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LITERATURA PORTUGUESA

PROF. STÉLIO FURLAN


LITERATURA PORTUGUESA

TROVADORISMO

PROF. STÉLIO FURLAN


Lo vers es fis e naturaus
e bos celui qui be l´enten;
e melher es, qui.l joi aten.
A canção é autêntica e sincera,
capaz de honrar àquele que a compreenda bem;
Mas melhor é para aquele que aguarda as alegrias do amor.
Bernart de Ventadorn (1150-1180)
TROVADORISMO

 CENAS TROVADORESCAS
• Rei AFONSO X, o Sábio (1221 -1284)
• Compositor e promotor da poesia trovadoresca.
• A sua corte foi centro de acolhida de trovadores e
jograis, especialmente de língua galego-portuguesa

http://www.agal-gz.org/modules.php?name=Biblio
http://cantigas.fcsh.unl.pt/
TROVADORISMO  Quer'eu en maneyra de proençal
CANTIGAS DE AMOR fazer agora hun cantar d'amor,
 De origem provençal
 Exprimem o sentimento masculino
e querrei mûit'y loar mha senhor,
 Cantigas ambientadas em palácios a que prez nen fremosura non fal,
 expressão de um meio refinado,
da vida feudal da corte. nen bõdade; e mays vos direy en:
tanto a fez Deus comprida de ben
que mays que todas las do mundo val.

D.DINIS (1261-1325)
Mapa da península ibérica (séc. XII)
 época do esplendor do Trovadorismo.
 “cantando a pátria nasceu” (Afonso Lopes Vieira)

Portugal hoje
TROVADORISMO

Os primeiros registros da literatura portuguesa


• versos manuscritos (século XII: 1189 ou 1198)

As composições trovadorescas encontram-se


reunidas em três coletâneas:
• Cancioneiro da Ajuda [310 cantigas]
• Cancioneiro da Vaticana [1205 cantares]
• Cancioneiro da Biblioteca Nacional [1647 canções]

• http://cantigas.fcsh.unl.pt/index.asp
CANCIONEIROS
MEDIEVAIS

CANCIONEIRO DA AJUDA [sec.XIII]


 Códice depositado na biblioteca do
Palácio da Ajuda [Lisboa]

 310 cantares de 38 compositores


 Composições líricas [de amor]
TROVADORISMO
conceitos

A expressão deriva do verbo provençal


trobar, que exprimia o poetar da época
enquanto ação de compor, de inventar,
de criar:
designava-se trobador ao poeta que
criava, instrumentava e, por vezes,
entoava suas próprias composições
poéticas.
TROVADORISMO
conceitos

“O poema recebia o nome


de “cantiga” (ou ainda de
“canção” e de “cantar”) pelo
fato de o lirismo medieval
associar-se intimamente
com a música:
a poesia era cantada, ou
entoada, e instrumentada.
Letra e pauta musical
andavam juntas...”

– MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa


através dos textos, p.15
TROVADORISMO
MANIFESTAÇÕES

► COMPOSIÇÕES LÍRICAS
• Cantigas de amor
• Cantigas de amigo

► COMPOSIÇÕES SATÍRICAS
• Cantigas de escárnio
• Cantigas de maldizer
TROVADORISMO
instrumentos

 Ver recriações de cantigas medievais do grupo português


Strella do Dia, disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=jIcxGcmMrr8
TROVADORISMO
ARTE DE TROVAR “E como há algumas cantigas em
[anônimo, séc. XIII] que falam tanto eles como elas,

CANCIONEIRO DA
por isso é importante que
BIBLIOTECA NACIONAL
entendais se são de amor ou de
http://cantigas.fcsh.unl.pt/artedetrovar.asp
amigo, porque se falam eles na
primeira cobra e elas na outra, é
de amor, pois move-se segundo a
argumentação dele;
e se falam elas na primeira cobra,
então é de amigo;
e se falam ambos em uma cobra,
então depende de qual deles fala
primeiro na cobra”.
Capítulo IV
Primeiros registros
[1189 ou 1198]
Canção da Ribeirinha

CANCIONEIRO DA AJUDA
Paio Soares de Taveirós, sec. XIII
Primeiros registros No mundo non me sei parelha,
[1189 ou 1198]
mentre me for como me vai,
Canção da Ribeirinha
ca já moiro por vós ─ e ai!
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi en saia!
Mau dia me levantei,
que vos enton non vi fea!

