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Teorias e técnicas

psicoterápicas especiais
O que é psicoterapia?

 É um método de tratamento que utiliza meios psicológicos com a finalidade de aliviar um


desconforto ou sofrimento psíquico, eliminar sintomas de transtorno definido, resolver
problemas pessoais de natureza emocional ou psicológica ou estimular o desenvolvimento
pessoal.

 O método é utilizado por um profissional treinado, que, de forma deliberada e intencional,


busca ajudar um cliente ou paciente que o procura com a finalidade de obter alívio para um
sofrimento de natureza psíquica.
 É realizada em um contexto interpessoal – a relação terapêutica – e em um setting
profissional.

 Utiliza a comunicação verbal como principal recurso.

 É uma atividade eminentemente colaborativa entre paciente e terapeuta.


 As psicoterapias distinguem-se quanto a seus objetivos, fundamentos teóricos, frequência
das sessões, tempo de duração, treinamento exigido dos terapeutas e condições pessoais
que cada método exige de seus eventuais candidatos.
 Embora todas utilizem a comunicação verbal no contexto de uma relação interpessoal, os
diferentes modelos divergem quanto ao racional ou à explicação que propõem para
justificar a ocorrência dos sintomas e as mudanças que almejam obter em seus pacientes
por meio de seus métodos específicos.
 Para a psicoterapia ser efetiva, ela depende, além do uso de técnicas específicas, de fatores
que são considerados comuns a todas as terapias. Ela exige do terapeuta capacidade de
empatia, autenticidade, calor humano, traços positivos de caráter (honestidade, interesse
genuíno pelo paciente, facilidade de comunicação e de relacionar-se com outras pessoas),
além de competência e conhecimento técnico sobre o problema ou transtorno a ser
abordado.

 Por parte do paciente, requer a capacidade de estabelecer uma relação terapêutica, de se


vincular afetivamente e de se comunicar de forma honesta com o terapeuta, bem como de
ter confiança e desejo sincero de fazer mudanças. Essas condições são necessárias para
todos os modelos de terapia.
As psicoterapias são tratamentos eficazes?
 Não há dúvida de que as psicoterapias são eficazes, visto que elas compartilham o mesmo
status de evidência de muitas intervenções para outras condições em saúde, entre as quais
medicamentos e procedimentos intervencionistas.

 Uma revisão sistemática que avaliou o tamanho de efeito das diversas modalidades de
psicoterapia foi publicada por Huhn (2014) e colaboradores e encontrou valores
estatisticamente significativos entre 0,17 (tamanho de efeito pequeno) para a terapia
cognitivo-comportamental (TCC) para abuso de álcool e 1,37 (efeito grande) para a TCC
para transtorno obsessivo-compulsivo. Desse modo, fica evidente que a resposta ao
tratamento é muito variável de acordo com a técnica e situação avaliadas.
 Entretanto, vale ressaltar que, apesar de a psicoterapia ser uma intervenção com riscos
mínimos e que visa ao bem-estar e à qualidade de vida do paciente, a avaliação das
evidências mostra que muitas críticas feitas à indústria farmacêutica, por conflito de
interesses, também cabem aos pesquisadores em psicoterapia.
Panorama de algumas abordagens
Psicanálise
Psicanálise

 Breuer e Freud tratavam seus pacientes através da hipnose e com essa técnica perceberam
que o afastamento de impulsos inaceitáveis da consciência, por meio da repressão, era o
responsável pelo caráter patogênico e que o ato de trazê-los de volta à consciência
produzia a perda de tal característica e, por conseguinte, o desaparecimento dos sintomas.

 Freud desenvolveu outras formas de acessar os conteúdos mentais inconscientes: a livre


associação – também chamada de regra fundamental da psicanálise –, a interpretação dos
sonhos e a análise da transferência, até hoje utilizadas para tal fim.
 No campo teórico, as ideias iniciais de Freud tiveram inúmeros desdobramentos,
destacando-se a psicologia do ego, que destaca que o mundo intrapsíquico é caracterizado
por conflitos entre três instâncias: o ego, o id e o superego. O conflito se manifesta por
meio da ansiedade, que, por sua vez, mobiliza os mecanismos de defesa do ego.

