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MAYOMBE – Literatura Angolana

Mestranda Dayane Themoteo UEA


Aluna Especial na disciplina Literaturas Africanas –
UFAM
Professora Drª Rita Barbosa
PEPETELA
Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, batizado com
o nome de Pepetela (kimbundu) pelos camaradas de guerra.
Nasceu em Benguela/ Angola em 1941, atuou na luta pela
libertação de seu país como guerrilheiro no Movimento
Popular de Libertação de Angola (MPLA), foi ministro da
Educação e Cultura no governo de Agostinho Neto (amigo
pessoal e camarada de guerra).
Através da Literatura de resistência e combate Pepetela
traz em suas obras a representação do drama vivido pela
sociedade angolana, que em vários aspectos busca sua
libertação (política, econômica, social)
MAYOMBE
Mayombe(1980) é um romance que se passa no
interior da Floresta Mayombe, no período de luta pela
independência de Angola, já por volta dos anos 70.
MAYOMBE
“Aos grupos de quatro, prepararam o jantar: arroz com corned-beef.
Terminaram a refeição às seis da tarde, quando já o Sol desaparecera
e a noite cobrira o Mayombe. As árvores enormes, das quais pendiam
cipós grossos como cabos, dançavam em sombras com os movimentos
das chamas. Só o fumo podia libertar-se do Mayombe e subir, por
entre as folhas e as lianas, dispersando-se rapidamente no alto, como
água precipitada por cascata estreita que se espalha num lago.”
(PEPETELA, 1980, pag.04)
MAYOMBE
Dividido em cinco capítulos ( A missão, A base,
Ondina, A surucucu, A amoreira ) e um Epílogo, onde os
próprios guerrilheiros são os narrados, apresentando
perspectivas diferentes da guerra (que por vezes é travada
entre os próprios camaradas guerrilheiros), desnudando
assim as divergências , o tribalismo entre eles, as atividades
cotidianas na guerra, as desilusões, dos medos e expectativas
de cada um.
MAYOMBE — Estás a gozar!
— Não estou nada. Ou porque sou o Comandante e
Tinham acabado de se lavar. Sem Medo acendeu deve apoiar-se para estar bem comigo e poder subir...
um cigarro. Até eles chegava o cheiro de matete ou porque tu és o Comissário, cargo logo a seguir ao
para o mata-bicho. O Comissário tossiu e disse: dele, e deve estar contra ti, destruir-te, mostrar os teus
erros, para apanhar o teu lugar.
— Tu és o Comandante, o que quiseres é lei...
— Pensas assim?
— Somos três no Comando, camarada. Se vocês os
dois não estiverem de acordo, eu inclino-me. Não — E certo!
sou ditador, bem sabes. — Também me parece que sim – disse o Comissário. –
— Somos três? Vocês são dois! Sem Medo fixou-o. É pena! É um bom militar, no meu entender.
Sobretudo quando eu não participo numa operação
Uma ruga cavou-se-lhe entre os olhos.
e, assim, as suas boas ideias não podem vir ajudar o
— Que queres dizer? meu prestígio. Quando eu estou, ele comete erros só
— Simplesmente que, desde que tu e eu não para me contradizer. Não porque eu tenha sempre
estejamos de acordo, vocês são dois e eu um: O Das razão, mas às vezes também tenho...
Operações vai sempre pelo teu lado. Até parece que O Comandante deu-lhe uma palmada no ombro.
nunca reparaste! — Tens de te habituar aos homens e não aos ideais. O
— Sim, reparei. Porque faz ele isso? cargo de Comissário é espinhoso, por isso mesmo. O
curioso é que vocês, na vossa tribo, até esquecem que
— Não tens ideia? são da mesma tribo, quando há luta pelo posto.
— Tenho duas: ou porque sou o Comandante, ou — O que não quer dizer que não há tribalismo,
porque tu és o Comissário. infelizmente. (PEPETELA, 1980, pag. 09 E 10)
MAYOMBE
Dessa maneira, a obra é uma representação das
descontinuidades que o processo de luta armada implica,
inclusive as incongruências daqueles que a fazem funcionar.
MAYOMBE: DO PASSADO AO FUTURO
Ângela Guimarães

“Mayombe é um romance-testemunho sobre um dos processo mais


importantes da história recente a nível mundial – a luta de
libertação nacional.”
“ [...] Mayombe é , em minha opinião, a obra que melhor
exprime a luta grandiosa, travada a nível individual e colectivo,
para, muito embora carregando o peso do passado, cada um e o
colectivo se projectarem no futuro.” (GUIMARÃES, 1989, pag.65)
MAYOMBE: DO PASSADO AO FUTURO
Ângela Guimarães
 O ESPAÇO (Mayombe – medo e o misticismo ) o reconhecimento da força ( ou
das forças ) da floretas e que como eles (angolanos) também luta contra e acolhe
o invasor.

