processo. Concebido como instrumento de que a função jurisdicional do Estado se serve para colocar
fim às crises existentes no plano de direito material, necessário regular a maneira como ele opera. É
fundamental que o instrumento atue segundo técnica adequada e apta a possibilitar que os fins sejam
atingidos. Esta é a função das formas e formalidades processuais, cuja razão de ser encontra explicação
fundamentalmente em fatores externos ao próprio processo.”
119
Estes dois sistemas se diferenciam pois no sistema da legalidade das formas procedimentais “o lugar em
que cada ato processual tem cabimento, bem como o prazo para a sua prática, encontra-se rigidamente pré-
estabelecido em lei em lei, podendo o desrespeito à prescrição legal implicar invalidade do próprio ato
processual, do seu conjunto (do procedimento todo), ou do resultado do processo (da sentença).” Um sistema
que “[...] é burocrático, e em muitas ocasiões implica a prática de atos processuais desnecessários ou
inadequados à efetiva tutela dos direitos.” Por outro lado, no sistema de liberdade das formas procedimentais,
“[...] não há uma ordem legal pré-estabelecida para a prática dos atos processuais, tampouco há disciplina
legal dos prazos, competindo aos sujeitos do processo (ora às partes, ora ao juiz) determinar a cada momento
qual o ato processual a ser praticado, bem como o tempo para tanto” (GAJARDONI, 2011, p.164 e ss).
123
120
Nesse ponto, importante dizer que a doutrina em geral se mostrava muito resistente ao reconhecimento da
desta liberdade das partes para influenciar no procedimento. Contudo, Barbosa Moreira (1984, p.182),
contrariamente, indicava ser possível observa, na vigência do CPC/1973 uma ampla liberdade contratual a
disposição das partes, tais como: a convenção de eleição de foro (artigo 111); a convenção para reduzir ou
prorrogar prazo dilatório (artigo 181); a convenção de distribuição do ônus da prova (artigo 333, parágrafo
único); o adiamento da audiência por convenção das partes (artigo 453, inciso I); a convenção entre os
litisconsortes para falar em audiência (artigo 454, § 1.º); a convenção sobre a administração de
estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, semoventes, plantações ou edifício em construção
penhorados (677, § 2.º); a convenção sobre indicação de depositário de bens sequestrados (artigo 824, inciso
I); a adoção convencional da forma de arrolamento para realizar partilha amigável (artigo 1.031); e a
convenção sobre alienação de bens em depósito judicial (1.113, § 3.º).
125
para além da predominância da flexibilização legal alternativa. Evidente que muitas das
disposições relativas à flexibilização procedimental legal alternativa subsistem no
CPC/2015, contudo, o que interessa abordar a partir deste ponto são as inovações pertinentes
à adequação procedimental. Nesse contexto, deve ser dito que inicialmente o Anteprojeto do
Código de Processo Civil, elaborado pela Comissão de Juristas instituída pelo Ato do
Presidente do Senado Federal nº 379, de 2009, estabelecia, já em sua exposição de motivos,
o princípio da adaptabilidade judicial do procedimento (KOPLIN, 2015), ou princípio da
flexibilização (judicial) do procedimento (GAJARDONI, 2011), como uma das importantes
modificações a serem implementadas.
A exemplo disso, o artigo 139, inciso VI do CPC/2015 estabelece uma flexibilização
legal genérica (limitada às hipóteses de aumento de prazos e inversão da produção dos meios
de prova), exigindo do juiz que resolva “[...] com justiça o caso levado à apreciação
jurisdicional”, exigindo ainda que tal condução seja o juiz concretize o princípio da
colaboração, ou seja “[...] paritário no diálogo e assimétrico na decisão da causa”. A direção,
nesse contexto, além de qualificada pelo princípio da colaboração, vem também qualificada
pelos princípios do contraditório e da tutela jurisdicional adequada (MARINONI;
ARENHARDT; MITIDIERO, 2017, p.283-4). Já o artigo 188, muito embora tenha
privilegiado o princípio da instrumentalidade das formas, e os preceitos de um formalismo
valorativo, perdeu oportunidade de literalizar uma construção normativa de flexibilização
procedimental legal genérica.121
Mesmo diante das limitações impostas pela redação final dos artigos mencionados,
as previsões normativas do CPC/2015 apontam para uma releitura do papel do juiz. O modo
como o juiz dirigirá o processo e utilizará os elementos de flexibilização disponíveis será
essencial ao desenvolvimento de um processo colaborativo, já que a fórmula escolhida pelo
legislador (ainda que um pouco limitada) cria uma medida de atuação coerente com os
demais direitos fundamentais das partes. A postura mais ativa do juiz na conformação do
procedimento pode auxiliar a trazer a necessária aderência entre o procedimento e a
realidade. Essa postura vem acompanhada da necessidade de se buscar, no desenvolver
processual, a compatibilidade entre a flexibilização do procedimento e o princípio do
contraditório (na acepção forte), mormente porque ao se suprimir determinados atos, deve
121
Na redação original do anteprojeto do código, o artigo correspondente vinha acrescido de um parágrafo
primeiro, com a seguinte redação “§ 1º Quando o procedimento ou os atos a serem realizados se revelarem
inadequados às peculiaridades da causa, deverá o juiz, ouvidas as partes e observados o contraditório e a
ampla defesa, promover o necessário ajuste.”
126
ser considerado que sua eliminação pode representar a supressão do próprio contraditório,
ponto central para um processo colaborativo.
Nesse sentido, como exemplo de flexibilização procedimental implementada pelo
CPC/2015, merece atenção a leitura em conjunto da improcedência liminar do pedido (artigo
332, CPC/2015), com a decisão de saneamento do processo (artigo 357, CPC/2015), vez que
uma leitura desatenta destes preceitos normativos pode violar os direitos fundamentais
processuais das partes (CABRAL, 2016). Isso porque, a decisão de organização e
saneamento do processo, que em uma perspectiva mais tradicional era vista como expressão
do modelo inquisitorial (um ato de autoridade pública) (LACERDA, 1985), na conformação
dada pelo CPC/2015 adquire uma feição colaborativa que permite sua compreensão como
manifestação da colaboração. Consequentemente, pode-se ler a partir do artigo 357 do
CPC/2015, que a série de providências que devem ser tomadas pelo juiz no sentido de melhor
delinear a lide traz previsibilidade para o processo e orienta a construção do procedimento
adequado à tutela pretendida pelas partes. Essa organização se manifesta tanto
retrospectivamente, sanando eventuais vícios que impeçam o conhecimento do mérito da
causa (inciso I do referido artigo); e prospectivamente no que diz com as questões que
delimitam a lide e preparam a causa para instrução e para o julgamento, como as questões
de delimitação das provas e do ônus probatório, além da fixação das questões de direito
relevantes para solução da lide (CABRAL, 2016; MARINONI; ARENHARDT;
MITIDIERO, 2017).
As feições delineadas no modelo e no princípio colaborativo ficam evidentes no
artigo em questão (357, CPC/2015), por exemplo, pela afirmação do dever de esclarecimento
constante nos §§ 1º e § 3º. Consequentemente, esse é um dispositivo que evidentemente
precisa ser lido como instrumento de concretização do próprio contraditório, garantindo não
apenas a segurança jurídica, pela delimitação da lide pelo saneamento de questões que
possam impossibilitar o julgamento de mérito, mas também trazendo efetividade, por meio
dos instrumentos de flexibilização processual, que promovam a adequação do procedimento
e o alcance da tutela adequada dos direitos sub judice (CABRAL, 2016).122
122
Sobre a organização e o saneamento do processo, Nunes (2016, p.235-6) afirma que o CPC/2015 adota “[...]
uma modalidade de saneamento compartilhado ou comparticipado, que permitirá a organização do
processo calcada nos preceitos constitucionais do contraditório, isonomia, ampla defesa e devido processo,
além da teoria normativa da comparticipação (art. 6º, CPC/2015) de modo a permitir às partes a obtenção de
efetiva paridade de participação processual que, deseja-se, culminará em uma decisão final resguardada pelo
necessário impedimento de surpresas processuais, que induzem o fomento da atividade recursal, retrabalhos
pelos juízes (a serem compelidos a proferirem várias decisões sobre o mesmo ‘objeto’) e aumento do tempo
de tramitação processual”.
127
Por fim, o que pode ser dito sobre os preceitos normativos aqui analisados, é que, de
fato houve uma ampliação nas possibilidades de flexibilização dos procedimentos, não
correspondendo mais à realidade, a afirmação de que o Código de Processo Civil brasileiro
é um código pautado pela flexibilização procedimental legal alternativa. O que se viu da
análise aqui apresentada é a opção do legislador por ampliar as hipóteses de flexibilização
tanto com a tentativa de incluir (mesmo que ainda de modo tímido) a flexibilização legal
genérica, quanto para incluir possibilidades de flexibilização judicial e voluntária. Nesse
sentido, percebe-se também que tais flexibilizações foram normatizadas a partir de
perspectivas que parecem respeitar, além de tentar concretizar, os direitos fundamentais das
partes, mas sobretudo, que abrem espaço para efetivação do modelo colaborativo de
processo, bem como para concretização da colaboração como um princípio.
CONCLUSÃO
Diante de tudo o que foi considerado nesta pesquisa, pouco ainda precisa ser dito. O
primeiro ponto a ser reforçado é que este estudo não teve intenção de ser conclusivo,
tampouco de explorar todos os pontos relativos aos temais aqui abordados. A pretensão,
muito mais singela, era demonstrar que a flexibilização procedimental garantida pelo
CPC/2015 funcionou como um indicativo de que o Código de Processo Civil adotou
predominantemente um modelo colaborativo de processo, pautado nos elementos que
caracterizam a colaboração como um princípio.
Também se pode afirmar que o CPC/2015, muito embora não abandone os modelos
processuais tradicionais (adversarial e inquisitivo), contém em seu corpo normativo uma
série de dispositivos que enfatizam a importância da colaboração entre as partes e o juiz. A
partir desta premissa se pode notar um redimensionamento do papel do juiz no processo civil
contemporâneo. Neste sentido, e em coerência com os direitos fundamentais processuais, se
estabelecem e fortalecem os deveres associados à colaboração como elementos aptos a
promover o direito a um processo justo.
Também se pode afirmar que a flexibilização incluída no CPC/2015, ao menos sob
o prisma analisado neste estudo, tende a trazer impactos positivos (no sentido da
concretização) aos direitos fundamentais das partes. Especificamente com a ampliação da
flexibilização permitida aos juízes, pode-se dizer que houve uma reformulação do papel por
ele desempenhado, lhe dando em certa medida protagonismo, para que não seja nem o juiz
129
Pilatos, como já foi mencionado por Dinamarco, mas ao mesmo tempo limitado o suficiente
para que não se torne o juiz Hércules da fórmula Dowkiniana. Igualmente no ponto em que
diz com a ampliação da flexibilização voluntária, percebe-se também uma modificação do
papel desempenhado pelas partes. Aqui, talvez a questão maior seja o controle a ser exercido
sobre estes poderes, para verificar se as disposições por elas estabelecidas não violarão
direitos fundamentais processuais. Nesse ponto, a redação dos preceitos normativos parece
suficiente; se na prática, efetivamente estas mudanças produzirão efeitos concretos e
positivos na prestação da tutela jurisdicional, somente a prática e a interpretação dos
Tribunais nos dirão.
REFERÊNCIAS
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos.
17.ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2016.
BARBORA MOREIRA, José Carlos. Convenções das partes sobre matéria processual.
Revista de Processo, nº 33, pp. 182-191, jan/mar. 1984. p.182.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 2.ed.
São Paulo: Malheiros, 2007.
FAZZALARI, Elio. Instituição de Direito Processual. Tradução da 8.ed. por Elaine Nassif.
Campinas: Bookseller, 2006.
KOPLIN, Klaus Cohen. O novo CPC e os direitos fundamentais processuais: uma visão
geral, com destaque para o direito ao contraditório. In: RUBIN, Fernando; REICHELT, Luis
Alberto (Org.). Grandes temas do novo Código de Processo Civil. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2015. pp. 15-51.
LACERDA, Galeno. Despacho Saneador. 2. ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1985.
NUNES, Dierle José Coelho. Processo Jurisdicional Democrático: uma análise crítica das
reformas processuais. Curitiba: Juruá, 2008.
______, et al. Contraditório como garantia de influência e não surpresa no CPC-2015. In:
DIDIER JÚNIOR, Fredie; NUNES, Dierle; FREIRE, Alexandre. Normas Fundamentais.
Salvador: Juspodivm, 2016. (Coleção Grandes Temas do Novo CPC, v. 8). pp.213-40.
Patrícia De Carli123
Josiane Caleffi Estivalet124
RESUMO
INTRODUÇÃO
123
Assessora Jurídica da Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul. Graduada em Direito pela
Universidade de Passo Fundo- UPF. Especialista em Direito do Trabalho, Previdenciário e Processo do
Trabalho pela Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC. Especialista em Direito Processual Civil pela
Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC. Especialista em Gestão Pública pela Universidade Federal de
Santa Maria- UFSM. Mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC. Doutoranda em
Desenvolvimento Regional pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul-
UNIJUÍ. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6589091187700313. Endereço eletrônico:
patriciadecarli@ymail.com.
124
Juíza de Direito no Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Professora do Curso de Pós-
graduação lato sensu da UNISC, na modalidade à distância. Possui graduação em Direito pela Universidade
de Santa Cruz do Sul. Especialização em Direito, Sociedade e Psicanálise e Direito Processual Civil pelo
Instituto de Ensino Superior de Santo Ângelo. É mestre em Políticas Públicas pela Universidade de Santa
Cruz do Sul. Membro do NEM, Núcleo de Estudos em Mediação da Escola Superior da Magistratura da
AJURIS (Associação dos Juízes do Estado do Rio Grande do Sul). Currículo
Lattes: http://lattes.cnpq.br/2727056550845985. Endereço eletrônico: josiane.ce.santcruz@gmail.com.
