PPGCISH
EPISTEMOLOGIAS DAS
CIÊNCIAS HUMANAS
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UNIDADE III
11º Encontro: 00/00 – Nova História e História Social Inglesa [AULA em colaboração
com o Prof. Dr. Linhares].
12º Encontro: 00/00 – Conceitos centrais das Epistemologias Modernas I: Humanidade
/ Animalidade, Objetividade / Subjetividade, Individualidade / Propriedade / Alteridade,
Pessoa / Espírito - Self, Natureza/Cultura.
13º Encontro: 00/00 – Conceitos centrais das Epistemologias Modernas II: Sociedade /
Estado, Cultura / Civilização, Técnica / Processo, Política / Autoridade / Liberdade /
Verdade.
14º Encontro: 00/00 – Conceitos centrais das Epistemologias Modernas III: Emoção /
Razão, Opinião, Crença, Conhecimento, Ideologia.
15º Encontro: 00/00 – Conceitos centrais das Epistemologias Modernas IV: Tempo
(Cotidiano, Ritual, Sagrado, Público).
Objetivos da Aula:
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Rebaixamento teórico-metodológico da Filosofia, classificada como discurso geral; e
diferenciação entre História e estória;
Noção de dados objetivos: laboratório, arquivo, pesquisa de campo; e de
metodologia científica nas Ciências Sociais, de modo que a busca pela verdade
deveria pautar-se em práticas impessoais, verificáveis e falsificáveis a partir de
registros axiologicamente neutros;
Debate epistemológico nas Ciências Sociais: olhar do pesquisador como ferramenta
de validação empírica:
Olhar exterior; Olhar interior; Olhar de baixo; universalidade da verdade sobre o
real;
Debate metodológico nas Ciências Sociais:
Dados qualitativos; dados quantitativos; linguagem matemática; linguagem
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Metodologia Geral
Reconhecimento da falência de uma abordagem dogmática na produção do discurso científico, de
modo que metodologias plurais e epistemologias concorrentes são acionadas;
Reconhecimento da complexidade social inerente aos critérios de cientificidade, de modo que estes não
devem reduzir-se a posturas estanques e dogmáticas do tipo qualitativo x quantitativo, identidade x
diferença, neutralidade x engajamento, exclusividade x anarquismo metodológico / epistemológico;
Pires permanece moderno, mas assume um tom de reflexividade: a Ciência como polêmica de si
mesmo, característico da modernidade reflexiva e tardia;
Visão moderna: da epistemologia e metodologia reificada ao objeto analítico;
Visão moderna reflexiva: das questões de pesquisa à epistemologia e ao método em construção;
Pires retoma o percurso histórico de debates epistemológicos que redundaram:
1. na produção fundacional do objeto analítico das Ciências Sociais (o fato social, em detrimento do
à normatividade científica como modo de recepção da crítica da normativa social produzida pelas
minorias sociais, étnicas, nacionais, políticas, econômicas, estéticas e morais.
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A metodologia geral parte, assim, de uma refundação epistemológica do conhecimento
científico: desnaturaliza e des-essencializa os discursos de verdade, de objetividade e de
cientificidade.
Pires, com efeito, sustenta uma postura epistemológica moderna reflexiva que:
Afirma um conhecimento sistemático do real válido empiricamente: esforço de objetivação e
registro do verdadeiro e do falso;
Esse esforço de objetivação inerente à pesquisa científica pode ser axiologicamente neutro ou
dessa objetivação do real, haja vista que juízos de valor e juízos de realidade são dificilmente
distinguíveis;
Observar o mundo empírico implica em acionar um mundo moral e emocional pré-estabelecido, de
modo que a produção da verdade científica é uma forma de construir o social e a cultura (traz um
projeto de sociedade), o que não impede hierarquizações científicas dessas construções.
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Objeto Construído
Objeto disciplinar: fato social, ação social, papéis sociais, sociabilidades, estruturas sociais, discursos,
narrativas, imaginário, simbólico, moralidades..;
Pré-construção social do objeto de estudo: o social e a cultura informam ao pesquisador as formas de
classificação e de representação do real, de modo que o olhar científico está contaminando por estas
construções em primeiro grau; as ciências sociais são observações tecnicamente codificadas das observações
do ator e agente social comum sobre o mundo;
O crime, a burocracia, o jornal, a sexualidade, a guerra, o divórcio, o contrato, a arte, a cidade são formas sociais e culturais de antemão
estabelecidas...
