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O Exame Psíquico/Exame do Estado Mental Atual

Semiologia Psicopatológica: estudo dos sinais e sintomas dos


transtornos mentais.

"Um fenômeno é sempre biológico em suas raízes e social em


sua extensão final. Mas nós não devemos nos esquecer
também, de que, entre esses dois, ele é mental". Jean Piaget.
"Poetas e romancistas são nossos preciosos aliados, e seu testemunho
deve ser altamente estimado, pois eles conhecem mais coisas entre o céu
e a terra com que nossa sabedoria escolar não poderia ainda sonhar.
Nossos mestres conhecem a psique porque se abeberaram em fontes que
nós, homens comuns, ainda não tornamos acessíveis à ciência."
Freud
(O delírio e os sonhos na Gradiva de Jensen, 1906)
Forma: estrutura básica do sintoma, relativamente semelhante nos
diversos pacientes (alucinação, delírio, idéia obsessiva, labilidade afetiva,
etc).

Conteúdo: aquilo que preenche a alteração estrutural (conteúdo de


culpa, religioso, de perseguição, etc), geralmente mais pessoal,
dependendo da história de vida do paciente, de seu universo cultural e da
personalidade prévia ao adoecimento.
Temas e interesses centrais para o ser O que busca e deseja
humano
Sexo Sobrevivência e prazer
Alimentação
Conforto Físico
Dinheiro Segurança e controle sobre o outro
Poder
Prestígio

Temores centrais do ser humano Formas comuns de lidar com tais temores
Morte Religião/mundo místico
Continuidade através das novas gerações
Ter uma doença grave Vias mágicas/medicina/psicologia, etc.
Sofrer dor física ou moral
Miséria
Falta de sentido existencial Relações pessoais significativas
Cultura
CONCEITO DE NORMALIDADE EM PSICOPATOLOGIA

"Que é loucura: ser cavaleiro andante


ou seguí-lo como escudeiro?
De nós dois, quem o louco verdadeiro?
O que, acordado, sonha doidamente?
O que, mesmo vendado,
vê o real e segue o sonho
De um doido pelas bruxas embruxado?

Carlos Drummond de Andrade


(Quixote e Sancho de Portinari, 1974)

Normalidade: ausência de doença, normalidade ideal, normalidade


estatística, normalidade como bem-estar, normalidade funcional,
normalidade como processo, normalidade subjetiva, normalidade como
liberdade, normalidade operacional.

Não existe um sintoma psicopatológico totalmente específico de uma


doença (patognomônico).
Limitações de uma psicopatologia das funções psíquicas.
Exame Psíquico:
1- Aspecto Geral: cuidado pessoal, higiene, trajes, postura, mímica, atitude
global do paciente.

2- Nível de consciência.

3- Orientação alo e autopsíquica.

4- Atenção.

5- Memória (fixação e evocação).

6- Sensopercepção.

7- Pensamento (curso, forma e conteúdo).

8- Linguagem.

9- Inteligência.

10-Juízo de realidade.
11- Vida afetiva(estado de humor basal, emoções e sentimentos predominantes).

12- Volição.

13- Psicomotricidade.

14- Consciência e valoração do Eu.

15- Vivência do tempo e do espaço.

16- Personalidade.

17- Descrever sentimentos contratransferenciais.

18- Crítica em relação a sintomas e insight.

19- Desejo de ajuda.

20- Se for o caso, o tratamento é voluntário ou involuntário?


CONSCIÊNCIA

Indica o grau de clareza do sensório. É o estado de estar desperto,


acordado, vigil, lúcido. Nível de consciência.

Alterações normais da consciência: sono normal, sonhos.

OBS: O inconsciente.
"O sonho é uma segunda vida. Não posso passar sem um frêmito por
estas portas de marfim ou córneas que nos separam do mundo invisível.
Os primeiros instantes do sono são a imagem da morte; um
entorpecimento nebuloso toma nosso pensamento, e não podemos
determinar o instante preciso em que o eu, sob outra forma, continua o
trabalho de existir. É um subterrâneo vago que se aclara aos poucos, e
onde saem da sombra e da noite as pálidas figura gravemente imóveis que
habitam a morada dos limbos."

