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AFROPERSPECTIVIDADE

1 - sobre os efeitos da reprodução e perpetuação cultural do racismo epistêmico no


ensino de filosofia.
- A teoria da afrocentricidade, elaborada por Molefi Kete Asante, situa o povo e a cultura
africana no centro de suas próprias produções materiais e simbólicas em detrimento do paradigma
eurocêntrico que, historicamente, tem realizado esforços para dizimar e subalternizar as produções
culturais africanas – suas formas de saberes, crenças e valores ancestrais e históricos (ASANTE,
2009; 2014).

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• Ao enfatizar os africanos como agentes de ação, mudança, transformação, ideias e cultura, o autor
expõe como a Afrocentricidade rejeita a marginalidade e a alteridade impostas pelo eurocentrismo, a
fim de demonstrar a centralidade da África na história mundial. Dessa forma, ele indica como
características da Afrocentricidade: a crítica à dominação cultural e econômica europeia, a correção no
reposicionamento do africano como sujeito de sua própria história e a fundamentação desse conceito no
pensamento cultural da África clássica, cujas principais fontes estão nas primeiras civilizações do Vale
do Nilo. Além disso, o autor oferece importantes referências de desenvolvimento e aplicação do
paradigma da Afrocentricidade em diversas áreas, tais como educação, ciência política, psicologia e
egiptologia.
• A Afrocentricidade como ideia articula uma poderosa visão contra-hegemônica que
questiona ideias epistemológicas que estão simplesmente enraizadas nas experiências
culturais de uma Europa particularista e patriarcal. Existe uma ética assertiva entre os
afrocentristas para deslocar o discurso em direção a uma abordagem mais orientada para
a agência para análise, exames, investigações e fenômenos. Portanto, para demonstrar a
ideia de culturas ao lado umas das outras, ao invés da ideia de culturas sendo adotadas
por uma ideia particular abrangente.
• Como uma ideia intelectual, a Afrocentricidade também se anuncia como uma forma de ideologia
antirracista, antiburguesa e antissexista que é nova, inovadora, desafiadora e capaz de criar formas excitantes
de adquirir conhecimento baseado no restabelecimento da localização de um texto, uma fala ou um
fenômeno. Assim, pode-se argumentar pela utilidade de uma interpretação afrocêntrica dos quilombos como
Abdias do Nascimento fez ao criar uma nova perspectiva na história. Não é simplesmente um fenômeno, no
sentido afrocêntrico, que pode ser visto apenas a partir da perspectiva dos europeus. Perguntamos o que
pensavam os africanos sobre a criação dos quilombos? Portanto, a interrogação de um fenômeno baseado em
perspectivas ou atitudes ou valores ou filosofia africanas irá gerar novas informações, padrões de
comportamento e percepções.
• A negação da expressão exploradora de raça, gênero e classe encontrada na construção europeia do conhecimento
é, ao mesmo tempo, controversa e uma parte do processo de desenvolvimento paradigmático. A Afrocentricidade
gira em torno da cooperação, da coletividade, da comunhão, das massas oprimidas, da continuidade cultural, da
justiça restaurativa, dos valores e da memória como termos para a exploração e o avanço da comunidade humana.
Estes valores baseiam-se numa plena compreensão das ideias culturais africanas e baseiam-se no estudo e reflexão
de sociedades africanas específicas, de modo transgeracional e transcontinental.
• O silenciamentos de outros modos de pensar que não sejam a partir do modelo eurocêntrico.
• O povo que eu invoco foi rechaçado por Kant, e Hegel. Vale a pena, destacar alguns trechos que
sintetizem as visões desses dois filósofos alemães sobre os povos africanos e afrodescendentes.
• Os negros da África não possuem, por natureza, nenhum sentimento que se eleve acima do ridículo.
O senhor Hume desafia qualquer um a citar um único exemplo em que um Negro tenha mostrado
talentos, e afirma: dentre os milhões de pretos que foram deportados de seus países, não obstante
muitos deles terem sido postos em liberdade, não se encontrou um único sequer que apresentasse
algo grandioso na arte ou na ciência, ou em qualquer outra aptidão; já entre os brancos,
constantemente arrojam-se aqueles que, saídos da plebe mais baixa, adquirem no mundo certo
prestígio, por força de dons excelentes. Tão essencial é a diferença entre essas duas raças
humanas, que parece ser tão grande em relação às capacidades mentais quanto à diferença de
cores (KANT, 1993, p. 75-76).
• (...) a principal característica dos negros é que sua consciência ainda não atingiu a intuição de
qualquer objetividade fixa, como Deus, como leis (...) negro representa, como já foi dito o homem
natural, selvagem e indomável (...). Neles, nada evoca a idéia do caráter humano (...). Entre os
negros, os sentimentos morais são totalmente fracos –ou, para ser mais exato inexistentes. (HEGEL,
1999, p. 83-86)
• 2 – a Afroperspectividade, como uma abordagem teórico-metodológica relevante para
combater o racismo epistêmico no ensino de filosofia
- epistemicídio
• O epistemicídio perpetrou uma desqualificação estética, ética, intelectual e espiritual de todos os povos não-
europeus. Afinal, além do domínio e colonização dos corpos e das terras, os europeus se esforçaram por efetivar o
domínio e a colonização da informação e do conhecimento. Todos esses processos estabeleceram relações
assimétricas que favoreceram a discriminação negativa e a desqualificação das produções intelectuais dos povos
africanos e de seus descendentes. Foram sucessivos ataques que criaram essa perspectiva de ausência de filosofia
fora da Europa.
• Filosofia ubuntu - A palavra Ubuntu tem origem nos idiomas zulu e xhosa do sul do continente africano e tem como
significado a humanidade para todos. Nesse sentido, a Filosofia Ubuntu fundamenta-se em uma ética da
coletividade, representada principalmente pela convivência harmoniosa com o outro e baseada na categoria do
“nós”, como membro integrante de um todo social.

