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CAMPO

GERAL
JOÃO GUIMARÃES ROSA
Reflexões Iniciais
- Aula Expositiva – Com bastante leitura
- O que são os movimentos artísticos?
- O foco de expressão artística vs. O avanço
tecnológico
Renoir, Pierre-Auguste. As grandes banhistas, 1887. Museu de Arte da Filadélfia.
Picasso, Pablo. As Banhistas, 1920
Picasso, Pablo. Banhistas Com Um Brinquedo, 1937
Reflexões Iniciais
- O foco narrativo na literatura é voltado para o
psicológico
- Como os acontecimentos afetam o psicológico
humano?
- O que se passa na mente humana?
MODERNISMO
BRASILEIRO
O Modernismo Brasileiro foi um movimento artístico que surgiu
oficialmente na Semana de Arte Moderna de 1922, se
estendendo até a segunda metade do século passado.
No entanto, estas datas são apenas referências, porque o
modernismo não foi uma coisa só, ou seja, envolveu várias
gerações de artistas, com ideias diferentes entre si, ainda que
algumas características estivessem quase sempre presentes,
como:
• O rompimento com as formas tradicionais de expressão
artística;
• A busca por uma expressão artística nacional e inovadora;
• Na literatura, a valorização do cotidiano, expresso em
linguagem simples.
Além disso, no início, havia o desejo de usar a arte para
representar a realidade brasileira. Com o tempo, os modernistas
se libertaram até mesmo desta obrigação
2º FASE DO
MODERNISMO (a
geração de 30)
• Estendendo-se de 1930 a 1945, a segunda fase
do Modernismo foi rica na produção poética e
também na prosa, sendo essa última a que
mais se destacou, caracterizada pelo
regionalismo voltado especialmente a região
nordeste. O universo temático dessa geração
amplia-se com a preocupação dos artistas com
o destino do Homem e no estar-no-mundo. Ao
contrário da sua antecessora, foi construtiva
2º FASE DO
MODERNISMO (a
geração de 30)
• Rachel de Queiroz;
• Jorge Amado;
• Graciliano Ramos;
• Érico Veríssimo;
• José Lins do Rego;
• Cecília Meireles;
• Vinícius de Morais.
3º Fase do Modernismo

• A terceira geração modernista, terceira fase do


modernismo ou fase pós-modernista
representa o último momento do movimento
modernista no Brasil.
• Também chamada de “Geração de 45”, a
última fase do modernismo começa em 1945 e
se estende até 1980.
• Os escritores desse período possuíam uma
atitude mais formal, em oposição ao espírito
radical, contestador e de liberdade
desenvolvido na Semana de 1922.
3º Fase do Modernismo
• O momento em que surge a terceira geração
modernista no Brasil, é o período menos
conturbado em relação às outras duas
gerações.
• Ou seja, é a fase de redemocratização do país,
visto que em 1945 termina o Estado Novo
(1937-1945) que fora implementado pela
ditadura de Getúlio Vargas.
• Em nível mundial, o ano de 1945 é também o
fim da segunda guerra mundial e do sistema
totalitário do Nazismo. Entretanto, tem início a
Guerra Fria (Estados Unidos e União Soviética)
e a Corrida Armamentista.
3º Fase do Modernismo

“O pensamento das personagens ganhou


força em relação as ações as personagens”
Principais Obras e Autores

• João Cabral de Melo Neto (1920-1999):


conhecido como “poeta engenheiro”, João se
destacou na prosa e na poesia pelo rigor
estético apresentado em suas obras: "Pedra do
Sono" (1942), "O Engenheiro" (1945) e "Morte
e Vida Severina" (1955).

