Você está na página 1de 19

ESCOLA SECUNDÁRIA DE ÀGUAS SANTAS

Análise dos poemas de Cesário verde


“ C R I S TA L I Z A Ç Õ E S ”

“FRÍGIDA”

Trabalho realizado por:


Marta Magalhães Nº
Pedro Miguel Eira Nº
Gonçalo Pinto Nº
“CRISTALIZAÇÕES”
Faz frio. Mas, depois duns dias de aguaceiros, A sua barba agreste! A lã dos seus barretes! E aos outros eu admiro os dorsos, os costados
Vibra uma imensa claridade crua. Que espessos forros! Numa das regueiras Como lajões. Os bons trabalhadores!
De cócoras, em linha os calceteiros, Acamam-se as japonas, os coletes; Os filhos das lezírias, dos montados:
Com lentidão, terrosos e grosseiros, E eles descalçam com os picaretes Os das planícies, altos, aprumados;
Calçam de lado a lado a longa rua. Que ferem lume sobre pederneiras. Os das montanhas, baixos, trepadores!
(…)
Como as elevações secaram do relento, Homens de carga! Assim as bestas vão curvadas! Mas fina de feições, o queixo hostil, distinto,
E o descoberto Sol abafa e cria! Que vida tão custosa! Que diabo! Furtiva a tiritar em suas peles,
A frialdade exige o movimento; E os cavadores descansam as enxadas, Espanta-me a actrizita que hoje pinto,
E as poças de água, como um chão vidrento, E cospem nas calosas mãos gretadas, Neste Dezembro enérgico, sucinto,
Reflectem a molhada casaria. Para que não lhes escorregue o cabo. E nestes sítios suburbanos, reles!

Em pé e perna, dando aos rins que a marcha agita, Povo! No pano cru rasgado das camisas Como animais comuns, que uma picada esquente,
Disseminadas, gritam as peixeiras; Uma bandeira penso que transluz Eles, bovinos, másculos, ossudos,
Luzem, aquecem na manhã, Com ela sofres, bebes, agonizas; Encaram-na sanguínea, brutalmente:
Uns barracões de gente pobrezita Listrões de vinho lançam-lhe divisas, E ela vacila, hesita, impaciente
E uns quintalórios velhos, com parreiras. E os suspensórios traçam-lhe uma cruz! Sobre as botinhas de tacões agudos.

Não se ouvem aves; nem o choro duma nora! De escuro, bruscamente, ao cimo da barroca, Porém, desempenhando o seu papel na peça,
Tomam por outra parte os viandantes; Surge um perfil direito que se aguça; Sem que inda o público a passagem abra,
E o ferro e a pedra - que união sonora! – E ar matinal de quem saiu da toca, O demonico arrisca-se, atravessa
Retinem alto pelo espaço fora, Uma figura fina, desemboca, Covas. entulhos, lamaçais, depressa,
Com choques rijos, ásperos, cantantes. Toda abafada num casaco à russa. Com seus pezinhos rápidos, de cabra!

Bom tempo. E os rapagões, morosos, duros, baços, Donde ela vem! A actriz que tanto cumprimento
Cuja coluna nunca se endireita, E a quem, à noite na plateia, atraio
Partem penedos. Voam estilhaços. Os olhos lisos como polimento!
Pesam enormemente os grossos maços, Com seu rostinho estreito, friorento,
Com que outros batem a calçada feita. Caminha agora para seu ensaio.
ESTRUTURA INTERNA
Partem penedos

Bom tempo. E os rapagões, morosos, duros, baços,


Cuja coluna nunca se endireita,
Partem penedos; cruzam-se estilhaços.
Pesam enormemente os grossos maços,
Com que outros batem a calçada feita.

E os rapagões, morosos, duros, baços


A sua barba agreste! A lã dos seus barretes!
Que espessos forros! Numa das regueiras
Acamam-se as japonas, os coletes;
E eles descalçam com os picaretes
Que ferem lume sobre pederneiras.
Homens de carga! / Assim as bestas vão curvadas! / Que vida tão custosa! / Que
diabo!

Homens de carga! Assim as bestas vão curvadas!


Que vida tão custosa! Que diabo!
E os cavadores descansam as enxadas,
E cospem nas calosas mãos gretadas,
Para que não lhes escorregue o cabo.
Povo! No pano cru rasgado das camisas
Uma bandeira penso que transluz
Com ela sofres, bebes, agonizas;
Listrões de vinho lançam-lhe divisas,
E os suspensórios traçam-lhe uma cruz!
De escuro, bruscamente, ao cimo da barroca,
Surge um perfil direito que se aguça;
E ar matinal de quem saiu da toca,
Uma figura fina, desemboca,
Toda abafada num casaco à russa.

desemboca
Homens de carga! Assim as bestas vão curvadas!

