Você está na página 1de 16

A EDUCAÇÃO SOCIAL NA

MATRIZ CULTURAL AFRICANA


Apresentação desenvolvida com base em dissertação de mestrado disponível em:
<http://www.ppged.ufscar.br/pt-br/arquivos-1/dissertacoes-defendidas/2018/ademri-barros-dos-santos.pdf>

Ademir Barros dos Santos


ademirmulato@gmail.com
CONCEITOS

CONCEIT SIGNIFICADO UTILIZADO FONTE


O
Culto/cultura Conjunto de costumes civilizacionais Alfredo Bosi, Dialética da colonização

Tradição Conhecimentos que transitam intergerações Dicionário Aurélio de Português Online

Grupo unido por laços culturais e/ou genéticos,


Nação Benedict Anderson, Comunidades imaginadas
reais ou imaginados, sujeitos à mesma soberania

Ney Lopes, Dicionário banto do Brasil


Candomblé Religião brasileira, de matriz africana A Casa de Oxumaré
Mãe Estela de Oxóssi, Discurso de posse na ALB
Calleja, Os professores deste século
Dermeval Saviani, Educação
Processo de transmissão intergeracional de Maria H. Gohn, Educação não formal na
Educação
saberes pedagogia social
Marcos F. Martins, Educação não escolar
Rocha, Pedagogia da diferença
VALORES CULTURAIS AFRICANOS

DEPOIMENTOS COLHIDOS EM
VALOR CULTURAL * AMBIENTE CONGRUÊNCIA
RELIGIOSO DE MATRIZ AFRICANA
Pertencimento à linhagem O ser = elo de união ancestrais/descendência x
Morte = outro modo de vida Os ancestrais interferem na vida presente x
Força vital (asè) Força divina que sustenta o universo x
Harmonia com a natureza Humanos e natureza partilham o mesmo asè x
Oralidade A palavra falada transmite poder x
Grupo precede o indivíduo O indivíduo depende da comunidade x

* Fontes: Munanga, K. O universo cultural africano. In: África – Brasil. Belo Horizonte: Fundação JP, v.14, n. 7-10, jul. a
out/1984, p. 64-74. Confirmação em Bâ, A. H. Amkoullel, o menino fula. São Paulo: Palas Athena: Casa das Áfricas, 2003.
FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS
TEOLÓGICOS

• Tudo o que é material, tem fundamento no sagrado, no mundo espiritual;


• Tudo é dual: o que é bom traz, consigo, o que é ruim; a recíproca é verdadeira;
• Não há maniqueísmo: entre o bom e o ruim, há todo o espectro de possibilidades;
• O sagrado disponibiliza tendências: a materialização obedece ao livre arbítrio individual;
• Toda a energia natural flui do espiritual para o material, de onde deve retornar, potencializada;
• O ser humano é elo entre seus antepassados e sua descendência, a quem deve ensinar a tradição;
• Toda ação humana é possibilitada pelo sagrado; mas, o humor do sagrado não é imutável;
• O sagrado permite momentos ruins, para o amadurecimento do ser humano;
• Toda oferenda corresponde ao agradecimento do ser humano pelo potencial fornecido pela divindade.
FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS
TEOLÓGICOS

A CIRCULARIDADE DO ASÈ

Do sagrado ao profano A Do profano ao sagrado

(a partir do Ser
supremo e via
orixás e ancestrais,
(via submissão,
para s demonstração de
os “mais velhos”,
fé, oferendas)
a comunidade e
a natureza) è
FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS
ANTROPOLÓGICOS

• O indivíduo inexiste sem seu grupo: só tem importância quando em comunidade;


• Toda a organização social exige a interação total entre todos os seus componentes;
• Todo indivíduo é importante na composição total do grupo a que pertence;
• Todo o grupo é hierarquizado por subdivisões correspondentes à longevidade ritual de seus membros;
• Decorre destas visões a necessária complementariedade entre todos os indivíduos do grupo;
• Todas as diferenças são bem vindas, porque correspondem ao sentimento de complementariedade;
FUNDAMENTOS
ANTROPOLÓGICOS

UBUNTU: A CIRCULARIDADE COMUNITÁRIA

Ubuntu

Circulação dos saberes: interação indivíduo / comunidade


FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS
ANTROPOLÓGICOS

UBUNTU* DESMEMBRADO
(ntu, em bantu, significa indivíduo, pessoa;
bantu, plural de ntu, significa grupo, comunidade).

FORMA** TRADUÇÃO SIGNIFICADO


Muntu Mu = o topo O ser humano pensante, que participa mas é responsável pela natureza.
Kintu Ki = significado A natureza, por não pensante, dependente da humanidade.
Hantu Ha = lugar e tempo A força, constantemente alterada pela intercessão lugar e tempo.
Kuntu Ku = lançar sobre As qualidades que o ser humano atribui à natureza.

* Do ditado bantu umuntu, ngumuntu, ngabantu: um indivíduo só é um indivíduo quando em comunidade;


o que foi resumido para “sou porque somos”.

