CONTEÚDO PENSADO A PARTIR DE UM CURRÍCULO-EMC: MARCAS DE

UMA GOVERNAMENTALIDADE NEOLIBERAL E DE UM PODER SOBRE A

VIDA DA POPULAÇÃO

Drando. Júlio César Gomes de Oliveira

26 de setembro de 2019
 QUESTÃO DE PESQUISA
Como são pensados os conteúdos de matemática a partir de um currículo-EMC,
enquanto discurso, e que efeitos de poder esses conteúdos estão produzindo na
educação matemática?

DO FERRAMENTAL TEÓRICO-METODOLÓGICO E A COMPOSIÇÃO DO MATERIAL E

ANÁLISE
As pesquisas em educação matemática constituem uma prática por meio de regras
que são estabelecidas discursivamente. Criação de posições de sujeitos e objetos que
são inerentes a um currículo-EMC.

O material que subsidia nossa discussão são trabalhos que foram publicados em
revistas da educação matemática (Bolema, Zetetiké e Revista Paranaense de Educação
Matemática) e no Encontro Nacional de Educação Matemática (2010, 2013, 2016).

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 Enunciado sobre conteúdo: enfatiza um trabalho com foco na realidade dos
estudantes, destacando problemas relevantes e interessantes que abordam
questões sociais
Na composição deste enunciado, uma primeira regra discursiva relacionada ao conteúdo
que , é o fato de que esse precisa possuir um foco na realidade dos estudantes.

A Educação Matemática Crítica (EMC), que

A Educação Matemática Crítica pressupõe o
ensino da Matemática com atividades
fundamentadas na realidade, problemas reais e
modelos reais. Quanto às atividades
desenvolvidas em um contexto de
semirealidade e os exercícios característicos da
Matemática Pura, são entendidos como úteis à
consolidação do conhecimento, ou seja,
poderiam ser utilizados depois da fase inicial de
construção do saber, para um reforço na análise
dos procedimentos matemáticos (BENNEMANN;
ALLEVATO, p. 3, grifo nosso).
encontra em Skovsmose (2000a, 2000b, 2001) um
de seus principais representantes, apresenta um
contraponto interessante às perspectivas
tradicionais em educação matemática, por
introduzir, nas aulas de matemática, propostas
interdisciplinares que se pautam, inclusive, pela
defesa do paradigma de construção de cenários
para investigação, abordagem calcada na
mudança do paradigma do exercício para o
paradigma da investigação. A EMC, na perspectiva
do autor, pressupõe uma transição da
fundamentação na matemática pura para o
embasamento na vida real, o que pode dar
margem a reflexões sobre a matemática e sobre
suas aplicações. Essa transição pode estimular a
reflexão dos alunos e conceder à EM uma
dimensão crítica (HOFMANN; MORO, 2012, p.3 39,
grifo nosso).
Segunda regra discursiva : é preciso pensar em problemas relevantes e interessantes que
abordam questões sociais.

O que a educação matemática crítica propõe é um novo paradigma: é possível

desenvolver no aluno a capacidade de gerenciamento das questões que se lhe
apresentem? É possível desenvolver no estudante a capacidade crítica que possibilitará a
paulatina construção de sua autonomia? Uma estratégia que pode ser usada na educação
crítica é a tematização. Busca-se um problema de relevância para os alunos, ligado às suas
experiências (TEIXEIRA; COUTINHO, 2013, p. 10, grifo nosso).
***
É possível perceber que os alunos ficam passivos no processo educativo quando o
conteúdo é ministrado de maneira descontextualizada e metódica. Sem levar em
consideração os saberes vivenciados pelos alunos em suas práticas diárias, bem como as
suas vontades presentes e futuras, o ensino de matemática geralmente torna-se
desinteressante (REIS; FERREIRA, 2010, p. 8, grifo nosso).
***
Compreender as relações entre os saberes e fazeres matemáticos que permeiam o
contexto escolar e a realidade do grupo envolvido na pesquisa à luz da dimensão
educacional da Etnomatemática e da Educação Matemática Crítica implica dialogar com a
cultura dos indivíduos envolvidos no processo educativo valorizando e problematizando
criticamente o contexto social, político, econômico no qual estão inseridos (REIS;
FERREIRA, 2010, p. 1, grifo nosso).
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Em uma perspectiva foucaultiana, para além de construir o objeto conteúdo, um currículo-
EMC coloca em movimentos efeitos de poder ao dizer sobre as questões que devem ser
consideradas pelo conteúdo matemático pautado na realidade dos estudantes.