132
Para alcançar os fins a que se propõe, partirá de um viés que privilegia as disposições trazidas
pela nova legislação civilista.
Nessa perspectiva, em um primeiro momento, será abordado o fenômeno da
judicialização da saúde. Diante das grandes dificuldades de se alcançar ao jurisdicionado os
objetos envolvendo a matéria de saúde postulados em Juízo sem vulnerar a organização
administrativa da política de saúde, em um segundo momento, abordar-se-á a necessidade
de novas direções na governança da justiça, que contemplem a resolução adequada destas
disputas, apresentando a perspectiva do novo Código de Processo Civil no que se refere a
esta temática.
Em um terceiro momento, analisar-se-á, com fulcro na legislação atual, a
possibilidade de autocomposição de conflitos na hipótese em que uma das partes for pessoa
jurídica de direito público, sobretudo, nas demandas que envolvem o direito indisponível à
saúde. Por derradeiro, apresentar-se-á breve análise acerca do sistema administrativo de
conciliação e mediação no âmbito da administração pública do Estado do Rio Grande do Sul
e analisar-se-á a viabilidade da implementação de práticas de mediação sanitária no âmbito
da administração pública.
Ressalta-se que a presente pesquisa, tem por objetivo avaliar novas possibilidades de
efetivação do direito à saúde no âmbito da gestão pública estadual. Uma vez que se torna
imperiosa a busca pela otimização da aplicação dos recursos públicos e a correspondente
satisfação do usuário do serviço público que busca a efetivação do seu direito social,
construindo-se, outrossim, uma nova compreensão de acesso ao direito à saúde e
concretização da justiça.
125
Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul a judicialização, em 2016,
correspondeu a 15% do orçamento da saúde, o que representa em valores monetários uma cifra de R$
320.822.977,77.
134
Para que se possa compreender o cerne do debate acerca de novos rumos na direção
da governança da justiça, que acabou por conduzir o Estado brasileiro a adotar políticas
públicas de resolução adequada de disputas urge refletir acerca da finalidade do Direito. O
ordenamento jurídico e a atuação do Estado, por meio do poder legitimado para promover a
jurisdição, deve ter por norte a finalidade maior do Direito que é a promoção da pacificação
social.
A ideia da confecção de um novo Código de Processo Civil, mais moderno e atento
a educar o usuário da Justiça para melhor resolver conflitos por meio de ações
comunicativas, nasce a partir de sugestões formuladas no ano de 2009 por uma comissão de
juristas. A mesma é aprovada no âmbito do Senado Federal no final de 2010. Após três anos
de tramitação na Câmara dos Deputados e de inúmeras audiências públicas e debates nos
estados, uma versão do Código de Processo Civil é aprovada pela Câmara em março de
2014. Entretanto, apenas no final do ano de 2014 o Senado Federal aprova o texto final.
(BARBOSA; SILVA, 2015, p. 11)
Dentre as inovações trazidas pelo novo texto legal, merece destaque a ideia central
de converter a figura do processo judicial em uma ferramenta que faça parte do contexto
social em que produzirá o seu resultado, a partir da compreensão de que a satisfação efetiva
das partes pode dar-se de modo mais intenso se a solução é por elas criada e não imposta
pelo juiz, razão pela qual passa a assumir protagonismo a resolução adequada de disputas, a
partir da operacionalização dos Métodos Consensuais de Solução de Conflitos. (BRASIL,
2010)
135
construir soluções para suas realizações são da essência desses processos. (CNJ, 2016, p. 31-
32)
Percebe-se, do exposto, que a nova legislação civilista traz insculpida em seus artigos
a compreensão de que os métodos consensuais são ferramentas relevantes no sentido de
garantir um caráter mais harmonizador para a solução dos conflitos, de modo que,
considerando o grande número de ações judiciais envolvendo demandas de saúde, urge
analisar a autocomposição de conflitos em matérias que envolvam este importante direito
social.
que a Administração Pública está incluída como destinatária dos métodos consensuais de
resolução de conflitos. (FAGÚNDES; GOULART, 2016, p.151)
Ao se falar de autocomposição de conflitos não se pode ignorar a questão do Poder
Público em juízo, uma vez que irrealizável a discussão acerca de um melhor funcionamento
do Poder Judiciário se não forem incluídas medidas que contemplem as demandas em que o
Estado é parte, cujo número representa expressivo percentual dos processos que tramitam
atualmente. Assim, da mesma forma que o acesso à justiça passa por um aperfeiçoamento
do seu significado, denotando muito mais uma solução qualificada do litígio do que a simples
interposição de uma ação, os princípios que regem a Administração Pública também devem
ser reinterpretados à luz da Constituição e dos demais direitos fundamentais nela insculpidos.
(EIDT, 2015, p. 56)
Outrossim, importa mencionar que os casos concretos devem ser avaliados para que
se possa precisar se a resolução consensual de conflitos deve ser utilizada no âmbito da
Administração Pública. Para tanto, deve ser realizado um exame abrangente dos argumentos
fáticos e jurídicos apresentados por cada cidadão, empresa ou entidade, ao questionarem um
determinado ato ou direito. Se a algum deles assistir razão, a medida mais econômica, em
razão da legalidade, é atender o pleito, com o reconhecimento total ou parcial da procedência
do pedido. Contudo, não tendo a causa fundamento fático e/ou jurídico, a alternativa será
contestar a ação, protegendo-se o interesse público. Ainda, quando se verificar que existe
algum grau de probabilidade de que o autor tenha razão, mas não exista certeza fática e/ou
jurídica, aí reside espaço para a utilização da resolução consensual de conflitos (SOUZA,
2016, p. 216).
Para viabilizar esse caminho, porém, é desejável que existam parâmetros prévios
contidos em normas legais ou administrativas, que estipulem os critérios necessários para a
celebração de acordos ou transações, que definam as autoridades encarregadas de realizar a
análise de risco, conforme critérios apresentados no parágrafo anterior, bem como verificar
as hipóteses em que se autorize o acordo em cada caso. Evitando a arbitrariedade e falta de
critérios por parte do servidor encarregado de promover a resolução consensual, de modo,
que o modelo ideal seria a composição de um colegiado composto por servidores ligados à
área jurídica e a área técnica, que se apresenta como objeto da contenda. (SOUZA, 2016, p.
216-217).
No contexto brasileiro os litígios em matéria de saúde de maior expressividade
referem-se ao acesso a um objeto material da demanda. Estes litígios se polarizam de um
138
lado pelo cidadão enfermo, demandando ações ou insumos de saúde, e de outro, pelo Estado,
provedor de serviços públicos de saúde. As demandas ocorrem em virtude da ausência do
serviço que deveria estar sendo prestado ou pela não previsibilidade do mesmo em políticas
públicas. Trata-se de um “enfrentamento social” que ganhou proporções epidêmicas e que
os mecanismos clássicos de resolução dos conflitos acabaram por produzir externalidades
negativas para o Sistema Único de Saúde, já debilitado por razões diversas, como o seu
histórico subfinanciamento. (DELDUQUE, 2015, p. 06)
Ainda, o conflito entre as necessidades individuais e coletivas que permeiam a
garantia de um direito caracterizado pela complexidade, como o direito à saúde, demonstra
que os sistemas político, jurídico e médico-sanitário chegaram ao esgotamento e que o Poder
Judiciário, sobrecarregado por essas demandas, não responde mais, com a eficácia esperada,
à pacificação dessas controvérsias. De modo que diante desse fenômeno surge a necessidade
de se apresentar uma alternativa viável ao acesso à justiça, para pacificar os conflitos na
saúde. (DELDUQUE; CASTRO, 2015, p. 507-508)
A fim de dirimir qualquer dúvida acerca da possibilidade de se utilizar da
autocomposição em matéria afeta ao direito público, a Lei 13.140/2015 traz expressamente,
no seu artigo 3º, que podem ser objeto de mediação “direitos indisponíveis que admitam
transação”. (EIDT, 2015, p. 70)
No que concerne especificamente a área da saúde, a judicialização tem agravado os
problemas dos entes públicos. É necessário pensar em uma cultura de superação do litígio,
em prol do fomento à resolução não adversarial dos conflitos em saúde. Com esta nova
perspectiva, todos ganham, desde os potenciais litigantes, bem como toda a sociedade. Urge
destacar que não é mais possível depositar todas as expectativas da sociedade no Poder
Judiciário, pois este não possui condições de resolver a totalidade dos problemas existentes.
Se faz necessário que a lógica do fomento aos conflitos seja superada em definitivo pelo
estabelecimento de estruturas e de uma cultura que possa evitar e solucionar os conflitos.
Sem esta perspectiva, não haverá melhorias no sistema de saúde, uma vez que o custo do
processo judicial e o grande número de ajuizamento de demandas tornará inviável o
Judiciário e a concretização desejada do direito à saúde. (SCHULZE, 2016)
Neste cenário preocupante, a Mediação Sanitária surge como um modelo alternativo
de resolução de conflitos na área da saúde. É preciso considerar que as relações em saúde
transcendem a ótica bilateral do médico com o paciente. Elas envolvem um grande número
de atores presentes em um sistema de saúde, daí advindo conflitos de toda a ordem, internos
139
O Comitê Executivo Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul, por sua vez, foi criado
em 2010, a partir da criação do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ). O objetivo é reduzir e qualificar as demandas de saúde dos
cidadãos. Em cada estado da Federação foi criado um comitê executivo. Segundo relatório
emitido pelo referido Comitê, em 2016 no Estado do Rio Grande do Sul, a judicialização
correspondeu a cerca de 15% do orçamento da saúde — mais de R$ 320 milhões. (CNJ,
2017)
Ao todo, os recursos destinados no ano de 2016 para a saúde foram de R$ 2,1 bilhões.
Se comparado aos números de 2013, houve redução no número de novas determinações na
área de medicamentos de 18,50% e de 37,76% na área de residuais (demandas de saúde que
não contemplam medicamentos, tais como procedimentos, consultas e exames). O gasto com
a judicialização de pacientes individuais passou de R$ 324.8 milhões em 2015, para R$ 275.8
milhões em 2016. O resultado se deve ao esforço das diversas instituições que participam do
grupo, tanto do Judiciário, como da Saúde, por meio da Ação de Planejamento Sistêmico. A
medida identifica um foco de judicialização e atua nele, para devolver ao gestor público e
atender da necessidade da sociedade. (CNJ, 2017)
Diante da relevância destas interlocuções e de um pensamento conjunto entre os
Sistemas de Saúde e de Justiça, cada vez mais percebe-se a adoção de iniciativas que buscam
interferir nos sistemas de forma célere, moderna e de modo a contribuir para torná-los
efetivos. Trata-se de uma estratégia que fomenta atitudes sistêmicas, diante de um cenário
de crescimento geométrico de demandas versus aumento aritmético de recursos para atendê-
las. Nesse compasso e na busca de atuar de forma intersetorial, diversas instituições
passaram a fomentar parcerias, formar comitês e redes de cooperação, prevendo, inclusive,
em seus mapas estratégicos, a necessidade de harmonia. (CNJ, 2015, p. 172)
A despeito da incontestável importância de uma atuação pautada por esta
metodologia, urge mencionar que são fatores decisivos para o sucesso de iniciativas como
essa a compreensão das instituições jurídicas de que o processo judicial não confere um
tratamento adequado aos problemas de saúde e, de outro, a vontade política dos gestores em
promover e intensificar o diálogo institucional e as soluções administrativas em saúde. Como
se pode observar em outras experiências pelo Brasil, as iniciativas desse tipo só conseguem
florescer e permanecer operantes nos locais onde os Poderes conseguem estabelecer um
nível razoável de colaboração e diálogo. (CNJ, 2015, p. 55)
142
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
BARBOSA, Oriana Piske de Azevedo; SILVA, Cristiano Alves da. Os métodos consensuais
de solução de conflitos no âmbito do novo Código de Processo Civil Brasileiro (Lei nº 13.
105/15). Disponível em:
<http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/arquivos/copy5_of_artigo.pdf>.
Acesso em: 12 ago. 2017.
BRASIL, Exposição de Motivos: Novo Código de Processo Civil (CPC) constante no Projeto
de Lei nº 8.046/2010. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=921859>.
Acesso em 30 ago. 2017.
CARLI, Patrícia De. A judicialização da política e o protagonismo dos juízes nas decisões
que envolvem o direito constitucional à saúde: reflexões acerca da jurisdição constitucional.
In: Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM. V. 9, n. 2, 2014, p. 284-304.
Disponível em: <https://periodicos.ufsm.br/revistadireito/article/view/13741>. Acesso em:
10 nov. 2014.
CNJ, Comitê Executivo do Fórum Nacional do Judiciário para Saúde. Ação de Planejamento
e de Gestão Sistêmicos com Foco na Saúde. Disponível em:
<http://www.famurs.com.br/arq_upload/20150817160106_Cartilha%20%20impress%C3%
A3o%20FAMURS_PGS_SA%C3%9ADE_14.08.15.pdf>. Acesso em: 11 out. 2015.
CNJ. Gastos com ações de saúde caem no Rio Grande do Sul. Disponível em: <
http://www.cnj.jus.br/noticias/judiciario/84334-gastos-com-acoes-de-saude-caem-no-rio-
grande-do-sul>. Acesso em: 08 out. 2017.
FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila; GOULART, Juliana Ribeiro. O marco legal da mediação
no Brasil: aplicabilidade na administração pública. In: Revista de formas consensuais de
solução de conflito. Curitiba, v. 02, p. 148-164, jul-dez. 2016. Disponível em:
http://www.indexlaw.org/index.php/revistasolucoesconflitos/article/view/1575. Acesso em
20 set. 2017.
GEBRAN NETO, João Pedro. Direito à saúde: direito constitucional à saúde e suas
molduras jurídicas e fáticas. Disponível em: <http://www.conass.org.br/consensus/wp-
content/uploads/2015/04/Artigo-direito-a-saude.pdf>. Acesso em: 14 jun. 2016.
SCHULZE, Jair. Conciliação e mediação nos conflitos sobre direito à saúde. Disponível
em: http://emporiododireito.com.br/conflitos-sobre-direito-a-saude/ Acesso em: 09 ago.
