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A compreensão de

textos
Como referido anteriormente, a leitura é uma actividade receptiva do quotidiano – lemos o nome de uma
praça, de um cartaz numa rua, de um anúncio. Ler é uma habilidade que faz parte do nosso dia-a-dia.
Contudo, por mais comum (banal) que possa parecer a realização de uma leitura, não se trata de uma
tarefa simples. Como se viu, a leitura pode ser apenas sinónimo de decifração. No entanto, não basta
somente descodificar. Ler significa compreender o que foi lido, o que implica que o leitor contextualize o que
leu e lhe atribua significado, melhor dizendo, que construa a significação; em suma: seja proficiente.
A compreensão de textos
A leitura é um processo interactivo entre o leitor e o texto, de
modo a que o primeiro obtenha informação, construa o significado do
texto, isto é, compreenda. Para tal, necessita de ler rápida e
eficazmente um texto, ou seja, precisa de ter fluência de leitura.
Ensinar a compreender é ensinar explicitamente estratégias para
abordar um texto (antes da leitura, durante a leitura e depois da
leitura). Colocam-se então duas perguntas:
- Como levar os alunos da decifração à compreensão do texto?
- Que estratégias de ensino explícito para desenvolver a fluência de
leitura?
A compreensão de textos
Podemos definir fluência de leitura como eficácia e rapidez no
reconhecimento de palavras, de modo a possibilitar uma eficiente
construção dos significados de um texto e expressividade (se em voz
alta). Pressupõe o reconhecimento instantâneo de palavras, libertando
a atenção e a memória para a recuperação rápida do significado da
frase (e do texto). Implica velocidade de leitura. Para isto, a frequência
de leitura é fundamental. Que estratégias para desenvolver a fluência?
A compreensão de textos
1. Reconhecimento imediato da palavra: para que a criança reconheça automaticamente
uma palavra é fundamental desenvolver a consciência fonológica, ou seja, o
conhecimento dos sons da língua, para que ela proceda rapidamente à
correspondência som-letra por um lado; por outro, que reconheça globalmente as
palavras.
2. Conhecimento da língua: tem de conhecer bem oralmente a língua em que vai ser
alfabetizada – conhecer a estrutura da língua, ter desenvolvimento lexical, compreender
o seu funcionamento, em suma ter desenvolvimento linguístico.
3. Experiência individual de leitura: o conhecimento do tema do texto e a aprendizagem
explícita de estratégias de abordagem da compreensão são fundamentais.
4. Experiência e conhecimento do mundo: estes saberes permitem-lhe a integração da
informação que lê.
A compreensão de textos
Assim, a criança vai passando da identificação da palavra ao texto:
reconhecendo automaticamente; conhecendo novas palavras e
enriquecendo-se do ponto de vista lexical; analisando a estrutura
interna das palavras, tendo sempre como base um trabalho de
estimulação do desenvolvimento da linguagem oral.
Referir-nos-emos ao ensino explícito, isto é, explicado aos alunos,
de estratégias para desenvolver a fluência, ou seja, a velocidade de
leitura, compreendendo simultaneamente o que lê, apresentando
estratégias gerais para abordagem de um texto, de modo a potenciar
a compreensão.
A compreensão de textos
Assim, antes de ler, é importante estabelecer um
objectivo de leitura (para que vou ler?), bem como
activar conhecimentos anteriores sobre o tema (o que
sei sobre este assunto?); interpretar gravuras e título (o
que é que esta gravura me faz lembrar?) e procurar
palavras que estejam realçadas a negrito ou sublinhadas,
pois estas palavras resumem ou contêm aspectos
semânticos (do significado) essenciais do texto.
A compreensão de textos
Durante a leitura, é fundamental prestar atenção ao que se lê, sem
o que não se compreende; perceber a estrutura do texto
(compreendemos de forma diferente uma história, uma notícia ou
uma instrução); ler com mais ou menos velocidade consoante a
dificuldade do texto; ler de novo cada parágrafo e procurar a
informação nova (o que se diz aqui de novo?); adivinhar pelo
contexto o significado de palavras novas; parafrasear, isto é, dizer por
outras palavras, e tomar notas durante a leitura; usar materiais de
referência (dicionários, enciclopédias); sintetizar à medida que se
avança. Estes passos são fundamentais para incrementar a
compreensão.
A compreensão de textos
Depois de ler, é importante comparar as
previsões iniciais sobre o seu conteúdo do texto
com a informação nele contida; fazer perguntas
sobre o que se leu e tentar responder; discutir
com os colegas sobre o lido e sobretudo reler.
A compreensão de textos
Centremo-nos agora nas componentes de compreensão da leitura.
São elas, segundo Catalá (2008), a componente literal; a componente de
reorganização; a componente inferencial e a componente crítica.
