NOTÍCIAS DE ALVERCA

OUTUBRO 2008 REPORTAGEM 07

Paula Atouguia*
É urgente cativar!

Opinião
INSATISFEITOS.
Os encarregados

de educação dos
alunos da “escola
do campo da
bola” exigem me-
lhores condições
na escola “pro-
visória” Infante
D. Pedro
J
á perdi a conta às vezes que li e reli um dos meus livros preferidos: “O
Principezinho.” Muito resumidamente, Saint-Exupéry conta-nos a história
de um menino que saiu do seu pequeno planeta para conhecer o mundo dos
adultos. Fala-nos do poder, da ambição, da vaidade, da avareza, da mentira e da
“tonteria” disto tudo. Fala-nos também da amizade e do amor.
Adoro especialmente aquela parte em que o Principezinho aprende, em conversa
com a raposa, que ter um amigo é cativar e que cativar é criar laços. Acerca dos
laços, diz a raposa: “Só se conhecem as coisas que se cativam. Os homens já não
têm tempo para conhecer o que quer que seja. Compram coisas feitas nos co-
merciantes. Mas como não existem comerciantes de amigos, os homens já não

Pais exigem obras têm amigos. Se queres ter um amigo, cativa-me!”

Cativar exige tempo, paciência, compreensão, respeito, entreajuda e amor, sem
julgamento ou crítica. Exige diálogo, olhos nos olhos. E em regra o que faze-

prometidas pelo município mos?! Conhecemos, usamos e deitamos fora, em função dos nossos interesses e
necessidades, numa atitude profundamente egoísta e de preferência à distância.
A uma velocidade cada vez mais alucinante, corremos de um lado para o outro
e coleccionamos centenas de contactos, que estão à nossa disposição à distância