2017.
TORRES, Artur. Anotações aos artigos 1ª a 12. In: OABRS. Novo Código de Processo Civil
Anotado. Porto Alegre: OAB RS, 2015.
147
RESUMO
O presente trabalho traz a temática das tutelas provisórias em se tratando de ações as quais
envolvam o direito à saúde. Faz-se uma leitura do tema da judicialização e as novas
confrontações das tutelas provisórias frente ao Código de Processo Civil de 2015. A questão
principal a ser respondida consiste: como ocorre a aplicação da tutela provisória de urgência,
pelo Poder Judiciário, em ações que versam sobre o direito à saúde, diante da importância
do instituto na efetivação desse direito fundamental? A metodologia utilizada será a dedutiva
e a técnica de pesquisa bibliográfica. As medidas provisórias em matéria de saúde são
provimentos imediatos e fundamentais a serem aplicados para que se alcance a proteção
desse bem jurídico, diante do perigo de dano irreversível, o que justifica a mitigação da
restrição legal às tutelas de urgência.
INTRODUÇÃO
126
Pós-doutorado pela Paris Lodron Universität Salzburg (2018) e doutorado em Direito pela Universidade de
Santa Cruz do Sul – UNISC (2016), com doutorado sanduíche na Ernst-Moritz-Arndt-Universität Greifswald,
Rechts – und Staatswissenschaftliche Fakultät (2016). Professora concursada da Universidade de Santa Cruz
do Sul – UNISC, no Curso de Direito e na Pós-Graduação em Direito, onde ministra matérias relacionadas
ao Direito Civil, ao Direito Constitucional e a Teoria do Direito. É integrante do grupo de estudos “Jurisdição
Constitucional aberta” coordenado pela Profa. Pós-Doutora Mônia Clarissa Hennig Leal, vinculado e
financiado pelo CNPq. É autora de livros e artigos publicados no Brasil e no exterior. E-mail:
rosanamaas@unisc.br.
127
Graduada em Direito pela Universidade Federal de Pelotas - UFPEL (1996); Especialista em Processo Civil
pela Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC (2017), advogada com atuação na área cível. E-mail:
analuiza.hernandez@gmail.com
148
Por sua vez, a tutela provisória objetiva a garantia do bem da vida, evitando que o
mesmo se perca na morosidade da tramitação processual. Em algumas situações urgentes e
graves, como se verifica nas ações as quais versam sobre o direito à saúde, na maioria das
vezes, é impossível aguardar a tramitação normal do processo. Ademais, considerando a
morosidade do Poder Judiciário brasileiro, a busca pela tutela provisória é medida que se
impõe, sob pena de perecimento do bem da vida.
Por conseguinte, a facilidade de acesso à justiça, a ineficiência do poder público em
gerir políticas que assegurem a prestação efetiva de atendimento à saúde, aliada à falta de
recursos, desvio de verbas públicas, entre outros problemas, levam a um único caminho: a
judicialização da saúde. Nesse contexto, questiona-se: como ocorre a aplicação da tutela
provisória de urgência, pelo Poder Judiciário, em ações que versam sobre o direito à saúde,
diante da importância do instituto na efetivação desse direito fundamental?
Através do método dedutivo e da técnica de pesquisa bibliográfica, trata-se, em
princípio, do direito à saúde como direito fundamental, assim como, da temática da
judicialização da saúde no Brasil, para, por fim, responder a problemática aqui enfrentada.
No Brasil, a saúde pública foi evoluindo no decorrer do tempo, de forma lenta, porém
positiva. A primeira Constituição Federal, promulgada em 1824, foi completamente omissa
em relação ao direito à saúde, assim como a Constituição de 1891. No entanto, a Carta de
1934 foi a primeira Constituição brasileira que fez referência ao direito à saúde, elevando a
saúde a condição de direito subjetivo do trabalhador, com a criação de vários institutos, como
das aposentadorias e pensões.
Na sequência, a Constituição de 1937, outorgada por Getúlio Vargas, tinha como foco
principal o trabalhador e a saúde das crianças. A seguir, a Constituição de 1946 foi a principal
propulsora na criação dos direitos fundamentais, trazendo os direitos econômicos, sociais e
culturais previstos na Constituição de 1934. Entretanto, o direito à saúde recebeu pela
primeira vez tratamento de direito fundamental na Constituição Federal de 1988, que incluiu,
entre os direitos sociais, o direito à saúde de forma igualitária a todos os cidadãos, conforme
dispõe o artigo 196.
Com a Lei 8.080/90, teve início a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS),
para a finalidade de promover a saúde à população, oferecendo tratamento igualitário a todos
os cidadãos. O SUS brasileiro é reconhecido internacionalmente como um dos maiores
sistemas de saúde do mundo, devido seu caráter universal. Pode-se dizer que é uma conquista
alcançada após anos de luta por uma saúde na qual se entende igualitária a todo cidadão.
No entanto, na prática, o referido sistema apresenta ainda muitas falhas devido a
inúmeros problemas, tais como: a escassez de recursos, falta de infraestrutura, desigualdade
na distribuição, entre outros. Além disso, o direito à saúde, como bem jurídico, é
indissociável do direito à vida, razão pela qual deve ser assegurado pelo Estado a todos
indistintamente. Segundo dispõe Ordacgy (2007), a saúde se encontra entre os bens
intangíveis mais preciosos do ser humano, digna de receber a tutela protetiva estatal, pois,
consubstancia-se em característica indissociável do direito à vida.
Desta forma, cabe ao Estado o dever e a responsabilidade constitucional de tutelar o
direito à saúde, por meio de políticas públicas e programas governamentais que permitam o
acesso universal e igualitário a todos os cidadãos. No entanto, a realidade brasileira se mostra
bastante distante da teoria. No Brasil, o acesso à saúde pública é precário e caótico. É cada
vez mais frequente pessoas que necessitam de atendimento pelo SUS ficarem longos
períodos aguardando por uma consulta com um médico especialista, ou aguardando a
disponibilização de medicamentos essenciais.
150
Assiste-se, através das grandes mídias, um número elevado de pessoas as quais ficam
sem obter a assistência desejada por causa da precariedade dos hospitais, vindo, portanto, a
aguardar por leitos em corredores, macas improvisadas, em condições desumanas e cruéis.
Muitos morrem sem o devido atendimento. A realidade da saúde pública no Brasil e a falta
de condições dignas de atendimento à população necessitada ferem o princípio da dignidade
da pessoa humana.
Portanto, o Sistema Único de Saúde, instituído e implementado pelo Estado, apesar
do caráter universal que possui, de atendimento à toda população, não supre à imensa
demanda, obrigando os cidadãos a buscarem a tutela jurisdicional, como (única) alternativa
de concretização do direito à saúde devidamente assegurado, o que leva, por conseguinte, à
crescente judicialização.
2 JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE
Diante da difícil e grave situação da saúde pública no Brasil, bem como, frente a
demais fatores, como ineficácia e omissão dos Poderes Públicos, escassez de verbas, não é
possível atender a população de forma satisfatória e eficaz, com isso, houve um aumento na
demanda de ações judiciais que versam sobre o direito à saúde. A “judicialização da saúde”
é um fenômeno recente no Brasil, o qual teve início no final da década de 1990. Cabe
ressaltar que o termo judicialização128 pode ser aplicado tanto da política como do direito.
A judicialização da política se refere à relação do Poder Judiciário com os demais
Poderes, Executivo e Legislativo, havendo uma espécie de “intervenção” nas competências
desses; já a judicialização do direito consiste na tendência de, cada vez mais, haver um
direito jurisprudencial. As duas espécies de judicialização possuem o mesmo pano de fundo,
ou seja, decorrem da transferência de decisões tidas como estratégicas, envolvendo larga
discussão sobre os direitos fundamentais, decisões sobre temas tidos como polêmicos, de
impacto social, que são tendencialmente mais voltados para a deliberação política, ao Poder
Judiciário (LEAL, 2013, p. 224).
128
Em complemento, abarca-se ainda a obra de Barroso (2013, p. 5) que traz também uma conceituação ao
fenômeno da judicialização, no sentido que tal fenômeno significaria “que questões relevantes do ponto de
vista político, social ou moral estão sendo decididas, em caráter final, pelo Poder Judiciário. Trata-se, como
intuitivo de uma transferência de poder para as instituições judiciais, em detrimento das instâncias políticas
tradicionais, que são o Legislativo e o Executivo. Essa expansão da jurisdição e do discurso jurídico constitui
uma mudança drástica no modo de se pensar e de praticar o direito no mundo romano-germânico”.
151
Desde então, vêm crescendo cada vez mais os pedidos por medicamentos e outros
serviços de saúde, sendo que, nos últimos anos, houve uma crescente demanda de ações
judiciais contra os entes federativos, considerando que o direito à saúde é um direito
inquestionável previsto constitucionalmente e de responsabilidade solidária entre os entes
estatais.
Na verdade, o Poder Judiciário passou a ser o refúgio daquelas pessoas que não
dispõem de recursos para custear o seu próprio tratamento médico os quais não se encontram
previstos pelo SUS; e, ainda, por medicamentos, não aprovados pela Anvisa; essas e outras
inúmeras causas, levaram, inclusive, a realização de uma Audiência Pública em 2009 pelo
Supremo Tribunal Federal.
Hoje, a judicialização da saúde no Brasil é uma realidade, o que se comprova através
das diversas pesquisas realizadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), intensificando o
debate sobre o tema frente aos elevados números apresentados pelas pesquisas. A 13ª edição
do Relatório Justiça em Números publicada em 2017 indica no tema “direito administrativo
e outras matérias de direito público” e no assunto “serviços/saúde”, que as demandas
judiciais, envolvendo diversos assuntos voltados à saúde correspondem a um total de
1.346.931 ações em todas as instâncias. Desse total, são 312.147 ações específicas visando
152
Para que o Poder Judiciário possa exercer a sua jurisdição é necessário que se faça
um determinado lapso temporal natural para que ocorra a tramitação processual necessária.
No entanto, em algumas situações urgentes, como se verifica nas ações que buscam a
concretização do direito à saúde, esse lapso poderá comprometer a prestação jurisdicional
de forma irreversível. Por tal razão, o sistema processual busca alternativas para sanar este
problema, através da tutela provisória de urgência, que objetiva neutralizar o perigo de dano
causado pela demora na tramitação processual, garantindo assim, a efetividade do
provimento final.
A Emenda Constitucional nº 45/2004 incluiu o princípio da razoável duração do
processo dentro das garantias fundamentais previstas no art. 5º, LXXVIII da Constituição
Federal de 1988 (BRASIL, 1988): “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação”. Tal inclusão tinha como objetivo precípuo combater a morosidade da prestação
jurisdicional, buscando uma maior celeridade processual.
No entanto, o termo “razoável” é abstrato, na medida em que não estabelece um prazo
para a duração do processo. O que é tempo razoável em um processo, pode não ser em outro,
cabendo a análise de cada processo em sua individualidade. O novo Código de Processo
Civil, prevê nos artigos 1º a 12, princípios fundamentais que regem o processo civil, sendo
que o art. 4º consagra o princípio da razoável duração do processo. Assim, o referido
princípio, previsto constitucionalmente, foi reforçado no novo diploma civilista, já que ele
objetiva a celeridade processual e busca uma maior efetivação da prestação jurisdicional.
Dinamarco (2002) ao discorrer sobre a relevância da busca da celeridade na solução
dos litígios, afirma que a frustração que o decurso do tempo pode trazer à vida, constitui
verdadeira ameaça à garantia de tutela jurisdicional, contida no sistema jurídico, pois essa
154
só pode ser considerada efetiva, quando for tempestiva. De fato, não se pode negar a
relevância do tempo de duração do processo na solução do litígio, pois, ainda que o direito
seja aplicado ao caso concreto sem equívocos técnicos e com estrita observância do direito
positivo, a demora pode acarretar ausência da utilidade da prestação jurisdicional.
As ações judiciais que versam sobre a saúde exigem uma prestação jurisdicional
urgente e célere, sendo que a tutela provisória é o instrumento, o meio a ser utilizado, sob
pena de perecimento desse direito fundamental. Assim, a tutela provisória de urgência tem
uma fundamental importância nestas ações judiciais, na medida em que antecipam uma
decisão promovendo uma simplificação procedimental, como forma de assegurar o bem da
vida. Nesse paradigma, dispõe Didier Jr. (2016, p. 562): “As atividades processuais
necessárias para a obtenção de uma tutela satisfativa (a tutela-padrão) podem ser demoradas,
o que coloca em risco a própria realização do direito afirmado. Surge o chamado perigo da
demora (periculum in mora) da prestação jurisdicional”.
Também, segundo Mouzalas (2016), a tramitação do devido processo legal pode
acarretar delongas suscetíveis de causar danos irreparáveis ao autor, violando assim a
efetividade e a razoável duração do processo. Dessa forma, diante de ações judiciais que
buscam o direito à saúde, a tutela de urgência, normalmente é deferida, quando está
devidamente evidenciado nos autos os requisitos legais referentes a probabilidade do direito
e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, de acordo com o disposto no
artigo 300 do Código de Processo Civil.
Os julgados a seguir transcritos versam sobre ações que postulam a concessão de
medicamentos, tratamento quimioterápico e colocação de prótese. Em todas estas ações
judiciais, observa-se que, devidamente atendidos os pressupostos legais, a tutela de urgência
foi deferida. E não poderia ser de outra forma, pois, caso houvesse o indeferimento da tutela
provisória de urgência, haveria risco de dano aos postulantes, considerando que as tutelas
pretendidas versam sobre saúde. Neste primeiro julgado, a parte postula o fornecimento de
medicamento de alto custo, tendo sido deferido o pedido diante da probabilidade do direito
e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
efetividade da tutela jurisdicional, foi criado para garantir ao réu o direito fundamental de
defesa, atendendo os princípios do contraditório e ampla defesa, buscando uma maior
segurança jurídica e ampliando a efetividade da tutela jurisdicional.
