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AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOCENTE

Suspensão do processo de avaliação do desempenho docente

O documento que a seguir se reproduz é o resultado da Reunião Geral de Docentes do


Agrupamento realizada no passado dia 3 de Novembro, pelas 18h 30m.

Para além do documento dirigido à senhora Ministra da Educação, do qual será dado
conhecimento a outras estruturas do Ministério, foi produzido e subscrito um segundo
documento dirigido a diferentes individualidades, nomeadamente:
Exmo. Senhor Presidente da República Portuguesa
Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República Portuguesa
Exmo. Senhor Primeiro Ministro
Exmo. Senhor Procurador-Geral da República Portuguesa
Exmo. Senhor Provedor de Justiça
Exmos. Senhores Presidentes dos Partidos Políticos com assento na Assembleia da República
Exmo. Senhor Presidente do Conselho Científico para a Avaliação de Professores
Exmo. Senhor Director Regional de Educação de Lisboa e Vale do Tejo
Exma. Senhora Presidente da Comissão de Avaliação do Desempenho Docente do AVELT
Exmo. Senhor Presidente da União das Associações de Pais e Encarregados de Educação do AVELT
Exmo. Senhor Presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais
À Plataforma Sindical
À Comunicação Social

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Exma. Senhora Ministra da Educação

Após várias tentativas frustradas para proceder à implementação do Processo de


Avaliação Docente, que se apresentou como manifestamente inexequível, os professores
do Agrupamento Vertical de Escolas de Luísa Todi, sito no Concelho e no Distrito de
Setúbal, reunidos no dia três de Novembro último, deliberaram subscrever os
considerandos e as questões que ora apresentam, o que fazem nos termos e para os
efeitos do artigo 5º, do Decreto-Lei nº 15/2007, de 19 de Janeiro.

A – A avaliação do desempenho docente não pode basear-se em modelos imperfeitos,


definitivamente injustos, em que, referindo a título de exemplo, profissionais de áreas
curriculares com práticas distintas são avaliados com base em pressupostos
quantificados idênticos ao mesmo tempo que, em outras situações, pesa de forma
acrescida uma avaliação externa determinada pela força de resultados comparados numa
dimensão nacional e levados em linha de conta na avaliação de cada um dos docentes.

B – Por outro lado, existem itens em que o Corpo Docente é perfeitamente impotente
que, no entanto, contam neste Modelo para a sua avaliação, nomeadamente as taxas de
abandono escolar, o que, para além de prosaico, se revela impossível de mensurar, pois
não está nas mãos dos professores controlar toda uma panóplia de factores sócio-
culturais e familiares dos discentes, pelo que é totalmente absurdo assumirem o ónus de
realidades que os transcendem.
C – A desigualdade de condições existentes nas diversas escolas, quer a nível da
disponibilidade de equipamentos, quer a nível da distribuição de alunos, coloca em
causa o rigor exigido em qualquer processo avaliativo.

D – Os docentes não podem aceitar os critérios previstos no diploma visando dividir


uma carreira em duas, professores titulares e professores, valorizando-se a ocupação de
cargos em detrimento do desempenho e da competência técnico-pedagógica e científica
do trabalho com os alunos.

E – A introdução da componente percentagens e quotas subverte qualquer conceito de


avaliação objectiva. Tal factor, no entender dos docentes, introduz, no modelo, uma
variável que não tem qualquer suporte pedagógico--didáctico, antes reflecte, desde logo,
um factor desestabilizante e injusto. Qualquer sistema de avaliação baseado em quotas e
percentagens pré-definidas só pode querer induzir `a priori resultados ou justificar
medidas de carácter administrativo e economicista.

F – Uma leitura e uma análise cuidadas permitem concluir que o modelo incita à
manipulação dos resultados da avaliação, gerando nas escolas situações de profunda
injustiça e parcialidade. Os professores não tiveram quotas ou percentagens enquanto
foram estudantes e quando fizeram os seus estágios, assim como não submetem os seus
alunos a uma avaliação baseada em quotas e percentagens. Por quê, então, a introdução
desta variável? Que conceito ou teoria pedagógica a sustenta?

G – Os docentes não concordam com o desencadeamento de relações de melindre entre


avaliados e avaliadores uma vez que é de forma meramente arbitrária e circunstancial
que se assumem as funções que determinam que se avalia hoje o colega que nos avaliará
amanhã.

H – É anti-democrático impor uma autoridade cega às escolas, da mesma forma que é


anti-pedagógico e contraproducente a recém-determinada inexistência de alunos com
necessidades educativas especiais, “desassinalados” por decreto e, por isso,
frequentando agora turmas com um elevado número de alunos, impedindo que seja
assegurada a estas crianças e jovens uma oferta educativa de qualidade o que, na prática,
se traduz num claro acto discriminatório e inconstitucional.