• Clarice Lispector (1920-1977): se destacou na


prosa e na poesia com um caráter lírico e
intimista: "Perto do Coração Selvagem" (1947),
"A Cidade Sitiada" (1949), "A Paixão Segundo
GH" (1964), "A Hora da Estrela" (1977).
Principais Obras e Autores

• Ariano Suassuna (1927-2014): Defensor da


cultura popular brasileira, Suassuna escreveu
romances, peças de teatro e poesias dos quais
se destacam: "Os homens de barro" (1949),
"Auto de João da Cruz" (1950), "O Rico
Avarento" (1954) e "O Auto da Compadecida"
(1955).
• Lygia Fagundes Telles (1923-): escreveu
romances, contos e poesias sendo uma de suas
marcas a exploração psicológica das
personagens em sua obra: "Ciranda de Pedra"
(1954), "Verão no Aquário" (1964), "Antes do
Baile Verde" (1970), "As Meninas" (1973)
João Guimarães Rosa

• Foi um dos mais importantes escritores


brasileiros do modernismo, além de ter
seguido a carreira de diplomata e médico.
• Nasceu em Cordisburgo, Minas Gerais, no
dia 27 de junho de 1908. Desde pequeno,
Rosa estudou línguas (francês, alemão,
holandês, inglês, espanhol, italiano,
esperanto, russo, latim e grego). Por
conseguinte, cursou os estudos
secundários num colégio alemão em Belo
Horizonte .
João Guimarães Rosa

• Pouco antes de entrar para a


Universidade, em 1929, Guimarães já
anuncia sua maestria com as letras, onde
começa a escrever seus primeiros contos.
• Em 1930, com apenas 22 anos, formou-se
pela Faculdade de Medicina da
Universidade de Minas Gerais, ano que
casa-se com Lígia Cabral Penna, com
quem teve duas filhas.
• https://www.youtube.com/watch?
v=ndsNFE6SP68
João Guimarães Rosa
• Obras publicadas em vida
• Sagarana (1946)
• Corpo de Baile (1956)
• Grandes Sertões: Veredas (1956)
• Primeiras Estórias (1962)
• Tutameia - Terceiras Histórias (1967)

• Obras póstumas
• Estas Estórias (1969)
• Ave, Palavra (1970)
• Magma (1997) – livro de poemas
Outras Obras do Autor

Sua obra mais importante:

Grande Sertão-Veredas

A obra, uma das mais importantes da


literatura brasileira, é elogiada pela
linguagem e pela originalidade de
estilo presentes no relato de
Riobaldo, ex-jagunço que relembra
suas lutas, seus medos e o amor
reprimido por Diadorim.
FICHA TÉCNICA

Gênero literário: ficção-novela


Escola literária: 3ª fase do modernismo
Espaço: sertão mineiro
Tempo: 1956
Narrador: 3ª pessoa
Temáticas Roseana

• A cultura sertaneja
• Explora estruturas sintáticas
• Uso de palavras estrangeiras
• Uso e criação de neologismos
• Vocabulário amplo e complexo
• Escrita com ritmo, aliterações e metáforas
• Temas envolvendo vida, destino, morte, Deus
• Linguagem poética
• Crise existencial e fluxo de consciência
• Ruptura com a cronologia tradicional das
narrativas
• Regionalismo
• Dualismo: bem e mal, velho e novo, rural e
urbano, amor e ódio
Análise da Obra – Campo Geral
“Um certo Miguilim morava com sua mãe, seu pai e seus
irmãos, longe, longe daqui, muito depois da Vereda-do-
Frango-d’Água e de outras veredas sem nome ou pouco
conhecidas, em ponto remoto, no Mutúm.”

A incerteza da exposição dos fatos mostra, desde início a que o leitor está
sujeito: uma narrativa líquida (instável) e profunda (por camadas). Esse
primeiro período já demonstra isso: um certo Miguilim pode indicar qualquer
pessoa que se enquadra na situação vivenciada por pelo protagonista: filho
de uma família com muitos irmãos, pobre, no interior de Minas Gerais, a
mãe possui um relacionamento com o Tio, a tia avó é assaz religiosa, os
cachorros expressam amizade, os irmãos são o mundo, a vida é o mutum,
arraial afastado de tudo. Tudo aqui relembra a ideia de um conto de fadas
(em um mundo distante, muito distante, longe, longe daqui, era uma vez –
são expressões que anunciam que o conteúdo é, antes de tudo, uma
invenção do real, um simulacro. 
Análise da Obra – Campo Geral
Personagens

O pai

A relação com o pai é truncada. Ele, Miguilim, não age como os outros irmãos. É lento,
disperso e gosta mais de brincar que de trabalhar nas coisas da roça. O pai talvez seja
seco e violento por causa da relação de afeto existente entre Miguilim e Tio Terêz. 
 