Portanto, em situações em que existe a possibilidade de irreversibilidade dos efeitos
fáticos da decisão para ambas as partes, o magistrado deverá ter uma sensibilidade maior ao
caso concreto, analisando as provas e agindo com total cuidado e prudência, considerando
que eventuais prejuízos patrimoniais podem ser resolvidos por perdas e danos. Constata-se
na prática que tal proibição contida no parágrafo 3º do artigo 300 do novo CPC não tem
impedido que as partes requeiram e obtenham medidas irreversíveis em sede de antecipação
da tutela. Aliás, é entendimento majoritário entre os doutrinadores e os principais Tribunais
do país que tal proibição não pode servir de impedimento à concessão da medida
antecipatória.
Conforme observa-se em Neves (2011, p. 1172), “um direito indisponível não pode
ser sacrificado pela vedação legal". Desse modo, o Poder Judiciário apresenta um papel de
importância ímpar ao julgar tais questões que envolvem o direito à vida, principalmente em
situações de irreversibilidade da antecipação da tutela requerida, de forma que o perigo de
dano irreversível à saúde justifica a aplicação das tutelas de urgência.
Por fim, cabe ao magistrado usar o bom senso e a ponderação ao julgar tais questões
que envolvem o direito à vida, principalmente em situações de irreversibilidade da
antecipação da tutela requerida, de forma que o perigo de dano irreversível à saúde justifica
a mitigação da restrição legal às tutelas de urgência.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de processo civil. Brasília: OAB,
Conselho Federal, Escola Nacional de Advocacia, 2016.
______. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Brasília, DF: Presidência da República, [2016]. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 8 dez.
2017.
_______. Lei nº 8080/90, de 19 de setembro de 1990. Brasília, DF: Presidência da República,
[1990]. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8080.htm>. Acesso
em: 05 set. 2016.
CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L.
(Coords.). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013.
CARLINI, Angélica. A saúde pública e as decisões dos tribunais –apontamentos para uma
reflexão crítica. In. ASENSI, Felipe Dutra. PINHEIRO, Roseni. Direito Sanitário. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2012.
160
DIDIER Jr., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 16. ed. Salvador: Jus Podivm, 2014.
v.1.
LEAL, Mônia Clarissa Hennig Leal. A jurisdição entre a judicialização e o ativismo judicial.
In: COSTA, Marli Marlene Moraes da; ____________ Direitos sociais e políticas públicas:
desafios contemporâneos. Tomo 13. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2013, p. 217-247.
MITIDIERO, Daniel. Antecipação de tutela. 2. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2014.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 2. ed. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Disponível em:
<http://www.tjrs.jus.br/busca/?tb=proc>. Acesso em: 19 nov. 2017.
161
RESUMO
INTRODUÇÃO
129
Especialista em Direito Imobiliário, Urbanístico, Notarial e Registral – convênio CFOAB/ENA, UNISC e
Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Rio Grande do Sul.
Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (2012). Advogada. E-
mail: amandapohl@gmail.com
130
Doutor em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (2003) com doutorado sanduíche pela
Universidade de Lisboa (2003); Pós-Doutor na Universidade de Lisboa (2011); Mestre em Direito pela
Universidade de Santa Cruz do Sul (1999); Professor da graduação e do Programa de Pós-Graduação em
Direito- Mestrado/Doutorado da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC; Advogado e consultor jurídico
da Confederação Nacional dos Municípios – CNM; E-mail: hermany@unisc.br
163
um lapso temporal de 13 anos. Em seu texto estão previstos diversos mecanismos a serem
utilizados como os instrumentos de regularização urbana, criados com a finalidade de garantir
a função social da propriedade, intervir na inclusão dos cidadãos que restaram excluídos da
cidade organizada.
Após uma breve análise dos instrumentos previstos no Estatuto da Cidade, irá ser
analisado instituto da Usucapião Especial de Imóvel Urbano, nas modalidades individual e
coletiva. Na sequência, o estudo enfocará o instituto do More Legal, atualmente na etapa IV,
tratando-se de um programa criado pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul.
Ao traçar o comparativo entre os institutos, pretende-se elucidar o tema ora abordado
para esclarecer os principais pontos de divergência entre os dois instrumentos, tendo em
vista que ambos possuem um mesmo objetivo, que é a regularização de imóveis que se
encontram em situações consolidadas, normalmente de moradia da população de baixa
renda.
A partir disso, será possível analisar a dimensão da importância da atuação efetiva
dos entes públicos para o processo de regularização fundiária, tendo em vista que o Projeto
More Legal IV, que visa facilitar o processo de regularização, abrange somente o estado do
Rio Grande do Sul.
Considerando que a Usucapião Especial de Imóvel Urbano é um instrumento
eminentemente jurídico em que o cidadão busca a regularização do seu imóvel em situação
consolidada e que o Projeto More Legal IV, é um instrumento jurídico-administrativo, onde
os Poderes Executivo e Judiciário do Rio Grande do Sul se unem para auxiliar o cidadão na
busca pelo mesmo fim, acredita-se que o engajamento havido pelo estado gaúcho vem a
facilitar e estimular o processo de regularização desses imóveis, consagrando os diretos
fundamentais à propriedade e à moradia.
O presente estudo é considerado relevante em razão do extenso caminho a ser trilhado
na persecução da regularização fundiária no Brasil. Isso porque o processo de regularização
deve, via de regra, ser encaminhado pelo particular, pelo cidadão habitante ou usuário do
imóvel irregular ou clandestino. Assim, não consegue compreender a circunstância irregular
em que se encontra e, na maioria das vezes, não tem nem conhecimento de como realizar
essa regularização.
Tendo em mente o panorama histórico da problemática, aliado à imensidão territorial
do nosso país, compreende-se a complexidade que é a busca pela realização da regularização
164
fundiária. Por isso, acredita-se que este estudo também poderá servir de base para que outros
estados brasileiros sejam estimulados a adotar o posicionamento do Rio Grande do Sul no
intento de promover a regularização fundiária no país.
Quanto à definição do método de abordagem, será utilizado o método dedutivo, em
que partiremos do estudo da parte geral da regularização fundiária, até a análise minuciosa
dos instrumentos de regularização da Usucapião Especial Urbana e More Legal IV,
empregando-se o método de procedimento comparativo entre ambos.
A técnica de pesquisa do presente projeto será desenvolvida a partir de pesquisa
bibliográfica que, por sua vez, consiste na análise documental realizada sobre várias fontes,
tais como normas constitucionais, leis ordinárias, decretos legislativos, resoluções
normativas, jurisprudência, revistas especializadas, periódicos, livros e doutrina.
elementos de continuidade, inconteste, pacífica, com intenção de dono e que atenda o prazo
estipulado (SILVA, 2012).
A posse com intenção de dono, referida por Silva (2012), significa a presença do
animus domini, ou seja, que o possuidor aja como se dono fosse. A título exemplificativo, o
possuir deve utilizar o imóvel para a sua moradia e também o cuidar, fazendo os reparos
necessários, com o intuito de não deixar que se deteriore, como o dono faria.
O animus domini deve estar livre de impedições à aquisição da propriedade. Não
permite a aquisição a posse exercida por conta de relação jurídica ou em decorrência da lei,
mesmo que exercida de forma direta e com intenção de dono, como é o caso de uma locação,
por exemplo. O locatário possui a posse mansa, pacífica, contínua e ininterrupta do imóvel,
mas está impossibilitado de adquirir a propriedade do bem pela usucapião, em qualquer
modalidade, em decorrência da relação jurídica havida com o dono do imóvel.
Foi no Código Civil de 1916 que ocorreu a regulamentação expressa da usucapião
no ordenamento jurídico pátrio, disciplinando-a nos artigos 550 a 553. O referido código
previa em duas modalidades: a ordinária e a extraordinária. A primeira tinha como requisito
a posse ininterrupta e inconteste pelo período de 10 anos entre presentes ou 15 entre ausentes,
com justo título e boa fé. Já a segunda dispensava o justo título e a boa-fé, porém exigia,
inicialmente, a posse ininterrupta e sem oposição pelo período de 30 anos e, após alteração
na redação do artigo 550, pelo período de 20 anos (BRASIL, 1916).
A forma ordinária, ao exigir o justo título e boa-fé, estabelecia que a posse fosse
exercida com opinio domini, ou seja, que o possuidor tivesse a plena convicção de ser o
legítimo proprietário daquele imóvel. No entanto, em ambos os casos se determinava que a
posse fosse exercida com animus domini, ou seja, que o possuidor agisse como se dono fosse
e exercesse o poder de fato sobre a coisa com o intuito e torná-la sua. Também não havia
qualquer distinção a respeito da localização do imóvel, podendo ser urbano ou rural.
A nova redação instituiu a posse continuada entre o antecessor e o herdeiro legítimo,
bem como a proibição de o direito ser requerido mais de uma vez por quem já foi por ele
beneficiado. O mais relevante, porém, diz respeito ao termo “edificação urbana”
acrescentado ao texto, possibilitando o pleito inclusive sobre apartamentos.
Já a segunda, modalidade coletiva, o Estatuto da Cidade inovou ao criar mais um
novo tipo de aquisição de imóvel através da usucapião. A razão de ser deste dispositivo se
justifica pela impossibilidade, no caso principalmente das grandes favelas, em se delimitar
o imóvel de cada particular.
166
Já o More Legal, por sua vez, nasce como uma alternativa, uma outra possibilidade
de adquirir a propriedade de um imóvel através da legitimação da posse. Ele surge da
necessidade de se aperfeiçoar os mecanismos de aquisição de propriedade já existentes para
uma ferramenta que passe a atender uma gama maior de pessoas e situações fáticas. Ele
surge da dificuldade das pessoas em se enquadrar nos requisitos da legislação existente,
desburocratizando o processo, simplificando a documentação exigida, inclusive dispensando
o requisito temporal, imprescindível em qualquer modalidade de usucapião.
No entanto, o More Legal é um instrumento de regularização fundiária criado pela
Corregedoria Geral de Justiça gaúcha. Por isso, sua aplicação restringe-se ao estado do Rio
Grande do Sul. Ou seja, somente nos cartórios de Registro de Imóveis gaúchos é possível
requerer a regularização da propriedade via More Legal.
Criou-se este provimento para que a lei pudesse se adequar à atual necessidade das
pessoas, pois o contrário já não era suficiente para mitigar essa problemática. Ou seja,
verificou-se que as normativas existentes em relação à matéria já não bastavam para cumprir
satisfatoriamente com o seu objetivo, que é a regularização das moradias para a população
de baixa renda.
O More Legal extrapola o âmbito jurídico. É iniciado extrajudicialmente no Cartório
de Registro de Imóveis, que é, pode-se dizer assim, a repartição pública especializada no
assunto. Lá, o Registrador fará a análise de toda a documentação pertinente, que, como visto
anteriormente, é bastante simplificada em relação a outros institutos que detém a mesma
finalidade, inclusive, e principalmente, em relação à Lei de Parcelamento do Solo Urbano, a
Lei nº 6766/79, que exige, para fins de registro, a apresentação de diversas certidões
diferentes, além do projeto completo do loteamento aprovado pelos órgãos encarregados.
Portanto, a parte mais exaustiva de todo o procedimento é realizado no Registro de
Imóveis, sendo remetido a juízo apenas, via de regra, quando a documentação já está apta a
atingir a sua finalidade, que é a prolação da sentença que vai autorizar o registro de propriedade,
ou em caso de suscitação de dúvida registral.
Destaca-se que o More Legal não resolve todos os problemas de regularização
fundiária no estado. No entanto, tem sido um instrumento muito útil e que acolheu sob o seu
prisma uma gama de situações de irregularidades que antes não tinham solução ou de solução
bastante dificultada.
Em que pese aqui no Rio Grande do Sul o programa More Legal esteja em vigor
desde o ano de 1995, portanto há 21 anos, e nesse período já tenha sido utilizado para a
170
CONCLUSÃO
Grande do Sul e, portanto, aplicável somente neste estado. Para a sua elaboração foi
necessário o engajamento de entes públicos, como o Poder Judiciário, os Cartórios de
Registro de Imóveis, o Ministério Público Estadual, sendo que para o seu efetivo
cumprimento é necessário, também, a atuação das Prefeituras Municipais.
Seu escopo é a promoção da regularização imobiliária de forma simplificada, não
obstante segura juridicamente, de propriedades em que seja verificada a situação consolidada
da posse sem levar em conta o requisito temporal da posse. No entanto, exige que o
requerente detenha o justo título que originou a posse.
Ao traçar o comparativo entre os institutos, verificou-se que a atuação efetiva do
Poder Público para a resolução de problemas sociais, neste caso da regularização fundiária,
é de suma importância, pois visa a facilitar o procedimento e, consequentemente, torna-lo
mais efetivo, atingindo uma gama maior de imóveis e pessoas, como é o caso do Rio Grande
do Sul.
Por fim, tendo em mente o panorama histórico da problemática, aliado à imensidão
territorial do nosso país, compreende-se a complexidade que é a busca pela realização da
regularização fundiária. Por isso, acredita-se que o próximo passo a ser dado em direção à
mitigação do problema em questão é a elaboração de um plano nacional, nos moldes do
provimento gaúcho More Legal IV.
REFERÊNCIAS
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Usucapião especial urbano: aspectos relevantes.
Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos, Bauru, n. 20, p. 243-266, dez./mar. 1997/1998.
Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/20265>. Acesso em: 14 maio
2016.
IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Atlas do Censo Demográfico 2010. Rio
de Janeiro: IBGE. Material postado no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
– IBGE, no hiperlink Biblioteca. Disponível em: <http:// biblioteca.ibge.gov.br/index.php/
biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=264529> Acesso em: 11 setembro 2016.
MARINGONI, Gilberto. O destino dos negros após a Abolição. 2011. Ano 8. Edição 70.
Material postado no site do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, no hiperlink
Desafios do Desenvolvimento. Disponível em:
<http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?
option=com_content&id=2673%3Acatid%3D28&Itemid=23>. Acesso em: 12 julho 2016.
