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O Desenho Livre:

Caminho para a Expressão da Criança


em Psicoterapia
O Que a criança faz quando desenha?
(ABERASTURY, 1992)

• Por volta dos três anos de idade, a vida mental da criança


está povoada de imagens, necessita conservá-las,
recuperá-las, revivê-las, repetir a angústia que lhe
provocaram e, deste modo, abundam os detalhes, os
objetos reais e fantásticos que seus desenhos recriam.

A IMAGEM É FUGIDIA E O DESENHO A RETÉM E IMOBILIZA


(SOUZA, 2011)

A produção de imagens é uma forma de comunicação de afetos que, a partir


daquele que a produz, estimula aquele que as observa a entrar em contato com
elas, como uma espécie de linguagem. Como apreciador de uma arte, podemos
simplesmente nos deixar levar por esta linguagem, mas como psicanalistas, temos
muitas vezes a função de acolher este código de linguagem e comunicação e tentar
encontrar um sentido. Assim como nos sonhos, temos imagens que se apresentam,
às vezes condensadas, distorcidas, aparentemente desconexas, mas que podem, a
partir de um determinado modelo de escuta, adquirir um sentido.

O sonho, o desenho ou o jogo apresentam-se ao psicanalista como uma espécie de


linguagem cifrada, a ser decifrada por uma certa postura de observação; o grande
enigma está em como desenvolver os processos de decifração.
(SOUZA, 2011)

A perspectiva que propomos como reflexão é considerar o


desenho, não como um "teste", mas como uma forma
possível de diálogo com as crianças, introduzindo a ideia de
que a produção gráfica da criança, a exemplo da produção
onírica, é antes de tudo resultado de um trabalho psíquico e
de que qualquer busca de sentido só será alcançada, se este
puder ser inserido em um diálogo e uma certa postura de
escuta.
OS TESTES PROJETIVOS DE DESENHO SÃO UM MEIO E NÃO UM FIM EM SI-
MESMOS

NECESSIDADE DE SE PRENDER AO DISCURSO DA CRIANÇA, ENQUANTO


DESENHA
(SOUZA, 2011)

Há sempre o perigo de trabalhar com códigos unívocos, onde


cada símbolo corresponde a um outro, a ele relacionado
diretamente, o que resulta em interpretações estereotipadas
e empobrecidas da mente humana, não alcançando uma
visão dinâmica do funcionamento da personalidade, além de
desconsiderar o aspecto transferencial de um diálogo do qual
ambos participam e no qual os personagens da dupla
interagem modificando os personagens do desenho.
BRINCAR E DESENHAR: DIFERENÇAS
FUNDAMENTAIS
BRINQUEDOS: A Projeção está
condicionada à natureza do
objeto.

PROJEÇÃO 2 VIAS
MATÉRIAS-PRIMAS: A projeção
ocorre a partir da maneira
como a criança manipula o
material, estando condicionada
ao ato e não ao objeto.

(DOLTO E ROUDINESCO, 1989) DESENHO


(SOUZA, 2011)

Os sentidos atribuídos às produções da criança provêm do fato de que


os afetos, em busca de representações ou ligações, se articulem a
elementos da trama do discurso do paciente, que podem ser
percebidos como indícios que mobilizam o psicanalista a construir um
objeto de conhecimento. É a partir de sua elaboração interpretativa
que este indício pode ser transformado em signo e como tal um
elemento de comunicação emitido para que a criança o receba.

AFETOS PROJEÇÃO DESENHO

DISCURSO

INTERPRETAÇÃO
A INTERPRETAÇÃO
COMO A CRIANÇA SE COMPORTA DIANTE DA
FOLHA DE PAPEL?