"Este menino é um mal-agradecido. Passeou, passeou, todos os dias esteve fora de cá, foi
no Sucurijú, e, quando retorna, parece que nem tem estima por mim, não quer saber da
gente..." A mãe puniu por ele: — "Deixa de cisma, Béro. O menino está nervoso...”

 
Desta forma, a triangulação entre pai, mãe e filho demonstra que Béro é avesso ao filho e,
para equilibrar a relação, a mãe o protege. Quase sempre o menino ficava de castigo em
casa quando o pai levava os outros irmãos para as pescarias.
Personagens

Os Irmãos
Chica – Mal humorada, birrenta.
Tomezinho – caçula.
Dito – intelectual de 04 anos; perspicaz, atencioso e sereno. Pensava antes de falar. Era o
ídolo de Miguilim.
Drelina. “— Bobo! Eu chamo Maria Andrelina Cessim Caz. Papai é Nhô Bernardo Caz! Maria
Francisca Cessim Caz, Expedito José Cessim Caz, Tomé de Jesus Cessim Caz... Você é Miguilim
Bobo...’’ (ROSA,2019. p.12)

 ·         Mãitina – misto de babá, louca e feiticeira. Vivia na fazenda fazendo pequenos trabalhos
como cozinhar e lavar. Tomava cachaça, predizia o futuro. Gostava muito de Miguilim.
Personagens

·        Vó Izidra – Na verdade, a avó real morrera e sua irmã, Izilda, recebera o tratamento por
respeito. Assim, ela era a Tia-avó de Miguilim. Mulher muito religiosa.

 ·         Seu Deográcias: Curandeiro e a quem o pai propôs ensinar os filhos a ler e escrever.
Provavelmente pai de Patori

·         Seu Aristeu (Curandeiro): “Mas Vovó Izidra tinha ojeriza de seo Aristeu, que morava na
Veredinha do Tipã, ele também assisava aconselhar remédios, e que para ver o Miguilim a mãe
queria que chamassem.

·         Liovaldo: No dia seguinte, sem ninguém esperar, chegou o mano Liovaldo, com tio
Osmundo Cessim, da Vila Risonha. Foi tanta alegria e surpresa, de Mãe, Pai, e de todos, que
ninguém não ia trabalhar na roça.

·         José Lourenço: Médico que pôs os óculos em Miguilim.


Personagens

Os Cachorros

·         Gigão, o maior de todos, caçador e defensor dos meninos.


·         Seu-Nome
·         Zé-Rocha (Zerro)
·         Julinho-da-Túha (Julim)
·         Caráter
·         Catita
·         Soprado
·         Floresto
·         Pingo-de-ouro
Análise da Obra – Campo Geral

O narrador é de terceira pessoa mas obedece ao foco do olhar sensível de


Miguilim. Toda a trama se passa entre acontecimentos em tempo real e
lembranças e pensamentos de Miguilim, seguindo quase que um fluxo de
consciência.

