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Reflexões sobre a aprendizagem da criança pelo corpo e movimento na

educação infantil

Reflections on the learning of the child by the body and movement in early
childhood education
DOI: 10.55905/revconv.16n.9-184

Recebimento dos originais: 24/08/2023


Aceitação para publicação: 22/09/2023

Nair Correia Salgado de Azevedo


Doutora em Educação pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCT – UNESP)
Instituição: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) - Campus de
Presidente Prudente, Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) - Campus de Laranjeiras do
Sul
Endereço: Laranjeiras do Sul – PR, Brasil
E-mail: nairazevedo@hotmail.com

Kátia Aparecida Morais


Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS)
Instituição: Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) - Campus de Laranjeiras do Sul
Endereço: Laranjeiras do Sul – PR, Brasil
E-mail: morais.k293@gmail.com

RESUMO
Considerar as especificidades das infâncias e das crianças pequenas é relevante e isso implica
entender que a criança dessa faixa etária é uma criança lúdica, que se movimenta, que brinca e
que está em constante busca ativa pelos conhecimentos ao seu redor. O objetivo geral dessa
pesquisa foi realizar uma reflexão sobre a aprendizagem da criança na Educação Infantil
considerando o processo histórico das percepções sobre o corpo e movimento na Educação
Infantil por meio de uma análise de documentos legais e normativos sobre a Educação Infantil.
A metodologia usou da abordagem qualitativa, do tipo bibliográfica e documental, considerando
documentos que trataram da regulamentação da Educação Infantil enquanto etapa da Educação
Básica, além dos documentos normativos que demonstram seu percurso curricular. Também
foram utilizados materiais publicados entre os anos de 2013 e 2023, como artigos em periódicos,
pesquisas no Banco de Dados da CAPES e livros. Concluímos que a temática “Corpo e
Movimento na Educação Infantil” possui grande relevância no processo de ensino e
aprendizagem das crianças, mas pela análise realizada dos documentos normativos curriculares,
foi identificado que a temática se faz presente, mas não há garantias de que ela ocorra de forma
efetiva em muitas escolas de Educação Infantil. A imaginação, o brincar, o corpo e o se-
movimentar na Educação infantil oferecem às crianças oportunidades reais de aprendizagem que
vão além daqueles inseridos por meio de códigos em avaliações institucionais, visto que as
brincadeiras postergam memórias em um local que não é passível de medições
institucionalizadas: dentro das crianças.

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Palavras-chave: educação infantil, corpo, movimento, brincar, crianças.

ABSTRACT
Considering the specificities of childhoods and young children is relevant and this implies
considering that the child of this age group is a playful child, who moves, who plays and who is
in constant active search for the knowledge around him. The general objective of this research
was to carry out a reflection on the learning of the child in Early Childhood Education considering
the historical process of perceptions about the body and movement in Early Childhood Education
through an analysis of legal and normative documents on Early Childhood Education. The
methodology used the qualitative approach, the bibliographic and documentary type, considering
documents that dealt with the regulation of Early Childhood Education as a stage of Basic
Education, in addition to the normative documents that demonstrate its curricular path. We also
used materials published between 2013 and 2023, such as articles in journals, research in the
CAPES Database and books. We conclude that the theme "Body and Movement in Early
Childhood Education" has great relevance in the process of teaching and learning of children,
but by the analysis of the curricular normative documents, it was identified that the theme is
present, but there are no guarantees that it occurs effectively in many schools of Early Childhood
Education. Imagination, play, the body and the movement in early childhood education offer
children real learning opportunities that go beyond those inserted through codes in institutional
evaluations, since the games postpone memories in a place that is not amenable to
institutionalized measurements: within the children.

Keywords: early childhood education, body, movement, play, children.

1 INTRODUÇÃO
Quando falamos de Educação Infantil é preciso considerar muitos pontos sobre o
processo de ensino e aprendizagem da criança. Entender as especificidades das infâncias e das
crianças pequenas implica considerarmos que a criança dessa faixa etária é uma criança lúdica,
que se movimenta, que brinca e que está em constante busca ativa pelos conhecimentos ao seu
redor.
Esse estudo objetiva apresentar a temática considerando a importância do
desenvolvimento infantil por meio da descoberta do corpo e a sua interação com o meio. Sabemos
o quão curiosas são as crianças com vários sentimentos, significações e valores da sua
subjetividade - isso é perceptível em estudos de autores que abordaremos no decorrer desse
trabalho.
Sendo assim, a criança pequena passa a construir sua visão de mundo e autonomia pelo
corpo e pelo movimento, sobretudo na Educação Infantil. Compreendemos que a corporeidade é
algo que indissociável na educação infantil, pois as crianças desde que nascem, buscam a