A componente literal (CL) de compreensão da leitura implica que o
aluno reconheça e compreenda tudo o que explicitamente figura num
texto. Apresentam-se alguns exemplos de perguntas e tarefas a
desenvolver com os alunos:
- distinção entre informação relevante e informação secundária;
- identificação da ideia principal;
- reconhecimento de pormenores;
A compreensão de textos
- identificação de relações de causa e efeito;
- compreensão de instruções;
- reconhecimento da sequencialidade de uma acção;
- identificação de elementos numa comparação;
- identificação de sinónimos e antónimos;
- domínio de vocabulário básico apropriado à idade.
Desenvolvendo estas tarefas em sala de aula, os alunos serão capazes de
identificar personagens e reconhecer-lhes traços de carácter; localizar
acontecimentos no espaço e no tempo e reconhecer ainda relações de causa e
efeito.
A compreensão de textos
A componente de reorganização (CR) comporta a apropriação e a
própria reorganização da informação recebida, sintetizando-a e
esquematizando-a. As tarefas que a seguir se apresentam
exemplificam formas de trabalho com os alunos:
- reorganização da informação segundo determinados objectivos;
- elaboração de resumos;
- reestruturação de um texto, esquematizando-o;
- concepção de títulos que englobem o sentido de um texto;
- divisão de um texto em partes.
A compreensão de textos
De igual forma, os alunos serão capazes de
identificar o tema/assunto do texto, bem como de
sintetizar partes do texto; ordenar cronologicamente
sequências de acontecimentos; interpretar e
reorganizar dados fornecidos em diversas frases do
texto, elaborar esquemas sobre o texto; mobilizar
informação dispersa no texto para responder a
perguntas e resumir informação, entre outras tarefas.
A compreensão de textos
A componente inferencial (CI) exerce-se quando se formulam
antecipações ou suposições sobre o conteúdo de um texto e sobretudo
quando, a partir da informação contida no texto, somos capazes de fazer
deduções com base nos conhecimentos prévios. Apresentamos de novo
alguns exemplos do que temos de trabalhar com os alunos:
- inferir o significado de palavras desconhecidas;
- antever a causa de determinados acontecimentos;
- inferir sequências lógicas;
- reconstruir um texto, variando personagens e acções;
- prever um final diferente.
A compreensão de textos
Deste modo, os alunos serão capazes de
dar um título ao texto e deduzir a ideia
principal, traços de carácter, prever
resultados e hipóteses de continuidade,
entre outras possibilidades de
compreensão.
A compreensão de textos
A componente crítica (CC) implica a formação de juízos próprios e a
identificação da linguagem do autor. Propomos alguns exemplos de tarefas de
ensino:
- análise do conteúdo de um texto;
- distinção entre factos e opiniões;
- manifestação de opiniões face ao conteúdo de um texto;
- (…)
Desenvolvidas estas tarefas de compreensão, os alunos serão capazes de
reconhecer os objectivos do escritor, colocar-se no lugar da personagem e dizer
como agiriam nas mesmas circunstâncias, dar a sua opinião sobre um facto ou
uma atitude, emitir juízos de valor variados.
A compreensão de textos
Neste sentido e procurando exemplificar o ensino da compreensão textual,
apresentamos ainda uma tipologia de perguntas, inspirada em Sim-Sim (2008), que
mobiliza estas quatro componentes de compreensão textual. A partir dela, podemos
construir perguntas de dificuldade variável, uma vez que se mobilizam competências de
compreensão distintas e se organizam de acordo com as componentes de compreensão
descritas. Ora veja-se:
A compreensão textual – Tipologia de perguntas
1. Apreensão global do sentido do texto; (CL)
2. Identificação das ideias centrais do texto; (CL)
3. Reconhecimento dos objectivos do autor; (CL/CI)
4. Realização de inferências; (CI)
5. Associação de pistas gráficas a material escrito; (CL/CI)
A compreensão de textos
6. Extracção de conclusões; (CI)
7. Relação da informação lida com conhecimentos exteriores ao texto; (CI)
8. Síntese de partes do texto; (CR)
9. Distinção causa/efeito; facto/ficção; (CL)
10. Identificação de pormenores; (CL)
11. Articulação e relacionação de partes do texto entre si; (CR)
12. Localização específica de informação; (CL)
13. Aplicação do conteúdo do texto a situações reais; (CI)
14. Opinião (crítica) sobre conteúdos; (CC)
15. Considerações sobre organização e forma do texto; (CC)
16. Compreensão de instruções para acção. (CL)
A compreensão de textos /
conectores
A compreensão de um texto depende também das relações
estabelecidas entre as proposições ou frases, asseguradas em grande
parte pela existência de conectores ou articuladores, que são palavras
ou expressões que têm por função ligar as frases e os parágrafos,
facilitando o trabalho de integração da informação. Funcionam como
uma espécie de “polícias sinaleiros” do texto (Ferrão, 2007),
indicando as direcções a seguir no que se refere à compreensão
textual. Por exemplo, se quisermos acrescentar algo podemos utilizar
uma expressão do tipo “além disso” ou se, pelo contrário, queremos
restringir poderemos usar “no entanto”, etc. Como se depreende, a
sua incompreensão compromete a construção da significação.
