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HISTÓRIA DA

CRIMINOLOGIA
PRECURSORES
 “Antes da publicação da famosa obra lombrosiana,
que costuma ser citada como “certidão de
nascimento“ da Criminologia empírica “científica”,
já existiam numerosas “teorias” sobre a
criminalidade. (…) Nesta “etapa pré-científica”
havia dois enfoques claramente distintos, em
razão do método de seus patrocinadores: por um
lado, o que se pode denominar “clássico” ( produto
das ideias do Iluminismo, dos Reformadores e do
Direito Penal “clássico”: modelo que se vale de um
método abstracto, dedutivo e formal);
 de outro, o que se pode qualificar de
“empírico”, por ser desta classe as
investigações sobre o crime, realizadas de
forma fragmentária por especialistas das
mais diversas procedências (fisionomistas,
frenólogos, antropólogos, psiquiatras, etc.),
tendo todos eles em comum o fato de que
substituem a especulação, a intuição e a
dedução pela análise, observação e
indução ( método empírico-indutivo)”
 Antes do aparecimento de Lombroso, que dá início ao
período da Antropologia Criminal, do século XV até
1875, houve uma enorme gama de autores que podem
ser considerados precursores da Criminologia. Entre
eles destacam-se:

1- Filósofos e pensadores, especialmente dos séculos


XVI, XVII, XVIII;
2- Penólogos e penitenciaristas;
3- Fisionomistas;
4- Frenólogos;
5- Psiquiatras e médicos de prisões.
Filósofos e pensadores
 Thomas Morus (1478-1535): publicou Utopia (obra de grande
importância para estudos e consultas até os dias de hoje), onde
descreve a enorme onda de criminalidade que assolava a Inglaterra
nessa época.
 Em sua obra, Morus imaginava uma sociedade idílica (e essa era sua
utopia), onde um governo organizado da melhor maneira proporcionaria
boas condições de vida a um povo, que assim seria equilibrado e feliz.
 Morus dizia que em um país, quando o povo é miserável, a opulência e a
riqueza ficam em poder das classes superiores e essa situação
economicamente antípoda faz gerar um maior nº de crimes.
 Portanto, Morus já sinalizava o factor económico como uma das causas
da criminalidade. Morus propugnava por penas menos rigorosas e que
elas fossem correspondentes à natureza dos delitos. Ele foi o 1º a expor
a necessidade de graduar as penas proporcionalmente aos delitos.
 Vivia-se naquela época uma deplorável crise económica na
Inglaterra. Flandres absolvia toda a produção de lã, o que forçou
a destinação dos campos ingleses ao pastoreio de gado menor
(o que tornou famosa a frase de Morus: “Na Inglaterra as
ovelhas comem os homens”).

Além disto, a Inglaterra era submetida ao déspota Henrique VIII,


enquanto a nobreza e o clero eram latifundiários e donos da
maior parte das riquezas do país, ainda existindo a péssima
exploração das terras.

Aliás, por ter bramido contra tal estado de coisas, apesar de ter
sido chanceler do rei Henrique VIII, Morus acabou sendo
decapitado.
 Martinho Lutero: influenciador de muitas
revoltas camponesas na Alemanha, foi o 1º
autor a distinguir uma criminalidade rural e
outra urbana.

 Francis Bacon: admitia como causas


determinantes da criminalidade, fenómenos
socioeconómicos, no que foi acompanho por
René Descartes.
 2-Penólogos e Penitenciaristas

No início do século XVIII, não existiam propriamente


prisões e as que havia mantinham-se em péssimas
condições. Os juízes eram unilaterais e arbitrários. A
confissão era a rainha das provas (regina probatione),
obtida através de torturas. Os primeiros aspectos de
prisões, que podem ser considerados como precursores
das atuais, estabeleceram-se em Amsterdão (Holanda) em
1611. Os detentos eram submetidos à trabalhos forçados
sem nenhuma utilidade prática, como moer pedras, extrair
areia, etc. Contra este estado de coisas levantaram-se
filósofos e humanistas, dentre eles:
 Desta forma, os humanistas e os
iluministas se rebelam e conseguem
suprimir em 1780 na França, a tortura;
em 1817 na Espanha, em 1840
aboliram a tortura em Hanover e em
1851 na Prússia.
 Montesquieu: escreveu a obra O Espírito das
Leis (L’esprit des lois), onde proclamava que
o bom legislador era aquele que se
empenhava na prevenção do delito, não
aquele que simplesmente se contentasse em
castigá-lo. “Ao invés de funcionar como
castigo, a pena deveria ter um sentido
reeducador”.
 Criou distinção entre os delitos( crimes
que ofendem a religião, os costumes, a
tranquilidade e a segurança dos
cidadãos) consagrando a preocupação
em classificar os delitos conforme o bem
jurídico atingido, não só quanto à sua
natureza mas também as próprias
características pessoais dos autores de
crimes.
 Jean Jacques Rousseau: em sua obra
de maior importância e divulgação,
Contrato Social, assevera que, se o
Estado for bem organizado, existirão
poucos delinquentes e na obra
Enciclopédia, diz que “a miséria é a mãe
dos delitos”.
 Voltaire: dizia que o roubo e o furto são os delitos do pobre.
 Condenava a aplicação de pena de morte, os martírios, suplícios ou
torturas aplicadas contra o delinquente.