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necessidade de explorar seu corpo e o ambiente que está inserida. No entanto, é de suma
importância que, no ambiente escolar, seja considerado aspectos sociais, contribuindo assim para
que a criança se desenvolva e se socialize com o meio.
O presente trabalho tem por finalidade demonstrar a importância que as atividades com
o corpo e movimento possuem na aprendizagem das crianças desde sua primeira infância, mais
especificamente dentro das instituições de Educação Infantil. Entendemos que as crianças têm a
necessidade de se movimentar e se expressar com auxílio do seu corpo, sendo assim uma
aprendizagem ligada ao brincar e ao interagir.
O intuito é contribuir para as discussões da temática considerando o contexto escolar
em que a criança está inserida, seu crescimento e o pleno desenvolvimento, de tal modo que o
professor esteja sempre mediando a sua aprendizagem. Sendo assim, será possível refletir de que
modo essa mediação contribui positivamente no seu processo de desenvolvimento cognitivo
enquanto ser humano, considerando a criança como um sujeito social e histórico.
É a partir do movimento que as crianças passam a constituir as noções de limites e
capacidades motoras. Aliás, é dessa forma que elas acabam produzindo conhecimento sobre a si
mesmo e sobre o outro. Partindo disso, vários autores que frisam as vantagens dos jogos e
brincadeiras na Educação Infantil serão abordados, como Vygotsky (1991), Brougère (2003;
2004; 2010), Kishimoto (2005), Friedmann (2012) entre outros.
É sabido que as práticas lúdicas na Educação Infantil favorecem a aprendizagem pelo
brincar, e isso implica considerar também o desenvolvimento motor da criança. A temática tem
sido discutida por meio de pesquisas há muito tempo e muitas delas (LIMA et al, 2014;
AZEVEDO, 2012; 2022; MOREIRA, 2014) e diversos outros, tem contribuído para testificar
que o corpo e movimento na Educação infantil possibilita à criança aprendizagens do ponto de
vista cognitivo, físico e social. Ou seja, a criança adquire habilidade enquanto brinca e que usará
para a aprendizagem de outros conteúdos.
Sendo assim, o objetivo dessa pesquisa é realizar uma reflexão sobre a aprendizagem
da criança na Educação Infantil por meio do corpo e movimento e refletir sobre o processo
histórico das percepções sobre o corpo e movimento na Educação Infantil por meio de uma
análise de documentos legais e normativos sobre a Educação Infantil.

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2 METODOLOGIA
A metodologia escolhida por essa pesquisa foi a abordagem qualitativa, do tipo
bibliográfica e documental. “Enquanto a pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das
contribuições de vários autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental baseia-se em
materiais que não receberam ainda um tratamento analítico ou que podem ser reelaborados de
acordo com os objetivos da pesquisa” (PRODANOV; FREITAS, 2013, p. 55).
A análise documental realizada por esse trabalho ocorreu por meio de documentos que
trataram da regulamentação da Educação Infantil enquanto etapa da Educação Básica, como a
“Constituição Federal do Brasil” (BRASIL, 1988), e a “Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional” - LDBEN nº 9.394/96 (BRASIL, 1996) além dos documentos normativos que
demonstram todo o percurso curricular da Educação Infantil, como os “Referenciais Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil” - RCNEIS (BRASIL 1988), as “Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil” - DCNEIs (BRASIL, 2010) e a “Base Nacional Comum
Curricular” - BNCC (BRASIL, 2017).
Já com relação à pesquisa bibliográfica, de acordo com Prodanov e Freitas (2013) esse
tipo de pesquisa são aquelas que partem de material já publicado sobre uma determinada
temática. Trata-se da busca por meio de livros, artigos científicos, dissertações, teses e outros
materiais que podem auxiliar o pesquisador no desenvolvimento teórico de sua temática.
No caso dessa pesquisa, ao utilizar estudos sobre a temática, foram usados materiais
publicados entre os anos de 2013 e 2023, como artigos em periódicos, dissertações e teses no
Banco de Dados da CAPES, bibliotecas virtuais de Universidades, bibliotecas físicas, etc.
Entretanto, é preciso mencionar também que há autores considerados clássicos para a discussão
da temática e que possuem publicações anteriores a essa temporalidade, como Vygotsky (1991)
e Brougère (2003; 2004; 2010) que debatem a temática do ponto de vista mundial e Kishimoto
(2005) e Friedmann (2012) que discutem do ponto de vista da Educação Infantil brasileira.

