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ERIC HOBSBAWM ERA DOS EXTREMOS O breve século XX 1914-199] ti MARCOS MARIA CELIA PAOLE ‘SBD-FFLCH-USP cue 504 CEA e ed | 2003 DEDALUS - Acervo - FFLCH-HI Copyright © 1998 by Enc Hobsbawm Estrada € publica por acordo com Pantheon ‘Books, una divi dt Random House, Ine “Tiel origina: Age ofeuremes The short reemith century: 1914-1991 Copa Hie de Aimed Preparasi: Shela Wess, Maria Lana Santos Bacellar Marcos Laie Fernandes Syvia Maria Pereira doe Santas fadice remiss Carin Inoue Aline Sanches Leme Revisi: Carmen da Costa Touché! Ediorial “Todo os diets desta edigdo reservados & Rua Bandeira Paulista, 702, 32 (04532.002 — Sto Paulo — sr “elefone: (11) 3167-0801, ax: (1) 3167-0814 ‘wwe companbiadastetas. com br INDICE Profiicio ¢ agradccimentos séeulo: vista agrea Parte um AERA DA CATASTROFE TAL A era da guerra total 2A revolugdo mundial 3, Rumo ao abismo econdmico 4A queda do lberalismo 5. Contra o nimigo comura 6. Asartes 1914-45 7.0 fim dos impérios Parte dois AERA DE OURO 910s anos dourados 10. Revolugo social IL. Revolugao cultural 12, 0 Terceiro Mundo 13, “Socialismo real” Parte ts (© DESMORONAMENTO. 14, As Décadas de Crise 29 6 90 113 144 178 +198 23 253 282 314 337 363 393, 15, 16. 17. 18. 19, ‘Terceito Mundo e revolugio Fim do socialismo Morre a vanguarda: as artes apos 1950 Feiticeiros e aprendizes: as eiéncias naturais Rumo ao milénio Bibliografia Outras leituras Tustragdes Indice remissive 421 447 433 504 537 563 579 583 585 PREFACIO E AGRADECIMENTOS Nao € possfvel escrever a hist6ria do sculo xx como a de qualquer outra poca, quando mais nao fosse porque ninguém pode escrever sobre seu pro prio tempo de vida como pode (e deve) fazer em relagdo a uma época conhe- Cida apenas de fora, em segunda ou terceira mio, por intermédio de fontes da poca ou obras de historiadores posteriores. Meu tempo de vida coincide com a maior parte da época de que trata este livro e durante a maior parte de meu tempo de vida — do inicio da adolescéneia até hoje — tenho tido consciéneia dos assuntos pablicos, ou seja, acumulei opinides e preconceitos sobre a épo- cca, mais como contemporineo que como estudioso. Este € um dos motivos pelos quais, enquanto historiador, evitei trabalhar sobre a era posterior a 1914 durante quase toda a minha carreira, embora no me abstivesse de escrever sobre ela em outras condigdes. “Minha época”, como se diz no jargio profis- sional, é o século xix. Acho que j & possivel ver o Breve Século xx — de 1914 até o fim da era soviética — dentro de uma certa perspectiva hist6rica, ‘mas chego a ele desconhecendo a literatura académica, para ndo dizer que desconhego quase todas as fontes primérias acumuladas pelo grande nimero de historiadores do século xx Claro, na pritica é completamente impossivel uma s6 pessoa conhecer a historiografia do presente século — mesmo em uma dnica lingua importante — como, por exemplo, o historiador da Antiguidade clissica ou do império bizantino conhece tudo 0 que foi escrito sobre esses longos periodos, na época depois, Mesmo pelos padres de erudigdo hist6rica, contudo, meu conheci- ‘mento no campo da hist6ria contempordnea é precario e irregular. O maximo que consegui foi mergulhar na literatura das questées mais espinhosas e con- trovertidas — a historia da Guerra Fria ou dos anos 30, por exemplo — o sufi ciente para convencer-me de que as opinides expressas neste livro sio defen- sveis 3 luz da pesquisa especializada. Claro, posso niio ter conseguido. Deve haver indmeras questies quanto as quais demonstro ignoraincia e defendo opi- nides polemicas nev, prio, assent soe alicercesetraarntsiegulares. Além da amplaevaniada letra de muitos anos, complements por toda 8 Tit necessiria para dar cursos desi do culo XX as pésgraduandos da New Schoo! or Socal Research, recor ao conkecimeno, As memorias€ 2s opinides acumulads por uma pessoa que vvewo Breve Seco Xx na pos to de “observador paricipante”, como dzem os anroplogos soca, ov Simplesmente como um vsfante de olosabenos, ou como oqus meus ences tas chamariam libizer—e oom inimeros ales. O