EFEITOS DE UMA GOVERNAMENTALIDADE NEOLIBERAL PRODUZIDOS EM UM

CURRÍCULO-EMC

[...] Este tipo de atividade [a atividade em questão trata-se do

pagamento do IPTU e da cobrança de multa pelos dias em atraso] faz
com que o estudante utilize os conceitos vistos em sala de aula em seu
cotidiano e também com que esse cidadão em formação aprimore o
controle de suas finanças, ressaltando que muitos dos alunos de Ensino
Médio já estão se inserindo, quando não, inseridos no mercado de
trabalho, sendo muitas vezes suporte financeiro de suas famílias, ou
parte importante desse (GABAN; DIAS, 2016,p. 10, grifo nosso).
***
César fez diversas compras em um único mês utilizando seu cartão de
crédito. Quando recebeu a fatura de seu cartão de crédito ficou muito
preocupado, pois havia gastado mais do que podia pagar. Diante disso o
que você sugere ao César para resolver seu problema? (SANTOS;
FERNANDES, 2016, p. 9, grifo nosso).
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Mesmo que não seja a pretensão deste currículo, ele coloca em circulação efeitos de poder
relacionado a uma governamentalidade neoliberal.

A lógica neoliberal permeia e reconfigura diferentes tipos de instituições. O resultado é que

o neoliberalismo não é mais uma política econômica distante, mas acaba sendo o princípio
organizador de nossa própria conduta e nosso próprio sentido de ser. Tomamos esses
efeitos como normais e até mesmo chegamos a acreditar que são necessários (VALERO,
2008, p. 63, grifo nosso).

Um currículo-EMC pode estar contribuindo para a produção de uma subjetividade

neoliberal na própria Educação Matemática e, diante disso, “acabamos por educar, não um
ser humano, mas um homus oeconomicus” (VALERO, 2018, p. 63).

Na lógica neoliberal, “a educação é um setor-chave na promoção da vantagem competitiva

econômica nacional e na prosperidade nacional futura” (PETERS, 2011, p. p. 221). Por isso,
é importante que se aprimore o controle das finanças, uma educação para consumo em
situações aplicadas à realidade contemporânea, que se discuta as diversas compras em um
único mês utilizando cartão de crédito para que os indivíduos, acima de tudo consumidores
e empreendedores de si, consigam competir neste grande mercado proporcionado e
defendido pelo racionalidade neoliberal.
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EFEITOS DE UM PODER SOBRE A VIDA PRODUZIDO EM UM CURRÍCULO-EMC

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8
 É plausível dizer, mesmo pensando em um currículo-EMC construído a partir de
ressonâncias de perspectivas críticas, que há efeitos de um poder que tem como corpo a
população sendo colocando em funcionamento.

Não é nosso objetivo dizer se isso é bom ou ruim, mas apresentar marcas de que esse
currículo não escapa de efeitos de poder no contexto social , vinculados ao biopoder.

No jogo discursivo de um currículo-EMC, para além de disciplinar o corpo ou cuidar de um

território, busca-se construir conhecimentos nos estudantes que possam colaborar para
uma análise e organização da população de forma eficiente, procurando fazer viver para
deixar morrer.

Um currículo-EMC, ao pensar nos conteúdos a partir da realidade, pode contribuir para o

governamento dos indivíduos na direção de uma tecnologia de poder vinculado ao
biopoder.

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 FIM DA CONVERSA...

O exercício de poder operado em uma formação discursiva de um currículo-EMC quanto aos

efeitos de uma governamentalidade neoliberal e do biopoder busca ser totalizador e
individualizante.

Entretanto, ao pensarmos em uma governamentalidade neoliberal e em uma

Biopolítica, no contexto da Educação Matemática, “há que se manter a fé nas lutas de
resistência e pelos direitos das populações” (BRANCO, 2015, p. 75).

OBRIGADO!
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