Comporta-se em relação a seu desenho na folha como se o espaço disponível fosse


muito menor do que aquele que a folha parece oferecer, ocupando mínimas
proporções da mesma, ou seu desenho parece transbordar o espaço efetivo da
folha? Ele se dá conta disso ou desconsidera?
Qual elemento do desenho é reduzido ou ampliado?
Como trabalha este espaço?
A folha parece dividida em duas partes distintas (cima/baixo ou direita/esquerda)?
O que há de invariante nestas características formais?
É possível detectar variações destas características ao longo da produção gráfica do
sujeito e como articulá-las ao tema do desenho ou ao traçado ou mesmo à relação
com o psicólogo.
Como estão as cores, gradações de intensidade cromática?
Com que partes do desenho ele parece insatisfeito, como lida com esta insatisfação
(apaga, retoca, reforça) e qual é o resultado final deste trabalho de acertar este
desenho?
3 NÍVEIS DE INTERPRETAÇÃO
(HAMMER, 1991)

ASPECTOS ASPECTOS
FORMAIS EXPRESSIVOS
(EXPRESSAM (EXPRESSAM A
MECANISMOS ORGANIZAÇÃO
DE DEFESA) DIANTE DOS
IMPULSOS)

DA E
DISCURSO A D
IC IDA
(EXPRESSA AS
N ÂM A L
SIGNIFICAÇÕES DI SON
R
INDIVIDUAIS) PE

INTERPRETAÇÃO
A EXPRESSÃO DA CRIANÇA
• Há outros meios de expressão humana além da fala. Esta,
frequentemente, já foi corrompida por tantas falsidades que as crianças
não podem mais servir-se dela para dizer a verdade.

• Há muita diferença (Angústia e Mecanismos de Defesa) entre pedir à


criança que faça um desenho, e ela fazê-lo por sua própria vontade. O
DESENHO LIVRE É LIVRE, ou seja, aparece espontâneamente.

• Ao invés de indicar diretamente o que a criança deve fazer, apenas diga-


lhe: “Você pode dizer com palavras, modelagens, brincadeiras ou
desenho”.

(DOLTO, 1985)
• Nem tudo deve ser interpretado, porque muitas
expressões da criança só adquirem significado com o
tempo.

• O analista deve prestar aos seus afetos, ao tomar


contato com qualquer produção da criança, e
comunicar-lhe isso: “Eu sinto isso de tal maneira, mas
não sei se é isso que você quer me comunicar”.

(DOLTO, 1985)
• Um desenho não terminado numa sessão pode ser retomado em outra,
conforme a necessidade e o contexto. Mais importante que o desenho em si
é aquilo que se diz dele.

• Devemos nos colocar no nível da criança e não levarmos as nossas fantasias.

• Interpretações devem ser feitas em forma de pergunta.

• Utilizar sempre a imaginação, p.ex.: Você pode me contar uma história desse
desenho? Se você estivesse em alguma parte desse desenho, onde gostaria
de estar? Ele se parece com alguma coisa que você conhece?

• TUDO É LINGUAGEM, MAS NEM TODA LINGUAGEM É PALAVRA.

(DOLTO, 1985)
ABERASTURY, A. (1992). A Criança e Seus Jogos. Porto Alegre: ARTMED.

Dolto, F. (1985). Seminário de Psicanálise de Crianças. (V. Ribeiro, trad.). Rio de


Janeiro: Zahar Editores.

Dolto F. E Roudinesco E. (1989). Elementos para uma História. In. CEIFALI, Meirele.
Seguindo os Passos de Dolto. Campinas-SP: Papirus. 1989.

Hammer, E.F. (1991). Aplicações clínicas dos desenhos projetivos. (E. Nick, trad.)
São Paulo: Casa do Psicólogo. (Original publicado em 1980).
Souza, Audrey Setton Lopes de. (2011). O desenho como instrumento
diagnóstico: reflexões a partir da psicanálise. Boletim de Psicologia, 61(135), 207-
215. Recuperado em 22 de outubro de 2014, de
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0006-
59432011000200007&lng=pt&tlng=pt. .

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