E, mia senhor, dês aquel di’, ai!


me foi a mi mui mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e ben vos semelha
d’aver eu por vós guarvaia,
pois eu, mia senhor, d’alfaia
CANCIONEIRO DA AJUDA nunca de vós houve nem hei
Paio Soares de Taveirós, sec. XIII
valía d’ua correa.
Primeiros registros escritos da Literatura Portuguesa

Canção da Ribeirinha
[1189 ou 1198]
No mundo non me sei parelha, • No mundo ninguém se assemelha a mim
mentre me for como me vai, • enquanto a minha continuar como vai,
ca já moiro por vós ─ e ai! • porque morro por vós, e ai!
mia senhor branca e vermelha, • minha senhora de pele alva e faces rosadas,
queredes que vos retraia • quereis que vos retrate
quando vos eu vi en saia! • quando vos vi sem manto!
• Maldito dia! me levantei
Mau dia me levantei,
• que não vos vi feia!
que vos enton non vi fea!

E, mia senhor, dês aquel di’, ai! • E, minha senhora, desde aquele dia, ai!
• Tudo me foi muito mal,
me foi a mi mui mal,
• e vós, filha de don Paai
e vós, filha de don Paai
• Moniz, e bem vos parece
Moniz, e ben vos semelha • de ter eu por vós guarvaia,
d’aver eu por vós guarvaia, • pois eu, minha senhora, como mimo
pois eu, mia senhor, d’alfaia • de vós nunca recebi
nunca de vós houve nem hei • algo, mesmo sem valor.
valía d’ua correa. [Paio Soares de Taveirós, sex XIII]
TROVADORISMO
► PRECEITOS DO
AMOR CORTÊS (séc.XI-XIII)

 MULHER como supremo Bem.  SEÑAL: pseudônimo poético da Dama.


 “mulher é sinônimo de virtude  Preserva a pretz (reputação) e não
excelente” provoca a sua sanha (indignação).

 SERVIÇO: conjunto de deveres do  MESURA: virtude suprema do amador:


vassalo para com o suserano  fundamento de toda a educação cortês:
moderação, respeito constante,
 Sinônimo de amor: o amador  equilíbrio das paixões e das atitudes
consagra sua vida à Mulher

 Fidelidade, constância, paciência,
esperança, alegria, CORTESIA
desprendimento, honra. forma de vida social,
sentimento moral
de base aristocrática.
Canção da Ribeirinha, de Taveirós
a estrofe ausente

• No mundo ninguém se assemelha a mim • E só teu odor, oh dor! me anima.


• enquanto a minha continuar como vai
• porque morro por vós, e ai minha senhora • Somente teu ser me resume.
• de pele alva e faces rosadas • Suspenso entre o riso e o siso,
• quereis que vos retrate
• sois toda o que não preciso.
• quando vos vi sem manto
• Maldito dia! me levantei • Minha esperança não se adere
• que não vos vi feia. • à tua espera, minha Senhora...
• E, minha senhora, desde aquele dia, ai! • Resta a lembrança do teu hálito,
• Tudo me foi muito mal • tua cor: senhas para o sonho.
• e vós, filha de don Pai
• Moniz, e bem vos parece
• de ter eu por vós guarvaia Stélio Furlan
• pois eu, minha senhora, como mimo
• de vós nunca recebi
• algo, mesmo sem valor.
En gran coita, senhor,
► CANTARES DE AMOR que peior que mort`é,
D. Dinis, 1261-1325 vivo, per boa fé,
e polo voss´ amor
. esta coita sofr´eu
por vós, senhor, que eu
Vi polo meu gran mal
e melhor mi será
de morrer por vós já
e, pois me Deus non val,
esta coyta sofr´eu
por vós, senhor, que eu

Polo meu gran mal vi,


e mais mi val morrer
ca tal coita sofrer
pois por meu mal assi
esta coita sofr´eu
por vós, senhor, que eu

Vi por gran mal de mi,


pois tan coitad´and´eu.
En gran coita, senhor,
CANTARES DE AMOR que peior que mort`é,
vivo, per boa fé,
e polo voss´ amor
esta coita sofr´eu
► PROCESSOS COMPOSITIVOS por vós, senhor, que eu
 Atafinda: processo métrico que Vi polo meu gran mal
consiste no encadeamento das coblas
e melhor mi será
 por meio das conjunções e, que, ca, de morrer por vós já
pero, ou... e, pois me Deus non val,
esta coita sofr´eu
 Fiinda: estrofe de menor extensão no por vós, senhor, que eu
fim do poema:
Polo meu gran mal vi,
 remate, acabamento, conclusão.
e mais mi val morrer
ca tal coita sofrer
pois por meu mal assi
esta coita sofr´eu
por vós, senhor, que eu

Vi por gran mal de mi,


pois tan coitad´and´eu.
TROVADORISMO
CANTARES DE AMOR
► ASPECTOS TEMÁTICOS
 A “coita d’amor,”  O olhar como responsável pela
transmissão do amor ao coração:
 a paixão vivida pelo trovador a
serviço de uma dama.  “por meu mal vos vi”.