 Notabilizou-se por sua luta pela reforma das prisões (ele mesmo esteve
preso e recolhido à Bastilha), pela reformulação da pena de morte,
propondo a substituição por trabalhos forçados.

Também combateu a prática da tortura como método de obter a verdade ou


a prova. Salientava Voltaire que o roubo e o furto são os delitos dos pobres.
Foi um dos primeiros a advogar o trabalho para os apenados.
 César Bonesana, “Marquês de
Beccaria” (1738-1794):
Escreveu a famosa obra Dos Delitos e
das penas (Dei Delliti, Delle Pene),
obra clássica e de leitura obrigatória nos
dias actuais à todos aqueles que se
interessam por criminologia.
 Beccaria nasceu em Milão, Itália, e teve a audácia,
aos 27 anos de idade, de afrontar os costumes
penais e as arbitrariedades da Justiça Criminal de
seu tempo, publicando a obra Dos Delitos e das
Penas, na cidade de Livorno, de forma clandestina,
temendo possíveis represálias.

 Tal livro causou muito impacto, sendo veemente


atacado por todos aqueles que, de uma forma ou de
outra, foram por ele atingidos ou porque não
concordassem com suas proposições.
 Sua obra é um protesto contra o injusto, cruel
e arbitrário procedimento da Justiça Criminal.
 Em um dos capítulos finais, dizia: “Para que
todo o castigo não seja um acto de violência
exercido por um só ou por muitos contra um
cidadão, deve essencialmente ser público,
pronto, necessário, proporcional ao delito,
ditado pelas leis e o menos rigoroso possível,
atendidas todas as circunstancias do caso”.
Seus principais postulados são:

 A atrocidade das penas opõe-se ao bem público (Princípio da humanização das


penas);

 As acusações não podem ser secretas (Princípio da Publicidade);

 As penas devem ser proporcionais aos delitos (Princípio da Proporcionalidade das


Penas);

 As penas devem ser moderadas;

 O roubo é ocasionado geralmente pela miséria e pelo desespero.

 As penas devem ser previstas em lei (Princípio da Legalidade, da Anterioridade ou


da Reserva Legal);

 Somente os magistrados é que podem julgar os acusados (Princípio da


Jurisdicionalidade);
 Aos juízes não deve ser dado interpretar as leis penais; (preocupação com a
arbitrariedade)

 Não se pode admitir a tortura do acusado por ocasião do processo (Princípio


da Proibição de tortura, da Humanidade e da Dignidade);

 O réu jamais poderá ser considerado culpado antes da sentença condenatória


(Princípio da Presunção de Inocência);

 Mais útil que a repressão penal é a prevenção dos delitos;

 Não tem a sociedade o direito de aplicar a pena de morte nem de banimento.

 O objectivo da pena não é atormentar o acusado e sim impedir que ele


reincida e servir de exemplo para que os outros não venham a delinquir;
 Nessa época, eleva sua voz contra a natureza punitiva que
se queira atribuir à prisão provisória, defendendo a
necessidade de que ela deveria ser tão suave quanto
possível.

 “Geralmente, o acusado preso antes do julgamento, é tratado


como se fosse um verdadeiro delinquente, quando a
experiência nos demonstra com bastante frequência, tratar-
se de pessoas sem nenhuma responsabilidade. Só a menção
desta circunstância, nos faz meditar sobre a arbitrariedade e
a crueldade desta medida” (SENDEREY, Israel drapkin.
Manual de Criminologia. São Paulo: Bushatsky, 1.978.P.21).
 O espanhol Mariano Cubí y Soler (1801-1875) autor
de Manual de frenologia e Sistema completo de
frenologia (1844), foi um dos primeiros a afirmar e
expor a teoria do criminoso nato, caracterizando-o
como um "subtipo humano".
 Para ele, "há criaturas humanas que nascem com
um desmedido desenvolvimento da destrutividade,
acometividade ou combatividade, aquisitividade (...)
cuja organização constitui relação ao naturalmente
 ladrão, ao violador, ao assassino, ao fraudador e a
outros tipos criminais"
 No âmbito da psiquiatria, muitos autores
são citados pela importância de seus
trabalhos.
 Benedict-Augustin Morel (1809-1873), por
exemplo, escreve um “Traité des
dégénérescences physiques,
intellectuelles et morales de l'espece
humaine et des causes qui produisent ces
varietes maladives » (l 857), associando a
criminalidade à degeneração.
 Benedict-Augustin Morel, expõe uma teoria da
hereditariedade dos transtornos mentais que
teria grande influência no pensamento
psiquiátrico até o início do século XX. Segundo
sua proposição, fortemente impregnada de
uma perspectiva religiosa católica, o homem
teria sido criado, perfeito, por Deus. A
degeneração, correlativa do pecado original,
consistiria na transmissão à descendência das
taras, vícios e traços mórbidos adquiridos
pelos antecessores.
 À medida que esses estigmas fossem
sendo transmitidos através das gerações,
seus efeitos tenderiam a se acentuar,
levando à completa desnaturação daquela
linhagem, chegando até sua extinção pela
esterilidade. Em decorrência dessa teoria,
muitos projectos de intervenção social de
cunho higienista foram desenvolvidos, de
modo a impedir a propagação da
degeneração da raça.
 Morel relaciona a degeneração à
alteração do tipo antropológico ou do
biótipo humano com a patologia,
particularmente com a mental. Era, para
ele, um desvio doentio do tipo normal
 da humanidade, hereditariamente
transmissível, com evolução progressiva
no sentido de decadência.
 Philippe Pinel (1745-1826), importante psiquiatra francês,
realizou os primeiros diagnósticos clínicos, separando os
delinquentes dos enfermos mentais.

