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Transtornos

Alimentares
Rafael Augusto T. de Sousa
Médico Preceptor
Mapa da Aula
 Definições  Psicopatologia inicial e
 Nosologia mantenedora
 Epidemiologia  Diagnóstico e Quadro
 Etiologia Clínico
 Fatores Predisponentes:
 Comorbidades
Vulnerabilidade  Exames Laboratoriais
 Fatores Precipitantes  Diagnóstico Diferencial
 Fatores Mantenedores  Curso e Prognóstico
Definições
Transtornos Alimentares
 Transtornos do comportamento alimentar:
- derivados principalmente de uma valorização
excessiva da apetibilidade (desirability) de
perder peso
- que causa prejuízo funcional, médico,
psicológico e social.

(Kaplan, 2007)
Definições
Transtornos Alimentares

 Transtornos relacionados à cultura


 Raramente se apresentam sem comorbidades

(Kaplan, 2007)
Transtornos Alimentares
Epidemiologia
 ~70% das garotas em idade colegial faz dieta
 Garotos – desejo de ganhar massa muscular
(bigarexia – forma de dismorfofobia)

(Kaplan, 2007)
Transtornos Alimentares
Epidemiologia
 10-20 ♀ : 1♂ (séries clínicas)
 Anorexia: 0,5 - 1%
 Bulimia: 1-4%
 Padrões de família: intrincada (enmeshed) ou
separada (disengaged)
 Mais frequente em meio urbano do que rural
 Orientação sexual: ↑ gays; ↓ lésbicas?
 Profissões com mais risco: Bailarina, modelo,
(Kaplan, 2007)
esportes que demandam ser magro, papéis na mídia
Transtornos Alimentares
Etiologia
 É transtorno de comportamento
não se faz diagnóstico só por distorção imagem
corporal e hipervalorização de magreza
 Modelo de droga e dependência de emagrecer
 Não há teorias biológicas validadas

(Kaplan, 2007)
Definições
Principais Categorias
 Anorexia Nervosa
 Bulimia Nervosa
Anorexia
Nervosa
Anorexia Nervosa
 História:
- Richard Morton (Fim do século XVII)
Nervous consumption – síndrome consumptiva
emocional
- Lasègue e Gull (1873)
Anorexie Hysterique
Anorexia Nervosa
Transtorno psicogênico que ocorria
predominantemente em garotas e mulheres jovens
Anorexia Nervosa
 Pubertaetsmagersucht – busca da magreza
por adolescentes
 Anorexie Hysterique – anorexia histérica
 Anorexia Nervosa – anorexia nervosa
(neurótica)
Anorexia Nervosa na Mídia
(Karen Carpenter)
Classificação e Diagnóstico
 Russel (1970)
Comportamento

Anorexia

Endócrino Psicopatologia
Classificação e Diagnóstico
- Comportamento
Comportamento > Leva a considerável perda de massa
corpórea
- Endócrino
Manifesto em amenorreia (♀) ou perda de interesse e
potência sexual (♂)
- Psicopatologia
Medo mórbido de se tornar gorda
Comportamento
- “Busca obstinada pela magreza” (Bruch)
- Recusa por manter o peso acima ou dentro do
normal para a idade e altura:
. peso corporal menor do que 85% do esperado
. IMC ≤ 17,5
- Fracasso em ganhar o peso esperado no
período de crescimento, levando a peso menor
do que 85% do esperado
Endócrino
 Amenorreia – sem menstruar por ao menos 3
ciclos
 Perda de:

- Potência sexual
- Interesse sexual
Endócrino
• Eixo Hipotalâmico-Hipofisário-Gonadal
- Relação com:
. Noradrenalina
. Serotonina
. Dopamina
- Amenorreia
. Por restrição calórica?
. Por estresse e estímulo do hipotálamo?
Endócrino
 Eixo Hipotalâmico-Hipofisário-Gonadal
- Achados:
. ↓ FSH
. ↓ LH
. ↓ Estradiol
Classificação e Diagnóstico
 Endócrino

↓ Ingestão Alimentar ↑ CRH ↓ Apetite


Endócrino
 Eixo Hipotalâmico-Hipofisário-Adrenal
- Hipercortisolismo:
. ↑ Produção?
. ↓ Clearance?
Endócrino
 Eixo Hipotalâmico-Hipofisário-Tireoideano
- Achados:
. TSH normal
. T4 normal
. ↓ T3
Psicopatologia
 Medo de se tornar gorda
 Auto-avaliação excessivamente centrada no

peso e forma do corpo


. Negação dos problemas que o baixo peso
acarreta
. Distorção de imagem corporal
Psicopatologia (Eating Attitudes Test)

 Fico apavorada com a ideia de estar


engordando
 Evito comer quando tenho fome
 Corto os meus alimentos em pequenos pedaços
 Presto atenção à quantidade de calorias dos
meus alimentos
 Evito alimentos ricos em carboidratos
 Sinto-me extremamente culpada depois de
comer
(Bighetti, 2004)
Psicopatologia (Eating Attitudes Test)