Procedimento epistemológico, teórico-metodológico e temático operado pelo pesquisador: seleções,
perspectivas e recortes na construção do objeto analítico.
Schutz (1987, p. 11): ciência como construção em segundo grau:
“...os objetos de pensamento, construídos pelos pesquisadores nas ciências sociais, baseiam-se em objetos
de pensamento construídos pelo pensamento comum do homem levando sua vida cotidiana entre seus
semelhantes, e a ele se reportando”.
A noção de objeto construído não implica em uma postura epistemológica construcionista do pesquisador:
A teoria, o olhar discriminador, vem antes dos fatos, os eventos circunstanciais do mundo social nominados, classificados e categorizados
pela teoria;
O Construcionismo não se interessa pela discussão ontológica sobre o real pressuposto pelo discurso nativo, de modo que não diferencia
entre juízos de valor e juízos de realidade;
A noção de objeto construído não implica em subjetivismo:
A construção científica, por definição, reduz a complexidade do social e da cultura em um discurso inteligível e metodologicamente
enquadrado, mas não necessariamente literário e subjetivista, pois busca a verdade em aproximações jamais conclusivas do real; 14
O objeto construído deforma a realidade, mas não a verdade: produz mapas mentais.
Ciência e Senso Comum
O modelo moderno reflexivo: ruptura com o senso comum; ruptura com a ruptura epistemológica
científica clássica e reflexão sobre o senso comum;
Demarcação entre formas de conhecimento, e não de acesso à verdade;
O senso comum, a teoria nativa, é o ponto de partida de toda reflexão empiricamente embasada
sobre o social e a cultura.
A produção da Verdade: 3 modelos E-T-M
Como apreender a verdade sobre o mundo social?
1. Olhar exterior e neutralidade axiológica: tradição positivista, funcionalista, estruturalista, sistêmica; ênfase
em dados quantitativos; discurso de ruptura com o senso comum, as pré-noções; dissociação entre contemplação
e ação; busca por leis e causalidades materiais;
2. Olhar interior e neutralidade axiológica: tradição compreensiva, fenomenológica, etnometodológica,
simbólico-interacionista; sujeito e objeto da pesquisa social partilham de uma mesma ontologia; ênfase na
subjetividade, na produção de sentidos, na linguagem, na ação social; dicotomia contemplação / ação e ruptura
relativa com o senso comum; primado dos dados qualitativos, da precisão descritiva; busca pela causalidade
intencional;
3. Olhar de baixo e engajamento crítico e emancipatório: tradição hegeliana, marxista, feminista, de estudos
culturais e de gênero, pós-modernas; afirmação da inserção da ciência no mundo social de hierarquias, posições,
fronteiras e interesses sociais e repertórios simbólicos; as pré-noções, o senso comum, fazem parte da pesquisa,
que deve organizar um confronto emancipatório ou uma luta por reconhecimento; busca pela causalidade
material, intencional e de interpretação e a consequente superação dos vieses inerentes às visões de mundo
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dominantes; constante preocupação com a reflexividade epistêmica; primado dos dados qualitativos, da ação
sobre a contemplação.
Formas de Medida no discurso científico e suas Funções
Precisão Teórica: ajuste do esquema conceitual enquanto verdade e aproximação do real ou enquanto
modelo de apreensão da teoria nativa;
Precisão Empírica: uso adequado das medidas quantitativa e qualitativa;
Funções de criatividade e de reflexividade no ato de medir: afastamento do objeto analítico (jogo das
grandezas), afastamento do olhar do pesquisador (jogo do pesquisador).
