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Teorias sobre a religião e sua

origem - IV

Jung
c) Jung (1875-1961)

 Médico e psiquiatra, nasceu na Suíça, numa família de


pastores protestantes.

 Teve contacto também com espíritas e praticou o espiritismo


durante algum tempo.

 A imagem que tinha de sua mãe era negativa, considerava-a


uma pessoa imprevisível.

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 Trabalhou com Bleuler em Zurich, em 1900, e
procurou novas compreensões das psicoses e
neuroses em Paris, tendo seguido algumas
conferências de Janet.

 A sua compreensão de psiquiatria leva-o a ir para


além do interesse pelos sintomas e a centrar-se na
totalidade do homem.

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 Descobre a psicanálise em 1906 e conhece Freud
em 1907, mantendo com ele uma relação
intelectual e de amizade profunda ao longo de 7
anos.

 Freud considerava Jung o seu discípulo mais


brilhante e tudo se orientava para que fosse seu
continuador e presidente da Sociedade de
Psicanálise
 Alguma divergências teóricas surgiram e a ruptura
consumou-se em 1913 e fundou uma nova escola face à
adesão de alguns discípulos.
 Presidiu às “Sociedades médicas de psicoterapia” entre
1930 e 1933, onde também ensinou.
 Criou em 1941 o Instituto C. Jung em Zurique para a
formação de psicoterapeutas; e outras escolas em várias
partes do mundo.

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 Jung alarga os conceitos da psicanálise e interessa-se pela
antropologia de Lévy-Bruhl (estudioso de povos primitivos, mitos
e filosofia oriental).
 Criou, a partir de Lévy-Bruhl, conceito de “inconsciente
colectivo”.

 Deixa-se influenciar também por Teilhard de Chardin, sobretudo


pela ideia de “imanência do espiritual na matéria” que vai ao
encontro da sua ideia de “evolucionismo psicológico e espiritual”.
 Considerava este como o motor do desenvolvimento da
humanidade
“Libido” –
- Para Freud é individual e está ligada ao desejo sexual, energia
sexual;
- Jung acusa Freud de ter sexualizado demasiado o conceito de
libido.
- Jung dá-lhe uma interpretação psicológica e filosófica – considera-
a “a energia psíquica” no seu conjunto, com fins culturais e
simbólicos, tem uma dimensão universal e cósmica,
simultaneamente individual e colectiva.

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“Inconsciente” – “Inconsciente colectivo”

- Expande o conceito de inconsciente (lugar do recalcado para


Freud)
- Liga-o aos mitos e culturas dos povos - o inconsciente
colectivo- através do qual e no qual se nutre o inconsciente
individual.
O inconsciente individual é constituído pela história
pessoal e produto do recalcamento infantil. Mas
também é portador de todos os estratos culturais da
humanidade.
Um sonho ou um sintoma não reenviam apenas para as
experiências pessoais, mas também para um fundo
originário e comum a todas as culturas (arquétipos)
através do inconsciente colectivo
“Os arquétipos”
- Os arquétipos tornam possível o Inconsciente colectivo.
- São o seu motor e também conteúdo. Não são estruturas pré-existentes ou
significantes.
- São feitos de símbolos e de imagens que têm uma acção dinâmica sobre a
personalidade consciente e inconsciente.
- Pelo facto de constituírem um fundo simbólico do I. Colectivo, existem como
potencialidade ou virtualidade.
- São simultaneamente símbolo e energia, anteriores ao indivíduo. São acção
dinâmica e têm uma valor emocional, tão importante como as emoções
infantis.
- São constituídos por imagens primordiais derivadas da pré-história da
humanidade.

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Os arquétipos são como as ideias de Platão ou as categorias apriorísticas de
Kant. Não podem ser conhecidos directamente, mas pela via simbólica, e
os símbolos são formados a partir da cultura e da experiência pessoal.
Os arquétipos são formas abstractas aos quais se pode aceder com
facilidade através dos mitos , dos sonhos, das crenças religiosas e dos
delírios. Propõe, por isso, o estudo dos pacientes (sonhos, delírios,
recordações históricas), bem como os mitos e as crenças religiosas.