3 CORPO, MOVIMENTO E INFÂNCIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: DISCUSSÕES


HISTÓRICAS
A história das instituições de educação infantil se constitui através da ligação das
relações da história da infância, sociedade, família, do trabalho, e diversos outras dimensões.
Diversos estudos relacionados à história da infância, da criança e da educação infantil nos

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apresentam a grandeza dessas concepções que se interligam com vários aspectos, como a história
da assistência, história da família e da pedagogia (KUHLMANN JÚNIOR, 1998).
No entanto, Kuhlmann Junior (1998) menciona que apesar de importante para que a
Educação Infantil brasileira ocorresse durante um bom tempo (mesmo que de forma contestável
nos moldes atuais) é preciso reconhecer que, especialmente em grande parte do século XX, não
existiam (um tinham muito poucas) instituições designadas à educação da criança. Além disso,
vale ressaltar que tais instituições se preocupavam apenas com questões referentes ao cuidado,
mais tarde é que começaram a ser vistas como instituições de ensino e, sendo assim, “a história
das instituições pré-escolares não é uma sucessão de fatos que se somam, mas a interação de
tempos, influências e temas, em que o período de elaboração da proposta educacional
assistencialista se integra aos outros tempos da história dos homens” (KUHLMANN, 1998, p.
77).
Além disso, a Educação ocorreu por muito tempo como forma de “controle familiar”:

Nos primeiros textos sobre instituições de educação infantil, na transição do Império


para a República, estas foram vistas como um meio de educar as crianças e as mães
pobres. No Rio de Janeiro do início do século XX, o Instituto de Proteção e Assistência
à Infância e o Patronato de Menores, além de creche, ofereciam cursos para as mães.
Para os pobres, a creche seria um meio para promover a organização familiar, e por isso
sempre se colocou como complementar a ela. De certo modo, isso expressa a tradição
colonizadora da catequese jesuítica que previa o recrutamento dos pequenos curumins
como forma de interferir nas culturas nativas. No início da década de 1980, as creches
continuavam, muitas vezes, a ser um meio de interferir na vida familiar, extrapolando o
necessário intercâmbio entre família e instituição (KHULAMNN JUNIOR, 2000, p.
12).

Considerando as primeiras instituições, podemos usar o exemplo da “Roda dos


expostos” que pode ser considerada por muitos historiadores como um marco de assistência a
infância, iniciado no período no período Colonial, mais precisamente na Santa Casa de
Misericórdia, no Rio de Janeiro. Nesse local eram atendidos bebês rejeitados por mães solteiras,
que procuravam se esconder um filho ilegítimo, ou simplesmente doar para adoção aqueles que
pertenciam as famílias de condições precárias e de baixa vulnerabilidade (KHULMANN
JUNIOR, 1998).
O surgimento dessas instituições de acolhimento foi de imensa importância para a
sociedade, pois foi por meio desses espaços que se evitava que muitos bebês fossem abandonados
na rua. A criança passou a ser vista como sujeito de propósitos e necessidades, como objeto de
expectativas e cuidados (pelo menos por essas instituições). Desse modo, o movimento para uma

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Educação Infantil enquanto espaço educacional ocorreu por um movimento bastante lento e no
início era designado apenas às classes mais abastadas, ou seja, a criança que era vista com a
centralidade social era a criança burguesa, os quais tinham mais acesso modernas propostas
pedagógicas (MONARCHA, 1997).
As primeiras propostas de instituições no Brasil acontecem no ano de 1889, quando foi
fundado a primeira Instituição de Proteção e Assistência à Infância, instalado no Rio de Janeiro.
De acordo com Kuhlmann Junior (1998) foi nesse período que começaram as discussões no
Brasil referente a educação da criança. Tais mudanças são perceptíveis a partir das primeiras
décadas do século XX, e foi marcado por inúmeras iniciativas ligadas a projetos de melhorias e
de reconstrução do país, bem como tendo um diálogo ideológico entre a oligarquia rural, pois
essa defendia a escola tradicional e a nova burguesia industrial-urbana, a qual se posicionava a
favor de uma renovação educacional.
Esse discurso passa a ganhar força nesse contexto e foi representado principalmente
pelo movimento de renovação pedagógica conhecido como “Movimento da Escola Nova”1, que
trazia alguns pontos da defesa pela escola pública, laica, obrigatória, com ensino universal e
destinados para meninos e meninas por meio do ampliamento do sistema de ensino. Entre
diversos pontos discutidos pelas propostas dos escola novistas, se encontrava a educação da
criança, tendo o suporte de todo o sistema educacional como base (KHULMANN JUNIOR,
1998).
Essas discussões passaram contribuir de forma significativa para que fossem
consideradas novas formas de se educar a infância brasileira. Trata-se de uma “escola nova”, ou
uma escola que, para Freire (1991) teria outros moldes, visto que “(...) a escola não deveria
trabalhar a criança, no sentido de treiná-la a ser adulta, mas, sim, no sentido de a criança construir
e reforçar as estruturas corporais e intelectuais de que dispõe” (FREIRE, 1991, p. 43).
Ocorre que muitas vezes é exatamente o contrário disso que nos é apresentado: dentro
das instituições as crianças acabam sendo proibidas de fazerem muitas coisas, pois exigem que
elas se tornem cada vez mais submissas e sem o direito de brincar. Aqui, percebemos que muitos

1
O Movimento da Escola Nova foi um movimento de renovação pedagógica que visava superar as formas
tradicionais do ensino. Baseado nos preceitos teóricos de Dewey, a educação deveria ser um dever público e direito
de todos. Os defensores de tal corrente, bastante presente no final do século XIX e primeiras décadas do século XX,
tinham na escola o elemento chave para promoção do equilíbrio social e, dessa forma, esse movimento ocupou-se
do debate relativo às funções da escola pública face às exigências do contexto social e político (SANTOS;
PRESTES; VALE, 2006).