A compreensão de textos /
conectores
Os conectores também induzem a realização de
inferências, na medida em que reduzem e/ou tornam
mais precisas as formas de interpretar as relações entre
frases (Viana, 2008). É pois necessário compreender o
sentido dos conectores não só para compreendermos o
sentido das frases e dos textos, como também para os
sabermos utilizar quando escrevemos. A título,
meramente ilustrativo, apresenta-se uma tipologia de
conectores:
A compreensão de textos /
conectores
Adição: E, pois, além disso, e ainda, não só…mas também, por um lado… por outro (lado)
Causa: Pois, pois que, porque, por causa de, dado que, já que, uma vez que, porquanto
Certeza: É evidente que, certamente, decerto, com toda a certeza, naturalmente,
evidentemente
Consequência: Por tudo isto, de modo que, tanto… que, de tal forma que Conclusão:
Portanto, logo, enfim, em conclusão, concluindo, em suma
Chamar a atenção: Note-se que, atente-se em, repare-se, veja-se, constate-se Dúvida:
Talvez, é provável, é possível, provavelmente, possivelmente, porventura
Enfatizar Efectivamente, com efeito, na verdade, como vimos
Esclarecer (não) significa isto que, quer isto dizer, não se pense que, com isto não
pretendemos
A compreensão de textos /
conectores
Exemplificar: Por exemplo, isto é, como se pode ver, é o caso de, é o que se passa com
Fim: Para, para que, com o intuito de, a fim de, com o objectivo de
Hipótese, condição: Se, a menos que, supondo que, (mesmo) admitindo que, salvo se,
excepto se
Ligação espacial: Ao lado, sobre, à esquerda, no meio, naquele lugar, o lugar onde
Ligação temporal: Após, antes, depois, em seguida, seguidamente, até que, quando
Opinião: A meu ver, estou em crer que, em nosso entender, parece-me que
Oposição, restrição: Mas, apesar de, no entanto, porém, contudo, todavia, por outro
lado
Reafirmação, resumo: Por outras palavras, ou melhor, ou seja, em resumo, em suma
Semelhança: Do mesmo modo, tal como, assim como, pela mesma razão
4. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES
SOBRE COMPREENSÃO TEXTUAL
ACTIVIDADE nº 4: Partindo de uma lengalenga…
1 Objectivo: mobilizar conhecimentos prévios.
Procedimentos:
a) de formação na EMP
- leitura pelo professor da lengalenga “Lagarto Pintado”;
- leitura, em voz alta, por 4 ou 5 alunos. O texto da lengalenga deve
ser distribuído a todos os alunos ou, caso não seja possível, passado
no quadro;
4. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES
SOBRE COMPREENSÃO TEXTUAL
LAGARTO PINTADO
- Lagarto pintado,
- quem te pintou?
- Foi uma menina
- que por aqui passou.
- Lagarto verde,
- quem te esverdeou?
- Foi uma folhinha
- que por aqui passou
4. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES
SOBRE COMPREENSÃO TEXTUAL
- Lagarto azul,
- quem te azulou?
- Foi a onda do mar
- que me molhou.
- Lagarto amarelo,
- quem te amarelou?
- - Foi o sol poente
- que em mim poisou.
- - Lagarto encarnado,
- quem te encarniçou?
- Foi uma papoila
- que para mim olhou.
4. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES
SOBRE COMPREENSÃO TEXTUAL
- leitura pelo professor das perguntas e os alunos respondem em coro;
dizendo os alunos as respostas;
- leitura pelos alunos, em pares, pergunta – resposta;
- leitura pelos alunos, em pares, das perguntas com alteração das respostas.
Exemplos:
- Lagarto pintado,
quem te pintou?
- Foi um menino
- que por aqui andou.
4. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES
SOBRE COMPREENSÃO TEXTUAL
- Lagarto verde,
quem te esverdeou?
- Foi uma libelinha
que por aqui voou.
- Lagarto azul,
quem te azulou?
- Foi a cor do mar
que me apanhou.
- Lagarto amarelo,
quem te amarelou?
- Foi o sol ardente
que em mim acertou.
- Lagarto encarnado,
quem te encarniçou?
- Foi um belo cravo
que para mim cheirou.
4. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES
SOBRE COMPREENSÃO TEXTUAL
- leitura pelos alunos, em pares, com alteração da cor do lagarto nas perguntas.
Exemplos:
- Lagarto laranja,
- quem te alaranjou?
- Lagarto roxo,
- quem te arroxeou?
- - Lagarto branco,
- quem te branqueou?
- - Lagarto cinzento,
- quem te acinzentou?
4. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES
SOBRE COMPREENSÃO TEXTUAL
b) de sala de aula do EP
A actividade proposta pode ser aplicada numa sala de aula do Ensino
Primário pelos estudantes da EMP. A sua realização na aula de
Metodologia permite- -lhes uma intervenção mais adequada.

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