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Lusíadas e mensagem

o paralelo…
Da leitura d’Os Lusíadas ressalta […] a busca de uma solução real
para reverter a situação da pátria; dos poemas de Mensagem, ressai,
intensificada no poema final, “Nevoeiro”, a proposta de uma solução
não mais de dimensão humana, mas transcendente.

C. Berardinelli, “Os Lusíadas e Mensagem: um jogo intertextual”, 2000

A comparação entre Os Lusíadas e a Mensagem impõe-


se pelo próprio facto de esta ser, a alguns séculos de
distância e num tempo de decadência, o novo canto da
pátria portuguesa.

Silvina Rodrigues Lopes, “Apresentação Crítica”,


Mensagem de Fernando Pessoa, Lisboa: Editorial Comunicação, 1986
Luís Vaz de Camões
 1546: Vasco da Gama parte de Lisboa para a viagem de
descobrimentos.

 1552: conflito com Gaspar Borges; vai preso por conta disso, mas é
solto após mandar uma carta com as suas desculpas ao nobre.

 Vai para o Oriente a serviço do rei de Portugal.

 Visitou Goa (1555) e Macau (1558) sendo nomeado Provedor-Mor


de Defuntos e Ausentes.

 Acusado de irregularidades volta, preso, para Goa a fim de


justificar-se.
 1570: Camões está de novo em solo pátrio, trazendo
consigo o manuscrito d’Os Lusíadas.

 1571: obtém licença da Inquisição para publicar a obra,


o que aconteceu no ano seguinte, em 1572. Meses
antes, lera o poema a D. Sebastião.

 Morre a 10 de Junho de 1580.


Os Lusíadas
 Publicado em 1572, com o auxílio de D.
Sebastião, do qual recebeu uma tença anual.
 Insere-se no movimento Classicista.
 Marca o início da Era Moderna da Língua
Portuguesa.
 Relata os descobrimentos portugueses e exalta
tanto a nobreza quanto os feitos do país.
“Os Lusíadas” – Uma epopeia
 Um poema épico, ou Epopeia, é uma longa narrativa em verso,
de carácter heróico, baseada em factos históricos, lendários ou
mitológicos, protagonizada por um herói.

 A epopeia teve a sua origem na literatura grega e foi continuada


na literatura romana.

 As epopeias mais célebres dessas literaturas são a “Odisseia” e


a “Ilíada” de Homero, e a “Eneida” de Virgílio.
“Os Lusíadas” – Estrutura interna
Proposição O poeta indica o assunto da epopeia.
Canto I
Estrofes 1 a 3
Invocação O poeta pede ajuda e inspiração às Tágides
Canto I (ninfas do Tejo; Calíope e Ninfas do Tejo e do
Mondego).
Estrofes 4 e 5
( Mais três invocações ao longo da
epopeia – Cantos III, VII e X)
Dedicatória O poeta dedica “Os Lusíadas” a D. Sebastião.
Canto I
Estrofes 6 a 18
Narração Narração em vários planos (Plano da Viagem,
De estrofe 19 do Canto I Plano Mitológico; Plano das Considerações do
até ao fim da obra Poeta e Plano da História de Portugal
(encaixado no plano da viagem).
“Os Lusíadas” – estrutura externa

 10 cantos (com número variável de estrofes);


 1102 estrofes;
 Oitavas;
 Versos decassílabos heróicos (acento na 6ª e
10ª sílabas);
 Esquema rimático abababcc (rima cruzada nos
seis primeiros versos, e emparelhada nos dois
últimos).
Fernando António Nogueira Pessoa
 1888 – 1935.

 É considerado um dos maiores poetas da Língua


Portuguesa, e o seu valor é comparado ao de Camões.