O 4° modelo E-T-M
O processo de objetivação científica desde uma postura de estrangeirice: liberdade política, ética, de
conhecimento (ontológica, teórica, epistemológica e metodológica); não pertencimento ao grupo
estudado e às suas perspectivas; mas vinculação, participação e interesse pelo mesmo em um olhar
distante e próximo, exterior e interior, de baixo e solidário, atento e indiferente, pois o estrangeiro
participa de forma não apologética;
Simmel afirma que a ciência é participação social, de modo que um olhar exterior, um olhar interior
distanciado e um olhar de baixo são meros equívocos sobre o fazer científico, que deve pautar-se em
participação-crítica, em reflexividade epistêmica, teórica e metodológica;
Bourdieu: o paradigma da objetivação participante;
Feminismo: perspectiva de identidade e de proximidade, mas pertencimento crítico e liberdade de
movimento;
Foucault: situar-se nas fronteiras do pensamento e afirmar a relacionalidade dos olhares de dentro, de
fora e de baixo. 16
Considerações epistemológicas para uma Metodologia Geral das Ciências Sociais e
Questões Epistemológicas Fundamentais:
Indiferença em relação às posturas epistemológicas construtivistas e realistas;
Pires, nesse sentido, refuta o dilema epistemológico clássico das Ciências Sociais e aponta que as
questões epistemológicas fundamentais incidem na abertura do pensamento científico para uma
modernidade reflexiva, crítica e consciente de sua participação no mundo social:
Ciência Social como modo e estilo de vida pautado na estrangeirice simmeliana: liberdade de movimento, de
combinação de paradigmas E-T-M; afirmação do interesse na busca pela verdade científica e na transformação social;
Superação da distinção entre pesquisas qualitativas e quantitativas: primado da precisão numérica
ou descritiva e das funções epistemológicas de criatividade e de reflexividade;
A metodologia, o procedimento de pesquisa, é trans-teórico e transdisciplinar;
As formas de medida (quantitativa e qualitativa) e os materiais empíricos (observações diretas,
documentos, experimentos) tem seus limites teóricos, ainda que não impliquem em posições
epistemológicas específicas;
Precisão numérica e precisão descritiva não são funções meramente intercambiáveis, pois que
apontam dimensões sociais e culturais particulares do mundo relacional humanos.
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QUESTÕES EPISTEMOLÓGICAS DA CIÊNCIA MODERNA: A SOCIOLOGIA DO
CONHECIMENTO E A INSERÇÃO SOCIAL DO DISCURSO CIENTÍFICO
O conhecimento é socialmente definido de forma ampla e não necessariamente abarca a demarcação de validade ou
falsidade, mas de aceitação social: ideias, ideologias, crenças, mitos, tecnologias, ciências, narrativas artísticas..;
A Sociologia do Conhecimento objetiva explicar e compreender o conhecimento, incluso a ciência, como produção,
representação, ação, função social;
Bacon, Voltaire e a crítica da perturbação social ao conhecimento objetivo: distinção entre Verdade e Interesse;
Nietzsche: distinção entre Validade e Utilidade do conhecimento;
Kant: sistematização de uma filosofia da consciência que reconhece o indivíduo como sujeito cognoscente e portador de
categorias inatas de pensamento; a consciência racionaliza o mundo em uma visão passível de comunicação coletiva;
superação do empirismo inglês; precursor do racionalismo durkheimiano;
Hegel: o conhecimento se realiza em função dos processos dialéticos do Espírito;
Marx: o conhecimento se realiza em função dos processos dialéticos das relações de produção; problema da falsa
consciência, da alienação positiva e negativa; possibilidade de objetividade do olhar de baixo emancipado dos
preconceitos da visão dominante;
Scheler: a ciência moderna é resultado de espaços de liberdade de investigação, crítica e reflexão adquiridos desde a
idade média europeia, quando emerge uma pluralidade de agências mundanas e religiosas em disputa moral e pela
definição ontológica, epistemológica e teórica do mundo: como resultado o paulatino estabelecimento da livre discussão
pública, da troca dialética de teses, do parlamento e do mercado, do anseio burguês pelo acúmulo de bens, do controle
racional instrumental da natureza, do social e da cultura, da aventura em busca da verdade que relativiza noções absolutas
de ontologia e de epistemologia;
Mannheim: conhecimento como narrativa interessada de grupos sociais; o relativismo E-T-M da ciência moderna se 18
realiza pela diferenciação social, pela mobilidade social, pela democratização política e econômica; o interesse social não
necessariamente invalida o conhecimento; distinção entre conhecimento ideológico e conhecimento utópico.