** Fonte: Dilma Melo Silva. Por que riem da África? São Paulo: Terceira Margem, 2009.
(coleção Percepções da diferença. Negros e brancos na escola, 6)
FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS
DO TEOLÓGICO AO ANTROPOLÓGICO

Fluxo do Asè

Ubuntu - comunidade
Indivíduo

Embora a palavra asè – força divina que sustenta o mundo profano – pertença ao yorubá, e ubuntu – a comunidade como
unidade social, com precedência sobre o indivíduo - tenha origem bantu, ambas, enquanto conceitos, são poderosos
operadores sociais em ambas as sociedades.
FUNDAMENTOS PEDAGÓGICOS
DINÂMICA DO PROCESSO

. O processo prioriza a prática sobre a teoria: fazer para saber;


. Portanto, a transferência dos saberes se apoia fortemente na prioridade da demanda sobre a oferta;
. A dúvida e o erro são instrumentos de aprendizagem;
. Assim sendo, o ensino é transferido, em grande parte, em resposta ao erro e curiosidade do
aprendiz;
. Em respeito à maturidade ritual deste, a resposta pode lhe ser negada;
. Como reação, aparece o instrumento curiosidade provocada, como reinício da dinâmica;
. A ludicidade, a corporeidade e o controle social são importantes fatores do processo.
FUNDAMENTOS PEDAGÓGICOS
FLUXO DO PROCESSO
Observação
Curiosidade
Dúvida

Oralidade

Tentativa
Erro

Correção
Repetição
FUNDAMENTOS PEDAGÓGICOS
CARACTERÍSTICAS DO ENSINO

Item Resposta

Quem ensina Todo o ambiente; todos os componentes, configurando o “professor difuso”;


Para entender a ação do sagrado sobre o profano, a hierarquia e a posição individual
Porque se ensina
como representante material dos antepassados e elo da linhagem;
O que se ensina Rituais, interditos, obrigações; comunitarismo, solidariedade, responsabilidade;
Principalmente pelo uso da curiosidade do aprendiz, movida a dúvida, tentativa e
Como se ensina
erro;
Como se avalia Intenso controle social, sob observação constante dos mais velhos e dos pares.
RESULTADOS

. Há a manutenção de valores culturais africanos na educação desta matriz;

. Esta manutenção é garantida pela tradição intergeracional e pelo controle social;

. Portanto, a educação não escolar está presente, é sólida e atuante;

. A oralidade ocupa papel central no processo;

. A responsabilidade pela transmissão de saberes cabe a todos os componentes da comunidade.


CRÍTICAS AO PROCESSO
ENTRAVES

. Temor da modernidade;

. Intolerância religiosa, que persiste, agressiva, há mais de meio milênio;

. Rejeição social assentada em antigas afirmações sobre os negros e seu culto demoníaco;

. A autoculpabilidade;

. O aprendizado de yorubá, idioma ritual não aceito socialmente;

. O desconhecimento do significado de alguns procedimentos, tais como a comensalidade;

. A convivência com a disseminada possibilidade de fraudes.


CRÍTICAS AO PROCESSO
FACILITAÇÕES

. A vida comunitária;

. O controle social;

. A disponibilidade concomitante e constante de todos os saberes do nível geral;

. A identidade dos objetivos religiosos e comunitários;

. O compromisso ritual;

. O respeito à hierarquia;

. O sentido de complementariedade entre todos os indivíduos;

. O respeito à individualidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASANTE, Molefi Kete. Afrocentricidade: notas sobre uma posição disciplinar. In: NASCIMENTO, Elisa Larkin (org.). Afrocentricidade: uma
abordagem epistemológica inovadora. São Paulo: Selo Negro, 2009. (Sankofa: matrizes africanas da cultura brasileira).
BÂ, Amadou H. Amkoulllel, o menino fula. São Paulo: Pals Athena-Casa das Áfricas, 2003.
______. A educação tradicional na África. In: Revista Thot. n. 64. São Paulo: Palas Athena, 1997, p. 23-26.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A pergunta a várias mãos: a experiência da pesquisa no trabalho do educador. São Paulo: Cortez, 2003. (Série
saber com o outro; v. 1).
CAPUTO, Stela Guedes. Educação nos terreiros: e como a escola se relaciona com crianças de candomblé. Rio de Janeiro: Pallas, 2012.
CORTELLA, Mario Sérgio. A escola e o conhecimento. São Paulo: Cortez, 2005.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido, 17ª. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
______. Extensão ou comunicação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.
LUZ, Marco Aurélio. Cultura negra e ideologia do recalque. 3. ed. Salvador: EDUFBA: Rio de Janeiro: Pallas, 2010.
MACHADO, Vanda. Fundamental é ser aprendente e malungo. s/d. (mimeo). Apostila do Grupo de Trabalho para inserção das diretrizes
nacionais para a educação das relações étnico-raciais e para o ensino de história e cultura afro-brasileira e africanas – GT-Ensino
Fundamental II. Brasília: MEC: SECAD, 2003.
MADURO, Otto. Mapas para a festa: reflexões latino-americanas sobre a crise e o conhecimento. Petrópolis-RJ: Vozes, 1994.
MUNANGA, Kabengele. O universo cultural africano. In: África-Brasil. Belo Horizonte: Fundação JP. v. 14, nº 7 a 10 – jul. a out/1984, p. 64-
74.
______. Negritude, usos e sentidos. 2. ed. São Paulo: Ática, 1988.
OLIVEIRA, Eduardo David de. Cosmovisão africana no Brasil: elementos para uma filosofia afrodescendente. Fortaleza: LCR, 2003, p. 11.
PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
SILVA, Dilma Melo. Por que riem da África? São Paulo: Terceira Margem, 2009. (coleção Percepções da Diferença. Negros e brancos na
escola, 6).
ROCHA, Rosa M. de Carvalho. Pedagogia da diferença: a tradição oral africana como subsídio para a prática pedagógica brasileira. Belo
Horizonte: Nandyala, 2009.
VERGER, Pierre. Orixás - Deuses Iorubás na África e no Novo Mundo. São Paulo: Corrupio, 2002.

Você também pode gostar