 Durante a sua vida, trabalhou em Jornalismo, Publicidade,


Comércio e, principalmente, em Literatura.
 Simbolista e modernista pelo sentido do efémero,
indefinição e insatisfação, bem como pela inovação
praticada através de diversos caminhos de formulação
do discurso poético (sensacionismo, paúlismo,
interseccionismo), foi marcado também pela poesia
musical e subjectiva, voltada, essencialmente, para a
metalinguagem e para os temas relativos a Portugal,
como o sebastianismo presente na obra Mensagem.

 Este livro foi o único publicado em vida do autor.


Mensagem (1934)
“Mens ag (itat mol) em': o espírito move a
massa".
 Em Dezembro daquele ano, ganha o prémio “Antero de Quental”.

 Insere-se no movimento literário Modernista.

 Abre com uma proposição latina (Benedictus Dominus Deus Noster


qui dedit nobis signum).

 Composto por 44 poemas. Proposição que aponta,


 Apresenta-se dividida em três partes: desde logo, para o carácter
espiritual da obra.
 Brasão (19 poemas);
 Mar Português (12 poemas);
 O Encoberto (13 poemas).
Primeira Parte – Brasão
 TEMPO DE PREPARAÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DO
IMPÉRIO

• Apresentação de figuras mitológicas e históricas que ‘criaram’ Portugal;

• Estabelecimento da essência (nobreza) de Portugal;

• Esta essência criou obra no passado (Mar Português) e pode criar no


futuro, no porvir (O Encoberto);
 ‘Bellum sine Bello’ (‘a guerra sem guerrear’)

 A epígrafe latina desta primeira parte avisa-nos


que a nova Distância não se alcança pela força.

 Mensagem é um poema de fraternidade e de
paz (simbolismo rosa-cruciano e templário).
SEGUNDA PARTE – MAR
PORTUGUÊS
 Tempo de realização e da queda;
 Tempo em que se conquista um Império
que depois se perde;
É preciso buscar uma nova Distância,
um outro mar (Possessio Maris…).
Terceira Parte – O Encoberto

 Tempo de espera;

 Tempo de esperança na realização de um


projecto indefinível, transcendente, para lá do
espaço e do tempo (Pax in Excelsis), para lá
do que é dado à razão humana conhecer.
Os Lusíadas e a Mensagem: Encontros...
 Preparação dos portugueses para a viagem de descobrimento
tanto em “Brasão”, de Mensagem, como no Canto I d’Os
Lusíadas;

 Afirmação do valor supremo da poesia;

 Concepção mística e missionária da história portuguesa,


preocupação arquitectónica: ambas obedecem a um plano
cuidadosamente elaborado, o reverso da vitória são as lágrimas.

 Poemas sobre Portugal e a nossa história (dimensão épica);


 Tanto Pessoa como Camões seleccionam, a seu jeito, a História,
destacando as figuras que mais lhes interessam para o projecto
global da sua obra;

 O elemento lírico em Mensagem e n’Os Lusíadas evidencia-se


no pendor subjectivo dos dois poemas – i.e. na importância da
voz do poeta. Essa voz faz-se ouvir, no caso da obra de
Camões, em momentos de auto-reflexão (que não existem em
Mensagem) e na crítica à gente da Pátria, à “gente surda e
endurecida” (X, 145).

 Nos dois poemas, é sublinhado o dado matricial da cultura grega


(Ulisses é colocado ao lado de figuras históricas);
 Ambas sublinham a possibilidade e o desejo de que Portugal se torne o
Quinto Império;

 O desejo de superar e a consciência do valor da poesia. Camões quer


superar os ‘antigos’ substituindo a ficção pela verdade; Pessoa quer
superar Camões e conferir novo ânimo à Pátria;

 Ambos os poetas destacam a figura de Nun’Álvares Pereira: ele é a


Coroa no poema de Pessoa, e o ‘fortíssimo leão’ n’Os Lusíadas;

 Sobre os perigos do mar, Pessoa e Camões imaginam duas figuras que


representam a mesma essência perigosa de toda a aventura, do desejo
de partir - Mostrengo (Mensagem) – figura ameaçadora e agressiva, sem
traços de humanidade vs Adamastor (Os Lusíadas) - dotado da
capacidade de amar.
Os Lusíadas e a Mensagem: Desencontros...

