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Violência uma das expressões da questão

social: aspectos teóricos-conceituais


Violência(s)

“Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz
violentas as margens que o comprimem” (Bertold Brecht)

“Raramente alguém diz de si mesmo ser violento [...] Violento é sempre


o outro, aquele a quem aplicamos a designação” (MICHEL MISSE, 2006)
O que é violência?
O que é violência?
Fenômeno de grande amplitude.
Atinge:
- Ricos e pobres
- Em cidades de grande e pequeno porte
- Em casa
- Na escola
- No trabalho
- No lazer
- Na televisão
- No trânsito
- Etc.
Perigos de quando se trabalha violência:
Caráter consensual

- Representado pela falsa obviedade e unanimidade quando se discute a violência;

- Consensualidade acerca da existência de um CONCEITO TÁCITO de violência;

- Dispensa da necessidade de defini-la, pois todos sabem do que se trata.


Perigos de quando se trabalha violência:
Coisificação da violência

- Associação de determinado comportamento à palavra violência;

- União da palavras violência à coisa violência, como se fosse um corpo único;

- O processo de coisificação prossegue até a definição, que passa a ser vista como a ÚNICA.

- A violência teria uma única forma de expressão;

- Outras formas de violência são refutadas.


Perigos de quando se trabalha violência:
Disputa Social

- Luta simbólica para impor uma definição à violência ou significado legítimo;

- A disputa ocorre em um espaço assimétrico de posições, beneficiando alguns grupos específicos;

- Reificação da violência;

- A imposição de um significado legítimo visa atender o próprio grupo/ator que a promoveu.


Perigos de quando se trabalha violência:
Perigos de quando se trabalha violência:
Disputa pelos sentidos e significados legítimos

- Tríade da disputa pelos sentidos e significaos legítimos de


violência;
Vítima

- Em um confronto violento, a vítima, o executor e a(s) Tríade


testemunha(s) podem divergir quanto ao julgamento social da
acerca da situação; Violência

- Podem divergir ou concordar acerca da validade e legitimidade Executor Testemunha


da utilização da violência naquela determinada situação.
Perigos de quando se trabalha violência:
Qual a interpretação dada a estes fatos, pensando na Tríade?
O Conceito de Paz
Paz e Violência são conceitos opostos;

Ausência de violência constitui a paz;

Estado de coisas que torna possível a transformação não violenta e criativa do conflito;

Paz negativa e Paz positiva.


O Conceito de Paz

Paz negativa

- Consiste na ausência de violência direta;

- Manutenção da violência estrutural;

- Evidencia que a erradicação da violência direta não é uma condição estritamente positiva.;
O Conceito de Paz
Paz positiva

- Corresponde a asuência das violências direta e estrutural, em um cenário de distribuição igualitária


de poder e recursos;

- Desenvolvimento vertical de sujeitos, grupos e sociedades.


O Conceito de Violência
“a causa da diferença entre o potencial e o real, entre o que poderia ter sido e o que é” (GALTUNG, 1969);

Existência de condições objetivas que impedem ou impediriam alguém de alcançar seu máximo potencial;

A violência está na origem da difrença entre a situação, a condição real e a condição potencial.

“[...]insultos evitáveis para as necessidades humanas básicas e mais amplamente


para a vida, fazendo que o nível real desça abaixo de níveis de satisfação do
potencial possível. Ameaças de violência também são violência” (GALTUNG, 1990).
O Conceito de Violência
TERREMOTO

Séc. XVIII – morte inevitável, incurável Passado – Inevitável


Séc. XXI – morte evitável, cura mundialmente Atualidade – Inevitável
reconhecida Futuro – ?
Tipologia da Violência
Tipologia da Violência
Violência DIRETA

- Relação SUJEITO – AÇÃO – OBJETO;


- Fenômeno observável e fácil de ser expresso por meio da linguagem;
- Ex. assalto a mão armada, um homicídio, uma briga, um estupro consumado, um genocídio;
- Envolve situações concretas, observáveis, visíveis;
- Envolve ao menos dois participantes (emissor e vítima);
- Dano de natureza física ou psicológica;
- Natureza dinâmica.
Tipologia da Violência
Violência ESTRUTURAL (OU INDIRETA)

- É aquela que se establece sobre a estrutura social;


- Situações que envolvem distribuição desigual de recursos ou serviços;
- Acesso limitado ou desigual a bens e serviços;
- Inclinação dos mais ricos dos recursos existentes para a sua auto-satifação;
- Contempla três fatores: econômicos, políticos e sociais;
- Fenômeno “invisível” (pouco visível);
- A violência é embutida na estrutura e aparece como desigualdade de poder e consequentemente como chances
desiguais de vida;
- Natureza estática.
Tipologia da Violência
Violência CULTURAL
- Valida a violência direta e estrutural;
- Faz com que a violência direta e estrutural pareçam certas ou não sejam vistas como erradas;
- Exemplificada pela religião e a ideologia, a linguagem e a arte, a ciência empírica e formal (lógica,
matemática)