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desses objetivos não são os da “escola nova” propostos em algum tempo de nossa história, mas
como menciona Azevedo (2022), trata-se de ser o objetivo principal a dominação de uma
instituição disciplinadora, que contempla muito mais os pressupostos neoliberais da atualidade.
É perceptível a existência de algumas escolas que não estão preparadas para promover
a autonomia da criança. Mas, isso não é regra geral e existem algumas instituições que pensam
em promover o pleno desenvolvimento das crianças - ressaltamos que é preciso que as
instituições venham a ceder espaços nas suas rotinas para que as crianças possam utilizá-lo em
prol de sua cultura lúdica. Infelizmente, o que temos visto com frequência é o contrário disso.
Tais ocorrências são um constructo histórico, e como considera Foucault (1987), muitas
escolas foram pensadas diante dos movimentos de fábricas, ou seja, que não tinham livre acesso
para suas ações, sendo um local com a proibição e controle de tempo, a abolição de movimentos
e diversos outros aspectos.
Essas escolas trazem diversas marcas ainda hoje, como por exemplo se sentarem em
fileiras um atrás do outro por um longo período e pela distribuição do tempo dos alunos sem o
“tempo livre” para brincar. Vasconcellos (2006) ressalta que por muitas vezes as escolas são
vistas como frias, sem cor. “Desse modo, na escola instrucional, detentora de uma concepção
passiva do indivíduo, não houve (e não há) espaço para a valorização da brincadeira articulada
com uma concepção de aluno como sujeito ativo. (...) Ao contrário, na corrente passiva
instrucional, não há lugar para brincadeiras” (VASCONCELOS, 2006, p. 62).
Com relação a alguns aspectos da história da Educação Infantil no Brasil, Kuhlmann
Junior (1998) nos relata que durante um longo período a Educação de crianças pequenas estava
muito mais associada ao “cuidar” do que ao “educar”. Sendo assim, a higiene, por exemplo,
estava associada aos principais objetivos dessas instituições e era ditada por autoridades da época
como a fonte verdadeira do bem-estar. Dessa forma, a proposta das creches estava ligada ao
projeto sanitário nacional, tendo como objetivo central a preocupação com a alimentação, com
os cuidados de higiene e segurança física, sendo pouco presente voltada ao desenvolvimento
pleno das crianças.
Obviamente, os cuidados com as crianças na Educação Infantil são de suma
importância. Ocorre que pensar apenas em “cuidar” não é mais o suficiente para desenvolvermos
uma criança cidadã. Também é preciso pensar na Educação da criança pequena considerando

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suas especificidades, suas necessidades físicas e sociais, além de promover uma educação
científica.
Além disso, Khulmann Junior (2000) nos alerta que, o discurso assistencialista na
Educação Infantil ainda é muito presente atualmente, visto que a falta de verbas na Educação é
uma realidade e a Educação Infantil acaba sendo uma das mais prejudicadas. O autor menciona
que a própria divisão existente na Educação Infantil não é organizada da maneira como
conhecemos por acaso:

A incorporação das creches aos sistemas educacionais não necessariamente tem


proporcionado a superação da concepção educacional assistencialista. A falta de verbas
para a educação infantil tem até estimulado novas divisões, por idades: apenas os
pequenos, de 0 a 3 anos, frequentariam as creches; e os maiores, de 4 a 6, seriam
usuários de pré-escolas; são várias as notícias de municípios cindindo centros de
educação infantil e limitando o atendimento em período integral. Mas as instituições
nunca foram assim e as creches quase sempre atenderam crianças de 0 a 6 anos, ou
mesmo as com mais idade – excluídas da escola regular ou em período complementar
a esta. De outra parte, sempre existiram pré-escolas apenas para crianças acima de 3 ou
4 anos (KHULMANN JUNIOR, 2000, p. 7).