Pode-se dizer que a novela é sobre o amadurecimento emocional do


personagem, sua visão de mundo e o seu relacionamento familiar
Fluxo de Consciência – Foco no Pensamento – Memórias de Infância
Estilisticamente, Guimarães Rosa utiliza várias formas de cumprir a função poética pronto e fixar
atenção do leitor. Como uma espécie de algoritmo, a escrita Roseana elabora formas de fazer
como que o leitor não despregue os olhos na obra lida. Metáfora, barbarismos, neologismos,
aliterações e várias outras figuras de linguagem estão na base de uma elaboração artística em que
a escrita se disfarça nem mineira, quando na verdade ela é inventada, Roseana. Veja abaixo:
Campo Geral – Resumo do
Enredo
• Miguilim mora com sua família numa região isolada e
primitiva: o Mutum. Lá, o pai – Bernardo –, a mãe –
Nhanina –, os irmãos – Dito, Tomezinho, Chica e Drelina –, a
avó Izidra, o Tio Terêz e os vaqueiros vizinhos vão lhe
ensinando, dura mas liricamente, a distinguir, a
compreender o mundo. Rosa e Mãitina, ajudantes da mãe
no serviço domestico, Pingo-de-Ouro, o papagaio, o gato,
os cachorros são os seus companheiros de travessia nas
veredas do Mutum.
Campo Geral
• Miguilim faz uma descoberta importante quando o Tio Terêz
tem de ir embora, por causa do ciúme do pai, desconfiado de
uma aventura entre a mulher e o irmão.
• O conflito de ser obrigado a se separar de uma pessoa a quem
ama, e de não poder ajudar o tio a se comunicar com a mãe
pelo sentimento de lealdade que deve ao pai, intensifica-se ao
longo do enredo, acrescido de outras dores como os medos de
morrer e o de crescer.
Campo Geral
• Um dia, por causa de uma briga com Liovaldo, Miguilim leva
uma surra do pai. Jura matá-lo. Odeia todos da família como
odiava Liovaldo, que era um menino “maligno” e o Patori,
menos Mãitina, a negra velha, e Rosa, que o consolava pela
morte de Dito.
• Então, Miguilim fica muito doente, dolorido de viver, quando o
pai, por ciúmes, assassina o vaqueiro Luisaltino e, em seguida,
se suicida de remorso.
Campo Geral
• Tio Terêz volta, casa com a mãe e, quase curado, Miguilim
redescobre o mundo através dos óculos emprestados pelo
doutor José Lourenço, que viera em visita.
• Além de lhe dar a luz de seus olhos, percebendo que Miguilim
era míope, o doutor convida o menino para ir com ele em
direção a uma outra vida e estudar. Miguilim, antes de partir,
novamente toma emprestado os óculos do doutor e – agora
sim – tem certeza de que o Mutum é bonito.
Campo Geral
• A mãe, os irmãos, o Tio Terêz, o vaqueiro Salúz, todos se
despedem do menino – que deixa os cachorros, o Papaco-o-
Paco, o gato Sossõe, o Dito e a Cuca Pingo- de-Ouro, o pai, os
vivos e os mortos, os medos e as mágoas – o menino deixa a
infância, a ingenuidade e o mundo mágico em que vivera, para,
enfim, acabar de crescer. Estudar. Enxergar com nova clareza as
coisas da vida e as coisas da morte.
Campo Geral

• Em “Campo Geral”, o aprendizado – a


travessia é a perda da ingenuidade
através da dor de crescer, de aprender
as coisas do mundo.
Cronologia dos Acontecimentos
• Inicia-se uma forte chuva, uma tempestade que anuncia uma tensão na vida
de Miguilim, onde é exposto a intriga entre o pai e o Tio Terez e a mãe dele