 Os sintomas representam soluções de compromisso entre a expressão plena dos impulsos


(ou sentimentos) e sua repressão ou seu manejo pelos mecanismos de defesa e moldam o
caráter da pessoa. A análise das defesas, que surgem como resistência ao tratamento, é o
foco da psicoterapia à luz da psicologia do ego.
Técnica de psicoterapia psicanalítica

 Na psicanálise, o analista adota uma atitude neutra, sentando-se às costas do paciente, não
havendo, portanto, um contato visual direto. O paciente é orientado a expressar livremente
e sem censura seus pensamentos, sentimentos, fantasias, sonhos, imagens, assim como as
associações que ocorrem, sem prejulgar sobre sua relevância ou seu significado.
 Em virtude da neutralidade, da repetição frequente das sessões e do divã, são estabelecidas
uma regressão e uma relação transferencial por parte do paciente, que passa a deslocar para
a pessoa do terapeuta pensamentos e sentimentos voltados originariamente para indivíduos
importantes de seu passado, repetindo padrões primitivos de relacionamento.
 Dessa forma, o passado se torna presente na chamada neurose de transferência. Por
intermédio das interpretações, centradas na análise e na resolução da referida neurose
transferencial, o paciente pode obter insight sobre tais padrões primitivos e desadaptados
de relações interpessoais, compreender a origem de traços patológicos de seu caráter,
reviver emoções perturbadoras associadas a figuras do passado (pai, mãe, irmãos),
modificá-las e livrar-se dos sintomas.
Indicações da psicanálise

 Transtornos da personalidade, especialmente os do grupo C ( evitativa, dependente e


obsessivo-compulsiva), e transtorno da personalidade borderline.
 Traços de personalidade ou caráter disfuncionais.
 Conflitos não resolvidos nas relações com os pais, que são responsáveis por dificuldades
nas relações interpessoais, inclusive sexualidade.
 Atrasos ou lacunas em tarefas evolutivas (p. ex., aquisição de identidade própria,
independência, autonomia, capacidade de se envolver afetivamente).
É necessário que o candidato à terapia
psicodinâmica:
 Tenha capacidade de introspecção razoável.
 Tenha motivação necessária para modificar aspectos de sua pessoa e interesse em aumentar
sua compreensão sobre si mesmo.
 Seja capaz de desenvolver um bom vínculo com o terapeuta e uma aliança terapêutica e de
comunicar-se de forma honesta com o terapeuta, predominantemente em palavras, e não
por meio de ações.
 Disponha de tempo e condições financeiras para arcar com os custos. Em geral, essas duas
condições definem a modalidade de terapia a ser escolhida: se psicanálise ou terapia de
orientação analítica.
Contraindicações da terapia psicanalítica

 No caso de transtornos mentais para os quais existem tratamentos efetivos mais breves e de
menor custo (p. ex., fobias, ansiedade social, transtorno de ansiedade generalizada,
transtorno de estresse pós-traumático, transtornos do humor, transtornos alimentares,
depressão, entre outros).

 Na presença de problemas de natureza aguda e que exigem solução urgente (p. ex.,
depressão, transtorno de estresse agudo, transtorno de pânico, etc.).

 Na ausência de um ego razoavelmente integrado e cooperativo (p. ex., psicose, transtornos


da personalidade graves, dependência de substâncias, transtornos mentais de origem
cerebral, transtornos neurocognitivos, deficiência intelectual).
Análise do comportamento
Análise do comportamento

 A terapia comportamental (TC) baseia-se nas teorias e nos princípios da aprendizagem


para explicar o surgimento, a manutenção e a eliminação dos sintomas. Entre esses
princípios, destacam-se: o condicionamento clássico (Pavlov), o condicionamento operante
(Skinner), a aprendizagem social (Bandura).

 Condicionamento clássico > fobias específicas, a agorafobia em pacientes com pânico.


 Condicionamento operante > a esquiva fóbica alivia sintomas de ansiedade.
 Aprendizagem social > comportamento pode ser adquirido pela simples observação de
outros indivíduos.
Técnicas da terapia comportamental:

 Exposição: pode ser in vivo ou na imaginação, gradual ou instantânea (inundação) e


assistida pelo terapeuta ou em grupo.
 Prevenção de respostas: abster-se de realizar rituais (verificações, lavação das mãos).
 Reforço positivo: tornar um evento agradável contingente a um comportamento desejável
(p. ex., dar atenção, elogiar, recompensar, etc.).
 Reforço negativo: remoção de algo desagradável como forma de estimular o
comportamento desejável (p. ex., remoção da sonda nasogástrica em indivíduos com
anorexia ou da imobilização em pacientes agitados).
 Relaxamento muscular e treino da respiração.
 Treino de habilidades sociais, treino de assertividade.
Terapia Cognitivo Comportamental
Terapia Cognitivo Comportamental

 A terapia cognitiva foi proposta inicialmente por Aaron T. Beck no início dos anos de 1960
para tratamento da depressão.