- Filosofia política
• Afroperspectividade é um plano de imanência e o seu solo é uma roda, (...), uma reterritorialização
contínua, ininterrupta de uma dinâmica africana criativa que dribla e ginga para se constituir.
• Em um modelo de agricultura que negocia e ginga com os tempos e ciclos da própria terra:

• https://g1.globo.com/goias/noticia/2017/03/fazendeiro-e-indiciado-e-multado-em-r-43-mi-por-retirar-agu
a-do-araguaia.html
• - desterritorialização = apropriação de territórios
• A terra é um bem comum, pois todos nós partilhamos dela.
• https://www.bbc.com/portuguese/brasil-59269706
LOCALIZAÇÃO
• Primeiro, é preciso dar passagem para o conceito de localização. Pois bem, localização “no sentido
afrocêntrico, refere-se ao lugar psicológico, cultural, histórico ou individual ocupado por uma pessoa em dado
momento da história” (Asante, 2008,p.96). O que significa que é necessário precisar em que lugar uma pessoa
está posicionada em relação à sua cultura. Porque é indispensável entender e demarcar a maneira como uma
pessoa está em relação à sua ancestralidade, suas referências históricas e culturais, avaliando “se essa pessoa
está em um lugar central ou marginal em relação à sua cultura” (Idem, p.97). Conforme Asante, uma pessoa
está deslocada ou descentrada sempre que se posicionar a partir de experiências que não fazem parte de sua
história, sempre que operar centrada nas experiências de outrem. Um(a) intelectual afrocentrista pretende
manter as experiências africanas e afro-diaspóricas “dentro, e no centro, de sua própria história” (Ibidem).
AGÊNCIA
• Agência é o segundo movimento-chave na roda da afrocentricidade. Em linhas gerais, “agência é a capacidade
de dispor de recursos psicológicos e culturais necessários para o avanço da liberdade humana” (Asante, 2008,
p.94), agência chama as pessoas para protagonizarem suas trajetória histórica e sua ancestralidade africana. Para
Asante, as pessoas africanas/afro-diaspóricas devem se tornar “agentes em termos econômicos, culturais,
políticos e sociais” (Idem, p.95). Um tipo de reorientação e recentralização que abandona as situações de
vítimas e dependentes que foram impingidas aos povos africanos/afro-diaspóricos. Portanto, qualquer evento
histórico sob o prisma da agência precisa considerar que estes povos são agentes. Por exemplo, na história do
Brasil é preciso considerar que a “supressão” do cativeiro não foi uma ação advinda da assinatura da Lei Áurea;
mas, um processo complexo protagonizado por levantes, insurreições, instalações de movimentos de contra-
cultura e diversas formas de resistências e reivindicações, tais como os quilombos, as fugas em massa e queimas
de casas-grande, além dos diversos movimentos abolicionistas, todos protagonizados por pretas e pretos durante
os períodos colonial e imperial.
REFERÊNCIAS

• NOGUERA, Renato. DUARTE, Valter. RIBEIRO, Marcelo dos Santos. Afroperspectividade no ensino de
filosofia: possibilidades da Lei 10.639/03 diante do desinteresse e do racismo epistêmico. O que nos faz pensar,
Rio de Janeiro, v.28, n.45, p.434-451, jul.-dez.2019.

• NOGUERA, R. Denegrindo a filosofia: o pensamento como coreografia de conceitos


afroperspectivistas. Griot : Revista de Filosofia, [S. l.], v. 4, n. 2, p. 1–19, 2011.

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