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Europa Moderna
Notas para um debate historiográfico
O Autor
Rodrigo Bentes Monteiro graduou-se em história pela
PUC- Rio, foi professor do ensino médio e
fundamental por vários anos, tornou-se mestre em
doutor em História Social pela USP. Também se
formou em História Moderna na graduação e pós-
graduação na UFF. Foi coordenador da Companhia das
Índias de 2006 a 2009 e em 2012, tendo organizado
vários eventos e livros. Liderou o grupo brasileiro
sobre a presença de Maquiavel no mundo ocidental, e
representa a Cia das Índias-UFF em convênios.
Introdução
Analisar a produção Historiográfica, sobretudo europeia, a partir das Reformas
Religiosas.
Surgimento da filosofia da história, a Reforma protestante era inserida no processo de
modernização da sociedade ocidental, conforme o pensamento de Hengel
“mundanização positiva”
Laicos: reformas como fundação do caminho para a liberdade
Católicos ultramontanos, defensores do papa: equivoco que desestabilizou princípios
de autoridade.
Com a Reforma Luterana, nascia a Idade Moderna, quando o “povo” tornava-se
protagonista da história.
Fome de Deus
Implicações que ultrapassam as mudanças institucionais eclesiásticas no século
XVI.
Aspectos culturais;
Aspectos econômicos;
Aspectos de poder vividos na Europa.
A historiografia nem sempre foi atenta aos desdobramentos dessas relações.
Transformações significativas na análise das questões religiosas do século XVI
passam a ocorrer a partir dos trabalhos de Delio Cantimori, Lucien Febvre e
Hubert Jedin.
Fome de Deus - Delio Cantimori
Delio Cantimori
Desdobramentos e novidades desses estudiosos esclarecidos
Lucien Febvre pelo “antes” e “depois” da produção historiográfica sobre as
reformas.
Hubert Jedin
Delio Cantimori
Conhecido por suas reflexões sobre os problemas de periodização do
Renascimento.
Idade Humanística Busca por relações entre o Humanismo e a Reforma
Fome de Deus - Delio Cantimori
O protestantismo em seu advento representou o fracasso:
Do ideal humanista;
Da autoconfiança exacerbada no homem;
Do otimismo excessivo em sua transformação através do livre arbítrio.
“Se um homem apenas olhar todo o papismo, na certa verá facilmente que grande
parte dele é mera magia.”
William Perkins
Fome de Deus – Jean Delumeau
Dificuldade de tipificação do que seria a boa religião:
Menocchio
Trás a possibilidade de fazer diferentes leituras sociais e culturais do cristianismo.
Le Catholicisme entre Luther et Voltaire:
Aborda a reforma católica
Demonstra a forma com que o autor concebe as reformas:
Atos não sequenciais entre si;
Tentativa de entender a sua gênese além dos abusos da Igreja
Fome de Deus – Jean Delumeau
A renovação da Igreja se deu em dois momentos:
Na pré-reforma
E no Concilio de Trento
Como que com tantas dificuldades o Concilio pôde marcar a história da Igreja?
Atendeu as necessidades religiosas do seu tempo, assim como a Reforma
protestante.
A cristandade ocidental tinha “fome de Deus”
Manifesta pela busca da palavra da vida e pelo pânico dos pecados.
Fome de Deus – Jean Delumeau
Duas leituras propostas para a Reforma Católica:
Endurecimento das estruturas: Clero mais firme e com ênfase na catequese.
Santidade e piedade: exemplos heroicos testemunhados nas vidas de papas e
religiosos do século XVI.
Hubert Jedin
Conceito de Reforma Católica diferente de Contra-Reforma.
Mencionado por Delumeau como o melhor historiador da Reforma Católica.
Fome de Deus
John Bossy
Uma reforma silenciosa:
Clérigos interessados em disciplinar práticas do casamento, do batizado após o
nascimento e da confissão periódica.
Promover a passagem de uma cristandade medieval para um catolicismo moderno.
Rompimento com os vínculos de solidariedade grupal para a delegação de
responsabilidades ao indivíduo como católico.