 A terapia cognitiva tem a premissa básica de que a maneira como as pessoas interpretam
suas experiências determina como elas sentem e como se comportam. A afirmativa do
filósofo estoico Epicteto (60-117 d.C.) de que “Os homens se perturbam não pelas coisas,
mas pela visão que têm delas”, expressa a ideia central do modelo cognitivo. De acordo
com o modelo, existem erros no processamento da informação (de lógica) sob a forma de
pensamentos disfuncionais, distorções cognitivas responsáveis pelos sintomas, em vários
transtornos mentais: nos transtornos de ansiedade, transtornos da personalidade,
transtornos alimentares, depressão, entre outros.
 De acordo com o modelo cognitivo, determinadas situações ativam pensamentos
automáticos negativos ou catastróficos coerentes com crenças ou esquemas cognitivos
disfuncionais subjacentes. Essas distorções cognitivas associadas a avaliações e
interpretações distorcidas têm como consequências alterações no humor, sintomas físicos e
mudanças de comportamento.
Técnica

 A terapia cognitiva geralmente é breve, com duração entre 10 e 20 sessões. Em algumas


situações, como no tratamento de transtornos da personalidade, pode se estender por mais
tempo.
 A terapia é uma descoberta guiada por meio de um trabalho colaborativo entre paciente e
terapeuta (empiricismo colaborativo). A função do terapeuta é auxiliar o paciente a usar os
próprios recursos para identificar erros de lógica, pensamentos e crenças errôneos ou
disfuncionais e, posteriormente, corrigi-los mediante exame das evidências, testes
comportamentais e geração de pensamentos alternativos.
 Utiliza sessões estruturadas, com uma sequência de tópicos predeterminada, e suas marcas
registradas são as tarefas para casa, as autoavaliações constantes e os feedbacks tanto do
terapeuta como do paciente.
Eficácia e efetividade da terapia cognitivo-comportamental

 Não há dúvidas de que a TCC é o modelo de terapia mais estudado empiricamente pela
ciência contemporânea, apresentando uma diversidade de aplicações clínicas eficazes.
Parte disso se deve à capacidade de manualização da técnica, que, consequentemente,
permite a replicabilidade em diversos contextos com maior precisão. Atualmente, há
centenas de metanálises de ensaios clínicos que comprovam a eficácia da TCC.
 As principais guidelines do mundo indicam a TCC e suas vertentes como abordagens
terapêuticas de primeira linha para uma diversidade de transtornos mentais. A lista a seguir
é baseada em relatórios do NICE, da Cochrane Library, da Canadian Agency for Drugs and
Technologies in Health (CADTH) e do Institute of Quality and Eficiency in Health Care
(Alemanha).
Indicações da TCC

 Depressão maior;
 Transtorno bipolar;
 Transtornos de ansiedade e transtorno obsessivo-compulsivo (TOC);
 Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT)
TCC, em princípio, é contraindicada a pacientes
com:
 Doença mental orgânica que implique comprometimento cognitivo;
 Psicose aguda;
 Níveis de ansiedade muito elevados ou incapacidade de tolerar aumento dos níveis de
ansiedade (p. ex., transtorno da personalidade borderline, transtorno da personalidade
histriônica).
 Ausência de motivação.
Terapias Contextuais
MINDFULNESS:

 Com a introdução da mindfulness (atenção plena) no contexto da saúde, no final da década


de 1970, por Jon Kabat-Zinn por meio do programa Mindfulness-Based Stress Reduction
(MBSR), um protocolo originalmente idealizado para o tratamento de pacientes com dor
crônica, o interesse pela inclusão de novas abordagens clínicas das práticas e dos
princípios da mindfulness aumentou consideravelmente.

 A partir de então, surgiram abordagens psicoterapêuticas baseadas nos princípios da


técnica de mindfulness e do contextualismo. Tais abordagens consideram as funções dos
fenômenos psicológicos e o contexto e dão ênfase às estratégias de mudança, nas quais se
busca a construção de repertórios amplos, flexíveis e efetivos, a partir do aumento da
consciência não julgadora do que ocorre na experiência do aqui e agora, e o
direcionamento dos comportamentos de acordo com os valores pessoais.
Fundamentos teóricos

 A abordagem mindfulness envolve um estado da atenção, uma consciência profunda e não


julgadora sobre o que acontece no momento presente. Trata-se do cultivo dessa habilidade
que permite às pessoas serem menos reativas às experiências tal qual elas acontecem, sejam
elas agradáveis ou não.

