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DO DIREITO DAS COISAS

PROFª MSC. ANDRÉA BORBA DA SILVEIRA


DA POSSE
POSSE
1. Introdução
- Origem e desenvolvimento em Roma.
- Defesa da paz social e a tutela à situação de fato.
- A quebra da paz social gera uma sanção natural: busca-se restituir-
se a situação anterior à violência praticada.
- Posse é situação de fato amparada por lei.

* Motivos:
a) A posse aparenta uma situação de direito.
b) Repelir a violência no seio da sociedade.
2. Teorias Explicativas da Posse
a) Teorias Subjetivas (Friedrich Karl von Savigny)
- A posse decorre da conjugação dos elementos animus e corpus.
- Animus: elemento subjetivo/ espiritual/ anímico (intenção de ter a
coisa como sua).
- Corpus: elemento objetivo/ material.

b) Teorias Objetivas (Rudolf von Ihering)


- A configuração do corpus é suficiente para a caracterização da posse.
- Nova interpretação para corpus: a conduta de dono, tendo em vista a
função econômica da coisa.
- Teoria acolhida pelo ordenamento brasileiro.
3. Conceito:
- Extraído a partir do art. 1.196 CCB.
- Posse é situação de fato, amparada por lei, que representa o
exercício, de fato, de alguns dos poderes peculiares à propriedade.
Atenção: Posse ≠ Propriedade
- Relação entre pessoa e coisa que se fundamenta na vontade do
possuidor.
- Relação entre pessoa e coisa que se fundamenta na vontade
objetiva da lei.
- Protege-se o possuidor por se estar protegendo presumidamente
ao proprietário.
- A proteção conferida à posse, todavia, é transitória e é vencida
pela prova do domínio (Rodrigues).
4. Posse e detenção
- Art. 1.198.
- Detenção: simples estado de fato de permanecer com um bem.
- Ato de mera conservação da posse alheia, em nome de outro e sob
suas ordens ou instruções.
- “Detentor”, “fâmulo da posse” ou “servidor da posse”.

* Segundo entendimento sobre “detenção”: art. 1.208.


* “A detenção é uma posse degradada: uma posse que, em virtude
da lei, se avilta em detenção” (Ihering).
5. Classificação da posse

a) Direta e indireta
- A posse é, por natureza, exclusiva.
- Admite-se, todavia, o desdobramento do seu exercício.
- Indireta: trata-se da posse quando o seu titular, afastando de si por
sua própria vontade a apreensão da coisa, continua a exercer a
posse de maneira mediata, após haver transferido a outrem a posse
direta.
- Direta: são possuidores diretos aqueles que têm a coisa que lhes
foi transferida pelo dono, que conservou consigo a posse indireta,
quer por força de direito pessoal ou direito real.
- Art. 1.197: cabimento das ações possessórias.
b) Composse
- Admite-se que o exercício da posse seja simultâneo.

- Art. 1.199.

- Pressupostos: pluralidade de sujeitos e coisa indivisa.

- Proteção possessória pode ser reclamada por qualquer


compossuidor.
c) Justa e injusta
- Art. 1.200.
- Justa: é a posse adquirida ou exercida em consonância com o
ordenamento jurídico. É despida de vícios.
- Injusta: é a posse que foi adquirida eivada de vício (violência,
clandestinidade, precariedade).

* Ponderações de Maria Helena Diniz: “posse injusta”.


* Ponderações de Carlos Roberto Gonçalves/ Venosa: detenção ≠
posse (art. 1.208, parte final).
* Violência (vim): consiste no emprego da força injusta.
- Equivalência com o Direito Penal: roubo.

- O direito não se coaduna com a violência. Por isso, nega-lhe


proteção possessória.

- Art. 1.208: cessação da violência (decurso de ano e dia).


* Clandestinidade (clam): constitui-se às escondidas ou que
decorre do furto de um objeto.
- Equivalência com o Direito Penal: furto.

- Carece de exteriorização e de publicidade.

- O direito não se coaduna com a clandestinidade. Por isso, nega-lhe


proteção possessória enquanto o agente não revelar a posse de
forma ostensiva.