O psiquismo está submetido aos dinamismos transformadores dos arquétipos


(transformam a personalidade)
Arquétipos

 O arquétipo parental – não corresponde apenas aos pais reais ou


aos pais fantasmáticos, mas tb veiculam as imagens parentais do
Inconsciente Colectivo, entidades universais poderosas (a mãe
individual é figura da “mãe colectiva” preexistente)

 Mãe dá conta do princípio dos cuidados maternos e simpatia,


fertilidade e renascimento, mas também o reino da morte. É
simbolizada pela divindade feminina, pela Virgem, o mar ou a lua;
e o lado negro pelas profundezas e pela morte (mãe boa e má,
vida/morte)

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 A “grande –mãe” – arquétipo da tirania sobre
aqueles que protegemos (crianças e doentes, p.e.)

 O arquétipo da pessoa é um compromisso entre o


indivíduo e a submissão-social ao grupo, por um
lado, mas este, por outro permite-nos ter relação a
outros.
 A sombra representa o conjunto das pulsões e dos instintos, é o
nosso ser inferior, o recalcado. Aparece nos sonhos, nos
sintomas, na religião e na arte.

 Animus – simboliza o masculino, parte recalcada do inconsciente


da mulher e energia do homem. Pode se simbolizado por uma
variedade de tipos masculinos.

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 Anima – simboliza o feminino, parte recalcada do
inconsciente do homem e que domina a mulher e os
grandes mitos femininos. É para o homem o princípio
feminino, parte da sombra, derivada primariamente da mãe.

 O velho sábio- é o arquétipo da megalomania que dá a


sentimento de omnipotência omnisciência como força de
dominação
 Os símbolos

Sendo o Inconsciente Colectivo constituído por


arquétipos, imagens arcaicas, Jung considera que os
símbolos são a via que permite acesso ao inconsciente
do paciente na cura.
Quanto mais o sujeito está submetido a essas imagens
arcaicas tanto mais está prisioneiro desse mundo
simbólico metido e escondido no mais fundo de si
mesmo.

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Os símbolos permitem fazer a ligação, a ponte entre
o que é desconhecido no homem e o que é
possível conhecer através do trabalho terapêutico.

A psicoterapia jungiana procura, desta forma,


elucidar o sentido dos símbolos, solicitando na
cura a imaginação activa e pessoal do paciente.
 O Self representa Deus, é o arquétipo da totalidade, da
integração e perfeição da personalidade, o resultado da
individualização.
Inclui consciente e inconsciente, os elementos opostos
da personalidade. Pode ser expresso geometricamente
por mandala, por reis e rainhas, por deuses e deusas,
Cristo ou buda, animais poderosos ou míticos…

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 A criança dá conta das origens da vida, desenvolvimento e
auto-realização e simboliza o potencial de desenvolvimento
escondido. Pode ser simbolizado por um macaco, uma jóia
ou uma bola dourada.

 Tesouro é simbolizado por uma jóia ou outro objecto valioso,


protegido por vezes por uma serpente ou dragão, numa
gruta, Na verdade dá conta da auto-realização ou salvação,
da descoberta do Self.
 Jung e alguns elementos da fé cristã

 A religião interessa-lhe como fonte de arquétipos


 Deus é um arquétipo, uma parte incogniscível do
inconsciente colectivo, mas experienciável através dos
símbolos. Tem assumido várias formas nas religiões:
Cristo, Buda, reis e rainhas... Deus é cogniscível através
da experiência religiosa do numinoso

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 Trindade – aparece em várias religiões, mas
considera que as quatro partes de mandala são
mais completos.
 O quarto lado da Trindade pode ser Satan, a
sombra, ou pode ser feminino, e, neste sentido,
ele entusiasmou-se com o dogma da Imaculada
Conceição.
 A eucaristia – é um símbolo persuasivo. Tem por detrás
o shamanismo, seus mistérios e sacrifícios aos deuses
pela fecundidade e renascimento.
 A eucaristia cristã dá conta de como Deus enviou o seu
próprio filho, que é ele próprio, para ser sacrificado.
 Deste modo o filho renasce novamente, bem como os
participantes, que sacrificam o egoismo, dissociando
parte do ego, e o Self é transformado