 De acordo com Germer (2015), na psicoterapia, o conceito de mindfulness inclui três


elementos: consciência, momento presente e aceitação. Supõe uma consciência plena, que
parte do terapeuta e envolve também o paciente, de estar atento de maneira intencional,
curiosa e não julgadora ao que acontece no momento presente: às emoções presentes, às
percepções, às sensações físicas e aos pensamentos. O objetivo é proporcionar um espaço
para se observar tudo o que acontece sem reagir, com a intenção de notar as experiências de
forma acolhedora, com a abertura de quem está vendo o que ocorre pela primeira vez.
Terapia comportamental dialética

 A terapia comportamental dialética, ou Dialectical Behavior Terapy (DBT), foi


desenvolvida e validada por Marsha Linehan para o tratamento de pacientes com
transtorno da personalidade borderline e com comportamentos de risco. A DBT é
estruturada nos conceitos de mindfulness, de atenção ao momento presente e ao que ocorre
interna e externamente ao paciente, treinando-se uma observação consciente e descritiva
das situações.

 Essa psicoterapia aborda a intenção de manter o equilíbrio entre aceitação e mudança,


reconhecendo-se a tensão dialética que se estabelece entre esses dois polos. É justamente
nesse reconhecimento da situação presente que a prática de mindfulness entra como eixo
central da DBT.
 O modelo teórico biossocial adotado para a compreensão da desregulação emocional parte
do pressuposto de que existe uma interação entre uma disposição biológica do sujeito para
a vulnerabilidade emocional associada a um ambiente invalidante e de que ambos se
impactam mutuamente, o que ocasiona uma aprendizagem deficiente para lidar com as
situações.

 Ambientes invalidantes são aqueles em que há, ao longo do desenvolvimento da criança, a


presença sistemática de respostas inapropriadas e erráticas
Técnicas

 A partir de então, pode-se ensinar novas estratégias para que o paciente consiga responder
de maneira mais habilidosa. O treinamento de habilidades da DBT inclui mindfulness,
regulação emocional, tolerância ao mal-estar e aceitação. Na terapia individual, são
trabalhados os objetivos do paciente de maneira hierarquizada, primando-se inicialmente
pela manutenção da vida, seguida pelo empreendimento de fatores que possam interferir na
condução da terapia e por questões que influenciem negativamente a qualidade de vida do
paciente.
 O objetivo maior da DBT é engajar o paciente a direcionar-se para uma vida valiosa,
consciente do que ocorre, mantendo o equilíbrio dialético entre as situações que se
pode modificar e aquilo que necessita de aceitação ativa, por meio do fornecimento de
habilidades para lidar com os eventos da vida.
Terapia de aceitação e compromisso

 A terapia de aceitação e compromisso (ACT), é baseada na teoria dos quadros relacionais


(RFT, na sigla em inglês), uma abordagem relacionada ao campo de pesquisa da cognição
e linguagem humanas. A RFT diz respeito à forma relacional e arbitrária que a cognição e
a linguagem humanas condicionam o comportamento, pois as habilidades racionais
utilizadas pela mente humana para resolver problemas podem ser ineficazes para auxiliar
as pessoas a lidar com a dor psicológica.

 Com base nisso, a ACT foi desenvolvida com o objetivo geral de proporcionar
flexibilidade psicológica, aceitando que sentimentos, pensamentos, memórias e
sensações desagradáveis são fatos que acontecem para todos e que podemos aprender
maneiras diferentes de viver de forma saudável e valiosa, ampliando o modo como
nos relacionamos com esses eventos.
Técnicas

 O modelo de psicopatologia da ACT compreende que a tentativa de controle de situações e


experiências pessoais julgadas negativas (eventos privados), a esquiva experiencial e a
fusão cognitiva (quando a pessoa se identifica com o que pensa e sente, acreditando ser o
que pensa em termos de self, p. ex., “Sou um fracasso”) promovem sofrimento e dor
psicológica. Para lidar com isso, a ACT utiliza técnicas de mindfulness, aceitação e
metáforas, afim de aumentar o contato com o presente, diminuir a esquiva experiencial e
fazer a distinção entre o self conceitual e o self como contexto, incrementando habilidades
no paciente para a realização de ações comprometidas com seus valores.
Indicações das psicoterapias contextuais:

 ACT: Dor crônica; Depressão; Ansiedade; TOC; Transtornos alimentares.

 DBT: Transtorno da personalidade borderline; Prevenção do suicídio;


Depressão; Abuso de substâncias; Condutas autolesivas sem
intencionalidade suicida.
Atividade

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