• Tudo se encaminha para um equilíbrio: Tio Terêz se foi, o pai está calmo,
Miguilim pode até ajudar na vida da fazenda levando a marmita para o pai, na
roça. Mas como toda vida calma é sempre balançada por uma “pedra no meio
do caminho”, Miguilim, na volta, encontra Tio Terêz. Este entrega um bilhete
de amor ao jovem, destinado à mãe. Ele seria então o mensageiro de um
amor proibido; um cupido às avessas. E é exatamente aqui a obra começa a
ter outro divisor de águas porque a temática vai abordar a questão ética
Cronologia dos Acontecimentos
• Enquanto filosofa a respeito de como agir, Miguilim fica cada vez menos
inserido nos elementos do cotidiano. Ele nem sabe que o pai não é o dono da
fazenda, mas Seu Sintra sim. Esse distanciamento será explicado no final da
história quando o jovem descobre-se míope. Assim, os valores externos ficam
mais “embaçados” enquanto os valores abstratos, internos, metafísicos toma
destaque e afloram em Miguilim.
Cronologia dos Acontecimentos
• Miguilim eram um consequencialista: pensava que seu ato poderia impactar a
si, ao pai, a mãe, aos irmãos, ao tio. O cálculo era necessário: “que palavras
certas falar?!”. Note que já estamos com outro personagem dentro do
primeiro. O primeiro era infantil, somente. Agora temos uma espécie de
transição para a fase adulta, pois o pré-adolescente é chamado a resolver uma
questão que envolve uma escolha ética. Esse exercício o faz crescer
emocionalmente, apesar da dor (ou por causa dela!). O adulto cresce na
personagem que, por escolha própria, após muito pensar, escolheu dizer a
verdade ao tio:
Cronologia dos Acontecimentos
• “― "Tio Terêz, eu principiei querer entregar a Mãe, não entreguei, inteirei
coragem só por metade..." Ah, mas, se isso, Tio Terêz não desanimava de
nada, recrescia naquela vontade estouvada de pessoa, agarrava braço dele,
falava, falava, falava, não desistia nenhum. Nenhum jeito! Agora Miguilim
esbarrava, respirava mais um pouco, não queria chorar para não perder seu
pensamento, sossegava os espantos do corpo. E não tinha outro caminho,
para chegar lá na roça do Pai? Não tinha, não. Miguilim lá ia. Ia, não se
importava. Tinha de ser lealdoso, obedecer com ele mesmo, obedecer com o
almoço, ia andando.” (p.75)
Cronologia dos Acontecimentos
• Tio Terêz entende a situação. Ao acalentar e agradecer o menino, alivia-o e vai
embora, para sempre. A vida volta ao normal, novamente e, como sempre,
sofre um arrebatamento. Desta forma, podemos criar um gráfico dos clímax
desta novela:
Cronologia dos Acontecimentos
• E assim, Guimarães Rosa consegue compor um carrossel de emoções em que
o leitor se depara com felicidades e incertezas, amor e ódio, crença na vida da
fazenda e vida divina... que vão fazendo-o participar da narrativa e vivenciar
as emoções do protagonista.
Cronologia dos Acontecimentos
• De manhã, Dito brincava no quintal. Queria ver uma coruja e pisou em caco
de vidro. Coruja é símbolo do azar, do mal agouro. E ele, então, contrai a
doença tétano. A doença é cruel: paralisa os músculos e causa muita dor.
Miguilim, desesperado, passa a ser o elo entre Dito (acamado) e o mundo lá
fora. Tudo o que acontecia, Miguilim informava. Trata-se de uma espécie
de velório em vida:

• “Mas agora o Dito não podia ir ajudar a arrumação, e então Miguilim gostava
de não ir também, ficar sentado no chão, perto da cama, mesmo quando o
Dito tinha sono, o Dito agora queria dormir quase todo o tempo.”
Cronologia dos Acontecimentos
• De manhã, Dito brincava no quintal. Queria ver uma coruja e pisou em caco
de vidro. Coruja é símbolo do azar, do mal agouro. E ele, então, contrai a
doença tétano. A doença é cruel: paralisa os músculos e causa muita dor.
Miguilim, desesperado, passa a ser o elo entre Dito (acamado) e o mundo lá
fora. Tudo o que acontecia, Miguilim informava. Trata-se de uma espécie
de velório em vida:

• “Mas agora o Dito não podia ir ajudar a arrumação, e então Miguilim gostava
de não ir também, ficar sentado no chão, perto da cama, mesmo quando o
Dito tinha sono, o Dito agora queria dormir quase todo o tempo.”
Cronologia dos Acontecimentos
• Essa noite aflitiva era 24 de dezembro, véspera de natal. A família foi
abençoada não com o nascimento do Menino Jesus, mas com a morte de uma
criança inteligente, carismática e amada, principalmente, pelo irmão. Antes de
morrer, Dito reclamou que o papagaio paco-o-paco falava sobre Miguilim, mas
nunca havia falado nada sobre ele, Dito:

• “Amanhã é o dia de Natal, Dito!" ―"Escuta, Miguilim, uma coisa você me


perdoa? Eu tive inveja de você, porque o Papaco-o-Paco fala Miguilim me dá
um beijim... e não aprendeu a falar meu nome... " 
Cronologia dos Acontecimentos
• O menino com tétano faz uma confissão a seu irmão. Ele, parece, saber sobre
a morte e deseja ir para o céu purificado... Miguilim se desespera, mas Dito,
com os dentes cerrados, custando a se expressar ainda acalenta o irmão
querido:

• “Miguilim desengolia da garganta um desespero. — "Chora não, Miguilim, de


quem eu gosto mais, junto com Mãe, é de você..." E o Dito também não
conseguia mais falar direito, os dentes dele teimavam em ficar encostados, a
boca mal abria, mas mesmo assim ele forcejou e disse tudo: — "Miguilim,
Miguilim, vou ensinar o que agorinha eu sei, demais: é que a gente pode ficar
sempre alegre, alegre, mesmo com toda coisa ruim que acontece
acontecendo. A gente deve de poder ficar então mais alegre, mais alegre, por
dentro!..." 
Cronologia dos Acontecimentos
• Antes do desfecho, volta ao arraial o irmão mais velho, Liovaldo. Chegou cheio
de festa, junto com o Tio Osmundo. Houve festa, mas o rapaz era mal
elemento: dissimulado e sexualizado. Logo arrumou encrenca com Miguilim
quando chutou alguns patos. Miguilim sentiu tanta raiva que o surrou, mesmo
sendo menor. 
• O pai espancou Miguilim, mas parece que o crescimento dele estava cada vez
mais perto da conclusão: não chorou.
• Leia a cena da violência entre pai e filho:
“Era dia-de-domingo, Pai estava lá, veio correndo. Pegou Miguilim, e o levou para casa, debaixo de
pancadas. Levou para o alpendre. Bateu de mão, depois resolveu: tirou a roupa toda de Miguilim e
começou a bater com a correia da cintura. Batia e xingava, mordia a ponta da língua, enrolada, se
comprazia. Batia tanto, que Mãe, Drelina e a Chica, a Rosa, Tomezinho, e até Vovó Izidra, choravam,
pediam que não desse mais, que já chegava. Batia. Batia, mas Miguilim não chorava. Não chorava,
porque estava com um pensamento: quando ele crescesse, matava Pai. Estava pensando de que
jeito era que ia matar Pai, e então começou a rir. Aí, Pai esbarrou de bater, espantado: como tinha
batido na cabeça também, pensou que Miguilim podia estar ficando dôido.
• — "Raio de menino indicado, cachorro ruim! Eu queria era poder um dia abençoar teus calcanhares
e tua nuca!..." — ainda gritou. Soltou Miguilim, e Miguilim caíu no chão. Também não se importou,
nem queria se levantar mais.” (p.113)
• Após Liovaldo ir embora, pensou em ir também. Cresceu, enfim. 
• A situação de sofrimento se agrava ainda mais, pois o pai, sentido ciúmes de
Luisaltino, matou-o e se matou  em seguida:

• "Escuta, Miguilim, sem assustar: seu Pai também está morto. Ele perdeu a
cabeça depois do que fez, foi achado morto no meio do cerrado, se enforcou
com um cipó, ficou pendurado numa moita grande de miroró... Mas Deus não
morre, Miguilim, e Nosso Senhor Jesus Cristo também não morre mais, que
está no Céu, assentado à mão direita!... Reza, Miguilim. Reza e
dorme!" (ROSA,2019. p.124)
• A ideia era que Tio Terêz voltasse para cuidar da família, mas Miguilim não
estava mais apegado, queria sair do Mutum. 
• Foi nesse contexto, então, que um médico passou pela vila Perguntou como se
chamava o garoto. A resposta foi rápida: “Miguilim, irmão do Dito.”
• O médico logo viu que o rapazinho “tinha vista curta” (miopia), pois o garoto
apertava os olhos para ver o que estava longe. Ao colocar seus óculos em
Miguilim, a epifania se fez:
• “Miguilim olhou. Nem não podia acreditar! Tudo era uma claridade, tudo novo
e lindo e diferente, as coisas, as árvores, as caras das pessoas. Via os
grãozinhos de areia, a pele da terra, as pedrinhas menores, as formiguinhas
passeando no chão de uma distância. E tonteava. Aqui, ali, meu Deus, tanta
coisa, tudo... O senhor tinha retirado dele os óculos, e Miguilim ainda
apontava, falava, contava tudo como era, como tinha visto. Mãe esteve assim
assustada; mas o senhor dizia que aquilo era do modo mesmo, só que
Miguilim também carecia de usar óculos, dali por diante. O senhor bebia café
com eles. Era o doutor José Lourenço, do Curvelo. Tudo podia. Coração de
Miguilim batia descompasso, ele careceu de ir lá dentro, contar à Rosa, à
Maria Pretinha, a Mãitina. A Chica veio correndo atrás, mexeu: — "Miguilim,
você é piticego..." E ele respondeu: — "Donazinha...” (p.128)
• O crescimento de Miguilim agora era físico: tudo lhe aparecia na retina. O
doutor José Lourenço logo percebeu que um Míope deseja ver as coisas de
perto e por isso convida o rapaz para ir morar na cidade, estudar. A mãe
autorizou e abençoou e, de óculos, deu-se uma despedida ampliada:
Questões de Vestibular

(UFG) – Diversos motivos narrativos compõem a trama de “Campo Geral”, texto da obra Manuelzão
e Miguilim, de Guimaraes Rosa. Qual o motivo narrativo principal para a composição do enredo
desse conto?

a) As desavenças entre Mãitina e a avó de Miguilim.


b) A instabilidade sentimental da mãe de Miguilim.
c) A observação do mundo pela ótica de Miguilim.
d) A rivalidade entre o Tio Terêz e o pai de Miguilim.
e) A solidariedade entre os irmãos de Miguilim.
Questões de Vestibular
(ITA) – A narrativa:

I desenvolve-se num universo fantástico, corroborado pela subversão da linguagem.


II não retrata as experiências afetivas entre Miguilim e as outras personagens, pois o foco está nas
ações dele.
III é escrita em terceira pessoa, mas a historia é filtrada pela perspectiva do menino Miguilim.
Está(ão) correta(s)

a) apenas I.
b) apenas I e II.
c) apenas II.
d) apenas III.
e) todas.

Os diminutivos do segmento contribuem para criar uma linguagem

a) afetada.
b) afetiva.
c) arcaica.
d) objetiva.
e) rebuscada.
Questões de Vestibular
(UFRGS) – Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as seguintes afirmações sobre sentimentos de
personagens de Campo Geral, da obra Manuelzão e Miguilim, de Guimarães Rosa.

 (V) Miguilim odiava seu Pai, pela violência das surras e castigos que ele lhe impunha: mandar
embora a cadela, ou soltar os passarinhos que estavam nas gaiolas.
(F) As rezas da avó e os feitiços de Mãitina enfim surtiram efeito: Miguilim passou a se sentir
culpado pela morte do irmão.
(V) Miguilim detestava o Mutum, mas, com a ajuda dos óculos do doutor, acabou finalmente
descobrindo que se tratava de um lugar bonito.
(V) Dito sentiu inveja de Miguilim porque Papaco-o-Paco era capaz de dizer “ – Miguilim, Miguilim,
me dá um beijim”, mas não conseguia pronunciar “Dito”.

A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é


a) F – V – F – F.
b) F – V – F – V.
c) V – V – F – V.
d) V – F – V – V.
e) V – F – V – F.
Indicações de Vídeos
Resumo sobre o Modernismo Brasileiro

https://www.youtube.com/watch?v=NPrE2IsrqLM
REFERÊNCIAS
BORGES, Gustavo. Resenha de Campo Geral, João Guimarães Rosa. 2020
http://literaturaprofessorgustavoborges.blogspot.com/2020/10/campo-geral-guimaraes-rosa.html

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