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Metodo AIPE (Prof. Mário Marques Fernandes)
Metodo AIPE (Prof. Mário Marques Fernandes)
Mário Marques Fernandes1, Juan Antonio Cobo Plana2, Fernanda Capurucho Horta Bouchardet3,
Edgard Michel-Crosato4, Rogério Nogueira de Oliveira5
5 Universidade de São
Paulo (USP), Faculdade de
Odontologia – São Paulo
(SP), Brasil.
rogerion@usp.br
SAÚDE DEBATE | RIO DE JANEIRO, V. 40, N. 108, P. 118-130, JAN-MAR 2016 DOI: 10.1590/0103-1104-20161080010
Validação de instrumento para análise do dano estético no Brasil 119
diferentes de pontos (sendo uma com zero aproximação a visão total da região anterior
ponto, seis contendo diferentes faixas de do aparelho estomatognático pela norma
pontos, e mais três faixas repetidas). A oblíqua, com aproximadamente 45 graus.
sequência das imagens foi randomizada e Após, os questionários foram recolhidos e
padronizaram-se a tela, o projetor digital, os dados tabulados eletronicamente.
a distância tela-projetor (dois metros) e o A validade de construção foi verificada
tempo de avaliação, de cinco minutos por pela comparação das questões constan-
categoria de lesão. tes nos quadros 1, 2, 3 e 4 traduzidos do
As imagens de um a dez contendo as ca- Aipe Brasil por meio de estatística descri-
tegorias foram analisadas de duas maneiras. tiva e pelos seguintes testes estatísticos:
Primeiramente, uma imagem mais distante Coeficiente de Correlação Intraclasse
contendo três posições faciais diferen- (ICC), Coeficiente de Correlação de
tes (frontal, oblíqua e lateral) foi exposta Spearman (SCC), Testes não-paramétricos
ao lado do estado anterior (sem lesão), Mann-Whitney e Teste Kruskal-Wallis com
também nessas três posições. A seguir, nível de significância de 5% (p≤0,05), após
outra imagem com essa categoria de lesão estudo de outliers.
em close na posição oblíqua foi exposta ao Visando a atender às questões éticas
lado do estado anterior, com régua em mi- envolvidas, este estudo foi submeti-
límetros, sendo novamente analisada por do ao Comitê de Ética e liberado pelo
cinco minutos. Utilizou-se como critério de nº16785713.4.0000.0075.
Quadro 1. Instrumento para análise do dano estético traduzido e adaptado culturalmente para uso no Brasil (Quadro1
de 4 do método)
Nível de comprovação. Responder à pergunta: Até que ponto se ‘vê’ ou se □ não se vê, ou praticamente não se vê
‘percebe’ a alteração da imagem da pessoa? □ se vê
□ se vê claramente
Nível da tendência do ‘olhar’* ao se fixar ou a se manter atento no sentido □ não tende a fixar o olhar ou nossos
de perceber a mudança de imagem. Responder à pergunta: Nosso olhar ou outros sentidos
nossos outros sentidos tendem a se fixar especificamente nessa alteração □ tende a se fixar ou fixa
da imagem da pessoa? □ tende a evitar o olhar
Nível de emoção que provoca. Responder à pergunta: Provoca algum tipo □ não provoca resposta emocional
de emoção à pessoa lesionada, como, por exemplo: tristeza ou alguma □ provoca ligeira resposta emocional
emoção semelhante? □ provoca resposta emocional intensa
Tipo de emoção que provoca. Responder à pergunta: Se fôssemos familia- □ não
res ou pessoas próximas à pessoa lesionada, sua imagem poderia chegar a □ sim, mas não muito
afetar nossa relação com ela? □ sim, muito
Fonte: Traduzido e adaptado do original em espanhol para uso no Brasil (COBO PLANA, 2010).
Nota: *Considerando a tendência do olhar como algo natural, sem inibições ou condicionamentos. O observador ou avaliador deve liberar-se dos
fatores condicionantes que provocam o decoro, a educação, a compaixão etc. que podem alterar essa tendência de continuar olhando.
Quadro 2. Instrumento para análise do dano estético traduzido e adaptado culturalmente para uso no Brasil (Quadro 2
de 4 do método)
Não se vê ou
0 Não relevante praticamente
não se vê □
Não tende a
1a6 Leve Se vê □ se fixar □
Tende a se
Se vê clara- Não costuma
7 a 12 Moderado fixar ou se
mente □ se lembrar □
fixa □
Quadro 3. Instrumento para análise do dano estético traduzido e adaptado culturalmente para uso no Brasil (Quadro 3
de 4 do método)
QUADRO AIPE/BRASIL 3 - PARA VALORAÇÃO DO NÍVEL DE IMPACTO EM CADA CATEGORIA
Muito pouco Um pouco Moderado Severo Muito intenso
Quadro 3. (cont.)
QUADRO AIPE/BRASIL 3 - PARA VALORAÇÃO DO NÍVEL DE IMPACTO EM CADA CATEGORIA
27 a 28 pon-
Valor final 25 pontos 26 pontos 29 pontos 30 pontos
tos
27 a 28 pon-
Valor final 25 pontos 26 pontos 29 pontos 30 pontos
tos
Fonte: Traduzido e adaptado do original em espanhol para uso no Brasil (COBO PLANA, 2010).