PAIVA, João Pedro Lamana. Projeto More Legal IV: principais novidades introduzidas na
CNNR. 2011. Material em PDF postado no site do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
– IRIB, no hiperlink Biblioteca Digital. Disponível em: <http://www.irib.org.br/files/obra
/4094_artigo.pdf>. Acesso em: 12 maio 2016.
______, João Pedro Lamana. Projeto “More Legal”. 2009. Material em PDF postado no site
do Registro de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre. Disponível em: <http://www.lama
napaiva.com.br/banco_arquivos/projeto_more_legal_3.pdf>. Acesso em: 12 maio 2016.
______, João Pedro Lamana. Proposta do IRIB ao CNJ para Edição de Provimento de
Regularização Imobiliária. 2013. Material em PDF postado no site do Registro de Imóveis
da 1ª Zona de Porto Alegre. Disponível em: <http://www.registrodeimoveis1zona.com.br/
174
arquivos/MORE_LEGAL-E-GLEBA-LEGAL-PROV-NACIONAL-IRIB-2013.pdf>.
Acesso em: 1º novembro 2016.
______. Tribunal de Justiça. More Legal. Material postado no site do Poder Judiciário do
Rio Grande do Sul, no hiperlink Corregedoria Geral de Justiça, Projetos. Disponível em:
<http://www.tjrs.jus.br/site/poder_judiciario/tribunal_de_justica/corregedoria_geral_da_jus
tica/projetos/projetos/more_legal.html> Acesso em: 16 maio 2016.
SILVA, Julian Gonçalves da. As modalidades de usucapião de bens imóveis e seus requisitos
processuais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 99, abr 2012. Disponível em:
<http://ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11463>.
Acesso em: 20 setembro 2016.
SOARES, Ronnie Herbert Barros. Usucapião especial urbana individual. 1ª Ed. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2004.
SOUSA JÚNIOR, José Lopes de. Usucapião especial urbana e a função social da
propriedade. Themis: Revista da ESMEC, Fortaleza, v. 8, n. 2, p. 243-268, ago./dez. 2010.
Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/39314> Acesso em: 14 maio
2016.
RESUMO
INTRODUÇÃO
131
Pós-graduanda em Direito Imobiliário, Urbanístico, Registral e Notarial pela Universidade de Santa Cruz
do Sul-UNISC. Email: jglvelho@hotmail.com
132
Doutora em Desenvolvimento Regional, Mestre em Direito, Professora do Curso de Direito da UNISC.
Advogada.
176
olvidar uma prática que se perpetua, mesmo em discordância com a previsão legal. O
entendimento legal dominante se embasa na não aceitação da fixação do preço do
arrendamento calculado em produto, gravando o contrato elaborado sob este prisma com
elementos de anulabilidade.
Para a elaboração do presente trabalho, parte-se do pressuposto de que a fixação do
preço do arrendamento em produto, de forma particular, é difundida em todo o território
brasileiro, às expensas da lei, que não insere esta prática em seu contexto, muito pelo
contrário, abomina. Desta forma, elabora-se o presente trabalho por meio do método
hermenêutico, buscando responder se a prática posta à prova produz efeitos no meio jurídico,
tornando-se verdade mesmo em oposição à previsão legal.
Para tanto, busca-se a averiguação de todo o questionamento proposto por meio de
pesquisa bibliográfica, doutrinária e jurisprudencial através de interpretação sistêmica, que
conduza veementemente a finalidade avençada, não de modo estático e singular à luz da
legislação, mas consoante com as recentes decisões prolatadas pelos Tribunais do país.
Em um primeiro momento, considera-se fundamento legal relacionado ao contrato
de arrendamento e sua (des)atualização frente a realidade atual. Posteriormente, são
verificadas as controvérsias sobre a remuneração no contrato de arrendamento rural,
enfatizando-se, por meio de estudo doutrinário e jurisprudencial, posição favorável a fixação
do preço do arrendamento em produto. Em segunda análise, se disserta a respeito do
posicionamento contrário à fixação do preço do arrendamento em produto, igualmente
respaldado em doutrina e jurisprudência consoantes ao estabelecido.
Posteriormente, se demonstram as implicações jurídicas da cláusula contratual que
fixa o pagamento do arrendamento rural em produto, mencionando a nulidade da cláusula
pré-estabelecida e as consequências que esta previsão traz ao processo judicial, quando
decorrente de inadimplemento contratual. Neste interin, examina-se o entendimento do
Código de Processo Civil em relação a descaracterização do contrato de arrendamento rural
como título executivo de primeira ordem, quando acrescido da cláusula que determina o
pagamento do preço do arrendamento em produto, apurando-se a dissonância existente entre
a previsão legal e a realidade fática, uma vez que, muito embora processualmente se faça
valer a norma teórica, inclusive com a imposição de sanções processuais que acarretam na
perda de direitos, na prática os usos e costumes se concretizam com esta previsão contratual,
sendo dissipada inclusive em Cartórios de Registro de Imóveis, quando registram os
contratos que dispõem desta forma e respeitam a vontade das partes.
177
arrendamento rural calculado em produto, constatando certa flexibilização em razão dos usos
e costumes regionais, o que embasa as decisões de alguns tribunais, no sentido de que os
costumes servem como fonte de direito.
Consoante a isso, a Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, Decreto-Lei
nº 4.657/42, em seu artigo 4º determina que “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso
de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. No artigo 5º prevê
que “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências
do bem comum”.
No caso em comento, não se trata de omissão da Lei, mas de adequação das decisões
em conformidade com os costumes adotados em regiões de cunho agrícola, uma vez que não
há negativa em afirmar que os costumes são fontes do direito, devendo receber valor
normativo. Neste sentido, parafraseando Lustosa (2001, não paginado), “o nosso
ordenamento jurídico consagra o acolhimento de tais regras não-escritas quando, diante do
caso concreto, a lei não for satisfatória, de modo a proporcionar um julgamento justo,
priorizando o bem-estar social, a paz e a harmonia”. Neste sentido, previne o art. 4º, da Lei
de Introdução as Normas de Direito Brasileiro. Mas, se o Direito amplia-se, evolui, alcança
progressos, é porque, necessariamente, ocorrem inovações em suas fontes. A vontade do
povo, corporificada em leis escritas ou em regras de convivência pacífica não-escritas,
segundo o fluir dos tempos, pode mudar.
A aplicação dos costumes como fonte do direito é verificada em decisão proferida
pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, na Apelação Cível Nº 70068294172133, onde
o relator reconhece sua aplicação e mantém a decisão de primeiro grau, reconhecendo o
pagamento feito em sacas de soja, levando em consideração os costumes da região onde a
sentença foi prolatada.
O próprio Código Civil corrobora positivamente para este questionamento quando
determina em seu artigo 113 que os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a
boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. Consoante, o artigo 422 do Código Civil também
determina que os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato como
em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé, enfatizando que tais princípios fazem
parte da essência do contrato celebrado.
133
Apelação Cível nº 70068294172-RS, Décima Nona Câmara Cível, Relator: Desembargador Voltaire de
Lima Moraes, Julgado em 16/06/2016.
180
134
Apelação Cível nº70049460504-Nona Câmara Cível-Tribunal de Justiça do RS-Relator: Tasso Caubi Soares
Delabary-j. em 25-07-2012; Agravo de Instrumento nº 70049450323, Nona Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini, Julgado em 15/08/2012.
182
135
Nesse sentido,STJ, REsp.nº 1.266.975-MG, 3ª Turma Recursal, Sessão do dia 10/03/2016. No mesmo
sentido, REsp. nº566.520-RS, julgado em 11/05/2004, Min. Rel. Aldir Passarinho Junior; 4ª Turma; REsp.
nº128.542-SP, Min. Rel. Ruy Rosado de Aguiar, unânime, DJU de 09.12.1997; 3ª Turma, REsp.nº
183
334.394-RS, Min. Rel. Carlos Alberto Menezes Direito, unânime, DJU de 05.08.2002; 4ª Turma, REsp. nº
127.561-SP, Min. Rel. Barros Monteiro, unânime, DJU de 01.09.2003.
184
demandas judiciais, pois muitos produtores ainda ignoram o texto legal e continuam a seguir
o costume de fixar o preço da remuneração dos arrendamentos rurais em produtos.
Para a solução do empasse, afirma Querubini (2017, não paginado), que, para os
casos de inadimplemento nos quais o contrato de arrendamento foi firmado em produtos,
a solução prática sugerida aos arrendadores é o ajuizamento de ação de cobrança cumulada
com reintegração de posse ou, conforme o caso, ação monitória, não deixando de
considerar que o arrendatário inadimplente continua obrigado a pagar pelas vantagens
obtidas pelo uso do imóvel cedido em arrendamento, sob pena de atentar contra a função
social dos contratos e a boa-fé contratual.
A obrigação de ressarcimento ao proprietário lesado não se desfaz em função da
cláusula que fixa o preço do arrendamento em produtos, uma vez que o arrendatário continua
obrigado ao pagamento pelas vantagens auferidas com o uso do imóvel arrendado, durante
o tempo pré-estabelecido naquele instrumento.
136
STJ, 3ª Turma, REsp. nº 1266975/MG, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/03/2016,
DJe 28/03/2016.
186
Desta forma, se verifica que vários são os pontos a serem observados quando
constatada a nulidade da cláusula que fixa o preço do arrendamento em produto e, como não
há pacificação de entendimento, alguns caminhos se abrem para que operador do direito
busque a solução aos conflitos instaurados sob este assunto, uma vez que são geradas
decisões totalmente contrapostas.
O Código de Processo Civil, quando trata dos títulos executivos extrajudiciais,
categoria a qual se enquadra o contrato de arrendamento rural quando estão preenchidos
todos os requisitos formais, determina em seu artigo 783 que a execução para cobrança de
crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação líquida, certa e exigível.
Estes requisitos, segundo discrimina Junior (2017, p. 210), a” certeza refere-se órgão
Judicial, e não às partes. Decorre, normalmente, da perfeição formal do título e da ausência
de reservas à sua plena eficácia”. Já no que diz respeito liquidez, o autor afirma que
consiste em um plus que se acrescenta à certeza da obrigação. Por ela demonstra-
se que não somente se sabe que "se deve", mas também "quanto se deve" ou "o
que se deve". Não são, porém, ilíquidos os títulos que, sem mencionar diretamente
a quantia exata da dívida, indicam todos os elementos para apurá-la mediante
simples operação aritmética em torno de dados do próprio documento.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
BORGES, Antonio de Moura. Estatuto da terra comentado e legislação adesiva. São Paulo:
Edijur, 2007.
BARROS, Wellington Pacheco. Curso de Direito Agrário. 9. ed. rev. atual. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2015.
CARDOSO, Beatriz. Teoria Geral da execução no Novo CPC. Publicado em 2017. Disponível
em: <https://beacarrdoso.jusbrasil.com.br/artigos/459425469/teoria-geral-da-execucao-no-
novo-cpc>Acesso em 22 de outubro de 2018.
LUSTOSA, Oton. A lei, o costume, o Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862,
Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/2113>. Acesso
em 10 de setembro 2018.
SOUSA, Vinícius Eduardo Silva. Enriquecimento sem causa como cláusula geral do Código
Civil: Interpretação civil-constitucional e aplicabilidade judicial. In: Âmbito Jurídico, Rio
Grande, XIV, n. 90, jul 2011. Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9921>. Acesso em
23 out 2018.
WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. O mundo rural brasileiro: acesso a bens e serviços
e integração campo e cidade. Disponível
em:<https://www.passeidireto.com/arquivo/4212413/o-mundo-rural---nazareth-wanderley>
Acesso em 26 de agosto de 2018.
191
RESUMO
O presente estudo tem o escopo de discutir a autonomia dos partidos políticos em face à
Justiça Eleitoral, especialmente no que concerne à jurisdição dos conflitos interno dos
mesmos. Nesse sentido, busca evidenciar que a Justiça Eleitoral assume um protagonismo
no cenário eleitoral brasileiro que ultrapassa o período eleitoral. Para tanto, traz como
problemática a verificação da competência jurisdicional acerca dos conflitos interna
corporis dos partidos políticos e sua regulação. Utiliza como metodologia de pesquisa o
método dedutivo e a técnica de fichamento bibliográfico com os principais autores nacionais
sobre o tema. Por fim, evidencia que a Justiça Eleitoral moderna caminha para uma
jurisdição que compreenda que sua atuação supera o período eleitoral e que cumpra seu
mister constitucional e democrático.
INTRODUÇÃO
137
Advogado eleitoralista. Pós-graduando em Direito Eleitoral pela Universidade de Santa Cruz do Sul –
UNISC. Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB de Santa Cruz do Sul. e-mail:
aelinck@hotmail.com.
138
Professor da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC e Advogado. Mestre em Direito. Doutorando em
Direito Ambiental pela Universidade de Caxias do Sul – UCS, com aderência à linha de pesquisa Direito
Ambiental e Novos Direitos. e-mail: cassioarend@unisc.br
193
ser eleito deverá aderir a partidos políticos tradicionais, que vivem, inequivocamente, a
maior crise de credibilidade da história do pluripartidarismo?
Ainda, como se inserir numa estrutura partidária pronta, dotada de autonomia
praticamente absoluta, sem ter que se submeter às vontades das suas lideranças, verdadeiros
proprietários dos partidos políticos? Quem regulamentaria isso?
Partidos e mais partidos vão sendo criados e homologados, muito também diante da
ausência de democracia interna partidária, virando, estas legendas, verdadeiros pequenos
feudos, compostos por líderes (que são carinhosamente chamados de caciques ou coronéis)
que sentam à mesa em busca de se garantirem na governabilidade.
Diante do quadro periclitante colocado em tela, este artigo visa articular a dificuldade de
sintonia entre o cidadão (eleitor) e os partidos políticos e a crise decorrente desta realidade,
à luz dos fatos recentes como as manifestações de rua de 2013, impulsionadas mais ainda
pelos desdobramentos da Operação Lava-Jato, estudando os motivos históricos que levaram
o sistema partidário (com mais autonomia que nunca) à praticamente falir.
