A obra camoniana retrata dois tipos de mulher. A primeira é uma
imagem realista e aparece em algumas redondilhas. […] A segunda é uma imagem petrarquista: está presente nos sonetos. […] A própria temática da medida velha é muitas vezes retirada da vida quotidiana: por isso as suas heroínas são mulheres apaixonadas, alegres, […] prontas a lutar pelos seus interesses e pelos seus sentimentos. A imagem realista opõe-se à imagem petrarquista1 em que a mulher personifica várias ideias: beleza, castidade, «alma gentil», «leda serenidade deleitosa», […] harmonia: a unidade profunda entre a beleza externa e a beleza interna. Olga Ovtcharenko «A mulher na obra camoniana», in Colóquio Letras n.º 125/126, 1992, pp. 9-10 Ficha informativa n.o 2
2. A mulher petrarquista
Petrarca (1304-1374) é o grande cultor do «amor elevado», que
celebra com múltiplos jogos de antíteses. Toda a sua obra é atravessada pela presença de Laura, a amada que conhece em 1327 e que lhe desperta um amor platónico. Apesar de a sua musa ter morrido em 1348, vítima da peste negra, Petrarca continua a cantá-la até ao fim dos seus dias, projetando o amor irrealizável numa cristalização perfeita que reflete a transcendência divina. A poesia petrarquista, escrita sob o signo da ausência e da solidão, impõe um modelo feminino, de cabelos loiros [pele nívea] e beleza serena, impalpável, abstrata, inacessível, símbolo de harmonia e perfeição [tendo a capacidade de contaminar positivamente a natureza]. Maria Graciete Besse, Camões sonetos, Mem Martins, Publicações Europa-América, 1992, p. 25 (texto adaptado)