 A primeira obra é optimista e representa o contentamento com a nação; a


segunda apresenta, no final, uma desolação em relação à situação actual do
país;

 Em Mensagem, a História de Portugal é pensada à luz de um plano de divino. O


que somos resulta de um acto de com-sagração, de algo que é predito por Deus;
n’Os Lusíadas, a intervenção divina aparece como complemento do valor dos
Portugueses, valor supremo capaz de escapar à lei da morte;

 Em Mensagem, D. Sebastião é o símbolo da loucura positiva, da sede de infinito


que caracteriza o ser humano que pretende ultrapassar a sua própria natureza;
n’Os Lusíadas, D. Sebastião é o “herói épico em potência”, uma vez que o sonho
de conquistar o Norte de África ainda povoava as mentes da época. Na sua
dedicatória, Camões incentiva o rei a novas empresas bélicas;
 Em Pessoa, o amor e o sentimento são transpostos para uma esfera
transcendente – o desejo, em Mensagem, é o desejo de um mito; n’Os
Lusíadas, o tratamento poético do amor entre um homem e uma mulher
sublima-se;

 Notamos na obra pessoana o uso de símbolos que nos remetem aos


Cavaleiros Templários, ao Santo Graal, à Maçonaria e à Rosacruz.
Camões não o faz;

 Os Lusíadas – poema épico (primazia da narração e da descrição,


características da epopeia; Mensagem - poema épico-lírico (carácter
mais abstracto e interpretativo);

 Em Mensagem, Pessoa selecciona “figuras de pensamento” e de


contemplação dotadas de uma capacidade visionária singular (ex. D.
Dinis, o ‘plantador de naus a haver’); n’Os Lusíadas, Camões (ou os
seus narradores), selecciona reis que se destacaram pela sua “feição
activa” e acção bélica (ex. D. Afonso III e D. Afonso IV);
 O mar n’Os Lusíadas é possibilidade de realização, coisa presente e
exterior; em Mensagem, significa promessa e desafio, o Horizonte por
buscar;

 N’Os Lusíadas, o poeta prevê o definhamento da pátria, a decadência


do Império. Mas, ao mesmo tempo, aponta a possibilidade de um
renascimento, a que a acção de D. Sebastião deveria dar início; em
Pessoa, a ideia de um novo Império ‘feito de Matéria’ – um império
terreno a alcançar pela acção bélica dos homens – é posta de parte;

 Os Lusíadas foi composto no início do processo de dissolução do


império e Mensagem publicada na fase terminal de dissolução do
império;

 Os Lusíadas tem um carácter predominantemente narrativo e pouco


abstractizante, enquanto A Mensagem tem um carácter menos
narrativo e mais imperativo e cerebral.
SIMBOLOGIA - MENSAGEM
 Brasão: O passado inalterável;
 Campo: Espaço de vida e de acção;
 Castelo: Refúgio e segurança;
 Quinas: Chagas de Cristo – dimensão espiritual;
 Coroa: perfeição e poder;
 Timbre: marca – sagração do herói para uma missão transcendente;
 Grifo: terra e céu – criação de uma obra terrestre e celeste;
 Mar: vida e morte, ponto de partida, reflexo do céu, princípio masculino;
 Terra: casa do homem, espelho do céu, paraíso mítico, princípio feminino;
 Padrão: marco, sinal de presença, obra da civilização cristã;
 Mostrengo: o desconhecido, as lendas do mar, os obstáculos a vencer;
 Nau: viagem, iniciação, aquisição de conhecimentos;
 Ilha: refúgio espiritual, espaço de conquista, recompensa do sacrifício;
 Noite: morte, tempo de inércia, tempo de germinação, certeza da vida;
 Manhã: luz, felicidade, vida, o novo mundo;
 Nevoeiro: indefinição, promessa de vida, força criadora, novo dia.


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