Gérard de Nerval (1808-1855) , "Aurélia"-1855


Alterações patológicas da consciência:

Quantitativas, rebaixamento: obnubilação, sorpor ou torpor e coma.


* Delirium, síndrome confusional aguda.

Qualitativas: estados crepusculares, estado segundo, dissociação da


consciência, transe, estado hipnótico, experiência de quase morte.
ATENÇÃO

Direção da consciência, estado de concentração da atividade mental sobre


determinado objeto. Torna o ser humano capaz de selecionar, filtrar e
organizar as informações em unidades controláveis e significativas.

"Milhões de itens [...] que são apresentados aos meus sentidos nunca
ingressam propriamente em minha experiência. Por quê? Porque esses
itens não são de interesse para minha pessoa. Minha experiência, é aquilo
que eu consinto em captar... Todos sabem o que é a atenção. É o tomar
posse pela mente, de modo claro e vívido, de um entre uma diversidade
enorme de objetos ou correntes de pensamentos simultaneamente dados.
Focalização, concentração da consciência são a sua essência. Ela implica
abdicar de algumas coisas para lidar eficazmente com outras"
William James (1952)
Formas de atenção:

Natureza: atenção voluntária X atenção espontânea


Direção: atenção interna X atenção externa
Amplitude: atenção focal X atenção dispersa

Características:

Tenacidade: consiste na capacidade do indivíduo de fixar sua atenção


sobre determinada área ou objeto.

Vigilância: permite ao indivíduo mudar seu foco de um objeto para outro.


Anormalidades da atenção:

Hipoprosexia: diminuição global da atenção.


Aprosexia: total abolição da capacidade de atenção.
Distração : superconcentração ativa da atenção sobre determinado objeto
ou conteúdo, com a inibição de tudo o mais.
Distraibilidade: patológico, estado que se exprime por instabilidade
marcante e mobilidade acentuada da atenção voluntária, com dificuldade
ou incapacidade para fixar-se ou deter-se em qualquer coisa que implique
esforço produtivo.
ORIENTAÇÃO

Capacidade de situar-se quanto a si mesmo (quem sou eu) e quanto ao


ambiente (espaço e tempo).

Requer o funcionamento e integração da atenção, percepção e memória.

Orientação autopsíquica e alopsíquica.


SENSOPERCEPÇÃO

Sensação: fenômeno elementar gerado por estímulos físicos, químicos ou


biológicos que provocam alterações nos órgãos receptores estimulando-os.
Percepção: tomada de consciência pelo indivíduo do estímulo sensorial.

Imagem (imagem perceptiva real) Representação (imagem representativa


ou mnêmica)
Nitidez Pouca nitidez
corporeidade pouca corporeidade
estabilidade instabilidade
extrojeção introjeção
ininfluenciabilidade voluntária influenciabilidade
completitude incompletude
"Todos admitirão sem hesitar que existe uma considerável diferença entre
as percepções da mente quando o homem sente a dor de um calor
excessivo ou o prazer de um ar moderadamente tépido e quando relembra
mais tarde essa sensação ou a antecipa pela imaginação. Essas faculdades
podem remedar ou copias as percepções dos sentidos, mas jamais atingirão
a força e a vivacidade do sentimento original. O máximo que podemos dizer
delas, mesmo quando operam com todo o seu vigor, é que representam o
seu objeto de maneira tão viva que quase se poderia dizer que os vemos ou
sentimos. [...] O mais vivo pensamento é ainda inferior à mais embotada
das sensações.
David Hume (1711-1776).
Alterações quantitativas da sensopercepção: hiperestesia, hipoestesia,
anestesia, parestesias e disestesias.

Alterações qualitativas da sensoperceção: ilusão, alucinação,


pseudoalucinação

Alucinações: auditivas, musicais, visuais, táteis, olfativas, gustativas,


cenestésicas, cinestésicas, funcionais, combinadas (sinestesias),
extracampinas, autoscópicas, hipnagógicas, hipnopômpicas, estranheza do
mundo percebido, alucinoses.