 Considerado o pai da moderna Psiquiatria, elabora


conceito de uma mania sem delírio, que seria o desajuste
do indivíduo que apresentaria distúrbios comportamentais
em relação aos valores, sem entretanto padecer de uma
patologia mental;
 Antes dele, o louco, considerado possuído pelo diabo, era
acorrentado; foi o primeiro a conseguir elevar o deficiente
mental da situação de pária à categoria de doente.
 Seu Traite médico-philosophique sur
l'aliénation mentale (1801) marca o
coroamento do saber psiquiátrico de
seu tempo.
 Jean-Etienne Esquirol ( 1.745- 1840), discípulo de Pinel,
estuda uma série de delinquentes alienados, buscando
estabelecer relações entre a loucura e o crime.
 Foi um dos pioneiros na diferenciação entre deficiência
mental e insanidade. Para ele a idiotia não era urna
doença, mas sim uma condição das faculdades mentais.
 Esquirol contribuiu com a psicologia por meio do
trabalho com internos e loucos em manicómios,
chegando a desencadear a criação de uma comissão de
investigação, na França, para verificação do tratamento
dado aos internos.
 No plano criminológico afirmou, em sua
principal obra, Des Maladies Mentales,
de 1838, que o acto criminal só poderia
ser realizado sob estado delirante, em
que o autor age por um impulso
maquinal, irresistível, o que logicamente
não autorizaria uma punição, posto que
o autor seria irresponsável.
 Em 1835, Pritchard conceitua a loucura
moral como: “São distúrbios nos quais
existe uma perversão do sentimento, do
temperamento, da tendência, dos
hábitos e da acção, sem irregularidade
na faculdade intelectiva. Essa loucura
do sentimento consiste na unilateral e
circunscrita atrofia do senso moral, com
consequência sobre a conduta”
 Outro autor francês Próspero Despine
que, em 1869 em Paris, com sua obra
 Psychologie naturelle, sob a rubrica de
"loucura moral" define a insensibilidade
moral permanente de certos
delinquentes, antecipando-se a
Lombroso nos estudos de taras
degenerativas de criminosos.
 Muito ligados à psiquiatria e à frenologia, nesse período
da historia, estavam os antropólogos, aos quais se
devem algumas importantes ideias utilizadas por
Lombroso.

 Lucas (1805-1885), em seu Traite philosophique et


physiologique de l 'hérédité naturelle, em 1847, enuncia
o conceito de atavismo como o reaparecimento, em um
descendente, de um caracter não presente em seus
ascendentes imediatos, mas, sim, em remotos. Lucas faz
referenda a uma tendência criminal transmissível pela
via hereditária, e presente já desde o momento do
nascimento do individuo.
 Gaspar Virgílio (1836-1907) que, em
1874, dois anos antes de Lombroso,
escreveu Sulla natura morbosa del delito,
referiu-se as características anormais dos
delinquentes e estabeleceu, como causa
importante do delito, a anormalidade do
seu autor, usando na Itália o conceito de
criminoso nato, algo que já havia sido
mencionado na Espanha por Cubi y
Soler.
 De notar que, em grande medida, tais ideias
receberam as decisivas contribuições de
Lamarck e Charles Darwin.
 O primeiro afirmava que os caracteres adquiridos
em função da necessidade do meio são
transmitidos aos descendentes, criando,
 assim, a base para o pensamento evolucionista
utilizado por Lombroso, em sentido inverso.
 O crime podia ser causado por uma regressão -
espécie de involução - já que os seres evoluíam
e eram seleccionados pelo meio.
 É, no entanto, Charles Darwin (1809-1882), em
sua obra The origin ofspecies, de 1859, quem
proporciona uma revolução paradigmática. Seu
livro poe de cabeça para baixo tudo o que a
ciência biológica havia escrito ate então. E com
ele que fica demonstrada a evolução das
espécies, desde as formas viventes mais
elementares ate chegarmos aos hominídeos. Sua
teoria implicava afirmar que a humanidade não
resultou de um processo criador repentino, mas
foi decorrência de uma lenta evolução natural.

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