De acordo com a “Constituição Federal do Brasil” (BRASIL, 1988) a Educação Infantil


é a primeira etapa da Educação Básica. A referida carta magna frisa a importância de a educação
permitir que muitas pessoas tivessem acesso a essa etapa da Educação. Trata-se de uma luta pelo
direito de conquistar os espaços públicos destinados ao atendimento infantil, onde felizmente
passou a ser reconhecido como direito de todos e dever do Estado. A partir do próximo tópico,
discutiremos questões importantes sobre a trajetória percorrida na Educação Infantil Brasileira e
quais documentos foram e são historicamente importantes para entendermos a inserção do corpo
e movimento enquanto conteúdos relevantes da Educação Infantil.

4 DISCUSSÕES SOBRE O CORPO E MOVIMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UM


POUCO SOBRE A TRAJETÓRIA HISTÓRICA CURRICULAR
A primeira infância é caracterizada por diversas mudanças tanto físicas, quanto
cognitivas, motoras e sociais. Isso demarca a importância do desenvolvimento integral das
potencialidades da criança. Nesses aspectos cabe-se a entender que esta fase permite a liberdade
de vivenciar e concretizar objetivos necessários para esse desenvolvimento infantil, visto que
nessa primeira infância a criança não “aprende” ela experimenta possibilitando a autonomia e a
liberdade (BRASIL, 1998).

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Após a promulgação da Constituição, ocorreu outra mudança significativa: a revisão da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, divulgada pela Lei nº 9.394 em 1996 (BRASIL,
1996). A nova LDBEN trazia em seu escopo muitas renovações, entre elas a previsão de
documentos norteadores curriculares que conduzissem, a partir desse momento, os caminhos da
Educação Pública no país.
Sendo assim, com relação à Educação Infantil, o primeiro documento divulgado foram
os “Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil” - RCNEIs (BRASIL, 1998),
divulgado em 1998. Trata-se de um documento construído coletivamente e que, embora tenha
um valor histórico inegável, é preciso mencionar alguns percalços durante sua elaboração.
Segundo Azevedo e Lima (2017), na época de sua elaboração, um grupo de estudos
coordenado pela professora Angela Barreto realizou debates e discussões que resultou em um
parecer técnico a respeito das especificidades da Educação Infantil e que não foi considerado em
sua versão final. Os autores ainda mencionam que houve muitas críticas de especialistas após a
sua divulgação, visto que o documento final transpareceu ser mais um manual de preparação da
criança na Educação Infantil para a escola do Ensino Fundamental.
Essa questão de os RCNEIS (BRASIL, 1998) se parecer mais como um documento
preparador para os anos iniciais do Ensino Fundamental é perceptível pela própria forma como
esse documento está organizado:

Subdivididos por Eixos, com objetivos, conteúdos, orientações didáticas, orientações


gerais para o professor e bibliografia, promovendo assim mais uma “didatização” do
processo de identidade e da ampliação da autonomia, entre outros, do que considerar de
forma mais específica, as necessidades da criança na Educação Infantil (AZEVEDO;
LIMA, 2017, p. 437).

Infelizmente isso também ocorreu em outros momentos em que o objetivo era a


construção de um currículo comum, como na construção da “Base Nacional Comum Curricular”
- BNCC (BRASIL, 2017) e que será abordado aqui mais adiante. Mas, independentemente dessas
polêmicas, é fato que as RCNEIs mencionam a importância do brincar, do corpo e do movimento
na Educação Infantil. Nele, vimos por exemplo que o brincar "(...) é uma das atividades
fundamentais para o desenvolvimento da identidade e da autonomia da Criança" (BRASIL, 1998,
S/P).
Outro documento importante para o percurso curricular na Educação Infantil são as
“Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil” - DCNEIs (BRASIL, 2010).

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Segundo Azevedo e Lima (2017) esse documento expõe a prática pedagógica enquanto promotor
de um desenvolvimento sociopolítico na Educação Infantil.
Entre as proposições, está a de que o brincar é um direito da criança, visto que ele auxilia
no processo de apropriação e renovação dos conhecimentos científicos adquiridos na escola de
Educação Infantil. Sendo assim, a criança tem o direto a “(...) aprendizagens de diferentes
linguagens, assim como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à
dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação com outras crianças” (BRASIL, 2010, p.
18).
Partindo disso, as DCNEIs (BRASIL, 2010) dão orientações para que se chegue a esses
objetivos, e uma das observações feitas pelo documento está o de organizar o espaço pedagógico
de forma a ampliar o repertório de mundo da criança. Ou seja, trata-se de promover o
desenvolvimento da criança por meio dos espaços, materiais diversos e de como o professor
promove a interação de todos esses elementos.
Vale lembrar ainda que as DCNEIs (BRASIL, 2010) trazem uma proposta curricular
que contempla dois eixos principais: as interações e as brincadeiras. Dessa forma, é necessário
que as crianças tenham a garantia de que terão a oportunidade de ampliar o repertório de suas
experiências corporais, por meio de um planejamento realizado pelo professor e pelas instituições
de Educação Infantil.
As DCNEIs (BRASIL, 2010) reconhecem a brincadeira como uma atividade essencial
desde a Educação Infantil e menciona que os conteúdos que compõem sua base têm origem em
várias áreas, entre elas as atividades desportivas e corporais.
Outro documento criado após as DCNEIs foi a “Base Nacional Comum Curricular” -
BNCC, divulgada em sua versão final (apenas para a Educação Infantil e anos iniciais do Ensino
Fundamental) em 2017. Primeiro é preciso mencionar que a BNCC (BRASIL, 2017) é um
documento que possui opiniões controversas e com críticas bastante pertinentes. Luz, Caxiado e
Azevedo (2017) por exemplo, mencionam que a BNCC é contraditória em muitos aspectos e um
deles é o fato dela não se denominar como um “currículo” mas se apresentar dessa forma em sua
grande totalidade. Não há, na visão das autoras, uma promoção de educação crítica, visto que ela
oferece uma proposta de educação por competências, pautados em ideais neoliberais de
Educação.

