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O ALTO DA

BARCA DO
INFERNO
GIL VICENTE

Professora Claudia GUmmersbach


Gil Vicente foi poeta e dramaturgo
português, considerado o “Pai do
Teatro Português”. Em Portugal, Gil
Vicente foi a figura mais importante
do humanismo literário.
Costuma-se enquadrar Gil Vicente
na segunda época da literatura
medieval portuguesa, uma época de
transição da Idade média para o
Renascimento, denominada de
Humanismo.
O teatro de Gil Vicente, chamado de
Teatro Vicentino, teve origem em 1502
com a apresentação de seu texto “O
Monólogo do Vaqueiro”. Suas peças,
de caráter popular, possuem um forte
teor satírico.
Suas obras apresentam critica aos
costumes da sociedade portuguesa,
tecendo um fiel retrato de sua época.
Além do caráter satírico, o conteúdo
das obras apresentava um teor
moralizante, repleto de humor.
Escrita na passagem da Idade Média para a Idade Moderna,
“Auto da Barca do Inferno” oscila entre os seus valores morais
de duas épocas: ao mesmo tempo que há um severa crítica à
sociedade, típica da Idade Moderna, a obra também está
religiosamente voltada para a figura de Deus, o que é uma
característica medieval.
O Humanismo caracterizou-se
como um período de conflitos e
mudanças de valores. Aos poucos,
o ser humano foi deixando de lado
a visão teocêntrica da existência
humana, passando a interferir
mais objetivamente no mundo em
que vivia. Começou a valorizar sua
própria capacidade intelectual e
artística, tornando-se autor de
descobertas científicas e de obras
de arte admiráveis.
O autor, Gil Vicente, enquadra-se
nesse momento de transição, ou seja,
está ligado tanto ao medievalismo
quanto ao humanismo. Esse conflito
faz com que Gil Vicente pense em
Deus e ao mesmo tempo exalte o
homem livre.
O reflexo desse conflito interior é
visto claramente na sua obra, pois ao
mesmo tempo que critica, de forma
impiedosa, toda a sociedade de seu
tempo, adotando assim uma postura
moderna, tem ainda o pensamento
voltado para Deus, característica
típica do mundo medieval.
“Auto“ = Peça teatral em forma poética, de origem medieval,
que focaliza temas religiosos e profanos, de criação
essencialmente popular, apresenta uma linguagem que integra
vocabulário e expressões consagradas pelo povo.
Os autos de Gil Vicente tratam sobre temas tradicionais de
caráter religioso-moralizante ou pastoris.
Manteve-se preso às tradições medievais e fez um teatro de tom
didático-moralizante, enraizado no teocentrismo e na ideia de
salvação da alma.
Apesar de suas personagens serem planas, sem profundidade
psicológica, elas tocam a universalidade de aspectos
psicológicos significativos que havia naquele tempo, bem como
os valores prezados ou repelidos por aquela sociedade.
Os membros da Igreja são alvo constante da crítica vicentina. É
importante observar, no entanto, que o espírito religioso presente
na formação do autor, jamais critica as instituições, os dogmas
ou hierarquias da religião, e sim os indivíduos que as
corrompem.

Acreditando na função moralizadora do teatro, colocou em cenas


fatos e situações que revelam a degradação dos costumes, a
imoralidade dos frades, a corrupção no seio da família, a
imperícia dos médicos, as práticas de feitiçaria, o abandono do
campo para se entregar às aventuras do mar.
As personagens desta obra são divididas em dois grupos: as
personagens simbólicas(alegóricas) e as personagens tipo.

Personagens TIPO: são os que apresentam características


gerais de uma determinada classe social. Esses tipos
utilizados por Gil Vicente raramente aparecem identificados
pelo nome. Quase sempre, são designados pela ocupação que
exercem ou por algum outro traço social (sapateiro, onzeneiro,
clérigo, frade, bispo, alcoviteira etc.).

Personagens SIMBÓLICOS: representam tipos particulares de


comportamento humano
O primeiro grupo inserem-se o Anjo e o Diabo, representando
respectivamente o Bem e o Mal, o Céu e o Inferno. Ao longo
de toda a obra estas personagens são como que os «juízes»
do julgamento das almas, tendo em conta os seus pecados e
vida terrena.