“Culturas inteiras dificilmente podem ser classificadas como violentas; essa é uma razão para preferir
a expressão ‘o Aspecto A da cultura C é um exemplo de violência cultural’ à estereótipos culturais
como ‘a cultura C é violenta’”. (Galtung, 1990, p. 291) 
Tipologia da Violência
ESCRAVIZAÇÃO

Processo de maus-tratos contra negros (direta)


Resultado da escravização (direta)
Negros relegados a posições sociais inferiores (estrutural)
Ideias racistas (violência cultural)
Modelo Ecológico
para compreender a violência

OMS Urie BRONFENBRENNER


Modelo Ecológico
para compreender a violência

1. Nível Individual

Para além dos fatores biológicos e demográficos, são tidos em consideração os outros fatores
tais como impulsividade, baixo rendimento escolar, abuso de substâncias [tóxicas] e histórico
de agressão e abuso.

Este nível, dá-nos indicação das características da pessoa, avaliando a possibilidade de ser
uma vítima ou um perpetrador da violência.
Modelo Ecológico
para compreender a violência

2. Nível Relacional

Este nível explora como as relações sociais próximas – por exemplo, relações com companheiros,
parceiros íntimos e membros da família aumentam o risco para vitimização violenta e
perpetração da violência.
Modelo Ecológico
para compreender a violência

3. Nível Comunitário

Este nível analisa os contextos comunitários em que as relações estão inseridas - como
escolas, locais de trabalho e vizinhança bem como as características desses contextos que
podem estar associadas ao fato da pessoa ser vítima ou perpetrador da violência: mudanças
frequentes de residência, falta de vínculos sociais, elevada densidade populacional,
comunidades com problemáticas de tráfico de drogas, elevados níveis de desemprego ou
grande isolamento social.
Modelo Ecológico
para compreender a violência
4. Nível Social

• normas culturais que apoiam a violência como uma forma aceitável para solucionar conflitos, atitudes que
consideram o suicídio como uma questão de escolha individual em vez de um ato de violência que pode ser
evitado;

• normas que dão prioridade aos direitos dos pais sobre o bem-estar da criança;

• normas que reafirmam o domínio masculino sobre as mulheres e crianças;

• normas que validam o uso abusivo da força pela polícia contra os cidadãos;

• normas que apoiam os conflitos políticos.


• normas culturais que apoiam a violência como uma forma aceitável para solucionar conflitos, atitudes que
consideram o suicídio como uma questão de escolha individual em vez de um ato de violência que pode ser
evitado;
Níveis de Intervenção
O modelo ecológico serve a dois propósitos:

1.cada nível do modelo representa um nível de risco

2.e cada nível também pode ser encarado como um ponto principal para
a intervenção.
Níveis de Intervenção
Intervir em fatores de risco
individuais ao nível
comportamental
INDIVIDUAL

Lidar com fatores culturais, Promover relacionamentos


sociais e econômicos mais pessoais saudáveis nos
abrangentes diversos contextos
MACROSSOCIAL RELACIONAL

Combater atitudes e práticas Aplicação de medidas


culturais adversas ao nível da preventivas em escolas, bairros
desigualdade de gênero e e locais de trabalho
garantir a igualdade de acesso
aos serviços COMUNITÁRIO
SOCIAL
Tipologia da Violência
Três grandes categorias de violência, que correspondem às características daquele que comete o
ato violento:
Tipologia da violência
Violência
coletiva

Violência
estrutural
Violência Violência
autoinfligida interpessoal
Tipologia da violência
Quatro categorias de violência, com base na natureza dos atos violentos:

1. Violência física

2. Violência psicológica

3. Violência sexual

4. Negligência ou abandono

5. Violência econômica ou financeira

6. Violência institucional
Tipologia da violência
Seis categorias de violência, considerando a qual grupo ou pessoa ela é direcionada:

1. Violência doméstica

2. Violência no casal

3. Violência nas relações afetivas

4. Violência contra mulheres

5. Violência intrafamiliar

6. Violência por parceiros íntimos


Tipologia da violência
Prevenção da Violência
As intervenções de saúde pública são tradicionalmente caracterizadas em três níveis de prevenção:

1.Prevenção Primária – antes da ocorrência da violência

2.Prevenção Secundária – imediatamente depois da violência

3.Prevenção Terciária – longo prazo


Referências

BONAMIGO, Irme Salete. Violências e contemporaneidade. Rev. katálysis,  Florianópolis ,  v. 11, n. 2, p. 204-213,  Dec.  2008 . 
 Disponível em:  <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-49802008000200006&lng=en&nrm=iso>.

DAHLBERG, Linda L.; KRUG, Etienne G.. Violência: um problema global de saúde pública. Ciênc. saúde coletiva,  Rio de Janeiro ,
 v. 11, supl. p. 1163-1178,    2006 .   Disponível em: http://www.scielo.br/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
81232006000500007&lng=en&nrm =isso.