As questões fundamentais da Sociologia do Conhecimento de certa forma ignoram a questão
epistemológica da validade do conhecimento e enfatizam:
O estudo das mudanças e transformações dos interesses acadêmicos e intelectuais em relação com as mudanças e
transformações sociais;
O estudo das mentalidades e suas justificações nativas;
O estudo da avaliação social dos tipos de conhecimento e os fatores que apontam para a sua aceitação ou rejeição;
O estudo das condições sociais de emergência de problemas e disciplinas de conhecimento;
O estudo dos processos de institucionalização da vida intelectual;
O estudo dos intelectuais;
A análise dos impactos sociais do conhecimento institucionalizado, científico e tecnológico
Contexto de emergência da Sociologia do Conhecimento
Conflito social, disputa moral e de narrativas em sociedades diferenciadas e democratizadas, de tradição na
institucionalização da produção intelectual;
Sociedade da desconfiança epistêmica e do caos cultural, mas não social, demanda profissionais da análise ideológica;
Revolução copernicana: erro e verdade são socialmente condicionados.
Paradigma para a Sociologia do Conhecimento
A base existencial das produções mentais dever ser buscada no social (formas relacionais) e na cultura (formas simbólicas),
enfatizando as relações causais ou funcionais e as relações simbólicas ou significativas entre conhecimento e base existencial;
A Sociologia do Conhecimento se nutre de teorias historicistas e teorias analíticas gerais;
Realismo: posição epistemológica preocupada com a validade do conhecimento; Construtivismo: a noção de verdade é
função de uma base social e cultural;
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Marx, Scheler, Mannheim, Durkheim, Sorokin: relações de produção e conhecimento; fatores reais e dados culturais; grupos
organicamente integrados produzem o conhecimento publicamente legítimo; o social é a fonte e repositório das formas
elementares de conhecimento; sistemas de verdade e integração cultural em sociedades complexas.
Tipos de Conhecimento e Função
Mito e lenda;
Conhecimento implícito na linguagem popular natural;
Conhecimento religioso;
Conhecimento místico;
Conhecimento filosófico-metafísico;
Conhecimento Positivo;
Conhecimento Tecnológico.
Função do conhecimento
Marx: organização das relações de produção e das forças produtivas;
Scheler: expressão das formas particulares dos grupos sociais, que atualizam essências eternas em juízos
localizados de valor.
Mannheim: afirmação ideológica e utópica de grupos sociais organizados;
Durkheim: organização dos rituais de coerção e de efervescência, regulação negativa e positiva do social;
Sorokin: expressão dos sistemas de verdade e integração cultural.
Problemas adicionais
Conhecimento e contexto cultural e social: raça, gênero, ideologias políticas e econômicas, religião,
filiação nacional e etc.
Darwin, Hobbes, Ricardo: seleção das espécies, guerra de todos contra todos, sobrevivência dos 20
mais aptos, lógica egoísta natural de mercado, Estado de Natureza...
Ethos e estrutura cultural da Ciência
Ciência Pura:
lugar moral e emocional, cognitivo e comportamental de questionamento e reflexão sobre o social e a cultura em
sociedades complexas e diferenciadas administradas em regimes de concorrência dos poderes e recursos sociais;
implica em um complexo emocionalmente modulado de normas e valores operados por cientistas situados em redes
de interdependência;
código de validação, de reconhecimento, de reciprocidade, de obrigação e de depuração de uma herança partilhada
de bens simbólicos;
projeto global de modernidade, de afirmação etnocêntrica dos valores culturais de acúmulo material e simbólico, de
trabalho e exploração da natureza e do social, de racionalidade instrumental, de objetividade do mundo social, de
quantificação e de comparação de fenômenos, de vida contemplativa, de abstração lógica, de diferenciação –
segmentação de causalidades;
questões de ciência: ontologia, epistemologia, teoria, metodologia, implicações éticas do conhecimento científico...
papéis sociais e ethos específico de respeito, lealdade e adesão aos cânones disciplinares; legitimação pelos pares;
insulação.
Universalismo: discurso de verdade objetiva, impessoal, verificável e falsificável de forma transcultural e global;
conhecimento científico acessível a toda a humanidade;
Comunismo: a ciência é um produto coletivo e herança comum; reconhecimento e estima como únicos direitos de
propriedade; imperativo da transparência, da honestidade, da comunicação;
Desinteresse: caráter público e testável da ciência frustra interesses escusos por parte dos próprios cientistas; o alto
custo transacional de comunicação da ciência faz dela um ‘mau negócio’; o público leigo cede aos apelos da
propaganda, do mito, do esoterismo, dos dogmas políticos e religiosos e do refrigério da arte;
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Ceticismo organizado: imperativo institucional e metodológico de organização autorreferente do conhecimento
científico, que se esgota em sua sacralidade própria e desinteressada.
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AULA 02 – 14.05.2020
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