No segundo grupo inserem-se todas as restantes personagens


do Auto, nomeadamente o Fidalgo, o Onzeneiro, o Sapateiro,
o Parvo (Joane), o Frade, a Alcoviteira, o Judeu, o Corregedor
e o Procurador, o Enforcado e os Quatro Cavaleiros. Todos
mantêm as suas características terrestres, o que as
individualiza visual e linguisticamente, sendo quase sempre
estas características sinal de corrupção.
Fazendo uma análise das personagens, cada uma representa
uma classe social, ou uma determinada profissão ou mesmo
um credo. À medida que estas personagens vão surgindo
vemos que todas trazem elementos simbólicos, que
representam a sua vida terrena e demonstram que não têm
qualquer arrependimento dos seus pecados.
Primeira apresentação: 1517 na câmara da rainha D. Maria de
Castela, que estava enferma.
É uma obra alegórica, tanto com relação aos personagens
quanto às ideias que, no geral, perpassam uma dedução moral.
Classificação do auto: auto de moralidade.
Tempo: psicológico, uma vez que todos os personagens estão
mortos, perdendo-se a noção do tempo.
Estilo: é escrito em tom coloquial, ou seja, a linguagem
aproxima-se a da fala, revelando assim a condição social das
personagens
Estrutura : pode-se dizer que o Auto possui um único ato,
dividido em cenas, nas quais predominam os diálogos entre as
almas, que estão sendo julgadas, com o anjo e com o diabo.
Os personagens do Auto, com exceção do anjo de do diabo, são
representantes típicos da sociedade da época. Eles raramente
aparecem identificados pelo nome, pois são designados pela
ocupação social que exercem (onzeneiro, fidalgo, sapateiro, etc.)
Todos o versos são Redondilhas maiores, sete sílabas poéticas.
As rimas obedecem, geralmente, o esquema ABBAACCA, como
se pode ver na fala do onzeneiro, transcrita abaixo:

"Olá, ó demo barqueiro! (A)


Sabeis vós no que me fundo (B)
Quero lá tornar ao mundo (B)
E trarei o meu dinheiro (A)
Aqueloutro marinheiro (A)
Porque me vê vir sem nada (C)
Dá-me tanta borregada (C)
Como arrais lá do barreiro (A)"
Tem como cenário um porto imaginário, onde estão ancoradas
duas barcas: uma como destino o paraíso, tem como
comandante um anjo; a outra, com destino ao inferno, tem como
comandante o diabo, que traz consigo um companheiro.

Todas as almas, assim que se desprendem dos corpos, são


obrigadas a passar por esse lugar para serem julgadas.
Dependendo dos atos cometidos em vida, elas são condenadas
à Barca da Glorificação ou à do Inferno. Tanto o anjo quanto o
diabo podem acusar as almas, mas somente o anjo tem o poder
da absolvição.
Quando a peça começa, estão no palco o Anjo e o Diabo com
seu Companheiro. A primeira cena mostra estes últimos
eufóricos na preparação do navio infernal que receberá as almas.
 Em oposição a esse quadro dinâmico está a figura do Anjo,
sério e calado, quase uma estátua.
As diferenças entre esses dois personagens são marcantes.
Além da oposição conceitual Bem x Mal, Céu x Inferno, eles
também assumem posturas opostas, fazendo com que o Diabo –
alegre, simpático e principalmente irônico – praticamente domine
a peça.
Fidalgo: é condenado à barca do inferno por ter levado uma vida
tirana cheia de luxúria e pecados.
Onzeneiro: é condenado ao inferno pela ganância, usura e avareza.
Parvo: ao chegar à barca da gloria o parvo diz não ser ninguém e,
por causa da sua humildade e modéstia, a sua sentença é a
glorificação.
Sapateiro: é condenado por roubar o povo com seu ofício durante 30
anos e por sua falsidade religiosa.
Frade: condenado à barca do inferno por seu falso moralismo
religioso.
Alcoviteira: condenada à barca do inferno pela prática de feitiçaria,
prostituição e por alcovitagem.
Judeu: condenado ao inferno por desrespeitar o Cristianismo.
Corregedor e Procurador: condenando-os ao batel infernal por
usarem o poder do judiciário em benefício próprio.
Enforcado: condenado ao batel infernal pela corrupção nos meios
burocráticos.
Cavaleiros das Cruzadas: O fato de morrer pelo triunfo do
Cristianismo garante a esses personagens uma espécie de
passaporte para a glorificação.

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