I – O modelo apresenta-se, como se tem vindo a perceber na prática, como utópico,


destacando-se mais pela sua marca burocrática e pela panóplia de procedimentos que
exige aos docentes, quase todos eles incompatíveis com a função primeira do professor
que é ensinar, uma vez que lhe retira tempo precioso que interessa dedicar aos alunos,
obrigando-o a concentrar-se na redacção de relatórios disto e daquilo e no delineamento
de estratégias daquilo e disto, numa situação de clara substituição das funções de outros
agentes técnicos em falta nas comunidades educativas para que seja efectivo o combate
ao abandono e ao insucesso escolares.
J – O modelo de avaliação do desempenho agora imposto desorganiza e desestabiliza as
escolas, o que nos leva à defesa da necessidade de se instituir um modelo alternativo
capaz de avaliar, de forma séria, concisa, clara e eficaz, as práticas docentes,
promovendo o sucesso profissional e o sucesso educativo em alternativa a este modelo
baseado em documentos que se justificam a si próprios, visando apenas alimentar o
protagonismo e a agenda dos actores políticos com vista agradar a uma opinião pública
manipulada pela propaganda populista, à semelhança do que alguns fazem quando da
crítica generalizada à acção dos agentes políticos ou de outros grupos profissionais.

L – Os docentes não podem ser tratados como fantoches no espectáculo da apresentação


de taxas de sucesso induzidas com o intuito de nos aproximarmos de uma virtual
realidade europeia.

M – Os docentes do Agrupamento lamentam, ainda, que alguns não valorizem, em


nome de uma gestão sustentável de recursos, as toneladas de papel que se vão gastar e a
consequente agressão ambiental resultante da implementação do modelo de avaliação
do desempenho docente.

Contudo, a boa postura profissional, caracterizada pelo elevado sentido de


responsabilidade que nos norteia, leva-nos a colocar um conjunto de questões cujas
respostas se consideram determinantes para o desenvolvimento do processo, a saber:

1 – Como garantir que o modelo agora em vigor, obrigando de forma incontornável ao


preenchimento de um excessivo número de fichas com base em um sem número de
indicadores, não se transforme num monstro burocrático que vai ensombrando já a
dinâmica do Agrupamento Vertical de Escolas Luísa Todi?

2 – Qual a legitimidade de implementação de um modelo que, obrigando os professores


a desdobrar-se em múltiplas tarefas, lhes retira tempo precioso para o necessário
desenvolvimento do trabalho pedagógico e acompanhamento dos alunos, subvertendo,
assim, a essência do seu trabalho, que é ensinar?

3 – Dada a incongruência do diploma, fundamento de muita contestação, quem pode


garantir que o modelo não se constitui como mais uma “reforma” entre tantas outras
que, de uma forma ou de outra, contribuíram para a instabilidade da acção das escolas e,
consequentemente, para o que agora alguns pretendem identificar como o insucesso que
caracteriza a oferta pública educativa?

4 – Como explicar as quotas de progressão na carreira definidas à margem de cada


escola, claramente estranguladoras do trabalho cooperativo, quiçá ofendendo a própria
letra do Estatuto da Carreira Docente, num modelo que se anuncia como uma mais-valia
pessoal e profissional promotora da construção de uma oferta educativa de excelência?
5 – Como legitimar a subordinação da avaliação do desempenho do docente ao sucesso
e ao abandono escolar quando se reconhece o quão determinante assume ser neste
processo a realidade social, económica e cultural dos alunos e quando estas escapam ao
controlo da responsabilidade e vontade dos professores?

6 – Por que razão estando envolvidas no processo educativo entidades do poder local e
nacional, supostamente parceiras das entidades escolares, pais e encarregados de
educação, alunos e professores só aos últimos são exigidos deveres e se cobram
resultados?

7 – Uma vez que é evocado o rigor científico do processo de avaliação do desempenho


docente, como resolver a avaliação de docentes de diferentes áreas disciplinares quando
os avaliadores têm formação científica e técnica dispare?

8 – Como assegurar uma avaliação equitativa face às desigualdades resultantes da


heterogeneidade que a acção docente determina: professores que têm alunos de apoio
educativo e professores que os não têm; professores que só trabalham com alunos de
apoio educativo; professores de disciplinas sujeitas a avaliação externa e de outras que o
não são; professores de disciplinas que pela suas especificidades, têm mais ou menos
probabilidades de sucesso dos alunos; professores cuja possibilidade de desempenhar
certas funções lhes trará eventuais benefícios e outros impossibilitados de as
desempenhar por razões que lhes são alheias?

9 – Como justificar que não se trata de um erro grosseiro o facto de docentes serem
avaliados com base nos resultados dos seus alunos assumindo-se, tanto quanto parece
deduzir-se da leitura do Código do Procedimento Administrativo, como parte
interessada no seu próprio acto avaliativo? E já agora como garantir o mesmo em
relação ao acto avaliativo do professor avaliador? Será que não estamos perante
situações de claro conflito de interesses?

Admitindo que, porventura, se possa entender as questões anteriores merecedoras de


resposta em fóruns de âmbito mais específico, não queremos perder a oportunidade para
também apresentar algumas questões que, indubitavelmente, se podem considerar de
carácter mais técnico:

10 – Como ultrapassar a falta de regulamentação relacionada com a avaliação de


docentes em situações excepcionais não contempladas no Decreto Regulamentar nº
2/2008, de 10 de Janeiro?