valor hstric ds. ‘es experincns no decor de er presencia grandes oases histrieas ov de ter conhecido ou encontrado destacados estas ou protagonists da i tia, Na verdad, minha experinca como jomalsta ccasionl em pesquiss neste ou naquele pats, sobretdo da América Latina, tm sido a que em geral as entevstas com presidetes ou outros fomadors de deisio no Sto Compensars, pela rzio dvi de que maior parte do que ess pessoas dizem & para esr pblico, Ax pesoas que nos esclarecem defo So a8 «ue padem — ou querem — alr liemente, de preferécia quando nd tm responsabilidad por grandes quesite. Apesar uss, meu conhecimento de pessoas ligares, emborafrgosament parcial eenganad. me oi de enor ine vali, mesmo trtando-seto-somente de vstar mesma cidade mam imervalo de trina anos — Valncia ou Palermo —, fo que permite com Preender a rapier eo anbito da tansformagao socal no eer quel Jo presente séulo ou mesmo tstando-s isomente da embranga de alg dito muito tempo em alguma conversa eguandado, s vez sem motivo ea, Dara uso Tuto. Seo hisoiadr tem condigbes de entender alguma cols dest séeulo& em grande pate pore i evi, spo ter transmit aos letores algo do que aren pote et, Come nio poeta deixar de serene Hiv tab se basa nas inf snages bids unt a eolepus,etudanes, todos a quem abort darn sua elaboragio. Em alguns casos a diva € sistematica O captulo sobre as cies fi submetdo a meus amigos Alan Mackay f— que além deer lalégrto 6 enicopedsta — e John Maddon. Pare do que este sobre desenvolvimento econtmico passou pea leitura de meu colega na New School, Lane Tayo, qe foi dont [Massachsets Inte of Technology — Isto de Teenologia de Massachsets; una pate muito maior depen. du da feta de tabalhios do acompanhamento do dates e, de um modo eral, da atengo dedicaa ts confernciasonganizada sore vias quests Inaroccondmicas no Tstuto Mundial para Pesquisa de Desenvolvimento condo da Universidade da osu (cxt/vipe) em Helsingue, quando exe intiuo se ransformou nim grande ceo internacional de pss © deb ts sch do doe Lal fjord Os vero ee es dep sar ness adirivel isitigo, na qualidade Je pesqusador vstante om bolas da McDonne! Dovglas, foram inestinavls, inclusive por Sua proxi 8 rmidade da uRss e sua preocupagdo intelectual com os tltimos anos desse pats. [Nem sempre aceitei o conselho daqueles a quem consultei e, mesmo quando 6 fiz, a responsabilidade pelos erros exclusivamente minha. Beneficiei-me muito das conferéncias e col6quios durante os quais os académicos dedicam boa parte de seu fempo a encontrar seus pares, inclusive com 0 objetivo de esstimullar-se uns aos outros, Nao tenho como agradecer a todos os colegas que me ajudaram ou corrigiram em ocasides formais e informais, nem toda a in- formacio que adquiri por acaso, por ter a sorte de ensinar a um grupo muito internacional de estudantes na New School. Contudo, penso que devo especi- ficar meu reconhecimento para com Ferdan Ergut ¢ Alex Julea, pelo que yendi em seus trabalhos sobre a revolugdo (urea e a natureza da migragao & ‘mobilidade social no Terceiro Mundo. Devo, ainda, & tese de doutoramento de ‘minha aluna Margarita Giesecke, sobre a APRA e 0 levante de Trujillo em 1932, A medida que o historiador do século xx se aproxima do presente, fica ceada vez mais dependente de dois tipos de fonte: a imprensa disria ou perié- dica e 0s relat6rios econOmicos periédicos e outras pesquisas, compilagies estatisticas e outras publicagies de governos nacionais e institui cionais. Minha divida para com jornais como © Guardian de Londres, 0 Financial Times ¢ 0 New York Times & mais que evidente. Minha divida para com as inestimaveis publicagtes das Nagdes Unidas e seus varios organismos e para com o Banco Mundial estd registrada na bibliografia, Ha que lembrar, ainda, a antecessora destes, a Liga das Nagdes, que embora na pritica fosse lum fracasso guase total, realizou admiraveis pesquisas e andlises, que culm naram no pioneiro Industrialisation and World Trade (Industrializagio comércio mundial}, de 1945, merecedoras de nossa gratidio, Nenhuma hist6~ ria das mudangas sociais © econémicas ocorridas neste século poderia ser eserita sem essas fontes. 