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A Natureza do Amor Parte II

O Amor Doente

Rubens Mário Mazzini Rodrigues, MD


Médico Psiquiatra
Paixão e Dor
• A paixão é um sentimento de
ampliação do amor que pode chegar
a ser patológica.
• O acometido de paixão perde o
auto-domínio em função do fascínio
que o outro exerce sobre ele.
• A palavra paixão tem origem na
palavra grega pathos = doença.
• O indivíduo acometido de paixão
patológica perde seu livre arbítrio e
seu poder de raciocínio tornando-se
dominado por uma emoção
prepotente.
Quando o amor se torna doente?

• O amor em si é sempre sadio.


• Nosso modo de vivê-lo é que
pode ser equivocado de modo a
torná-lo “doente”.

• Definição:
• O amor doente é uma modalidade patológica de viver
os componentes do amor ou de viver os diferentes
momentos de uma relação afetiva.
Poética da Paixão

• As paixões, especialmente as mais


doentias e dolorosas, têm inspirado
os poetas ao longo dos séculos.
Quase todo o poeta é um doente de
amor.

• “O amor pode não só coroar-nos, mas também


crucificar-nos e podar-nos. A dor pela falta ou
incompletude do amor - pela rejeição ou pela perda
do(a) amado(a) – nos faz sofrer profundamente, na
mesma medida em que esse sentimento pode nos fazer
felizes.”
Gibran Khalil Gibran
Toda dor de amor é patológica?

• Existem dores normais, que nos


ajudam a crescer e expandir nossas
experiências.
• Não existe aprendizado sem dor, e o
aprendizado do amor não escapa a
essa regra.
• A dor de amor só é doentia quando se torna excessiva a ponto de
bloquear o nosso avanço ou desenvolvimento na vida.
• Quando o sofrimento é excessivo pode necessitar de tratamento.
• Na fase de apaixonamento o cérebro torna-se instável e mais
vulnerável aos fatores estressantes podendo, então, favorecer a
eclosão de patologias latentes.
Sistema Límbico
Onde Tudo Acontece
Tipos de Doenças do Amor

• As doenças do amor são classificadas de acordo com a


fase em que acontecem:

• Patologias da Atração
• Patologias do Apego
• Patologias da Separação
• Ciúme patológico
Patologias da Atração
Incompetência para amar

• Pessoas que não são capazes de se


apaixonar ou amar por serem
insensíveis aos estímulos positivos
que vêm dos outros.
• Primária: É um transtorno raro. Ocorre
em indivíduos frios, calculistas e
extremamente racionais ou em patologias
graves como o autismo, esquizofrenia ou
psicopatia.
• Secundária: Conseqüente a um trauma
profundo causado por um grande
ressentimento ou desilusão amorosa.
Apaixonamento Fácil

• O indivíduo não faz outra


coisa que não apaixonar-se e
mudar de parceiro
repetidamente = loveholic.

• A cada vez que acontece o acometido fica convencido que


“desta vez vai dar certo” e jura que “desta vez é pra valer” e
de que não vão mais apaixonar-se por mais ninguém e que
agora “vai pôr a cabeça no lugar”.
• É um fenômeno comumente apresentado por portadores de
Transtorno de Humor Bipolar.
Medo de apaixonar-se

• Pessoas que temem perder a


liberdade e tornar-se
dependente de outra pessoa.

• Pode ser devido a experiência familiar negativa.


• Traumas de relacionamentos anteriores com parceiros
agressivos, dominadores ou extremamente ciumentos.
• Medo de perder o controle.
• Timidez excessiva com hipersensibilidade à rejeição.
Atrações Múltiplas
• Atração por duas ou mais
pessoas ao mesmo tempo.
• O apaixonamento múltiplo é
biologicamente impossível.

• No entanto, é possível amar uma pessoa


profundamente e apaixonar-se por outra, porque esses
dois processos são independentes.
• Entretanto, existem poucas pessoas capazes de tolerar
que seu parceiro tenha outros relacionamentos.
Patologias do Apego
Incapacidade de Apego

• A atração e o apaixonamento
ocorrem normalmente mas a
relação nunca evolui para a fase
de apego.