 Louva-se as virtudes da Dama  O tema do elogio impossível, da


(“mia senhor”): falta de correspondência amorosa.
 beleza incomparável...
 Sandece: perda do apetite, a
insônia e o tormento de amor.
 “perdi o riir
perdi o ssen e perdi o dormir”.
LÍRICA GALEGO-PORTUGUESA
O amor, entre nós, é uma súplica D.DINIS [1261-1325]
apaixonadamente triste. E não há nada que
exprima tão bem esse caráter de prece do que
a tautologia, a repetição necessária do apelo Polo meu gran mal vi,
para alcançar um dom, que não chega jamais. e mais mi val morrer
ca tal coita sofrer
pois por meu mal assi
Por isso o nosso lirismo é por vezes um
esta coita sofr´eu
documentário precioso da poesia pura: tudo se por vós, senhor, que eu
exala num suspiro, numa queixa, numa efusão
exclamativa. É uma voz que vem dos longes da Vi por gran mal de mi,
alma. A emoção não se pulveriza em cintilações pois tan coitad´and´eu.

de forma artística; sempre uno, o turbilhão


emocional permanece até o fim
substancialmente o mesmo, com uma ou
outra modificação levíssima de forma. Isto dá a
cantiga d´amor um cunho de obsessão, de
monotonia plangente...”
 LAPA, Rodrigues. Lições de Literatura Portuguesa. Época Medieval, p.132
LITERATURA PORTUGUESA
TROVADORISMO
 AMOR CORTÊS
 Convenção social e literária.

 Empréstimo da homenagem feudal:

 “Transposição do esquema social criado pelo feudalismo, o

amor se tornou um “serviço” (culto) prestado pelo trovador à sua


dama, como compromisso que se estabelecia entre o senhor e
vassalo” [Spina].

 O Amor reveste-se das formas de vassalagem feudal.


 O código/ritual amoroso reproduz a relação senhor e vassalo.
Intertextos trovadorescos
Queixa
Composição: N.Siqueira / E. Neves
Caetano Veloso

Um amor assim delicado Princesa, surpresa, você me arrasou


Você pega e despreza Serpente, nem sente que me envenenou
Não devia ter despertado Senhora, e agora, me diga onde eu vou
Ajoelha e não reza Senhora, serpente, princesa

Dessa coisa que mete medo Um amor assim violento


Pela sua grandeza Quando torna-se mágoa
Não sou o único culpado É o avesso de um sentimento
Disso eu tenho a certeza Oceano sem água
INTERTEXTOS TROVADORESCOS
▶ STELLALEONARDOS (1923- ...) ▶ GUILHERME DE ALMEIDA (1890-1969)
Com Dobre Rondó do Muito Triste
Ay SENHORA d' olhos verdes!
Da triste vida que eu vivo
Ay senhora, bastam verdes:
polos vossos olhos verdes o menos triste é a tristeza.
me vem ver de ui verdor. Muito mais triste é a incerteza,
Sem eles, ay! basta verdes: essa falta de motivo
ando cego de ver dor. para viver como eu vivo
Pola minha negra vida só de surpresa em surpresa,
em negrume desvivida cada vez mais sendo presa
ay meu lume! que he de mim? das coisas de que me privo
Desvivo por vós, senhora
d' olhos verdes e marfim. e sujeito, embora esquivo,
às ordens da natureza:
"Se m' isto tomara outrora,
causadora, com certeza,
cuidara de ver-lhe fim,
mas qu' hei-de cuidar j' agora desse gosto negativo
sem esperança, e sem mim?" da triste vida que eu vivo .

Amanhecência (1974) Poema inédito, 1917 (?)


DOBRE : Tipo de poema trovadoresco RONDÓ ou triolé: poema de forma fixa
em que se repete a palavra no fim de (século XIII), construído sobre duas rimas
vários versos.

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