A realidade contemporânea denota que cada vez mais os partidos políticos são
criados, fundidos ou mesmo extintos, com a finalidade não de carregar uma bandeira
programática consistente e que compreenda a visão de mundo de parte da sociedade. Muitos
são criados, com facilidade, decorrentes da autonomia constitucional e legal, para apenas
ampliar espaços de poder, para negociar coligações, tempo de TV e demais meios de
comunicação, verbas do fundo partidário, enfim, para entrar no balcão.
Existe um consenso que não existem tantas ideologias para justificar tantos partidos.
Todavia, para algumas correntes doutrinárias existiriam razões para uma quantidade
razoável de partidos e para outra que deve haver uma redução mais drástica no número dos
partidos. Bernardino (2018, p. 62) aborda exatamente nesses termos:
Em que pese a sua importância como canal necessário de participação política, o
declínio do pluripartidarismo está relacionado não à pluralidade de partidos em si,
mas especialmente pela multiplicidade desordenada destes nos últimos anos. Essa
demonização da esfera partidária também é consequência de recorrentes e
consecutivas denúncias, escândalos e processos que trazem à tona diversos casos
de corrupção praticados por partidos políticos e seus filiados, fatos estes que só
desestimulam o eleitor, causando um sentimento de repulsa pela política. Parte do
descrédito no sistema pluripartidarista deve-se ao fato de vários partidos existirem
somente com o fito de angariarem recursos, sejam eles fruto do fundo partidário,
sejam doações privadas ou, ainda, de existirem somente com a finalidade de
194
É daí que nasce duas consequências muito ruins do pluripartidarismo tal qual
implantado no sistema eleitoral brasileiro: a descrença do eleitor nos partidos políticos e a
perda de credibilidade do sistema partidário.
Este fenômeno é facilmente percebido por fatos internos já constatados e evidentes,
como a profissionalização e burocratização dos partidos políticos, eleições indiretas nas
convenções para escolhas dos seus órgãos executivos e éticos e, até mesmo, na escolha dos
candidatos. Campos Neto (2018, p. 332-333) vai ao ponto, no que chama de “Oligarquização
da Política”, citando Michels (1982, p. 27-28):
O partido amadurecido burocratiza-se e a direção torna-se oligárquica. O partido
deixa de ser meio e passa se tornar fim. Todos os órgãos e instrumentos que em
princípio eram destinados a assegurar “[...] o funcionamento da máquina do
partido – subordinação, cooperação harmoniosa dos membros individuais,
relações hierárquicas, discrição, correção – acaba-se atribuindo mais importância
que ao grau de rendimento da máquina”. [...] Diante deste cenário, a única
preocupação da oligarquia seria “afastar tudo que seja suscetível de introduzir-se
nas rodas da sua engrenagem, ameaçando assim, senão o próprio organismo, então
sua forma externa representada pela organização”. A oligarquização do partido
político, também, funda-se na ideia da necessidade de outorgar a uma elite os
poderes para definir e executar ações com a agilidade necessária a fim de alcançar
os objetivos perseguidos pela organização. [...] Um fator que alimentaria o livre
processo de oligarquização seria a passionalidade dos cidadãos em assuntos
relacionados à política e, nos partidos políticos, a abstenção voluntária dos filiados
na participação das decisões do partido. A participação popular, no âmbito
externo, e a participação partidária, no âmbito interno da organização, são restritas
a grupos reduzidas de pessoas que tomam as decisões pelo todo. (Grifos originais).
Neste processo oligárquico, conforme estudado por Michels (1982, p. 97), o Partido,
assim como a própria ação estatal, usaria dos mesmos artifícios, como o uso manipulativo
da imprensa e todo o tipo de ardil possível para manipular as massas, antes indivíduos sem
envolvimento partidários, doravante filiados.
195
O próprio autor contrapõe essa posição um tanto realista de Michels (1982, p. 97),
de que os partidos políticos inevitavelmente estão mercê da oligarquização e burocratização,
aduzindo que este processo se deve à “[...] falta de controle dos representantes pelos
representados, da rarefeita responsividade consciente na disposição dos líderes em adotar as
medidas preferidas pelos liderados [...]” (CAMPOS NETO, 2018, p. 337).
As questões internas dos partidos políticos, num contexto de enfraquecimento do
sistema partidário, passaram a ser ainda mais irrelevantes sobre o ângulo do acesso à Justiça,
fazendo com que a grande maioria das possíveis divergências internas fosse resolvida dentro
do próprio meio, em face da falta de um controle externo jurisdicional efetivo. Isto poderia
levar a inúmeras situações não almejadas, como a submissão às lideranças partidárias, que
se portariam como legítimos donos da agremiação partidária e, sendo essa, apenas, uma
bandeira que os agasalha.
Por essa razão, inclusive, a Justiça Eleitoral, nos últimos anos, definitivamente
deixou de conhecer as questões internas partidárias, passando a tratá-las como meras
associações civis comuns, devendo suas questões internas serem conhecidas pela Justiça
Comum, de competência residual.
Daí que os partidos políticos, embora concebidos como associações regidas pela Lei
Civil, possuem, na realidade, outra significação e até mesmo protagonismo e, assim, não
podem ser analisados com o mesmo olhar sobre os demais entes associativos. Para tanto,
salienta-se que:
Embora se afirme o caráter privado do partido sob a Constituição de 1988, é certo
que o papel, enquanto instituição que exerce relevante função de mediação entre
o povo e o Estado, confere-lhe características especiais e diferenciadas, que não
se deixam confundir com uma simples instituição privada. Daí ressaltar-se que o
partido é dotado de natureza complexa, que transita entre a esfera puramente
privada e a própria esfera pública. [...] Diferentemente, por exemplo, de alguns
textos constitucionais [...], a Constituição de 1988 e a Lei dos Partidos Políticos
(Lei nº 9.096/95) não consagraram expressamente o princípio da democracia
interna nos partidos. Não significa, porém, que tal princípio não esteja
contemplado pela nossa ordem constitucional (MENDES, 2017, p. 793).
Por isso que a partir da reflexão anterior, o cenário político-eleitoral do país está
exigindo da Justiça Eleitoral atenção, dedicação e esforço muito maiores que apenas durante
os processos eleitorais (que, por si só, já é de um extraordinário movimento).
É fato notório que as ações eleitorais últimas levaram o povo ao maior envolvimento
na política, despertando interesse em participar dela, a acompanhá-la e transformando o
pleito eleitoral, doravante, apenas o ápice de algo construído permanentemente e de
constante e incessante aumento de intensidade. É necessário que vejamos agora que o
país, diante do ativo movimento de seu povo, informado rapidamente pelas redes sociais,
está e provavelmente estará sempre envolvido com a política. Daí que a própria Justiça
197
Eleitoral, como foi ensinado por Macedo (2018, p. 266), deverá estar cada vez mais ativa e
estruturada.
Por isto que os conflitos partidários internos em período “não eleitoral”, num
contexto de tantas repercussões perante a sociedade, não podem ser tratados como matéria
residual. Até porque, como já foi refletido acima, o que viria a ser o período “não eleitoral”,
se o assunto que domina todo o debate público a pelo menos cinco anos é política e eleições?
É importante medir o quão nefasta é a competência residual para processamento e
julgamento das questões interna corporis dos partidos políticos, em período não eleitoral,
tanto para as partes, quanto para o Poder Judiciário e também para a sociedade em geral,
num contexto de necessidade de fortalecimento interno destas agremiações.
O Conselho Nacional de Justiça (2017) divulgou os números do Judiciário do ano de
2016, e as conclusões que se retiram dos seus dados, permitem reflexões importantes
também no que tange o congestionamento dos Tribunais de Justiça Comum, em comparativo
com os Especializados (caso dos Tribunais Eleitorais).
Conforme os dados que se encontram no CNJ, o tempo médio de tramitação dos
processos pendentes e baixados na fase de conhecimento (CNJ, 2017) foram os seguintes no
ano de 2016: a) Os baixados: Justiça Estadual: 2 (dois) anos e 9 (nove) meses e; Justiça
Eleitoral 4 (quatro) meses. b) Os ativos (pendentes): Justiça Estadual: 4 (quatro) anos e 10
(dez) meses e; Justiça Eleitoral: 7 (sete) meses.
Ainda, também se encontra no referido documento que o Tempo Médio da Sentença
nas fases de execução e conhecimento no primeiro grau na Justiça Comum foram os
seguintes: a) Fase de Conhecimento: 1 (um) ano e 7 (sete) meses e; b) na fase de execução:
4 (quatro) anos e 8 (oito) meses.
Também foi extraído que o Orçamento do Poder Judiciário correspondeu a 1,4 (um
ponto e quatro décimos) do Produto Interno Bruto (PIB) e, deste valor, 56,7% (cinquenta e
seis por cento e sete décimos) foram destinados para a Justiça Estadual, enquanto 6,2% (seis
por cento e dois décimos) foram destinados para a Justiça Eleitoral.
Por sua vez, o custo por Magistrado de Primeiro Grau correspondeu, em 2016, aos
seguintes números: a) Justiça Estadual, custo médio mensal por Magistrado: R$ 49.093,00
(quarenta e nove mil e noventa e três reais) e; b) Justiça Eleitoral, custo médio mensal por
Magistrado: R$ 8.782,00 (oito mil, setecentos e oitenta e dois reais). Cabe fazer uma
observação que os Juízes Eleitorais, nesses casos, são os próprios Juízes Estaduais das
Comarcas que acumulam a função.
198
A partir desta introdução, o referido Autor, faz menção que o princípio da liberdade
de expressão, tão importante em um processo eleitoral, deve ser observado com muita
atenção em todos os instantes enquanto período democrático, momento em que se refere a
Osório (2016, p. 79 apud FUX, 2018, p. 99):
As eleições são hoje a peça central do sistema de autogoverno democrático. Em
uma democracia representativa, o direito de sufrágio permite que o povo exerça o
poder político de modo indireto, a partir da formação de um corpo de
representantes. No entanto, o processo eleitoral é mais do que um procedimento
200
Diante do quadro, uma nova equação se coloca em mesa para profunda análise diante
da complexidade: de um lado, a necessidade de não haver uma omissão absoluta do Poder
Judiciário, colocando os partidos políticos mercê das oligarquias políticas formadas pela
classe política e; de outro, o próprio Poder Judiciário turbinado por anseios populares, ante
aos fatos escandalosos que chocaram o povo, com muito poder autoconcedido ou por leis,
por vezes, criadas num contexto histórico em que se acreditava na impunidade e, neste
sentido, extremamente interventor, quase legislador, agindo também em excessos e abusos
de poder.
201
Como foi referido por Guedes (2018, p. 112), é necessário cautela para os
Magistrados Eleitorais diante do excesso de responsabilidade e até mesmo diante do fato de
que, hodiernamente, ele deixou de ser um mero condutor do processo eleitoral, mas passou
a ser uma figura cujas decisões podem influenciar decisivamente na vontade popular.
A resposta se dá na observância ostensiva aos princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade.
O dever de proporcionalidade possui dupla dimensão: de vedação ao excesso
(Übermassverbot) e de vedação à proteção deficiente ou insuficiente
(Untermassverbot). De fato, a proporcionalidade constitui autêntica pauta de
moderação e prudência a orientar toda a atuação do Poder Público. Sua função é
permitir a harmonia axiológica do sistema normativo. Seu fundamento é a própria
noção de princípios jurídicos como mandamentos de otimização em face de
restrições fáticas e jurídicas, na esteira do magistério de Robert Alexy. Sua
operacionalização é metodologicamente desdobrada em três etapas: adequação,
necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. [...] ao lado de vedação ao
excesso, a proporcionalidade possui a dimensão de proibição de proteção
deficiente. Aludida acepção desenvolveu-se no direito tedesco, a partir da
convicção de que os direitos fundamentais não seriam apenas direitos de defesa,
oponíveis em face do Estado, mas, para além disso, possuiriam uma dimensão
objetiva, de vez que tutelam certos bens jurídicos e valores que devem ser
promovidos e protegidos diante de riscos e ameaças originários de terceiros, como
instrumento de controle da inação ou da atuação deficiente estatal (FUX, 2018, p.
104-105). (Grifos originais).
Diante destas reflexões, não existe dúvidas que a Justiça Eleitoral, doravante,
tende a caminhar em terreno cada vez mais dificultoso, de modo que exigirá várias
tomadas de decisões importantes, todavia, algumas já tomadas, inclusive com o auxílio
do Novo Código de Processo Civil, de 2015, como se demonstrará na sequência do
desenvolvimento deste trabalho.
Importante referir que um dos instrumentos que vem auxiliando a Justiça Eleitoral
na resolução de alguns problemas vinculados às técnicas processuais garantidoras de
segurança jurídica, o Novo Código de Processo Civil vem sendo um importante diploma
colaborador para esta nova fase. Como ensina Macedo (2018, p. 272), os artigos 926 e 927
do Diploma Processual Civil, “construiu um sistema no qual prepondera a função normativa
da atividade dos tribunais”.
Independentemente de sistemas de outros países, no Brasil, a teoria dos chamados
precedentes ganha características próprias, voltada essencialmente para o que o
art. 926 do CPC/2015 institui como um valor a ser perseguido pelos tribunais: a
uniformização e estabilidade de sua jurisprudência. Não necessariamente atuando
no vazio da norma, parte desta para lhe dar contornos e extensão específicos. [...]
De qualquer sorte, o art. 927 do CPC/2015, complementando a norma instituída
pelo dispositivo antecedente, estabelece processualmente um rol de decisões
colegiadas aptas a instituir o procedente vinculante, seja para os processos em
curso, seja para os processos futuros, a exemplo do que dispõem os art. 332 do
mesmo estatuto autorizando o julgamento de improcedência liminar do pedido, a
ser proferido pelo juiz de primeiro grau, em casos tais. Enunciado com vinculação
erga omnes e com projeção temporal para o futuro, reveste-se de função
normativa: o exigir do destinatário este ou aquele comportamento frente à
determinada premissa fática (MACEDO, 2018, p. 273). (Grifos originais).