Quadro 4. Instrumento para análise do dano estético traduzido e adaptado culturalmente para uso no Brasil (Quadro 4
de 4 do método)
Focos transitórios especiais: partes do corpo habitualmente não expostas □ não se percebe ou praticamente não
à visão, mas a situações específicas, como banhos de sol, trajes de banho se percebe
etc. □ se percebe
□ se percebe claramente
Focos de especial transcendência em atividades de trabalho: dependendo □ não se percebe ou praticamente não
da atividade, como, por exemplo, uma cicatriz glútea em profissional que se percebe
requeira sua exposição específica. □ se percebe
□ se percebe claramente
□ não se percebe ou praticamente não
Outros focos especiais. se percebe
□ se percebe
□ se percebe claramente
Fonte: Traduzido e adaptado do original em espanhol para uso no Brasil (COBO PLANA, 2010).
Tabela 1. Medidas descritivas para as pontuações em cada lesão (n=54) e cálculo da variação para análise do erro
Interexaminador
Medidas descritivas
Coef.
Desvio
Sequência Mínimo Máximo Média Variação
Padrão
(%)
Embora este seja um estudo pioneiro na va- divisão entre dano fisiológico e estético,
lidação transcultural do Aipe, não havendo, visando a não incorrer em dupla quantifica-
portanto, estudos prévios para comparações, ção. Diferentemente do Brasil, na Espanha
os resultados verificados nos testes de con- essa questão se apresenta dividida nas in-
fiabilidade mostraram patamares importan- vestigações, ou seja, pela Lei nº 35/2015, o
tes e satisfatórios quanto à variabilidade e dano estético é avaliado independente do
homogeneidade dos escores. prejuízo fisiológico existente na vítima (COBO
O conceito de dano estético considera a PLANA, 2010). No Brasil, não se estabeleceram
repercussão de uma sequela estática (cica- a extensão e os contornos do dano moral,
triz, deformações) ou dinâmica (claudicação mais especificamente do dano estético em
da marcha, alterações na mímica etc.), resul- discussão nem se disciplinou a forma da sua
tando na deterioração da imagem da pessoa liquidação, não havendo parâmetros básicos
em relação a si própria e aos outros. Devem para evitar decisões díspares (GONÇALVES, 2015).
ser levados em conta tanto o grau de visibili- Esse fato pode explicar a razão pela qual os
dade (MAGALHÃES, 2004 APUD BOUCHARDET ET AL., 2010) avaliadores que tiveram conteúdos sobre
como a análise da alteração pejorativa da valoração de dano corporal previamente à
imagem como um todo incluindo outros sen- aplicação do instrumento e especialização
tidos, tais como olfato, audição e tato (COBO em outras áreas da odontologia conferiram,
PLANA, 2010). de forma mais abrangente, uma pontuação
Nesta investigação científica, constatou- superior para algumas lesões.
-se o fato de as maquiagens não permitirem Assim, torna-se fundamental que os
a avaliação por outros sentidos nem avalia- peritos utilizem, nos diferentes foros brasi-
ções dinâmicas ou com movimentos nos leiros, o instrumento Aipe associado a uma
modelos simulados, razões pelas quais as criteriosa avaliação descritiva dos elementos
análises foram feitas com lesões estáticas constituintes do dano e às características
em imagens. No contexto da investigação do do lesionado, tais como idade, sexo, pro-
prejuízo estético orofacial, orienta-se a ava- fissão, estado civil, dentre outros (CARDOZO,
liação de movimentos como sendo aqueles 1997). Nesse sentido, a experiência pessoal de
realizados normalmente no cotidiano dos vida e dos profissionais com mais tempo de
periciados e classificados pela Organização formado ajuda o avaliador e pode explicar
Mundial de Saúde, devidamente registrados a relação direta encontrada nos avaliadores
em vídeo (OMS, 2004). Recomendamos mais com mais idade ao analisar uma lesão mo-
estudos nessa importante linha de pesquisa derada, observando-se escores significativos
nas ciências forenses com uma metodolo- p=0,026.
gia dinâmica, evidenciando a utilização do Cumpre destacar que o método proposto
quadro 4, que aborda critérios complemen- para quantificação de dano estético é regu-
tares na valoração desse prejuízo, enfocando lamentado e utilizado na Espanha, objeti-
a relação do dano estético na comunicação, vando estabelecer um número preciso e final
relação sexual e atividades de trabalho. de pontos no quadro 3 do Aipe. Obtido esse
Uma dificuldade que permeia esse tipo escore, é possível fazer a conversão para
de estudo é o fato de as tabelas e escalas valor em dinheiro ao lesionado no respec-
existentes nas diversas metodologias para tivo quadro do dispositivo legal espanhol.
valoração de dano estético não terem sido Embora o Código Civil brasileiro preveja
validadas de forma transcultural. A verifica- a reparação de danos por lesões, não disci-
ção de como está disciplinada a liquidação do plina sua liquidação nem tampouco fornece
dano estético dos dispositivos legais de cada orientações sobre como analisá-los. Além
País é fundamental e, ainda, se existe alguma da pormenorizada descrição técnica das
Referências
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). WILD, D. et al. Principles of good practice for the
Classificação Internacional de Funcionalidade, translation and cultural adaptation process for patient-
Incapacidade e Saúde. Lisboa: OMS, 2004. reported outcomes (PRO) measures: report of the ISPOR
Task Force for translation and cultural adaptation. Value
SANTOS, J. A. A avaliação do Prejuízo Estético. In: Heath, Malden, v. 8, n. 2, p. 94-104, 2005.
VIEIRA, D. N.; QUINTERO, J. A. Aspectos práticos da
avaliação do dano corporal em direito civil. Coimbra:
Caixa Seguros, 2008. p. 85-94.