A
na Luísa, mãe da pequena Cata-
rina, de sete anos, já perdeu o
sono, preocupada com o bem-
-estar diário da sua filha na escola que esta
actualmente frequenta. Ela e muitos outros
encarregados de educação dos alunos da
“escola do campo da bola”, transferidos
provisoriamente durante este ano lectivo
para a recém-desactivada Escola Se-
cundária Infante D. Pedro, em Alverca,
protestaram de forma veemente, durante
a última assembleia de freguesia, contra a
alegada falta de condições higieno-sa-
nitárias que reina naquele estabelecimento
de ensino.
Recordamos que a Escola Básica do 1.º
Ciclo n.º 2 e Jardim-de-Infância n.º 4 de
Alverca funcionaram durante muito
tempo junto ao campo pelado do FCA,
mas esse equipamento vai agora entrar em
obras de recuperação e ampliação (a cargo
do município vila-franquense), durante
um ano, tendo a solução encontrada sido
a de colocar as crianças num estabeleci-
mento já de si (muito) carente de equipa-
mentos. “É lamentável terem metido
numa escola com 40 anos, desde sempre
considerada provisória, miúdos entre os
três e os oito anos de idade”, referiu Paulo
Caldeira, dando uma “mão cheia” de
exemplos de coisas que alegadamente
funcionam mal, a começar pelas casas de
banho.
À conversa com o “NA”, Ana Luísa afi-
ança, por seu turno, que, na parte dos ra-
pazes, existe “apenas uma sanita, para
adultos e a descoberto”; ao passo que para
as meninas existem “três ou quatro sanitas,
mas sem resguardo, sem quaisquer
condições de higiene”. Para piorar a situ-
ação, “não há sequer papel higiénico e as
crianças chegam ao ponto de reter as ne-
cessidades fisiológicas para evitarem ir à
casa de banho”. Entretanto colocaram-se
ali WC’s portáteis, similares aos utilizados
nos concertos, mas foram encerrados por
recomendação das autoridades sanitárias,
“dado que se destinam a pessoas mais ve-
lhas”, confirma Teresa Galhardo, delegada
de saúde pública do concelho de Vila
Franca de Xira.
Logo no início desta assembleia, no
período destinado às intervenções das
várias bancadas, o eleito da CDU, Nuno
Ramos, chamou a atenção para este pro-
blema. “Aquele espaço é perigoso para as
crianças, não existem equipamentos de
lazer e a segurança é deficitária; a escola é
um autêntico labirinto.” Entre as críticas
contam-se ainda a falta de iluminação (ar-
tificial) condigna nas salas de aula, a
ausência de um plano de emergência (de
evacuação) da escola e o perímetro exte-
rior (muito) degradado – “nas traseiras
(onde actualmente se fazem as entradas e
saídas das crianças) há pais que já viram
ratazanas a passar”, adverte Ana Luísa,
criticando também a ausência de
condições no refeitório (que funciona no
espaço do antigo bar).
Na resposta, o presidente do executivo,
Afonso Costa, lamentou a situação mas
garantiu que no ano lectivo 2009/2010 os
alunos regressarão à escola do campo da
bola. Até lá os pais (des)esperam pelas
obras de adaptação da Infante D. Pedro,
prometidas pela Câmara Municipal para
Agosto último. “Nada foi feito, à ex-
cepção de terem cortado o mato que havia
nas traseiras.”
Portão principal
passará a ser
utilizado
Confrontada com estas críticas, a
vereadora com o pelouro da Educação,
Conceição Santos, apontou vários aspec-
tos que a edilidade procurou colmatar
desde logo. “Fizeram-se algumas inter-
venções ao nível da parte eléctrica das
salas. Quanto às instalações sanitárias,
foram revistas e substituídos os autoclis-
mos.”
A responsável acrescenta, no entanto, que
os eventuais melhoramentos a serem rea- de uma tecla ou telefonema. Esperamos ansiosamente pelas mensagens que nos
lizados a curto prazo, nomeadamente ao distraem de um vazio existencial e, caso não cheguem ou não venham ao nosso
nível das casas de banho, “nunca serão de gosto, não faz mal; descartamos e passamos ao seguinte. Afinal de contas, estes
grande amplitude, pois esta é uma situação “amigos” são como um livro de bolso: cabem em qualquer lugar e estão sempre
transitória”. Mas afirma que haverão me- à mão para qualquer eventualidade.
lhorias: “Vamos instalar sanitas onde hoje Para cativar é preciso ser-se humilde e corajoso. Estaremos nós na disposição de cativar?
existem pias. Quanto ao pré-escolar, ficou
determinado que estas crianças iriam a um * Assistente Social, paulaatouguia@yahoo.com
conjunto específico de casas de banho,
sempre acompanhadas por educadoras e
auxiliares.” Acerca do refeitório, “alargá-
mos o espaço do antigo bar, deitando pare-
des abaixo, pelo que está a funcionar
normalmente com seis tarefeiras a dar
apoio permanente aos alunos”.
A edil sustenta, por fim, que as questões
da segurança estão salvaguardadas, pois
existem “18 auxiliares de acção educativa
para cerca de 300 crianças”; quanto aos
equipamentos de lazer, “serão ali monta-
dos brinquedos, ou seja, haverá uma zona
recreativa em condições”. No futuro, as
entradas e saídas vão passar a ser feitas
pela porta principal (junto à Avenida In-
fante D. Pedro). “Fez-se uma consulta aos
pais e a maioria deles deseja essa situação.
Vamos agora colocar guarda corpos
naquele corredor para impedir que as cri-
anças vão para a estrada, assim como
preparar a zona da portaria e as fun-
cionárias para ajudarem os alunos a atrav-
essar a estrada. De qualquer forma, é uma
solução em relação à qual coloco algumas
reticências, uma vez que estamos perante
uma via de intensa circulação automóvel,
ao passo que nas traseiras, junto ao pavi-
lhão municipal, o espaço é mais desafo-
gado.”
Conceição Santos assegura que, daqui por
um ano, as crianças já estarão na renovada
escola do campo da bola: “É uma obra de
grande dimensão que, salvo eventuais im-
ponderáveis, estará pronta dentro de um
ano.” Mas Ana Luísa não crê nestas
palavras: “A minha filha entrou agora para
a segunda classe e estou convicta que fará
ali o quarto ano.”
MC