11 – O período de avaliação dos professores é de 2 anos civis; o mandato das Comissões


Coordenadoras da Avaliação Docente é de 2 anos lectivos. Significa isto que uma
Comissão Coordenadora da Avaliação Docente acompanha o desenvolvimento do
trabalho dos professores durante 20 meses passando o mandato para uma nova
Comissão Coordenadora da Avaliação Docente em Agosto, tendo esta última a
responsabilidade de avaliar o trabalho dos professores que apenas acompanhará durante
4 meses. Como resolver esta incongruência?

12 – Para quando a regulamentação de questões relacionadas com a avaliação de


docentes em situações excepcionais não contempladas no Decreto Regulamentar nº
2/2008, de 10 de Janeiro? Como proceder nas situações de docentes em ausência por
doença, por um período prolongado (por exemplo, situações de gravidez de risco)?
Como proceder nas situações de licença de parto, quando o tempo de licença coincide
com o período de definição de objectivos e de observação de aulas? Como proceder no
âmbito das funções de avaliador, principalmente no caso do 1º Ciclo do Ensino Básico
quando existe incompatibilidade de horários entre avaliadores e avaliados, não sendo de
todo possível compatibilizar o calendário de observações de aulas sem prejuízo da
componente lectiva do docente avaliador?

13 – Se um dos factores de avaliação é o esforço feito para não faltar, onde se garante
que os referidos docentes não serão penalizados?

14 – Como exercer funções de avaliação, no caso das delegações de competências, sem


os docentes avaliadores terem passado por qualquer processo de formação no âmbito da
supervisão em avaliação?

15 – Quem custeia as deslocações dos docentes avaliadores a outras escolas do


Agrupamento, algumas fora da cidade, no cumprimento das suas funções de
observação, no âmbito da avaliação docente?

16 – Quando se processa a transição de escalão dum docente que perfaz o tempo de


permanência no escalão numa fase intermédia do processo de avaliação docente?

17 – Como pôr em prática, nomeadamente no caso do 1º Ciclo do Ensino Básico, o


enunciado dos pontos 6 e 7, do artigo 29º, do Capítulo III, do Decreto Regulamentar nº
2/2008, de 10 de Janeiro, “Pode ser considerada na avaliação do coordenador do
departamento curricular a avaliação realizada pelos docentes do correspondente
departamento quanto às respectivas funções de coordenação, em termos a definir no
Regulamento Interno”, quando a maioria dos docentes não conhece directamente o
trabalho desenvolvido pelo Coordenador, no desenvolvimento das suas funções?

18 – Como pode a Comissão Coordenadora da Avaliação Docente exercer as


competências que lhe são atribuídas no âmbito da validação das classificações de
Excelente, Muito Bom ou Insuficiente se, no quadro da calendarização definida de
acordo com o artigo 22º, do Secção III, Capítulo II, este se desenvolve já no decurso do
ano lectivo 2009/2010, tendo todos os seus elementos cessado funções como
Coordenadores de Departamento com assento no Conselho Pedagógico? A sua
coordenadora, nomeadamente, já não será, à data, Presidente do Conselho Pedagógico,
cargo que será então, de acordo com o Decreto-Lei nº 75/2008, de 22 de Abril, por
inerência, ocupado pelo Director do Agrupamento.
19 – Também a avaliação efectuada pela direcção executiva fica comprometida a meio
do processo, pela implementação do novo modelo de gestão segundo o qual, os
avaliadores, neste contexto, poderão já não exercer funções de gestão. Como
desenvolver uma função inerente a um cargo que já não desempenham?

20 – Com a implementação do novo modelo de gestão, vão existir alterações às


estruturas intermédias, nomeadamente aos Departamentos Curriculares, perdendo
algumas delegações de competências a sua validade, no meio do processo de avaliação.
Como proceder então?

21 – Como proceder, ainda, quando um docente avaliador ou avaliado muda de


estabelecimento de ensino, por concurso nacional, no decurso do calendário de
avaliação?

22 – No caso da adaptação do calendário de avaliação aos docentes contratados por


período superior a 6 meses, como assegurar as mesmas garantias de reclamação e
recurso, sem prejuízo da adequação da etapa da auto-avaliação, obedecendo ao
imperativo de conclusão do seu processo de avaliação até 20 dias antes do final do
contrato, assegurando a eventual renovação deste? (pontos 1 e 3, do artigo 28º, do
Capítulo III, do Decreto Regulamentar nº 2/2008, de 10 de Janeiro).

23 – Como pode ser tão importante a avaliação para a contratação no ano lectivo se a
mesma só é oficializada de acordo com calendário em Dezembro, enquanto que os
contratos cessam a 31 de Agosto?

Face ao exposto, interessa informar V. Exa. de que, até ao cabal esclarecimento das
questões agora identificadas, os subscritores consideraram adequada a suspensão dos
procedimentos relativos ao processo de avaliação no seio deste Agrupamento.

Certos da melhor atenção, apresentam-se cumprimentos.

Setúbal, 3 de Novembro de 2008

Os docentes do Agrupamento Vertical de Escolas Luísa Todi, Setúbal

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