Assim surge o mundo do Mayombe, domínio da natureza poderosa, bela


e violenta, para onde convergem homens de diversas origens. (GUIMARÃES,
1989, pag.66)

“Os paus mortos das paredes criaram raízes e agarraram-se à terra e as cabanas
tornaram-se fortalezas. E os homens, vestidos de verde, tornaram-se verdes como as folhas
e castanhos como os troncoscolossais. A folhagem da abóbada não deixava penetrar o Sol e
o capim não cresceu em baixo, no terreiro limpo que ligava as casas. Ligava, não: separava
com amarelo, pois a ligação era feita pelo verde.”
MAYOMBE: DO PASSADO AO FUTURO
Ângela Guimarães
 O TEMPO
Na mata do Mayombe coexistem diversos tempos – o
mágico, o tribal, o colonial, a sociedade nova ... Fundindo o
passado e o futuro, num ritual de libertação, forja-se uma
nova identidade global, nacional. (GUIMARÃES, 1989, pag.68)
MAYOMBE: DO PASSADO AO FUTURO
Ângela Guimarães
 AS PESSOAS
E em relação ao tempo pode dizer-se que todos têm um
traço comum – todos aceitaram ser tratados como «bandidos
a soldo do estrangeiro» antes de serem reconhecidos como
nacionalistas e heróis. (GUIMARÃES, 1989, pag.68)

O sentido crítico do narrador destaca linhas de


articulação de hábitos, que impregnam suas personagens,
deixando à mostra as reais motivações dos guerrilheiros,
mitificados pelos discursos oficiais. (ABDALA JR, 2013, pag.
80)
MAYOMBE: DO PASSADO AO FUTURO
Ângela Guimarães
 O AMOR
A vida no Mayombe assenta numa rede de amor. Amor das
glórias passadas de Luna e do Ngola, do mundo futuro e do
homem novo. Amor da liberdade e da dignidade nacional.
Amor por ideias e mitos passados e futuros. Amor pelo poder
e suas vantagens. (GUIMARÃES, 1989, pag.70)
MAYOMBE: Angola entre o passado e o futuro
Marina Ruivo
Mayombe foi escrito no princípio da década de 1970,
mais exatamente em 1971, quando o guerrilheiro e escritor
Pepetela encontrava-se combatendo no enclave de
Cabinda, que então constituía a 2ª Região Político-Militar do
MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola). A
região abriga a grande floresta do Mayombe, incorporada no
romance mediante sua coloração infinita de verdes, suas
enormes árvores, muitas lianas, e também perigos e
encantamentos diversos, configurando-se como um espaço
que adquire bastante relevância na narrativa,interagindo
vivamente com os personagens.(RUIVO,2009,pag. 241).
PEPETELA E A SEDUÇÃO DA HISTÓRIA
Inocência Mata
No panorama da literatura angolana, a publicação de
Mayombe, em 1980, é um momento de viragem. Com este
romance e com outros que se lhe seguiriam (como Yaka, Lueji: o
Nascimento de um Império e A Gloriosa Família: o Tempos dos Flamengos),
Pepetela consolida uma das mais produtivas tendências da literatura
angolana (a relação entre Ficção e História) e um dos mais
portentosamente ideológicos veículos de reflexão sobre o país que
acabava de nascer. Em Mayombe Pepetela (vice-ministro da Educação
por ocasião da publicação) constrói uma história de celebração do
esforço de um povo pela libertação nacional, cujos protagonistas,
guerrilheiros, funcionam como representação metonímica desse
povo. (MATA, 2000, pag 51)
PEPETELA E A SEDUÇÃO DA HISTÓRIA
Inocência Mata
Romances como Mayombe, Yaka, Lueji, A Geração da
Utopia, Parábola do Cágado Velho ou A Gloriosa Família são
metaficções historiográficas, ou seja, são romances que se
apropriam de personagens e acontecimentos históricos, não
para simplesmente celebrar o passado, mas para o utilizar
como veículo de uma reflexão sobre a própria condição
presente do país e sua projecção futura. . (MATA, 2000, pag
57 e58)
REFERÊNCIAS
PEPETELA. Mayombe, São Paulo: Leya, 2013.
GUIMARÃES, Ângela. Mayombe: do passado ao futuro In Les
Litteratures africaines de langue portugaise , pag. 65-71
Paris: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989.
ABDALA JR, Benjamim. Memórias de uma geração da utopia, ou da
esperança como princípio In Revista do Núcleo de Estudos
de Literatura Portuguesa e Africana da UFF, Vol. 5, n°
11,pag. 69-85, 2013.
RUIVO, Marina. Mayombe: Angola entre o passado e o futuro In
Portanto... Pepetela, São Paulo: Atteliê Editorial, 2009
MATA, Inocência. Pepetela e a sedução da História In Laços de
memória e outros ensaios sobre Literatura Angolana,
Luanda:UEA, 2001

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