- Art. 1.208: cessação da clandestinidade (decurso de ano e dia –


conquista de juridicidade).
* Precariedade (precario): vício que decorre do abuso de confiança.
- O agente recebeu a coisa com prazo para restituí-la, porém a
retém indevidamente quando ela lhe é reclamada.
- Equivalência com o Direito Penal: apropriação indébita.
- Art. 1.208: a precariedade jamais convalesce. Portanto, enquanto
configurada,nunca gozará de juridicidade.
- Ressalva: art. 1.203 (presunção juris tantum de que a posse
mantém o mesmo caráter com que foi adquirida).
* Julgado STJ: Precedente REsp 154.733/DF
“O aludido art. 1.200 do Código Civil não esgota, porém, as
hipóteses em que a posse é viciosa. (...) Os vícios que maculam a
posse são ligados ao momento da sua aquisição, salvo a
precariedade que somente se origina de atos posteriores”
(Gonçalves).
“A violência e a clandestinidade podem, porém, cessar. Nesse caso,
dá-se, segundo expressão usada por alguns doutrinadores, o
convalescimento dos vícios. Enquanto não findam, existe apenas
detenção. Cessados, surge a posse, porém injusta, em relação a
quem a perdeu” (Gonçalves).

“Na realidade, porém, ao estabelecer que enquanto não cessadas a


violência e a clandestinidade não se adquire posse, mas detenção, o
dispositivo em apreço estabelece uma fase de transição, em que o
esbulhador terá mera detenção, antes de adquirir posse, injusta
ante o esbulhado. Assim, não há convalescimento de posse, mas
transmudação de detenção em posse, com a cessação dos vícios das
violência e da clandestinidade” (Gonçalves).
d) De boa-fé e de má-fé
- Justa/ injusta: analisa vícios extrínsecos à posse.
- Boa-fé/ má-fé: analisa a posição psicológica do possuidor em face
da situação jurídica da posse.

d.1) Posse de boa-fé: decorre da crença de que o possuidor se


encontra em situação legítima. Nela, o possuidor ignora
(desconhece) o vício ou obstáculo que impede a aquisição da coisa.
- Art. 1.201, caput c/c art. 1.202 (pode se transformar em posse de
má-fé).
- Boa-fé não se configura diante do erro inescusável/ ignorância
grosseira.
- Presunção juris tantum de boa-fé: presença do justo título (art.
1.201, parágrafo único).
“Justo título é o instrumento que conduz um possuidor a iludir-se por
acreditar que ele lhe outorga a condição de proprietário. Trata-se de
um título que, em tese, apresenta-se como instrumento formalmente
idôneo a transferir a propriedade, malgrado apresente algum defeito
que impeça a sua aquisição. Em outras palavras, é o ato translativo
inapto a transferir a propriedade por padecer de um vício de natureza
formal ou substancial” (ROSENVALD, N.).

“O justo título pode se concretizar em uma escritura de compra e


venda, formal de partilha, carta de arrematação, enfim, um
instrumento extrinsecamente adequado à aquisição do bem por modo
derivado. Importa que contenha aparência de legítimo e válido, com
potencialidade de transferir direito real, a ponto de induzir qualquer
pessoa normalmente cautelosa a incidir em equívoco sobre a sua real
situação jurídica perante a coisa” (ROSENVALD, N.).
d.2) Posse de má-fé: verifica-se quando o possuidor tem
conhecimento do vício que impede a aquisição da coisa.

“Haverá posse de má-fé quando o possuidor está convencido de que


sua posse não tem legitimidade jurídica, e nada obstante, nela se
mantém” (Pontes, 1977:70).