 Demoro mais tempo para fazer as refeições do


que as outras pessoas
 Sinto que os alimentos controlam a minha vida
 Demonstro auto-controle diante dos alimentos
 Sinto desconforto após comer doces
 Gosto de sentir meu estômago vazio

(Bighetti, 2004)
Psicopatologia
 Ideia prevalente?
 Delírio?
 “Ainda que de tão extremas sejam patológicas,
estas crenças representam um exagero da
preocupação difundida acerca do controle do
peso que se criou na nossa comunidade”
Fatores Precipitantes
 Dieta - 95% dos casos  Abuso sexual
 Uma combinação de  Mudança de cidade, de
risco – exercício escola
excessivo + dieta  Competição na escola
 Eventos na puberdade,
especialmente em
 Desilusões amorosas
pacientes com peso  Doença familiar
acima do devido e  Brigas familiares
sensibilidade grande a
críticas.
 Transtorno de Humor
 Repugnância à
menstruação e a
sexualidade
Fatores Mantenedores
 Combinação:
- Fatores Externos – reforçadores sociais
. Indivíduos:
auto-críticos
perfeccionistas
perseverantes
. Anorexia como mediador das relações familiares
- Fatores Internos – reforçadores psicológicos e fisiológicos
. Anorexia como forma de auto-controle na puberdade
Episódios Bulímicos (Binges)
 Episódios bulímicos (comer compulsivo):
- Em determinado espaço de tempo
- Quantidade de alimento certamente maior do
que alguém comeria neste tempo e
circunstâncias
- Sensação de perda de controle durante o
episódio
Episódios Bulímicos (Binges)
 100g de chocolate = ~500 Kcal
 Barra de chocolate família (100 a 200g)
 Episódios de comer compulsivo (binges)
objetivos – de 2 a 5 mil Kcal
Purgação
 Indução de vômitos
 Uso de laxantes
 Uso de diuréticos
 Uso de enemas
Subtipos de Anorexia
- Restritivo – sem comer compulsivo ou
purgação
- Compulsão Periódica/Purgativo – com episódio
de comer compulsivo (binge) OU purgação
(purgação sem compulsão é muito raro)
Anorexia – Subtipo Restritivo
 Aproximadamente 50%
 Ingestão alimentar muito restrita: tentativas de
consumir de 300-500 Kcal/dia
 A paciente pode ser obstinadamente hiperativa
Anorexia – Subtipo Purgativo
 Aproximadamente 50%
 Os pacientes alternam tentativas de dietas rigorosas com

compulsões ou purgações intermitentes


 Compulsões:

- Subjetivas – paciente sente perda de controle e que comeu


mais do que queria
- Objetivas
 Purgação – compensação pelas calorias não queridas:

1. Vômitos

2. Abuso de laxantes

3. Diuréticos
Restritivo Purgativo
Obesidade na Mais Frequente
Família
Obesidade na Mais Frequente
Infância
Métodos para Mais agressivos
controle de peso
Associação com Cluster C Cluster B
transtorno de
personalidade
Impulsividade: Mais Frequente
Álcool/drogas
Furtos
Bulimia
Nervosa
Bulimia
Boul (boi)
+
Lemos (fome)
História
 Etiologia Gástrica:
- Fames canina
- Bulimia syncopalis (séc. XVIII)
- Bulimia emetica (séc. XVIII)
História
 Vomitar histérico (séc. XIX)
 Década de 1970 – vai surgindo uma descrição

de sintomas distinta de anorexia


 Russel – Bulimia Nervosa (1979)

Sobreposição grande com o conceito de


anorexia nervosa
Classificação e Diagnóstico
 Russel
Comportamento
Compensatório

Bulimia

Ímpetos Psicopatologia
(comer
compulsivo)
Quadro Clínico
 Russel
. Compensatório (comportamento)
. Ímpetos poderosos e intratáveis de comer
excessivo
. Psicopatologia – medo mórbido de se tornar
gorda
Quadro Clínico
 Compensatório
- Purgação – vômitos, laxantes, diuréticos,
enemas
- Jejuns
- Exercício Excessivo
Quadro Clínico
Í
 mpetos de comer excessivo
- Episódios bulímicos:
. Em determinado espaço de tempo
. Quantidade de alimento certamente maior do
que alguém comeria neste tempo e
circunstâncias
. Sensação de perda de controle durante o
episódio
Quadro Clínico
 Psicopatologia
- Auto-avaliação excessivamente influenciada
pela forma do corpo e pelo peso
Quadro Clínico – DSM IV
 Acrescenta:
- Pelo menos:
. 3 meses de duração
. 2 vezes por semana
Subtipos
 Purgativo
 Não Purgativo – outros mecanismos
compensatórios, como jejum e exercícios
excessivos
Bulimia Purgativo Não-Purgativo
Distorção de Mais frequente
Auto-imagem