203
internas, admitir que os conflitos partidários signifiquem divergências de teor político e que,
em última análise, terão influência no pleito eleitoral, estando ele distante ou não, restam
claros.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
BLASZAK, José Luís. Democracia interna dos partidos. In: FUX, L.; PEREIRA, L. F. C.;
AGRA, W. M. (Coord.); PECCININ, L. E. (Org.). Direito Partidário. Belo Horizonte:
Fórum, 2018. p. 307-326. v. 2.
206
FÉLIX JÚNIOR, Waldir Franco. Justiça Eleitoral brasileira: histórico, funções e possíveis
propostas do direito comparado para a revitalização de organismo eleitoral. In: FUX, L.;
PEREIRA, L. F. C.; AGRA, W. M. (Coord.); PECCININ, L. E. (Org.). Direito
Constitucional Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 251-263. v. 1.
GUEDES, Néviton. A democracia e a restrição aos direitos políticos. In: FUX, L.;
PEREIRA, L. F. C.; AGRA, W. M. (Coord.); PECCININ, L. E. (Org.). Direito Partidário.
Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 111-119. v. 1.
MACEDO, Elaine Harzheim. Normatização das eleições: a Justiça Eleitoral detém funções
legislativas? In: FUX, L.; PEREIRA, L. F. C.; AGRA, W. M. (Coord.); PECCININ, L. E.
(Org.). Direito Constitucional Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 265-282. v. 1.
MENDES, G. F.; BRANCO, P. G. G. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo:
Saraiva, 2017.
RAIS. Diogo. Direito Eleitoral Digital. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
ZÍLIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 4. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2014.
207
RESUMO
INTRODUÇÃO
139
Mestre do Programa de Pós-Graduação em Direito pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai
e das Missões (URI) Campus Santo Ângelo - RS. Bolsista CAPES no programa acima referido. Especialista
em Direito Eleitoral pela Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). Bacharela em Direito pelo Curso de
Graduação de Direito da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI) Campus Santo
Ângelo RS. Advogada. E-mail: carhlaalves@hotmail.com
140
Graduada em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (2002); Especialista em Direito Constitucional
- ênfase em Direito Municipal pela Universidade Luterana do Brasil (2005); Mestre em Direito - Políticas
Públicas de Inclusão Social - pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC -(2007). Doutora em Direito
pela Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC - (2014). Docente da Universidade de Santa Cruz do Sul –
UNISC - e professora permanente do PPGD desta universidade. Email: d-friedrich@hotmail.com
208
representação, até que ponto a política de cotas tem se mostrado eficaz? A participação da
mulher na política precisa se tornar realidade.
A mulher brasileira conquistou a capacidade eleitoral ativa (alistabilidade)
facultativa em 1932, que passou a ser obrigatória mais tarde, em 1946. Apesar de serem a
maioria das eleitoras, ainda representam a minoria em cargos políticos. Na verdade, se hoje
ocupam 30% (trinta por cento) das candidaturas é porque os partidos são obrigados a
colocarem mulheres na disputa.
Destaca-se que o empoderamento feminino representa uma das principais faces nesse
milênio, e o amadurecimento da mulher na política terá influencias e reflexos nessa
conquista. Diante disso, se analisará quais foram e quais ainda são os obstáculos que
impedem uma maior participação feminina de elegibilidade na política brasileira,
desenvolvendo uma breve trajetória histórica das mulheres nos espaços de poder.
Para o objetivo deste estudo se requer ainda, como método de abordagem o
hipotético-dedutivo. O método de procedimento utilizado nesse artigo consistirá em uma
abordagem bibliográfica em fontes variadas, a partir de livros, revistas, artigos, e análises
comparativas, a pesquisa compreenderá também compilação de dados e informações e
análise dos mesmos.
De outro giro, foi durante a revolução industrial que a inserção da figura feminina no
mercado de trabalho iniciou-se. As indústrias se fortaleciam cada vez mais, o trabalho
feminino tornou-se mais acessível aos olhos dos empregadores, deixando a mão de obra
masculina em segundo plano, em razão dos baixos salários que eram destinados às mulheres,
já que sua mão de obra era mais barata.
Mas a questão de gênero sempre foi um obstáculo, pois apesar da grande participação
feminina no mercado de trabalho, os cargos bem remunerados, assim como os cargos de
chefia, continuaram pertencendo aos homens.
Com a chegada do século XIX, as mulheres iniciaram sua busca por melhores
condições de trabalho: luta pela redução da jornada de trabalho, aumento dos salários, assim
como melhorias na condição de trabalho. Mesmo assim as mulheres operárias continuavam
carregando o estereótipo da figura materna e educadora, destinadas ao cuidar do lar, ser
esposa e mãe, pois
[...] todos (as) sabemos que não é a mesma coisa ser mulher ou homem dentro de
uma fábrica, num sindicato, ou simplesmente dentro de nossas casas. Vive-se no
masculino ou no feminino (...) mecanismos quase invisíveis tecem as relações
entre mulheres e homens na vida quotidiana (...) Estes fios sutis e às vezes
210
Nas eleições convocadas por Getúlio Vargas para uma Assembleia Constituinte, nos
anos de 1934 e 1935, foi eleita a primeira mulher deputada federal, Carlota Pereira de
Queiroz, médica paulista. Berta Lutz, cientista e feminista, primeira suplente do Distrito
Federal, assumiu o mandato em 1936. Porém, nessa época, o voto era permitido somente
para as mulheres que tinham profissão remunerada, o que só veio a mudar mais tarde, com
o Código de 1965, vigente até hoje.
Cabe destacar que o primeiro Código Eleitoral brasileiro trazia o voto feminino como
voto facultativo (assim como o voto para homens a partir de 60 anos), ou seja, percebe-se
que o voto feminino não tinha a mesma natureza do voto masculino.
Ademais, a história demonstrou que as mulheres foram restritas a esfera privada, pois
o mundo público pertencia aos homens. A mulher era considerada geneticamente inferior,
212
era algo “natural”. Historicamente, em razão da hierarquia sexual, a mulher foi privada de
seus direitos civis e políticos. Qual era a necessidade do voto feminino? E ainda, por quais
motivos uma mulher se candidataria? Se ela já estava sendo representada pela figura
masculina?
As cotas eleitorais por gênero são instrumentos de ação afirmativa, com objetivo de
maior participação feminina passiva no cenário eleitoral brasileiro. É um instrumento que já
vem sendo usado em vários outros países com a finalidade de se buscar o equilíbrio entre
homens e mulheres, tendo em vista as inúmeras limitações históricas que as mulheres
sofreram e sofrem até hoje.
Inúmeras são os entraves da participação igualitária nos campos da vida social, por
isso se faz necessário ações afirmativas como instrumentos de promoção de uma verdadeira
igualdade, não só formal como também substancial, entre homem e mulher.
O Projeto de cota de gênero organizado pelo Professor Dahlerup, e amplamente
difundido pela ONU e União Parlamentar, prevê três espécies de cotas, cuja finalidade é a
maior participação feminina na política, são elas: 1 reserva de assentos para mulheres no
Parlamento; 2 cotas de gênero legalmente exigidas na lista de candidatura; 3 cotas
voluntárias constituídas por partidos políticos. O Brasil adotou o tipo 2.
213
A Lei 9504/97, que estabelece as normas para as eleições, em seu artigo 10º, §3º,
prevê a cota eleitoral por sexo:
Artigo 10. Cada partido poderá registrar candidatos para a Câmara dos Deputados
câmara legislativa, assembleias legislativas e câmaras municipais, até 150% do
número de lugares a preencher.
§ 3º Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido
ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas
de cada sexo.(grifo nosso).
No histórico das cotas eleitorais por gênero no brasil a primeira lei a prescrever
exigência foi a Lei 9.100/95, que determinava que, pelo menos 20% das vagas de
candidaturas de um dos gêneros por cada partido ou coligação. Com a entrada em vigor da
Lei 9.504/97 o percentual mínimo foi elevado para 25%, e depois novamente elevado para
30%, porcentagem que é mantida atualmente. Senão vejamos:
Mesmo diante dos avanços de igualdade de gênero as mulheres ainda são a minoria
nos cargos políticos, assim como na participação de partidos políticos, apesar de
representarem mais da metade da população brasileira. É necessário que se reflita e se
observe a participação feminina nos diversos espaços de poder. Questiona-se como
transformar e superar essa realidade?
Hoje, passados mais de 80 (oitenta) anos em que as mulheres conquistaram seus
direitos políticos ainda tem participação inexpressiva na política, apesar de representarem
mais da metade do eleitorado. É incompreensível que se tenha maior população de gênero
feminino e não se tenha essa representação na política. As mulheres são a maioria na base,
porém a minoria no topo.
A democracia exige um grau de correspondência entre a constituição social e a
composição do corpo legislativo, e atualmente existe uma diferença muito grande entre nossa
representação e o corpo social, o que consequentemente resulta em uma democracia débil e
um sistema (não) representativo.
As cotas de candidaturas são uma importante ferramenta de incentivo à participação
política das mulheres, historicamente afastadas dos pleitos eleitorais, mas ainda são
insuficientes.
Ademais, nenhum dos sexos pode dispor mais de 70% (setenta por cento) das
candidaturas partidárias, entende-se, portanto, que, em regra, no mínimo 30% (trinta por
cento) das vagas deveriam ser preenchidas por mulheres, mas a realidade é bem distante
desse percentual. A representação feminina não vem refletindo minimamente o papel da
mulher na sociedade. As políticas de incentivo atuais são insuficientes para o rompimento
desse bloqueio de participação.
As legendas cumprem a determinação estabelecida em lei, mas apenas de maneira
formal. Na convenção escolhem-se verdadeiras laranjas com o intuito de atender a lei, e não
candidatas que não vão realmente figurar. Não basta a indicação de candidatas mulheres,
mas sim assegurar condições básicas pra que elas realmente possam disputar o espaço na
representação política. De acordo com informações do Tribunal Superior Eleitoral:
E isso se confirma por meio dos dados trazidos pela Procuradoria Especial da Mulher,
quando questionadas sobre a mulher não votar em mulher, 83% (oitenta e três por cento)
responderam que a questão de gênero não faz diferença, 79% (setenta e nove por cento)
responderam já ter votado alguma vez em mulheres. Quando questionadas sobre por que não
se candidatam, 41% (quarenta e um por cento) responderam que o motivo é a falta de apoio
dentro dos partidos, 23% (vinte e três por cento) responderam que não têm interesse pela
política, 19% (dezenove por cento) expressaram a dificuldade de concorrer com homens. A
falta de apoio da família e tarefas domésticas são pouco citadas, ficando apenas com 6%
(seis por cento) e 5% (cinco por cento), respectivamente.
As razões que explicam a ausência da figura feminina na política são baseadas em
estereótipos sexistas e machistas, consequência de séculos de discriminação em relação ao
gênero feminino, percebe-se que as mulheres são discriminadas pelos próprios partidos.
O direito ao voto foi conquistado, mas ainda existe uma distância muito grande na
participação feminina na política brasileira, e esse problema está longe de ser superado.
Importante destacar algumas questões que impedem e limitam a participação feminina na
política brasileira trazidas pela pesquisa Procuradoria Especial da Mulher:
Quanto à situação da mulher na sociedade:
- A elevada carga de trabalho, com a tripla jornada;
- O caráter machista da sociedade;
- O domínio masculino dos partidos políticos.
Quanto às leis afirmativas:
- A ineficiência dentro do atual sistema brasileiro de cota nas listas de
candidaturas;
- A baixa alocação de recursos nas campanhas das mulheres.
- A falta de punição aos partidos que não cumprem a legislação.
- A falta de formação e de campanhas de conscientização. (BRASIL, 2015, p.48)
(grifo nosso).
217
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
BOMFIM, Benedito Calheiros; ACKER, Anna Britto da Rocha. A trajetória social, política
e cultural da mulher no Brasil. In REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL DO
TRABALHO DA 1ª REGIÃO. V. 23, n.50, jul/dez 2011.
BRASIL. Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965. Institui o Código Eleitoral. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil. Poder Executivo, Brasília, 1965.
GILLIGAN, Carol. Imagens da relação. In: MIGUEL, Luis Felipe; BIROLI, Flavia.
Teoria política feminista: textos centrais. Vinhedo: Editora Horizonte, 2013, p. 81-120.
MONTEGRO, Ana. Ser ou não ser ferminista. Recife: Guararapes, 1981. Mulher, estudos
de gênero. Organização de Marlene Neves Strey. São Leopoldo: Ed. UNISINOS, 1997.
MURARO, Rose Marie, 1932 – A mulher no terceiro milênio: uma história da mulher
através dos tempos e suas perspectivas para o futuro. Rio de Janeiro, 2ª ed. Rosa dos
Tempos, 1992.
SOUZA LOBO, Elizabeth. In: KARTCHEVSKY, André et. al. O sexo do Trabalho. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1986.
VI AS INCONSTITUCIONALIDADES
PRESENTES NO DIREITO PENAL
222
RESUMO
INTRODUÇÃO
141
Advogada. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade de
Santa Cruz do Sul – UNISC, na linha de Pesquisa “Organizações, Mercado e Desenvolvimento”. Especialista
em Advocacia Criminal, pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. Bacharel em Direito, pela
Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. E-mail: juliana.dp.adv@gmail.com
142
Mestra em Direito pelo Programa de Pós-graduação Mestrado e Doutorado da Universidade Santa Cruz do
Sul - UNISC. Linha de pesquisa Políticas Públicas de Inclusão Social. Conceito Capes 5. Especialista em
Direito do Trabalho, Previdenciário e Processo do Trabalho - UNISC. Graduada em Direito UNISC. Endereço
de e-mail: patriciareusch@gmail.com
223
Sendo assim, o órgão competente para julgar a ADPF é o Supremo Tribunal Federal.
Entretanto, necessário salientar que, a legitimidade ativa para ingressar com ADPF é restrita
aos mesmos que podem propor ação direta de inconstitucionalidade, ou seja, os previstos no
art. 103 da Constituição Federal.
