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Viver

Aquela estranha personagem, de olhar vazio, de olhar neutro, sem


expressão, apenas com o medo e a interrogação estampados no rosto,
olhava.
Olhava para o metro, olhava para a agitação.
Ouvia. Ouvia o barulho, ouvia o silêncio.
Aliás, tentava perceber o porquê de toda aquela agitação, o porquê
de todo aquele barulho. Tentava perceber a razão que justificaria o facto
de aquelas quatro pessoas, três homens e uma mulher, lhe estarem a fazer
aquelas estranhas perguntas.
“Como se chama”, “Sente-se bem”, “Quer ajuda”?
É claro que ela sabia com se chamava! Chamava-se… chamava-se…
Não se chamava. Já se tinha chamado. No tempo em que era como uma
daquelas tristes pessoas, embrulhada num mundo de agitação e stress, já
tivera nome. Largara-o! Já não sabia quem era, já não sabia quem fora!
-“Maria?”
Aquele nome actuara como um tiro. De repente recordações, de
repente memórias, tudo começara a aparecer como num filme. Cenas de
vida, cenas da sua vida.
“Maria”. Era esse o seu nome, “Maria”!
Caíra em si! Olhara para as pessoas que tinham pronunciado o seu nome,
pessoas essas que pareciam saídas de um filme cómico-dramático. Duas dessas
quatro pessoas eram de aspecto curiosamente idêntico. Dois homens. Dois
detectives do corpo especial de investigação, como indicava o distintivo
cuidadosa e estrategicamente colocado no bolso do casaco. Faziam-se
acompanhar por uma psicóloga dos serviços da polícia, a Doutora Teresa
Coutinho, rapariga de vinte e quatro anos que acabara o mestrado à ano e
meio, sendo ainda nova nas andanças da sua profissão, mas fazendo já o seu
nome andar acompanhado por “Doutora”. Com eles também se encontrava o
guarda da estação do metro.
A rapariga, Maria, sentia-se confusa. Sentia-se envergonhada e
sentia-se muda.
As quatro pessoas que lhe tinham reavivado a memória, apercebendo-
se do seu estado de choque, perguntaram-lhe se precisava de alguma coisa,
ao que Maria respondeu:
-Viver
Inês Vieira
Nº11 8ºB

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