PALHARES, MFS., and SCHWARTZ, GM. A violência. In: Não é só a torcida organizada: o que os torcedores organizados têm a
dizer sobre a violência no futebol? [online]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2015, pp. 11-26. ISBN 978-
85-7983-742-5. Available from SciELO Books .
Introdução

CONSENSO

NEGOCIAÇÃO
- Reconhecimento da
MEDIAÇÃO alteridade
(REPRESENTAÇÕES/VALORES)

DIFERENÇA
Identidades, afetos, Negação da alteridade
conceitos, representações,
sentimentos VIOLÊNCIA
Introdução

CONSENSO?

NE
ÃO

GO

CIA
AR
MP

ÇÃ
DIFERENÇA
CO

O
REFORMULAÇÃO
Introdução DICOTOMIA
(Pierre Bourdieu)

cultura/natureza razão/emoção sujeito/objeto

mente/corpo ativo/passivo público/privado

MASCULINO/FEMININO

Cultura-mente-razão = homem
Natureza-corpo-emoção = mulher

RELAÇÃO DE PODER
Introdução

“Violência é compreendida como um processo pelo qual um indivíduo


é transformado de sujeito em coisa” (Marilena Chaui)

PODER ASSIMETRIA REIFICAÇÃO


VIOLÊNCIA DE GÊNERO E
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

O conceito de gênero foi construído historicamente e socialmente, visando compreender as


relações estabelecidas entre homens e mulheres.

Gênero: “elemento construtivo das relações sociais baseado em diferenças percebidas entre
os sexos” (Joan Scott).

A construção social dos sexos atribui diferentes espaços de poder para homens e homens.

Os estereótipos reservados a homens e a mulher delimitam os parâmetros de subjetivação e


de segregação nas relações de gênero.

A compreensão das relações de gênero implica que sejam entendidas como construção social
baseada na diferenciação biológica dos sexos.
Violência de Gênero
e Intergeracional

Gênero

Referencial teórico para análise e compreensão da desigualdade entre o


que é atribuído à mulher e ao homem.

Imagem idealizado do masculino e do feminino

Não percebemos a sua produção e reprodução social


Violência de Gênero
e Intergeracional
Gênero

Esfera produtiva e reprodutiva

Mulheres: delicadeza, sensibilidade, passividade, subordinação e


obediência
A mulher surge através de uma imagem sensível, fiel, honesta, instintiva,
generosa, perspicaz. (FRAGILIDADE)

Homens: brutalidade, indiferença, iniciativa/atividade, comando, virilidade


O homem aparece através de uma figura forte, disciplinadora, isento de
instintos, emoções e sensibilidade. (FORÇA)
Modelo masculino de dominação de arquétipo viril.
Violência de Gênero
e Intergeracional

Gênero

Cultura patriarcal reproduzida na família: valorização do homem em


detrimento da mulher.

Dominação masculina X Inferioridade feminina


Violência de Gênero
e Intergeracional

Gênero

Final da década de 1960: estudos sobre as relações familiares questionam o


papel tradicional da mulher na família e a condição feminina na sociedade

Violência contra a mulher passa a ser encarado como um problema de social


e de saúde pública

Categoria política e de reivindicação feminista que não respeita fronteira


de gênero, idade, classe social, raça/etnia, religião e grau de escolaridade
Violência de Gênero
e Intergeracional

Gênero

Década de 1970: Movimento de mulheres

Questionamento dos papeis atribuídos pela condição de serem mulheres

Igualdade de direitos entre homens e mulheres

Inserção problemática no mercado de trabalho: mão de obra mais


barata e dupla jornada.
VIOLÊNCIA DE GÊNERO E
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Existe poder em todas as relações interpessoais, e esse poder se mantém porque os vários
atores – tanto os dominadores como os dominados – aceitam as versões da realidade social que
negam a existência de desigualdades.

A violência doméstica contra as mulheres impacta toda a família da vítima e do agressor.

Pensar o gênero como conhecimento construído na interação significa romper com a ideia de
naturalização desse conceito, isto é, os modelos elaborados e utilizados pelas crianças,
adolescentes e adultos não são naturais, nem inerentes à constituição biológica do homem e da
mulher.

Para desconstruir as relações de gênero é preciso modificar concepções de masculino e


feminino, construídas sobre estereótipos de gêneros.
Violência de Gênero
e Intergeracional

Relações de poder: mulheres e crianças obedecem ao homem

Homem se constitui como autoridade máxima do núcleo familiar

Poder do homem é socialmente legitimado, seja como pai, seja como


esposo

Relações familiares permeadas pelo medo, de modo que desvios dos padrões
naturalizados podem desencadear conflitos
Violência de Gênero
e Intergeracional

Relações interpessoais assimétricas e hierárquicas

Vitimação física como disciplinamento

Novos modelos de interação e inter-relações baseados em relações mais


simétricas entre homens e mulheres, entre pais e filhos. Relações mais
respeitosas, mais saudáveis.

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