Nessa seara, nota-se que, a ADPF surge como forma de suprir a lacuna que havia
sido deixada na regulamentação do controle de constitucionalidade do direito pátrio, tendo
seu cabimento particularizado, na medida em que será empregada em caso de ameaça de
lesão ou lesão a preceito fundamental por órgão público ou quando for relevante o
fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou
municipal.
Sendo assim, defendem a possibilidade de ajuizamento da ADPF, naquelas situações
caracterizadoras de descumprimento de normas materialmente constitucionais, ou seja,
aquelas normas que tratam da estrutura do Estado, das relações de poder, dos direitos e
garantias fundamentais do ser humano. (MENDES; STRECK, 2013)
Destaca-se que esse viés, trazido pelo instrumento da Arguição de Descumprimento
de Preceito Fundamental, leia-se APDF, engloba o desenvolvimento do presente estudo.
[...] essas decisões podem ser classificadas como litígio estrutural ou casos
estruturais, os quais se caracterizam por: a) afetar uma ampla quantidade de
pessoas; b) envolver várias entidades estatais responsáveis por falhas sistemáticas
nas políticas públicas adotadas; c) implicar ordens de execução complexas,
mediante as quais o magistrado impõe a adoção de medidas coordenadas para
tutelar toda a população afetada, não só os demandantes do caso concreto.
Tem-se que o Estado de Coisas Inconstitucional, tende nada menos, que a construção
de soluções estruturais voltadas à superação desse lamentável quadro de violação massiva
de direitos das populações vulneráveis em face das omissões e negligências do poder
público.
Embora suas raízes estejam na Colômbia, o referido Instituto já alcança outros países,
como Peru e Brasil.
No Brasil, o debate sobre o estado de coisas inconstitucional chegou no Supremo
Tribunal Federal com o ajuizamento da Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental - ADPF n. 347, pelo Partido Socialismo e Liberdade - PSOL, concernente ao
sistema penitenciário brasileiro, tema que será abordado no terceiro capítulo do presente
trabalho.
O direito de punir do estado emanou da vida comunitária. Pois para que a paz e o
interesse da maioria fossem preservados criaram-se as regras comuns de convivência e a
consequente punição ao agente que contrariava essas regras, ou seja, o infrator.
Neste momento, o presente estudo visa abordar o sistema prisional brasileiro, em seu
contexto histórico, para em seguida analisarmos os diversos entraves, que dificultam a
eficácia do mesmo. Salienta-se que o conceito de pena, assim como sua finalidade foi uma
preocupação constante na história e evolução direito penal.
229
[...] o modelo penitenciário Brasileiro foi construído para servir aos senhores, em
tempos de revolução, império e ditadura, onde o pensamento acerca de pessoa
presa era completamente diferente dos vivido atualmente, pois o país nunca tinha
vivido nenhum momento de democracia tão longo, o que sem dúvida, influi na
administração pública, e esta, por sua vez, age diretamente na administração
carcerária.
Aliás, importante destacar que o Brasil, até 1830, não tinha um Código Penal próprio,
eis que, por ser ainda uma colônia portuguesa, submetia-se às Ordenações Filipinas, que em
seu livro V trazia o rol de crimes e penas que seriam aplicados no Brasil.
A pena de Prisão foi instituída no Brasil, em 1830, com o Código Criminal do
Império, que traz a previsão de duas modalidades de prisão: prisão simples e prisão com
trabalho, esta poderia ser perpétua inclusive.
Segundo Assis, (2007, p.01),
Cabe ressaltar que, o referido código não determinou nenhum sistema penitenciário
específico, deixando livre a definição do sistema e do regulamento a ser seguido a cargo dos
governos provinciais.
Destaca-se que, as prisões brasileiras já apresentavam problemas relacionados a
precariedade e falta de estrutura. Após muitas discussões, com a construção das casas de
correção no Rio de Janeiro e em São Paulo, em meados de 1850, ocorrem as primeiras
mudanças no sistema penitenciário brasileiro com a introdução de oficinas de trabalho,
pátios e celas individuais, por conta da implantação de modelos estrangeiros como o Sistema
da Filadélfia e o de Auburn.
De acordo com Assis, (2007, p. 01),
[...] as leis penais sofreram sensíveis mudanças ao final do século XIX em razão
da Abolição da Escravatura e da Proclamação da República. O Código Penal da
República, de 1890, já previa diversas modalidades de prisão, como a prisão
celular, a reclusão, a prisão com trabalho forçado e a prisão disciplinar, sendo que
cada modalidade era cumprida em estabelecimento penal específico. Já no início
do século XX, a prisões brasileiras já apresentavam precariedade de condições,
superlotação e o problema da não-separação entre presos condenados e aqueles
que eram mantidos sob custódia durante a instrução criminal.
Em 1940, é publicado através de Decreto-lei o atual Código Penal, o qual trazia várias
inovações e tinha por princípio a moderação por parte do poder punitivo do Estado.
No que tange ao conjunto de leis relacionadas à Execução Penal, embora a matéria
estivesse disposta dentro do Código Criminal do Império, somente em 1941, com o
surgimento do Livro IV, do Código de Processo Penal (Dec. Lei 3.689 de 03.10.1941), pela
primeira vez na legislação brasileira passou-se a disciplinar a execução da pena e da medida
de segurança, entrando em vigor junto com o Código Penal, em 01 de janeiro do ano de
1942. (FRANCO; COULTER, 2006)
Entretanto, por adotar um sistema de penas que contrariava a Constituição de 1946,
o Código Penal de 1940, se manteve por doutrina e jurisprudência, até 1961, quando surge
um novo projeto coordenado por Nelson Hungria. Após um controvertido trâmite, chega-se
a um novo Código Penal, sancionado pelo governo militar, em 1969.
Em 1977, retomou-se a iniciativa de reforma dos Códigos (Penal, Processual e
Execução Penal) e somente, em 1983 é aprovado o projeto de lei do Ministro da Justiça,
Ibrahim Abi Hackel, o qual se converteu na Lei nº 7.210, de 11 de Julho de 1984, a atual e
vigente Lei de Execução Penal.
A lei de execução penal brasileira é tida como sendo de vanguarda, e seu espírito
filosófico se baseia na efetivação da execução penal como sendo uma forma de preservação
dos bens jurídicos e de reincorporação do homem que praticou um delito à comunidade.
Nesse sentido, para Franco; Coulter, (2006, p. 02) a referida lei surge como,
Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório,
aparelho sanitário e lavatório.
Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e
condicionamento térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).
Nessa seara, salienta-se que o Brasil está em terceiro lugar no ranking dos países que
mais prendem no mundo. Face os nossos três concorrentes diretos nesse pódio autoritário
(Estados Unidos, China e Rússia) somos o único país cuja população carcerária segue
aumentando. (LACERDA, 2017)
Para Lacerda, (2017, p. 01),
[...] a tendência autoritária no Brasil não se revela apenas nos números absolutos
que nos colocam em terceiro lugar no vergonhoso pódio dos países que mais
prendem no mundo. Sim, é assustador constatar que superamos a Rússia em mais
de cento e vinte mil presos. Também é assustador notar que, fosse o Estado de São
Paulo um país, ocuparia sozinho o sétimo lugar nesse ranking com seus mais de
duzentos e quarenta mil presidiários. Mas, acima de tudo, merece atenção o fato
de que seguimos aumentando nossa população carcerário enquanto nossos rivais
233
Assim, verifica-se que o Brasil convive com um total abandono do sistema prisional,
o que deveria ser um instrumento de ressocialização, muitas vezes, funciona como escola do
crime, devido à forma como é tratado pelo estado e pela sociedade. (DULLIUS;
HARTMANN, 2011)
Destarte, a atual estrutura penitenciária no Brasil, requer a tomada de melhorias de
um modo geral na assistência aos presos, para que seja possível a efetiva aplicação da Lei
de Execução Penal na sua amplitude, garantindo os direitos mais inerentes à condição
humana e possibilitando a verdadeira ressocialização do indivíduo.
(b) determinou aos Juízes e Tribunais que passem a realizar audiências de custódia
para viabilizar o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária, num
prazo de até 24 horas do momento da prisão.
Destarte, embora a ADPF, nº. 347 esteja pendente de uma decisão definitiva, pois
encontra-se aguardando julgamento no Supremo Tribunal Federal, considerando os
fundamentos analisados até o momento, pode-se delinear os caminhos a serem traçados pela
corte para o efetivo enfrentamento da matéria, abarcando, inclusive a adoção da tese do
Estado de Coisas Inconstitucional da Corte Colombiana.
Ao analisarmos o voto do relator da ADPF nº. 347, ministro Marco Aurélio, nota-se
a clara opção pela via dialógica do instituto, propondo que o STF interfira na formulação e
implementação de políticas públicas e em escolhas orçamentárias, mas mediante ordens
flexíveis seguidas de monitoramento da execução das medidas. Entende-se com a decisão
da corte que procurou-se manter o equilíbrio institucional, ou seja, os fundamentos da
decisão colocam direcionam o tribunal para o caminho da interação institucional em torno
de um objetivo comum, a garantia dos direitos fundamentais. (Brasil, 2015)
Destaca-se que, diante das condições degradantes da vida dos presos nas
penitenciárias brasileiras, a efetivação dos direitos humanos torna-se uma verdadeira utopia.
Cabe ressaltar que as condições degradantes, a superlotação, a falta de vagas, as
estruturas, faz com que os apenados vivam sem o mínimo de dignidade humana, o que torna
o ambiente carcerário um verdadeiro cenário de horrores.
Nessa seara, o atual sistema penitenciário brasileiro não passa de uma verdadeira
escola superior do crime, sendo que ao submeter os presidiários a situações que ferem a
237
dignidade humana, faz com que esses indivíduos se revoltem ainda mais com suas
realidades.
Desta feita, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Lei de Execução Penal
e a Constituição Federal trazem normas em que estabelecem os traços ideais das
penitenciárias, mas de um modo geral contradiz com a realidade encontrada nas cadeias
brasileiras. Conforme assevera Assis, (2007, p. 03),
Nesse sentido, esse ambiente nocivo e degradante das prisões também se caracteriza
pela incidência de agressões físicas, psicológicas e morais sofridas pelos presos no ambiente
prisional, que partem principalmente da própria classe pública, que corrompidos em um
sistema de interesses, tratam os condenados como indivíduos inferiorizados que devem
respeitar a lei dos mais fortes nas penitenciárias e se moldarem para sobreviver.
Desta forma, por todo o exposto, embora tenhamos uma legislação pertinente sobre
a tutela dos direitos fundamentais no sistema penitenciário brasileiro, o que se encontra é
outra realidade, em que a segurança pessoal não é garantida e os direitos fundamentais da
pessoa humana são massivamente violados por aquele que deveria ser o maior garantidor, o
Estado.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
ASSIS, Rafael Damasceno de. As prisões e o direito penitenciário no Brasil. Direito Net, 31
mai. 2017. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/3482/As-prisoes-
e-o-direito-penitenciario-no-Brasil>. Acesso em 07 set. 2018.
ASSIS, Rafael Damasceno de. A realidade atual do sistema penitenciário brasileiro. Direito
Net, 29 mai. 2017. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/3481/A-
realidade-atual-do-sistema-penitenciario-brasileiro>. Acesso em 21 set. 2018.
_______. Supremo Tribunal Federal. Informativo, 798. 7-11 set. 2015. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo798.htm>. Acesso em
21 set. 2018.
CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Consultor Jurídico, 01 set. 2015. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2015-set-01/carlos-campos-estado-coisas-inconstitucional-
litigio-estrutural>. Acesso em 01 ago. 2018.
DEPRÁ, Vinícius Oliveira Braz; Wilian Valer. Estado de coisas inconstitucional: uma
discussão na pauta de julgamento do supremo tribunal federal. 2015. In: XI Seminário
Nacional: Demandas sociais e políticas públicas na sociedade contemporânea. Disponível
em:
<http://online.unisc.br/acadnet/anais/index.php/snpp/article/view/14239&ved=2ahUKEwiv
iPOK8q7eAhULfpAKHcAYDNYQFjAAegQIBRAB&usg=AOvVaw3s6wTi4hohfhOkU
NWK0vp0>. Acesso em 19 ago. 2018
FRANCO, Maria Figueiredo; COULTER, Arthur Francis. Execução penal e seus avanços.
Mar. 2016. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/47724/execucao-penal-e-seus-
avancos>. Acesso em 21 set. 2018
GARAVITO, César Rodríguez; FRANCO, Diana Rodríguez. Cortes y cambio social – como
la Corte Constitucional transformó el desplazamiento forzado em Colombia. Bogotá: Centro
de Estudios de Derecho, Justicia e Sociedad, Dejusticia, 2010.
JÚNIOR, Dirley da Cunha. Estado de coisas inconstitucional. Brasil Jurídico. 10 dez. 2015.
Disponível em: <https://www.brasiljuridico.com.br/artigos/estado-de-coisas-
inconstitucional>. Acesso em 20 set. 2018.
MENDES, Gilmar Ferreira; STRECK, Lenio Luiz. Comentários ao art. 102, § 1°, da
Constituição Federal. In: CANOTILHO, J. J. Gomes. et. al. Comentários à constituição do
brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013. p. 1388-1396.
MOREIRA, Rômulo de Andrade. Uma vitória pírrica: o julgamento da ADPF 347. 13 set.
2015. Disponível em: <https://romulomoreira.jusbrasil.com.br/artigos/232387594/uma-
vitoria-pirrica-o-julgamento-da-adpf-347>. Acesso em 21 set. 2018.
SILVA, Roberto Baptista da. Manual de direito constitucional. Barueri, SP: manole, 2007.
SCALON, Raquel Lima. Controle constitucional das leis penais: da prognose legislativa
sobre os efeitos potenciais e concretos da lei penal aos deveres de seu monitoramento e de
melhoria da lei penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 35. ed. São Paulo:
Malheiros, 2012.