Imagem eidética, pareidolias.


Imaginação, fantasias.
MEMÓRIA

Capacidade de registrar, manter e evocar as experiências e os fatos já


ocorridos.

Fase de registro, fase de conservação e fase de evocação.

Memória imediata, recente e remota.

Memória de trabalho, memória episódica, memória semântica, memória de


procedimentos.
Alterações quantitativas:

Amnésias ou hipomnésias (retrógrada e anterógrada).

Alterações qualitativas:

Paramnésias: ilusões e alucinações mnêmicas.

Fabulações ou confabulações, criptomnésias, ecmnésia, lembrança


obsessiva.
Alterações do reconhecimento: agnosias (táteis, visuais, prosopagnosia,
auditiva, anosognosia, anosodiaforia, simultanagnosia, grafestesia)

Falso desconhecimento, síndrome de Capgras, síndrome de Capgras


inversa, síndrome do duplo subjetivo, síndrome de Frégoli ou falso
reconhecimento.

Alterações do reconhecimento não-delirantes: déjà-vu, déjà entendu, déjà


pensé, déjà vécu, jamais-vu.
AFETIVIDADE

"Súbita, uma angústia...


Ah, que angústia, que náusea do estômago à alma!"
Fernando Pessoa

É um termo genérico, que compreende várias modalidades de vivências


afetivas, como o humor, as emoções e os sentimentos.

HUMOR: tônus afetivo do indivíduo, o estado emocional basal e difuso em


que a pessoa se encontra em determinado momento, disposição afetiva de
fundo.
Alterações do humor: distimia (hipotimia, hipertimia, euforia, elação),
puerilidade, estado de êxtase, irritabilidade, ansiedade, angústia, medo.

AFETO: qualidade e tônus emocional, que acompanham uma idéia ou


representação mental.
Alterações do afeto: modulação ou ressonância, (embotamento, labilidade).
VONTADE OU VOLIÇÃO

Dimensão complexa da vida mental, relacionada intimamente com as


esferas instintiva, afetiva e intelectiva.

Alterações: hipobulia/abulia, ato impulsivo, ato compulsivo.

Automutilações, frangofilia, piromania, dipsomania ou "binge eating",


potomania, fetichismo, exibicionismo, voyeurismo, pedofilia, pederastia,
gerontofilia, zoofilia, necrofilia, coprofilia, ninfomania, satiríase, compulsão
à masturbação, compulsão a utilizar roupas íntimas do sexo oposto,
compulsões a utilizar clistéres, poriomania, cleptomania, jogo patológico,
compulsão por comprar, compulsão por internet e videogames,
negativismo, obediência automática, fenômenos em eco, automatismo.
PSICOMOTRICIDADE

Alterações dos atos motores, como ato final de alterações de volição.

Agitação psicomotora, lentificação psicomotora, inibição psicomotora,


estupor, catalepsia, flexibilidade cérea, cataplexia, estereotipias motoras,
maneirismo, tiques, conversão motora

Alterações de marcha.

Apragmatismo, apraxias.
PENSAMENTO

Características: curso, forma e conteúdo.

Curso: Modo como o pensamento flui, sua velocidade e ritmo ao longo do


tempo;
Forma: Estrutura básica, "arquitetura";
Conteúdo: temas predominantes, assuntos.

Pensamento mágico, pensamento dereístico, pensamento concreto ou


concretismo, pensamento inibido, pensamento vago, pensamento prolixo,
pensamento deficitário, pensamento demencial, pensamento confusional,
pensamento desagregado, pensamento obsessivo
Alterações de curso: Aceleração do pensamento, lentificação do
pensamento, bloqueio ou interceptação do pensamento, roubo do
pensamento.

Alterações formais: Fuga de idéias, dissociação do pensamento,


afrouxamento das associações, descarrilhamento do pensamento,
desagregação do pensamento.

Alterações de conteúdo: Conteúdo persecutório, depreciativo, religioso,


sexual, de poder, riqueza, prestígio ou grandeza, de ruína ou culpa,
conteúdos hipocondríacos.
JUÍZO DE REALIDADE

Julgamento, é função do pensamento.

