Parecerista: Isaias Francisco de Carvalho Orientador: André Luis Mitidieri Pereira “Existe corpo num corpus.” - Roland Barthes, Roland Barthes por Roland Barthes
“O gelo dos dados históricos se derrete com o
sol da narração.” - Tomás Eloy Martínez, Entrevista a Ariel Palácios A PESQUISA: • Apresentaremos a escrita de Tomás Eloy Martínez por meio da relação entre texto literário: o Romance Purgatório, da crônica : "En memória de Susana Rotker" e de três entrevistas com o autor.
• Destacamos a pertinência do conceito de “Biografema” (BARTHES,
1990) e “Espaço Biográfico” (ARFUCH, 2010), que delineia a potencialidade (auto)biográfica na ficção literária, seu compromisso de (re)contar e rasurar a história, sendo a literatura um mosaico de possibilidades.
• Analisamos a configuração “biografemática” da obra literária
Purgatório, observando a multiplicidade do sujeito Tomás Eloy Martínez, onde apresenta-se o jornalista, o ficcionista, o crítico literário e como essas facetas promovem rasuras na história linear e em concepções canônicas de literatura. METODOLOGIA:
Barthes constrói os sujeitos do
enunciado a partir de pequenos detalhes que muito revelam sobre as personalidades históricas; afastando-as da unicidade, faz jus às múltiplas posições que ela ocuparam no universo social, além de inovar na narração de vidas (p. 45). A VIDA RONDA A LITERATURA OU A LITERATURA MOLDA A VIVÊNCIA: CORPUS ESCREVER PARA COLOCAR ALGO NO LUGAR: • O trabalho de Martínez será justamente o contrário, colocar em cima da narrativa “oficiosa” da história linear, possibilidades flexíveis de interpretação dos fatos pela literatura:
• Entrevistadora: ¿Este libro cierra la discusión en torno a si la
dictadura argentina fue o no el fruto de una guerra? Es tan absurdo el secuestro de Simón, como tan absurdos fueron tantos secuestros y desapariciones durante esa época…
• Martínez: Creo que el proyecto de la dictadura argentina fue la
destrucción de un país para poner otro encima. En general en Chile y en otros países las dictaduras fueron lo mismo. Se trata de deshacer algo para poner otra cosa basada en el modelo ultraconservador, autoritario y en los principios de Dios, Patria y Hogar (MARISTAIN, 2009, p. 3). RASURA, MARTÍNEZ O CARTÓGRAFO: A escrita ficcional se apresenta por ele como forma de superação através de uma atividade cartográfica, ficcional, novelística, romanceada e poética, movimento crítico que se dá no Purgatório através de metáforas:
Os mapas são ficções mal redigidas, prosseguiu. Muita
informação e pouca história. Mapas de verdade eram os antigos: criavam mundos do nada. Aquilo que não se sabia era imaginado. [...] Um cartógrafo, se quiser, pode inverter os rumos do mundo. [...] Os mapas tinham ensinado a desordenar a lógica da natureza, a criar ilusões onde a realidade parecia invencível (MARTÍNEZ, 2012, p.12-14-15). RELAÇÃO COM ESPOSA: Ao Falar sobre cautivas (livro escrito por sua esposa), ele realça uma cena de feminicídio: una mujer quemada viva por un marido fanático e intolerante en Maracaibo (p. 2). Essa preocupação com o gênero feminino, que ele irá abordar em outras entrevistas e sua necessidade de reivindicar a injustiça sofrida, tal qual no momento que o autor (inserido como personagem em seu purgatório) fala da relação de Emilia e o seu esposo mais jovem:
Ao acordar, fiquei entusiasmado imaginando a felicidade que
aquela mulher mais velha poderia sentir ao receber o amor e o sexo de um homem bem mais jovem que ela. Tanto fazia que fosse o seu marido ou não. Parecia-me um ato de justiça literária, pois na maioria das histórias a equação é invertida (MARTÍNEZ, p. 204). “EN MEMÓRIA DE SUSANA ROTKER”:
Cada vez que alguno de los dos necesitaba sentir la
resonancia de sus ideas en otro ser, nos leíamos en alta voz, con cierto aire de desafío y también con la esperanza de que el otro asintiera y dijera: "Sí, qué bien, cómo me habría gustado escribir eso".[…] Su inteligencia era como una luz: se movía en todas direcciones, con una intensidad que jamás declinaba, y era maravilloso tocar esa luz, porque desprendía calor, y felicidad, y fuerza: pocas luces podían llegar tan hondo con tan pocas palabras (MARTÍNEZ, 2000, p.1). JUSTIFICATIVAS: • O trabalho se faz importante em via da teorização das maneiras do sujeito interferir no texto escrito, através da subjetividade, do seu eu pertencente a um coletivo e do eu subjetivo individual.
• A importância dos textos e temas abordados se justificam pelo contexto
em que se passam, quando pensamos em um país que passou por processos de violência, repressão e pobreza, fato que sem dúvida teve projeção na história de seu povo e nas representações literárias.
• A teorização sobre o conceito de biografema e espaço biográfico são
potentes ferramentas de mirada para o texto e para a participação do escritor para além de sua obra, resgatando ou propondo leituras esquecidas pela crítica e priorizando aquelas que dialoguem com a necessidade de rasura do EU em narrativas contemporâneas. CONSIDERAÇÕES FINAIS:
• Dentro dessa perspectiva, apresentamos a leitura
biografemática dessas narrativas (incluídas num espaço biográfico contemporâneo) que divergem das versões autoritárias do estado, da história e do cânone, como uma postura de leitura descentralizadora de versões hegemônicas que nos levaram à dependência econômica, política e cultural, que ao divergir não apenas democratiza, mas traz uma (re)leitura crítica da história, usando a ficção como ponte necessária. Essa definição torna-se chave para olhar para os textos híbridos como subproduto de séculos de colonialismo e imperialismo, hibridação que levou a uma sociedade mestiça em que a desigualdade social e a má distribuição de renda se fazem problemas estruturais, os textos híbridos inserem-se neste contexto de negação de direitos a determinadas camadas sociais. REFERÊNCIAS: ARFUCH, LEONOR. O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2010.
BARTHES, Roland. Sade, Fourier, Loyola. São Paulo: Brasiliense, 1990.
BRASIL, UBIRATAN. Leia a última entrevista de Tomás Eloy Martínez. Disponível em:<http://cultura.estadao.com.br/noticias/geral,leia-ultima- entrevista-de-tomas-eloy-martinez,504756>. Acesso em: 10 jun. 2017.
CANCLINI, Néstor García. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da
modernidade. 4. ed.
DOSSE, François. O desafio biográfico: escrever uma vida. São Paulo: EDUSP, 2009.
MARISTAIN, Mónica. transfusiones al óleo. Entrevista a Tomás Eloy Martínez.
MARTÍNEZ, Tomás Eloy. Purgatório. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
MITIDIERI, André Luís. Biografemas homoculturais de Eva Perón no romance
Santa Evita, de Tomás Eloys Martínez. In: MITIDIERI, André Luis; CAMARGO, Flávio Pereira (Org). Literatura, homoerotismo e expressões homoculturais. Ilheús: Editus, 2015. p. 41-75.
PALACIOS, Arial. Entrevista Tomás Eloy Martínez, o ficcionista da história.