Bom tempo. E os rapagões, morosos, duros, baços, Homens de carga! Assim as bestas vão curvadas!
Cuja coluna nunca se endireita, Que vida tão custosa! Que diabo!
Partem penedos; cruzam-se estilhaços. E os cavadores descansam as enxadas,
Pesam enormemente os grossos maços, E cospem nas calosas mãos gretadas,
Com que outros batem a calçada feita. Para que não lhes escorregue o cabo.

A sua barba agreste! A lã dos seus barretes! Povo! No pano cru rasgado das camisas
Que espessos forros! Numa das regueiras Uma bandeira penso que transluz
Acamam-se as japonas, os coletes; Com ela sofres, bebes, agonizas;
E eles descalçam com os picaretes Listrões de vinho lançam-lhe divisas,
Que ferem lume sobre pederneiras. E os suspensórios traçam-lhe uma cruz!
No pano cru rasgado das camisas
ESTRUTURA EXTERNA
• MÉTRICA

O poema Cristalizações de Cesário Verde é constituído por vinte quintilhas, sendo o primeiro verso
de cada uma alexandrino (doze sílabas) e os quatro restantes decassílabos.

12 Bom tem po. E os ra pa gões, mo ro sos, du ros, ba ços,


10 Cu ja co lu na nun ca se en di rei ta,
10 Par tem pe ne dos; cru zam-se es ti lha ços.
10 Pesam enormemente os grossos maços,
10 Com que outros batem a calçada feita.
• ESQUEMA RIMÁTICO

O esquema rimático é ABAAB, havendo portanto rima cruzada, interpolada e emparelhada. De


notar a predominância de rima rica. O esquema descrito aplica-se exatamente em todas as estrofes do
poema.

A A sua barba agreste! A lã dos seus barretes!


B Que espessos forros! Numa das regueiras
A Acamam-se as japonas, os coletes;
A E eles descalçam-se com os picaretes,
B Que ferem lume sobre pederneiras.
“FRÍGIDA”
Balzac é meu rival, minha senhora inglesa! Cintila ao seu rosto a lucidez das jóias. Porém, não arderei aos seus contactos frios,
Eu quero-a porque odeio as carnações redondas! Ao encarar consigo a fantasia pasma; E não me enroscará nos serpentinos braços:
Mas ele eternizou-lhe a singular beleza Pausadamente lembra o silvo das jibóias Receio suportar febrões e calafrios;
E eu turbo-me ao deter seus olhos cor das ondas. E a marcha demorada e muda dum fantasma. Adoro no seu corpo os movimentos lassos.

Admiro-a. A sua longa e plácida estatura Metálica visão que Charles Baudelaire E se uma vez me abrisse o colo transparente,
Expõe a majestade austera dos invernos. Sonhou e pressentiu nos seus delírios mornos, E me osculasse, enfim, flexível e submissa,
Não cora no seu todo a tímida candura; Permita que eu lhe adule a distinção que fere, Eu julgara ouvir alguém, agudamente,
Dançam a paz dos céus e o assombro dos infernos. As curvas da magreza e o lustre dos adornos! Nas trevas, a cortar pedaços de cortiça!

Eu vejo-a caminhar, fleumática, irritante, Desliza como um astro, um astro que declina,
Numa das mãos franzindo um lençol de cambraia!... Tão descansada e firme é que me desvaria,
Ninguém me prende assim, fúnebre, extravagante, E tem a lentidão duma corveta fina
Quando arregaça e ondula a preguiçosa saia! Que nobremente vá num mar de calmaria.

Ouso esperar, talvez, que o seu amor me acoite, Não me imagine um doido. Eu vivo como um monge,
Mas nunca a fitarei duma maneira franca; No bosque das ficções, ó grande flor do Norte!
Traz o esplendor do Dia e a palidez da Noite, E, ao persegui-la, penso acompanhar de longe
É, como o Sol, dourada, e, como a Lua, branca! O sossegado espectro angélico da Morte!

Pudesse-me eu prostar, num meditado impulso, O seu vagar oculta uma elasticidade
Ó gélida mulher bizarramente estranha, Que deve dar um gosto amargo e deleitoso,
E trêmulo depor os lábios no seu pulso, E a sua glacial impassibilidade
Entre a macia luva e o punho de bretanha!... Exalta o meu desejo e irrita o meu nervoso.
ESTRUTURA INTERNA
Pudesse-me eu prostar, num meditado impulso,
Ó gélida mulher bizarramente estranha,
E trêmulo depor os lábios no seu pulso,
Entre a macia luva e o punho de bretanha!...
Cintila ao seu rosto a lucidez das jóias.
Ao encarar consigo a fantasia pasma;
Pausadamente lembra o silvo das jibóias

E a marcha demorada e muda dum fantasma.


Metálica visão que Charles Baudelaire
Sonhou e pressentiu nos seus delírios mornos,
Permita que eu lhe adule a distinção que fere,
As curvas da magreza e o lustre dos adornos!

Desliza como um astro, um astro que declina,


Tão descansada e firme é que me desvaria,
E tem a lentidão duma corveta fina
Que nobremente vá num mar de calmaria.

Você também pode gostar