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Na mesma direção, Cury, Reis e Zanardi (2018) mencionam que a BNCC não reconhece
muitos dos saberes apresentados pelos alunos como importantes, sugere que os professores não
sabem ensinar (já que a BNCC aponta em sua descrição uma necessidade de segui-la à risca para
ensinar as crianças) além de apresentarem sim um currículo “pronto” para ser aplicado. Segundo
os autores, tais concepções apenas reforçam estereótipos e condições sociais e nada promovem
além de uma continuidade para que alunos pobres continuem sendo pobres.
Entretanto, em meio a tantas críticas (e esse trabalho não pretende menosprezá-las), o
brincar é previsto dentro da BNCC, embora de forma tímida e sem reforçar a importância que
essa atividade tem na Educação Infantil. Assim como o ocorrido com as RCNEIs (BRASIL,
1998), a BNCC (BRASIL, 2017) também desconsiderou pareceres técnicos.
Campos e Durli (2020) mencionam que antes da promulgação da BNCC ocorrer, ela
teve 4 versões variando entre momentos em que eram ouvidos especialistas e depois
considerando opiniões de organismos internacionais que não tinham, necessariamente, relações
com a Educação, como por exemplo, o banco Itaú e a Wolkswagen, além do instituto Ayrton
Senna e da fundação Leman. A última versão considerou a visão desses órgãos (com visão
neoliberal de educação para os países subdesenvolvidos) e não de especialistas.
Sendo assim, não é surpreendente que encontremos muitas falhas nesse documento. A
respeito do brincar, percebemos que ele é abordado de forma superficial, visto que a própria
exigência e cobrança com relação à alfabetização das crianças pequenas ocorre na maior parte
das propostas contidas na BNCC:

Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e tempos, com


diferentes parceiros (crianças e adultos), ampliando e diversificando seu acesso a
produções culturais, seus conhecimentos, sua imaginação, sua criatividade, suas
experiências emocionais, corporais, sensoriais, expressivas, cognitivas, sociais e
relacionais (BRASIL, 2017, p. 36).

Aparentemente, trata-se de uma citação muito positiva com relação ao brincar, mas
quando lembramos da cobrança que há dentro desse próprio documento com relação à
alfabetização já a partir da Educação Infantil, é possível pensar: qual o tempo será destinado ao
brincar?
Ainda, a BNCC determina que “por meio das diferentes linguagens, como a música, a
dança, o teatro, as brincadeiras de faz de conta, elas se comunicam e se expressam na junção
entre corpo, emoção e linguagem” (BRASIL, 2017, p. 37). Mesmo abordando tais questões, com

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tantos objetivos em torno de uma alfabetização das crianças pequenas cada vez mais cedo, é
comum surgir a seguinte indagação: como e em quais momentos será possível a criança brincar
dentro das instituições de Educação Infantil?
Trata-se de questionamentos pertinentes e que a priori não há respostas, apenas algumas
percepções sobre a cobrança sofrida pelos professores e pelas crianças sobre como atingir os
objetivos dos referidos “códigos de conteúdos” estabelecidos pelo documento.
É preciso, então, considerar que tais documentos foram todos escritos baseados em
orientações de órgãos como o “Banco Mundial” - BM, a “Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico” - OCDE, a “Organização Mundial de Comércio” - OMC, e a
própria “Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura” - UNESCO
(AZEVEDO; LIMA, 2017).
Sendo assim, quando observamos a falta de consideração pela visão técnica em
documentos curriculares como os RCNEIs (BRASIL, 1998) e a BNCC (BRASIL, 2017) por
exemplo, é perceptível que tais ações estavam em acordo com a lógica neoliberal, e não porque
a Educação Infantil deveria ser uma educação cidadã e crítica.