Secularização Desencantada
A secularização é um assunto muito complexo e não possuí um meio de
avaliação consensual;
Segunda metade do século XX, estudos marxistas sobre o tema;
Crítica da historiografia revisionista a esse modo de interpretação;
Dialogo de Hugh Trevor-Roper com a tese de Max Weber ( Ética Protestante e o
Espírito do Capitalismo);
Roper concluí a existência de um vínculo indireto entre calvinismo e
capitalismo na Europa ocidental (contrário as interpretações marxistas e
weberianas);
Secularização Desencantada
Conversão generalizada de “empresários capitalistas” para o Calvinismo;
Conversão acompanhada da migração desses empresários de países católicos
para repúblicas protestantes, devido o avanço da burocracia estatal das cortes
europeias que sufocava o capitalismo;
Para Hugh Trevor-Roper não seria propriamente o catolicismo a impedir
diretamente o capitalismo;
Dessa forma se torna imprópria a ideia weberiana da ética calvinista como
principal motor de forma direta, do desenvolvimento capitalista;
Secularização Desencantada
Importância das ideias da sociologia de Weber nos estudos históricos sobre a
Reforma e o alvorecer da Idade Moderna;
Principal referência: Secularização;
A sociologia religiosa de Weber representou um divisor de águas nos estudos
sobre o tema;
Para o filosofo Giacomo Marramo o termo secularizar surgiu ao final do século
XVI, nas disputas canônicas francesas;
Secularização Desencantada
Termo relacionado à passagem de um religioso regular ao estado secular;
Em meados do século XVIII a secularização estava ligada ao conceito unitário
de tempo histórico;
Surgimento da ideia de progresso como temporalidade cumulativa e irreversível
representando o moderno processo de secularização;
No século XIX, a palavra secularização tem expansão semântica no campo
político;
Secularização Desencantada
No início do século XX o desenvolvimento da moderna sociedade
europeia ocidental foi pensado pela primeira vez, de forma completa
por Max Weber, como processo de secularização;
Duas vertentes:
Concepção geral do processo cultural no Ocidente;
Rompimento com filosofias da História anteriores, o idealismo de Hegel e o
materialismo de Marx;
Secularização Desencantada
Segundo Marramo o papel da secularização em Weber seria
incompreensível sem a tese da ética do protestantismo calvinista
como base do espírito do capitalismo, aspecto do crescente
racionalismo ocidental moderno;
Para Weber o efeito da dessacralização levou o enquadramento da
secularização no processo de desencantamento do mundo, que se
traduziu na recusa dos meios mágicos e sacramentais de busca da
salvação;
Secularização Desencantada
Origem do capitalismo em Weber:
Atividade mundana possível sem se desfrutar do mundo excessivamente;
Apenas na valorização do trabalho, preocupação e interesse de cada um por
si próprio.
A característica distintiva da Idade Moderna seria a alienação do
mundo, e não a alienação de si como se pensava Marx;
Secularização Desencantada
A ampliação de sentidos em volta da palavra secularização acabou figurando
como uma filosofia da história camuflada, um termo indeterminado e
controverso interpretado como descristianização ou dessacralização;
No âmbito político é utilizado para tratar e perda de modelos tradicionais;
No debate filosófico figura como sinônimo da erosão dos fundamentos
teológicos e da abertura à dimensão da escolha da responsabilidade e do agir do
homem no mundo;
Historicamente a secularização apenas significou a separação entre Igreja,
Estado, religião e política.
Religião Política
São muitos os exemplos de interação entre religião e política no Início da Época
Moderna, em Cortes reformadas ou católicas, que relativizam a separação entre
Igreja e Estado no campo institucional ou nas ideias relativas ao governo e a
moral.
Para Marc Bloch, o absolutismo era uma espécie de religião. O autor deixa
evidente a simbiose entre a realeza e o sagrado, que perdurou na Corte inglesa
até a ascensão da Dinastia Hanover, e na França até a Revolução.
Quentin Skinner contempla um universo vasto de textos, de forma a estabelecer
o “contexto intertextual" e posicionar melhor as obras consideradas seminais do
pensamento político moderno.
Religião Política
Destaca-se o estudo sobre a mudança da política protestante: da consideração
do príncipe como predestinado por Deus, ao dever de resistir e lutar pela
deposição de um tirano, mormente em Cortes Católicas.
Em perspectiva diferente de Skinner, Massimo Firpo afirma em sua obra O
cardeal, diante o quadro comumente aceito para pintar o vértice da Igreja em
Roma, no início do século XVI, de violência, devassidão, avidez e corrupção,
que naquele tempo, nada disso provocava escândalo, pois a consciência comum
não separava clérigos e leigos. Uma imagem austera e contrita da vida religiosa
só seria afirmada no contexto posterior da Reforma Católica.