• O acometido dessa modalidade alega que nunca se sente


preparado para dar o passo seguinte e passam a adiá-lo
continuamente por motivos fúteis ou que não sabe explicar.
Apego Imediato
• É o caso de pessoas que
dizem “eu te amo” logo após
terem conhecido alguém que
os atrai.
• Em geral trata-se de mulheres que gostam mais do
relacionamento amoroso em si do que do indivíduo amado.
• Elas querem a todo custo um vínculo desse gênero e afirmam
que desejam um relacionamento sério.
• A força desse desejo às deixa cegas e acabam atraídas por
homens inadequados, ou pior, por homens que as enganam ou
já comprometidos.
• Quando o parceiro corresponde inicialmente ao sentimento o
empenho solicitado é tão excessivo que espanta até o homem
mais apaixonado.
Apego Superficial

• A fase de atração e paixão é normal e


desemboca no apego, mas esse é
pouco intenso e pouco duradouro.
• Em alguns casos o sujeito não se deixa
envolver devido a seqüelas de
relacionamentos anteriores não
satisfatórios ou até traumáticos.
• Outros limitam voluntariamente o apego por medo de perder a
liberdade ou por não querer se empenhar muito na relação.
• Há aqueles que sofrem por não conseguir estabelecer uma
relação estável e duradoura apesar de a desejarem.
• Fobia social: Indivíduos que têm medo de relações afetivas em
geral e adotam conduta evitativa.
Apego Inseguro ou Obsessivo

• Mesmo desejando vincular-se


o indivíduo é inseguro quanto
ao que está sentindo ou tem
sérias dúvidas sobre o que o
parceiro sente por ele.

• Isso pode conduzir a um vai-e-vem de sentimentos e flutuações


de humor, além de rupturas bruscas e injustificadas seguidas de
arrependimento pouco tempo depois.
• O indivíduo pode sofrer devido a formas dolorosas de incerteza e
dúvidas obsessivas recalcitrantes.
• Em comparação com outras patologias os pacientes obsessivos
são os que menos se casam, como mostrado no filme “Melhor é
Apego Dependência
• Ocorre em pessoas que sentem-se
sempre inferiores quando não
formam um casal.
• São pessoas que têm medo da
solidão ou com dificuldades de se
relacionarem consigo mesmas.

• Não toleram a idéia de que o parceiro possa ter outros interesses


(vida própria) fora da relação afetiva, desejam o parceiro de um
modo exclusivo e sofrem muito cada vez que precisam se
separar.
• Muitas vezes plasmam sua vida no outro, renunciam a quase
tudo e querem que o parceiro faça o mesmo.
• A relação funciona como uma droga com a separação lembrando
uma síndrome de abstinência.
Apego Obstinado
• Mesmo sem ser correspondida a pessoa se
apega, apesar de todas as evidências e
negativas seu amor pelo outro persiste e até
se intensifica ao longo do tempo.
• Pode ocorrer com pessoas narcisistas que
não conseguem admitir uma rejeição.
• O sofrimento é intenso, pois mesmo sabendo que seu sentimento
não é correspondido o indivíduo dedica e vida ao outro, segue-o
por toda parte, humilha-se e se ajoelha a seus pés, não raro
chegando às raias do ridículo.
• A esperança não se enfraquece quase nunca, o indivíduo sempre
encontra um motivo para acreditar que o outro lhe corresponde,
quando a esperança desmorona desmoronam junto, como
mostrado no filme “E o Vento Levou”.
Apego Delirante
• O indivíduo se apega a um
parceiro que lhes é indiferente
e têm a convicção de que é
correspondido.
• Difere do apego obstinado pelo
grau de distanciamento da
• realidade.
Muitas vezes o objeto da paixão é uma pessoa famosa ou
poderosa como, por exemplo, um ator de novela.
• Nos casos mais graves esses sujeitos se aproximam de seu ídolo
e as repetidas recusa podem desencadear um comportamento
agressivo.
• Em geral são pessoas que perderam o senso da realidade e
apresentam um transtorno psicótico.
• Há casos em que o sentimento se mantém secreto por anos a fio
revelando-se no final em um clímax psicótico.
As Patologias e o Amor

• Nesses casos o amor doente ocorre como um


sintoma de uma patologia pré-existente.
Amor Sintomático

• Já fizemos referência a alguns desses casos:


oPsicopatia = Incapacidade de Amar
oTranstorno Bipolar = Apaixonamento fácil
oFobia Social = Apego Superficial
oTranstorno Obsessivo = Amor Inseguro
oPersonalidade Narcisística = Amor Obstinado
oPsicose = Amor Delirante
• Há outros casos especiais:
o Depressão
o Esquizofrenia
o Ciúme Patológico
Depressão
• A depressão se caracteriza por perda de energia vital, desânimo,
incapacidade de sentir prazer e alegria, ansiedade, pessimismo,
medo, insegurança, desesperança, tristeza, etc ...
• Pode chegar ao ponto de o paciente não
conseguir mais sentir atração (diminuição ou
perda da libido) ou afeto pelo parceiro.
• Homens deprimidos podem chegar à conclusão
de que todas suas dificuldades derivam da
relação e acham que é melhor se separar.
• Pode ocorrer que um indivíduo deprimido traia o
cônjuge tentando provar a si mesmo que ainda é
capaz de se atrair por alguém.
• A paixão pode funcionar como um formidável
antidepressivo.
• Por outro lado, o fim de uma paixão pode
precipitar uma depressão latente.
Esquizofrenia