Erros: podem ser cometidos por crenças ou ignorância, são compreensíveis.


Ex: preconceitos, crenças culturais, superstições e idéias prevalentes.
X
Delírios: patológicos, incompreensíveis e irredutíveis,

Idéias prevalentes: relação direta com motivações afetivas pessoais. Pode


evoluir para delírio.
Delírio: juízos patologicamente falsos.
Não é a falsidade que mais importa num delírio, mas a justificativa que se
dá a ele, o tipo de evidência que lhe assegura que as coisas são assim.
Características do delírio: Certeza subjetiva, irredutibilidade, seu conteúdo
é impossível, produção individual.

Delírios compartilhados. (folie a deux, folie a troix)

Delírio de perseguição, de referência, de relação, de influência, de


grandeza, místico, religioso, de ciúmes, erótico, de ruína, de culpa, de
negação de órgãos (Cottard), hipocondríaco, de reivindicação, de
invenção...
LINGUAGEM

Atividade especificamente humana (verbal).


Sistema de signos arbitrários.

Afasias, parafasias, agrafia, alexia, disartria...

Logorréia, loquacidade, bradifasia, mutismo, perseveração e estereotipia


verbal, ecolalia, palilalia, tiques verbais, coprolalia.
CONSCIÊNCIA E VALORAÇÃO DO EU

Consciência de que os fatos, os pensamentos, os sentimentos provém de si


mesmo.
Alteração da consciência da existência.
"Sinto-me como um nada, um morto"
Alteração da consciência da execucação.
Outra pessoa pensou, desejou, ou impôs seus pensamentos de alguma
maneira.
Consciência de unidade do Eu
Consciência de unidade do Eu no tempo
Consciência da oposição do Eu em relação ao mundo.
Despersonalização e desrealização
Alterações do Eu corporal
Valoração do Eu: auto-estima
PERSONALIDADE

Conjunto integrado de dados psíquicos, total das características individuais.

Temperamento e caráter.

Dificuldade de separar da doença quando em surto.

Predisposição a crises neuróticas: ansiedade, depressão.

INTELIGÊNCIA

Capacidade de resolver problemas novos

Retardo mental de diversos graus.


VIVÊNCIA DO TEMPO E DO ESPAÇO

Tempo:
Tempo subjetivo (interior, pessoal)
Tempo objetivo (exterior, cronológico, mensurável)

Alterações:
Ilusão sobre a duração do tempo, atomização do tempo, inibição da
sensação de fluir do tempo.
"O segundo, não o tempo, é implacável.
Tolera-se o minuto. A hora suporta-se.
Admite-se o dia, o mês, o ano, a vida,
a possível eternidade.

Mas o segundo é implacável.


Sempre vigiando e correndo e vigiando.
De mim não se condói, não pára, não perdoa.
Avisa talvez que a morte foi adiada
ou apressada
Por quantos segundos?

Carlos Drummond de Andrade


"Viajei. Julgo inútil explicar-vos que não levei meses, nem dias, nem outra
quantidade qualquer de medida de tempo a viajar. Viajei no tempo é certo,
mas não do lado de cá do tempo, onde o contamos por horas, dias e meses;
foi do outro lado do tempo que eu viajei, onde o tempo se não conta por
medida. Decorre, mas sem que seja possível medi-lo. É como que mais
rápido que o tempo que vimos viver-nos..."
Fernando Pessoa, 1995.
Espaço:

Alterações:

Perda das fronteiras entre o eu e o mundo exterior


Espaço dilatado, que invade o de outras pessoas.
Espaço encolhido, contraído.
Espaço perigoso, assustador, invadido por aspectos ameaçadores e hostis.
Descrever sentimentos contratransferenciais.
Transferência e Contratransferência

Crítica em relação a sintomas e insight. (ter conhecimento de que o que


causa o sofrimento é sintoma, é patológico)

Desejo de ajuda.

Se for o caso, o tratamento é voluntário ou involuntário?

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