Ansiedade em Mais grave


relação à
alimentação
Auto-agressão Mais frequente

Depressão, Mais frequente


Ansiedade, abuso
de álcoco
Anorexia e Bulimia
Anorexia Bulimia
Idade de Início Adolescência Fim da Adolescência/
Idade Adulta
Fome Negam Referem
Introvertidos Extrovertidos
Comportamento normal vergonhoso
considerado
Comportamento Inativo Ativo
Sexual
Personalidade Obsessiva Histriônica
Comorbidades com Humor e Humor e Abuso de
transtornos Ansiosos Substâncias
Falta
 Comorbidades
 Ex. Laboratoriais
Caso Clínico
 Identificação: L,16a9m, solteira, branca, estudante do 3°colegial
(colégio particular), natural e procedente de São Paulo-SP, sem
religião, mora com o pai, a mãe e o irmão (21 anos).
 Peso: 50,2 Kg, Altura: 1,71m, IMC: 17,1
 Queixa Principal: “Preciso me alimentar de uma forma mais saudável”
 História da Moléstia Atual:
 L. foi “gordinha” na infância. Aos 11 anos fez um regime com auxílio
de sua pediatra e alcançou um peso desejável. Teve algumas oscilações
de peso e, no início de 2007, pesava 62 kg (IMC=21). Sentia sua
barriga muito grande, em especial os flancos. Começou então a fazer
academia (aulas de spinning e outras), posteriormente associando a
dieta dos pontos (1080 Kcal/dia) ao seu esforço para perder peso.
Também caminhava diariamente. Como não obteve uma perda de peso
satisfatória, desistiu da dieta dos pontos e passou a restringir a
alimentação. Não comia mais alimentos “gordurosos” como pizza ou
batatas-fritas. Deixou de tomar refrigerantes.
Caso Clínico
 Ao final de 2007 L. notou que seu peso estava baixo (52 Kg), mas
mesmo assim queria emagrecer. Passou a pular os almoços e a ter episódios
bulímicos subjetivos, como a ingestão de meia lata de leite condensado com
sensação de perda de controle. Em 2008 passou a tomar laxantes, pois
notava a sua barriga estufada. Chegou a usar uma cartela, que conseguiu
coma sua mãe. Nega vômitos ou uso de diuréticos.
 Seus pais começaram a se preocupar com o seu peso e ligaram para o
Protad. Contudo desistiram da triagem. No fim de março, L. comeu quase
metade de um pavê e sentiu necessidade de ajuda médica. Então procuraram
novamente o serviço.
 L. chegou ao Protad com 51,2 Kg, fazendo até 3h de treino na academia por
dia, caminhando diariamente (até 1h/dia), em uso de laxantes, com restrição
de repertório de alimentos, bem como se abstendo de algumas refeições.
 Evolução do Tratamento Ambulatorial:
 30/04/08 – P=51 Kg. Anamnese.
 7/05/08 – P=50,1 Kg. Pula refeições. Uso de laxantes por 4 vezes (até
2 vezes num dia). Episódios bulímicos subjetivos.
Caso Clínico
 14/05/08 – P=49,9Kg. Sem uso de laxantes. Pula menos refeições.
 21/05/08 – P=50,2 Kg. Sem uso de laxantes. Caminhou bastante
num dia. Fez as 5 refeições todos os dias, exceto no sábado.
 História Mórbida Pregressa: Obesidade infantil.
 História do Desenvolvimento: Gestação não planejada, placenta
prévia; nascimento a termo sem intercorrências. DNPM normal, sempre
teve boa sociabilidade e bom desempenho escolar. Menarca aos 12
anos. Nunca teve namorado, mas já “ficou” com garotos.
 História Familiar: Tia materna com retardo mental e avô materno com
Alzheimer.
 Perfil Psico-Social: L. refere um bom relacionamento com a mãe, com
quem se abre, a despeito de sua mãe sair cedo e retornar do trabalho só
à noite. Seu pai é percebido como distante, embora trabalhe em casa e
passe muitas tardes com L.. O seguimento mostrou que seus pais estão
interessados, apesar de terem dificuldade de ajudá-la.
Caso Clínico
 Revisão de Sistemas: Obstipação (freqüência de 2x/semana);
Menstruação irregular, atualmente mais espaçada (cerca de
50/50 dias) e com fluxo menor.
 Exame Psíquico: Humor não polarizado, afeto ressonante a
estímulos positivos e negativos, cooperativa, pensamento com
conteúdo de culpa em relação à alimentação e auto-imagem
vista como normal (diz estar contente com o seu corpo), crítica
parcial (percebe que tem um problema, mas não quer ganhar
peso).
 Fatores Predisponentes:
 Obesidade na infância.
 Fatores Precipitantes:
 Exercícios excessivos e dieta.
Caso Clínico
 Fatores Perpetuantes:
 Família pouco hábil para colaborar no
tratamento.
 Fatores Prognósticos:
 Positivos:
 Início na adolescência, pouco tempo de doença
ativa, peso não muito baixo, ausência de
comorbidade psiquiátrica.
 Negativos:
 Purgação, família inábil.
Obrigado pela atenção!
Referências
• Bighetti, F et alii;J. bras. psiquiatr;53(6):339-
346, nov.-dez. 2004.
• Eating Attitudes Test, Garner, 1982
• Kaplan

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