Religião Política
Pode-se explicitar com mais vagar um caso de vínculos estreitos entre as
Reformas Religiosas e as questões políticas desfazendo fronteiras entre
religião, magia, filosofia e o próprio exercício do poder.
Ao analisar o ambiente intelectual da monarquia francesa no tempo das
Guerras de Religião (1559-1598), Denis Crouzet identifica, após a eclosão dos
conflitos, duas respostas da realeza – não excludentes entre si - às violências
interconfessionais. A mais evidente, de matriz humanista, tentava fundar a paz
pela tolerância da fé reformada.
Religião Política
Além dos ódios, existia a solução da tolerância como preservação do Estado,
pois sem um poder dominante, os homens guerreariam ao infinito. O rei devia
manter a paz, justificativa de organização social e política capaz de findar os
conflitos.
Para Natalie Davis, no ambiente da França no século XVI, a religião era vivida
de forma violenta por vários segmentos sociais. Deste modo a autora recupera
o tema da devoção religiosa, e aproxima sua análise das anteriores inovações de
Febvre e Delumeau, ao rejeitar explicações puramente economicistas ou
institucionais.
Religião Política
Não obstante a leveza dos conflitos inerentes às guerras religiosas no ensaio de
Crouzet, ele desenvolve versões acerca do evento da família real, católicas e
protestantes que lhe permitem trabalhar a construção de estereótipos políticos
como Catarina Médici e Carlos IX: a rainha feiticeira e o caçador.
Exemplo do Massacre de 1572
Religião Política
Um sonho perdido da Renascença, um ideal neoplatônico de amor e tolerância
religiosa - expresso nas formações intelectuais e de governo incidentes em
membros da família real dos Valois Angoulême. Sonho destruído pela estratégia
do malfadado assino do Almirante Gaspar de Coligny – na época influente
sobre o rei Carlos - , pelo acuamento político da família régia ante os radicais
protestantes, e pela falência da tolerância religiosa promovida pela monarquia.
Esse conjunto resultaria no plano de massacre, polêmico no referente a
extensão da ordem do rei, se dirigia aos chefes protestantes , ou a todos os
huguenotes em Paris.
Religião Política
De qualquer modo, a fúria coletiva foi desencadeada em todo o
reino, mediante oposições religiosas que eram ao mesmo tempo
políticas.
Reforma Moderna
Koselleck observa que somente nos anos de 1700 começou a tratar dos “tempos
modernos”
Conceito de modernidade séculos depois indicava o início do período que pretendia
abarcar.
Essa expressão está relacionada à criação do conceito de Idade Média
Idade Média e Moderna entrelaçadas a Renascimento e Reforma. Mas enquanto a
ideia do Renascimento em oposição aos tempos medievais necessitou de tempo
medievais, e se consolidou com um período em 1800. A palavra Reforma para os
protestantes ganhou um sentido e se tornou um período especifico. O que antes
apresentava um significado não cronológico, e referia apenas a vida religiosa
Reforma Moderna
Logo a historiografia protestante tinha a expressão como um conceito de época.
A reforma de Lutero vinculada a restauração da pureza da mensagem sagrada
escritura.
Delio Cantimori, trata as reformas religiosas como tópico característico da
Época Moderna. Ele faz uma aproximação entre dois movimentos culturais,
Humanismo e Reforma: pelo espírito crítico presente em ambos, e o
conhecimento do idioma a fim de se conhecer a verdade ao lidar com os textos
antigos.
A passagem do Humanismo até a Reforma mostra a grandeza do homem e sua
pequenez perante Deus, teria seu marco simbólico no saque de Roma em 1527.
Reforma Moderna
A Reforma protestante manifestou-se historicamente como inimigo do
Humanismo, por isso alguns humanistas franceses e italianos foram a favor da
Reforma Católica, mais simpática a ideia de livre-arbítrio.
Hannah Arendt disserta sobre a Idade Média em três grandes eventos, entre eles
a Reforma Protestante. Ela identifica um traço da modernidade no fenômeno
religioso da alienação do mundo, que para Weber era a origem da nova
mentalidade capitalista.
O perfil do homem moderno não seria dado pela mundanidade, mas pela sua
interioridade.
Reforma Moderna
Kolleseck aponta o surgimento da questão da individualidade em meio as
Reformas. Uma consciência mais individual – conhecimento de si mesmo, bem
visto por Lutero e Calvino.
A construção da identidade própria mediante a constatação das diferenças
alheias, era algo característico do homem moderno, segundo Garin.