* Importância da distinção:
- Solução quanto aos frutos, benfeitorias e acessões.
* Possuidor de boa-fé:
- Faz jus aos frutos percebidos e os pendentes até que dure a boa-fé
(art. 1.214, caput).
- Cessada a boa-fé deve restituir os frutos pendentes e os que foram
colhidos com antecipação, deduzidas as despesas de
produção/custeio (p. único).
- Não responde pela perda/deterioração que não deu causa (art.
1.217).
- Faz jus à indenização pelas benfeitorias úteis e necessárias , com
direito de retenção (art. 1.219).
- Quanto às benfeitorias voluptuárias, se não for indenizado, pode
levantá-las desde que sem detrimento da coisa (1.219).
* Possuidor de má-fé:

- Responde por todos os frutos (colhidos, percebidos e pelos que


deixou de colher), mas faz jus às despesas de produção e custeio
(art. 1.216).

- Responde pela perda/deterioração ainda que acidentais (art.


1.218).

- Faz jus apenas à indenização pelas benfeitorias necessárias, mas


sem direito de retenção, nem de levantamento (art. 1.220).
Atenção!

Não confundir as classificações:

Posse justa e injusta ≠ Posse de boa e de má-fé.

“A justiça ou injustiça da posse determina-se com base em critérios


objetivos, diversamente do que ocorre com a posse de boa ou de
má-fé que tem em vista elementos subjetivos, pois decorre da
convicção do possuidor. [...]” (STJ, RE n.º 9.095/ SP, Rel. Min. Cláudio
dos Santos).
e) Posse ad interdicta e ad usucapionem
e.1) Ad interdicta: é a posse que é protegida pelos interditos possessórios,
visando repelir ameaça contra a posse, visando mantê-la ou recuperá-la.
- Qual posse poderá ser protegida?
- Art. 1.211.
- “Cessadas a violência e a clandestinidade, a mera detenção, que estava
caracterizada, transforma-se em posse injusta em relação ao esbulhado,
que permite ao novo possuidor ser mantido provisoriamente, contra os
que não tiveram melhor posse. Na posse de mais de ano e dia, o possuidor
será mantido provisoriamente, inclusive contra o proprietário, até ser
convencido pelos meios ordinários (CC 1.211)” (Gonçalves)
- A posse viciada pode ser protegida contra terceiros?
-“Mesmo o possuidor injusto ou de má-fé com relação a determinado
sujeito poderá defender a posse contra terceiros, em relação aos quais a
exerce sem qualquer vício” (Venosa, 2014, p. 80).
* Critério: melhor posse.
e.2) Ad usucapionem: é a posse que se prolonga por determinado
lapso de tempo estabelecido na lei, deferindo a seu titular a
aquisição do domínio.

- É, em suma, a posse capaz de gerar o direito de propriedade.


f) Posse nova e posse velha*
* Gonçalves, Tartuce, Diniz

f.1) Nova: até um ano.


f.2) Velha: ano e dia ou mais.
- Importância da distinção: aplicação do rito processual cabível (especial x
ordinário).

* Venosa
- Art. 558 CPC/ 2015: “Regem o procedimento de manutenção e de
reintegração de posse as normas da Seção II deste Capítulo quando a ação for
proposta dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho afirmado na petição
inicial.
-Parágrafo único. Passado o prazo referido no caput, será comum o
procedimento, não perdendo, contudo, o caráter possessório”.
g) Jus possidendi e jus possessionis

g.1) Jus possidendi: é a posse fundada na propriedade. A posse,


nessa hipótese, é o conteúdo ou objeto de um direito, qual seja, o
direito de propriedade ou direito real limitado (Venosa).

- É o direito à posse, conferido ao portador de título devidamente


transcrito, bem como ao titular de outros direitos reais. É a posse
causal, titulada (Gonçalves).
g.2) Jus possessionis: é o direito fundado no fato da posse, nesse aspecto
externo (Venosa).

* Gonçalves:
- É o direito de posse, derivado de uma posse autônoma,
independentemente de qualquer título.

- É tão somente o direito fundado no fato da posse, que é protegido


contra terceiros e até mesmo o proprietário.

- O possuidor só perderá para este, futuramente, nas vias ordinárias.


Enquanto isso, aquela situação será mantida. E será sempre mantida
contra terceiros que não possuam nenhum título nem melhor posse. [...]
O jus possessionis perserva até que o jus possidendi o extinga (Gonçalves).

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