Isso implica entender que esses mesmos organismos que garantem às crianças o direito
de brincar, de jogar, de participar de um lazer e de ter condições dignas de viver a
infância por meio de muitos documentos e Leis, também exigem de instituições
diretamente ligadas a elas algumas ações para que a Educação caminhe conforme seus
preceitos e objetivos, que diretamente sofre influências diversas advindas das condições
impostas e exigidas por esses mesmos órgãos (AZEVEDO; LIMA, 2017, p. 438).

Portanto, não podemos nos esquecer de que, ao mesmo tempo em que a criança tem
vários direitos, como o de brincar em contextos educacionais, as escolas de Educação Infantil
também já são cada vez mais pressionadas na lógica neoliberal que seguem objetivos da
economia capitalista mundial que, por sua vez, é sustentada por muitos organismos multilaterais.

Trata-se de uma perspectiva em que a Educação deve ser pautada na ideia de que o
capital humano (quantidade ou grau de educação e de qualificação tomado como
indicativo de um volume de conhecimentos) é essencial para a potencialização da
capacidade de produção (AZEVEDO; LIM, 2017, p. 439).

Entretanto, os anseios sobre a relação com o corpo e movimento não são recentes dentro
da Educação Infantil. A educação corporal é discernida desde as primeiras sistematizações
pedagógicas e no Brasil surgem algumas preocupações principalmente a partir do século XIX.

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Porém, sabe-se que desde então houve inúmeros avanços a partir dessa temática (AZEVEDO,
2022).
A cultura corporal busca ampliar o repertório de habilidades motoras na educação
infantil. Está elencada na historicidade humana preservando as particularidades da escola e do
trabalho do professor na mediação do conhecimento. Assim, torna-se possível formar um
indivíduo, como sujeito histórico, crítico e consciente da sua realidade social (AZEVEDO, 2022).
Sabe-se que nos primeiros meses da vida de uma criança o corpo passa a ser explorado
por ela, pois é a partir daquele momento que, por meio da sua corporeidade, passam a se
expressar, percebendo os sentidos. Além disso, Azevedo (2022) cita sobre a importância de
reconhecer as crianças como um sujeito social, ou seja, como protagonista nos locais em que ela
está inserida.
Sabemos que atualmente vivemos em uma sociedade que, de certa forma, fere com as
ações das crianças, como deixar de participar de atividades ou até mesmo não poder ir ao recreio,
privando-as dos direitos do movimento dentro de muitas instituições (AZEVEDO, 2022;
MOREIRA, 2014).
Nesse sentido, Goellner (2003) cita que:

O corpo é uma construção sobre a qual são conferidas diferentes marcas em diferentes
tempos, espaços, conjunturas econômicas, grupos sociais, étnicos, etc. Não é, portanto,
algo dado a priori nem mesmo é universal: o corpo é provisório, mutável e mutante,
suscetível a inúmeras intervenções consoante o desenvolvimento científico e
tecnológico de cada cultura bem como suas leis, seus códigos morais, as representações
que cria sobre os corpos, os discursos que sobre ele produz e reproduz. (GOELLNER,
2003, p. 28)

Independente da época e das circunstâncias ocorridas na vida de cada criança, todas de


certa forma brincaram em algum momento. Sabe-se que antigamente as crianças não tinham
acesso a diversos brinquedos sem contar que muitos não tinham condições de comprar, mas
muito inventavam com o que encontrava (AZEVEDO, 2022).
Segundo Freire (1982), “brincar possibilita estabelecer relações: e as relações são
sempre transformadoras”. Em uma perspectiva pela Educação Física na Educação Infantil, Freire
(1989) cita a importância de o lúdico estar cada vez mais presente nas escolas de Educação
Infantil: “Creio, na minha parte, que todas as propostas sérias de desenvolvimento poderiam ser
realizadas dentro do jogo, aproveitando seu caráter lúdico”. (FREIRE, 1989, p. 76).

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A educação infantil atualmente tem uma nova visão, em que tem buscado ações
educativas que possam ser direcionadas na prática para as crianças pequenas - visão essa que, de
certa forma, tende a estimular plenamente o desenvolvimento infantil. Porém, ainda se predomina
no cuidado ao invés da educação e se tratando com o corpo infantil, as crianças dessa faixa etária
tem uma falta de compreensão de como e de que maneira o corpo se relaciona com a
aprendizagem (FREIRE, 1989).
De acordo com Moreira (2014) a capacidade imaginativa humana pode ser entendida de
diversas maneiras e sua importância para o desenvolvimento é explicada por diferentes áreas do
conhecimento. Outro ponto importante é a concepção predominante de que na infância a
imaginação tem um papel essencial, de que representa uma manifestação particular.
As crianças são vistas diversas vezes como indivíduos que estão sempre fantasiando,
por ainda não entenderem a ordem normativa e lógica das coisas ao seu redor como os adultos.
De fato, a imaginação tem um papel importante na infância. Por meio da linguagem imaginativa
da criança é estabelecida uma conexão singular com a realidade que possibilita a compreensão
dos acontecimentos e avança a partir da interação com o coletivo, com as tradições, aos quais são
concedidos alternativas, devaneios e ideais (MOREIRA, 2014).
Na mesma direção, Sarmento (2005) menciona outras características infantis a serem
consideradas:

