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Sobre o ouvir Rubem Alves

O ato de ouvir exige humildade de quem ouve. E a humildade est nisso: saber, no com a cabea mas com o corao, que possvel que o outro veja mundos que ns no vemos. Mas isso, admitir que o outro v coisas que ns no vemos, implica reconhecer que somos meio cegos... Vemos pouco, vemos torto, vemos errado. Bernardo Soares diz que aquilo que vemos aquilo que somos. Assim, para sair do crculo fechado de ns mesmos, em que s vemos nosso prprio rosto refletido nas coisas, preciso que nos coloquemos fora de ns mesmos. No somos o umbigo do mundo. E isso muito difcil: reconhecer que no somos o umbigo do mundo! Para se ouvir de verdade, isso , para nos colocarmos dentro do mundo do outro, preciso colocar entre parntesis, ainda que provisoriamente, as nossas opinies. Minhas opinies! claro que eu acredito que as minhas opinies so a expresso da verdade. Se eu no acreditasse na verdade daquilo que penso, trocaria meus pensamentos por outros. E se falo para fazer com que a aquela que me ouve acredite em mim, troque seus pensamentos pelos meus. norma de boa educao ficar em silncio enquanto o outro fala. Mas esse silncio no verdadeiro. apenas um tempo de espera: estou esperando que ele termine de falar para que eu, diga a verdade. A prova disto est no seguinte: se levo a srio o que o outro est dizendo, que diferente do que penso, depois de terminada a sua fala eu ficaria em silncio, para ruminar aquilo que ele disse, que me estranho. Mas isso jamais acontece. A resposta vem sempre rpida e imediata. A resposta rpida quer dizer: No preciso ouvi-lo. Basta que eu me oua a mim mesmo. No vou perder tempo ruminando o que voc

disse. Aquilo que voc disse no o que eu diria, portanto est errado...

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