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 Cristo – arquétipo do Self, que corresponde a Deus.
 É o principal símbolo do Self.
 Parece perfeito, mas não é completo, pois perdeu a
sombra.
 A separação de Cristo de Deus (incarnação) com o
seu nascimento simboliza a nossa separação dos
nossos pais.
 A morte de Cristo simboliza a necessidade de
sacrificar o ego em ordem à completude.
 Dogmas religiosos – nascem da experiência.
 Dogmas e rituais religiosos protegem a experiência
religiosa de perturbações graves ou patológicas.
 Neste sentido conidera que o protestantismo, ao
abandonar os dogmas e ritualidade católicos, ficou
enfraquecido

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 A tarefa espiritual de individuação – a integração da personalidade dá
conta de auto-realização, de completude.
 Consiste na combinação de elementos opostos, consciente e
inconsciente, aceitação dos elementos reprimidos, edificação do Self.
 Isto é uma tarefa da meia idade da vida, ou da psicoterapia.
 E isso é uma procura religiosa, já que o Self é um arquétipo religioso
representado por símbolos religiosos.
 O louvor a Deus conduz a libertação da inadequação humana, e tal
transformação está presente nos ritos de iniciação.
 Os símbolos de transcendência dão conta da busca de metas de auto-
realização
 Outras ideias religiosas
 Gnosticismo – tem a crença de um mundo em
permanente conflito entre o bem e o mal.
 Para Jung a luta desses dois opostos simbolizam o
conflito interno da personalidade.
 A salvação pode ser conseguida através de
conhecimentos místicos e esotéricos que podem
reconciliar os dois lados.

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 Alquimia – tem a ver com as experiências químicas
para transforma os metais em ouro (pedra filosofal).
Para Jung simboliza a transformação da personalidade
através da sua integração
 Jung interpreta a história de Job como a revelação de
que Deus tem um lado escuro, um lado sombra, que é
violento e injusto. Job conseguiu tomar conhecimento
deste lado e Deus teve de reparar a situação através da
incarnação.
 Conclusão:
- Jung foi simpático com a religião. Considerava-a importante
para a saúde mental, pois é um factor de sentido para a vida e
porque aponta desafios ou metas importantes para o homem.
- Compreende-se que tenha defendido que a religião tem uma
função importante na integração da personalidade e na
construção do Self.
- Defendeu em dada altura que cada pessoa necessita de
encontrar um sentido religioso na vida.

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 Jung, porém, não era um homem religioso, nem se importava com a
veracidade da religião no que se refere à afirmação da existência de
Deus.
 Interessava-se por temas religiosos e crenças na perspectiva de
encontrar arquétipos aí presentes para, deste modo, melhor
compreender a mente humana.
 Neste sentido, a religião apenas dá conta de um arquétipo da
deidade, o qual é para a mente apenas a razão pela qual a pessoa
se pode pronunciar sobre Deus.
 Deus era para ele somente uma realidade psíquica
 Para finalizar - Jung trás contributos importantes para o
estudo da religião:
 A importância do símbolo e da linguagem simbólica
 A interligação entre cultura e religião
 A importância da religião no desenvolvimento e
integração harmónica da personalidade
 A religião como factor de sentido para a vida e produtor
de metas a alcançar

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 Ficam algumas críticas
 Deus é uma realidade psicológica, não tem consistência real
 O religioso tem apenas uma função psicológica: estruturar o
inconsciente colectivo e permitir a integração da personalidade
 A religião é uma via de acesso aos arquétipos
 Jung parte de conceitos apriorísticos -arquétipos- e constrói
uma gramática para a interpretação do inconsciente individual
e colectivo: a religião, pela sua natureza simbólica, ritual e
histórica, serve estes objectivos
 Enquanto que Freud fala de inconsciente, Jung fala de
inconsciente colectiva. Caracterize este conceito.
Quais os seus conteúdos?

 Jung tem uma opinião positiva sobre a religião. Qual a


sua função para o autor?

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