[...] a infância não é a idade da não-fala: todas as crianças, desde bebês, têm múltiplas
linguagens (gestuais, corporais, plásticas e verbais) por que se expressam. A infância
não é a idade da não-razão: para além da racionalidade técnico-instrumental,
hegemônica na sociedade industrial, outras racionalidades se constroem,
designadamente nas interacções entre crianças, com a incorporação de afectos, da
fantasia e da vinculação (SARMENTO, 2005, p.25).

A imaginação permite outras opções para a realidade, as histórias podem ter diferentes
desfechos, os ambientes podem ser ainda mais surpreendentes. Embora a imaginação faz parte
da constante transformação da criança, com o tempo passa a evoluir, diante das experiências,
através dos desafios. Tanto as crianças como os adultos são seres imaginativos, mesmo que na
infância a imaginação tende a ser mais intensa (SARMENTO, 2005).
A imaginação infantil torna-se, assim, um importante recurso para a compreensão da
criança como sujeito social, sendo também a fantasia uma das formas de observar como as
crianças se apropriam, dão novos significados e criam cultura. As expressões particulares

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convidam a uma exploração mais profunda do universo infantil, buscando entender a infância
pela perspectiva das próprias crianças, é fundamental levar em conta as fantasias que elas criam,
pois essas representam manifestações significativas (SARMENTO, 2005).
Moreira (2014) considera a linguagem imaginativa enquanto variação e diversidade do
corpo em ação no mundo, como por exemplo: cantar, dançar, sorrir, chorar, correr, silenciar.
Dessa forma, aperfeiçoar tempos e espaços, na materialidade que é importante para a imaginação,
propiciando experiências significativas que colaborem com a liberdade experimental das
crianças.
Por fim, é preciso considerar que a criança na educação infantil é uma criança lúdica,
que se movimenta, que busca o corpo e o movimento em todos os locais em que ela está. Cabe à
escola de Educação Infantil proporcionar por meio dos seus tempos, espaços e materiais
momentos para que a educação por meio do Corpo e Movimento aconteça.
Independente de todo o contexto histórico buscado para entender muita coisa que ainda
acontece nas escolas de Educação Infantil, não se pode negar um direito que tem sido
negligenciado às crianças dessa etapa da educação brasileira: o direito de brincar, de jogar, de se
relacionar com seus pares, de produzir uma cultura lúdica e de perpetuar suas culturas por meio
das relações ocorridas em vários locais e, especialmente, nas escolas de Educação Infantil.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A temática “Corpo e Movimento na Educação Infantil” possui grande relevância quando
pensamos no processo de ensino e aprendizagem das crianças pequenas. No entanto, pela análise
realizada dos documentos normativos curriculares, foi identificado que a temática está lá, mas
sem garantias de que ela possa ter condições de se fazer presente em muitas escolas de Educação
Infantil.
Primeiro devido à própria trajetória de construção dos RCNEIS e da BNCC, que não
contemplou um olhar técnico à época de sua construção. Preferiu-se, em suas versões finais, dar
prioridade para órgãos ligados ao Banco Mundial e à UNESCO, por exemplo, o que acabou por
se contemplar a ótica capitalista também na Educação, ou seja, a priorização do preparo para o
mercado de trabalho desde a Educação Infantil.
Segundo, pois nessa lógica de preparo das crianças pequenas para os anos iniciais do
Ensino Fundamental, demonstrado, por exemplo, por meio da pressão pela alfabetização, pouco

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tempo sobra às crianças para que elas usem os recursos do corpo e do movimento nas escolas de
Educação Infantil. Sendo assim, muito ainda temos que caminhar para que o brincar e o se-
movimentar aconteçam enquanto direito adquirido pelas crianças.
No entanto, é preciso mencionar que a imaginação, o brincar, o corpo e o se-movimentar
na Educação Infantil oferecem às crianças pequenas a oportunidade de experienciar ações que
ela ainda não pode exercer e acaba por desenvolver estruturas sociais, motoras e cognitivas que
usarão para todo e qualquer tipo de aprendizagem, e isso inclui os conteúdos do currículo escolar.
A cultura corporal, então, promove tais habilidades, ampliam seu repertório social,
contemplam interações entre pares e oferecem oportunidades reais de aprendizagem às crianças
que vão muito além daqueles inseridos por meio de códigos em avaliações institucionais, visto
que as brincadeiras postergam memórias em um local que não deveria ser passível de medições
institucionalizadas: dentro das crianças.

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