• A esquizofrenia é um transtorno psicótico crônico e evolutivo que pode


provocar desagregação gradativa da vida emocional, com alteração profunda da
identidade e do comportamento.
• Com o avanço da doença o paciente pode se afastar de todas as formas de
relacionamento, isolando-se do convívio social e apresentando um
empobrecimento progressivo da vida afetiva.
Ciúme Patológico
O Ciúme

• Para alguns, é o “tempero do amor”.


• Na visão de Haverlock Ellis:

“É o dragão que mata o amor sob o


pretexto de mantê-lo vivo”.

• O ciúme é uma sentimento complexo – mistura de medo e raiva –


relacionado à percepção real ou fictícia de risco de infidelidade.
• Até certo ponto pode ser considerado um componente normal do
relacionamento amoroso.
Diferença entre os sexos

• Do ponto de vista biológico, o ciúme está


relacionado, no homem, a uma preocupação com a
certeza de paternidade e, na mulher, com a garantia
de proteção estável e duradoura para ela e durante a
gravidez e apoio para a criação dos filhos.

• Em função disso, homens e mulheres apresentam gatilhos diferentes para


disparar o ciúme:
o 70% das mulheres relatam que a infidelidade emocional é mais difícil de suportar.
o 60% dos homens relatam que a infidelidade sexual seria pior.
Limites da Normalidade

• O limite entre o ciúme normal e patológico é


uma questão de intensidade e vínculo com a
realidade.
• É um limite difícil de traçar, extremamente
flutuante e relativo, dependendo da
personalidade das partes envolvidas.

• A intensidade do ciúme está relacionada com a fragilidade e inadequação da


personalidade de quem o sente ou provoca (se deliberadamente).
• O ciúme tende a ser tão mais intenso quanto maior o sentimento de insegurança.
• Muitas vezes está relacionado a fantasias desvinculadas da realidade as quais
podem chegar ao nível do delírio.
Ciúme Patológico

• Define-se como patológica toda forma de ciúme que se baseia em


suspeita infundada de infidelidade e que seja capaz de modificar
pensamentos, sentimentos e comportamentos.
• A suspeita ou a convicção de infidelidade sem comprovação
objetiva não apenas alteram o equilíbrio emocional da pessoa
com ciúme como também podem ser danosos ao parceiro e ter
um impacto desastroso sobre a relação.
• Quando o sujeito está absolutamente convencido de que o
parceiro o está traindo, sem possuir evidência alguma, estamos
diante de uma distorção da realidade, portanto, diante de um
transtorno psicótico definido como delírio ou paranóia de ciúme.

• O acometido costuma controlar minuciosamente o parceiro, vasculhando seus objetos


pessoais, verificando seu telefone celular, revistando as roupas e, modernamente, até
mesmo rastreando o e-mail, o MSN e o Orkut.
• Tende a interpretar como “prova” qualquer detalhe “suspeito” por mais banal e
insignificante que seja.
• Em casos graves pode chegar até mesmo ao homicídio.
Créditos
• Donatella Marazziti
o Psiquiatra italiana, Professora da “Universitá di Pisa”, uma
das principais pesquisadoras atuais sobre as implicações das
emoções relacionadas ao amor e paixão sobre a saúde
mental. Esteve em Porto Alegre em 2007 para proferir uma
conferência sobre o tema no Congresso Brasileiro de
Psiquiatria.
• Aldo Carotenuto
o Psicanalista italiano de linha junguiana, Professor da
“Universitá di Roma”, autor de vários livros sobre o tema,
em especial “Eros e Pathos – Amor e Sofrimento”.
• Francesco Alberoni
o Sociólogo italiano e escritor, Professor da “Universitá di
Milano” , criador da expressão “estado nascente”, autor de
vários livros sobre o tema, em especial “Enamoramento e
Amor”.
• David Buss
o Psicólogo americano, Professor da “Texas University”,
conhecido por pesquisas sobre psicologia evolucionária a
respeito das diferenças entre homens e mulheres na escolha
de parceiros, autor do livro “A Paixão Perigosa”, um
estudo sobre o ciúme.

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