5s leitores tero de aceitar a maior parte do que escrevi neste livro na base da confianga, com excegdo das Sbvias opinides pessoais do autor. Nao hi sentido em sobrecarregar um livro como este com um enorme aparato de refe- réncias ou outras marcas de erudigdo. Tentei restringir minhas referéncias & fonte das citagoes textuais, das estatisticas e outros dados quantitativos — fontes diferentes as vezes apresentam niimeros diferentes — e 3 ocasional jus- lificagio de afirmagSes que 0s leitores possam achar pouco comuns, desco- nhecidas ou inesperadas e de alguns aspectos em que as opinides controverti- das do autor possam exigit uma certa corroboragao. Essas referéncias esto centre parénteses no texto. O titulo completo da fonte encontra-se no final do volume, Essa bibliografia no passa de uma relagiio completa de todas as for les efetivamente citadas ou mencionadas no texto. Ela ndo € um guia sistem tico para outras leituras. Depois da bibliografia hé um breve indicador de outras leituras. O conjunto das referencias também foi concebido de modo a fiear bem separado das notas de rodapé, que apenas ampliam ou restringem 0 texto, 9 Contudo, por uma questio de justiga, quero indicar algumas obras em {que me apoiei bastante ou com que estou particularmente em débito, Eu no spostaria que seus autores deixassem de sentit-se devidamente apreciados. De ‘um modo geral, devo muito & obra de dois amigos: 0 historiador econdmico e infatigével compilador de dados quantitativos Paul Bairoch e Ivan Berend, ex- presidente da Academia Htingara de Ciéncias, a quem devo 0 conceito do Breve Século xx. Sobre a historia politica geral do mundo desde a Segunda Guerra Mundial, P. Calvocoressi (World politics since 1945 [Politica mundial de 1945 em diante}) foi um guia seguro e as vezes — compreensivelmente - ccustico. Sobre a Segunda Guerra Mundial, muito devo ao soberbo War, eco: nomy and society 1929-45 (Guerra, economia e sociedade 1929-45], de Alan Milward, e, sobre a economia p6s-1945, achei utiissimos Prosperity and upheaval: The world economy 1945-1980 (Prosperidade e revolta: a economia mundial de 1945-1980}, de Herman Van der Wee, ¢ Capitalism since 1945 [Capitalismo a partir de 1945), de Philip Armstrong, Andrew Glyn e John Harrison. The Cold War [A Guerra Fria}, le Martin Walker, merece uma aten- ‘620 muito maior do que a moma recepgo que The reservaram os criticos. Sobre a hist6ria da esquerda desde a Segunda Guerra Mundial, muito devo 20 ddr. Donald Sassoon, do Queen Mary and Westfield College, Universidade de Londres, que teve a bondade de me deixar ler seu vasto e esclarecedor estudo do assunto, ainda incompleto. No que diz respeito a histéria da URSS, minha divida principal € para com os textos de Moshe Lewin, Alec Nove, R. W. Davies ¢ Sheila Fitzpatrick; no que diz. respeito & China, para com os de Benjamin Schwartz e Stuart Schram; € no que diz respeito ao mundo iskimi co, para com Ira Lapidus e Nikki Keddie. Minhas opiniGes sobre as artes muito devem as obras (e A conversa) de John Willett sobre a cultura de Weimar, bem como a Francis Haskell. No capitulo 6, penso ser ébvia minha divida para com 0 Diaghilev de Lynn Garafola. Meus agradecimentos especiais aos que me ajudaram coneretamente a preparar este livro. Sao eles, em primeiro lugar, minhas auxiliares de pesqui- sa Joanna Bedford em Londres ¢ Lise Grande em Nova York, Gostaria de acentuar sobretudo minha divida para com esta dima, sem quem eu nao poderia ter preenchido as enormes lacunas em meu conhecimento nem conte rido fatos e referéncias lembrados apenas pela metade. Também sou muito ‘gato a Ruth Syers, que datilografou meus rascunhos, ¢ a Marlene Hobsbawm, que leu varios capitulos do ponto de vista do leitor no académico com inte- resse genérico pelo mundo modemo, a quem este livro se dirige, 14 mencionei minha divida para com os estudantes da New School, que assistiram as aulas nas quais tentei formular minhas idéias e interpretagbes. A. eles dedico este livro. Eric Hobsbawm Londres — Nova York, 1993-4 10 O SECULO: VISTA AEREA Olhar panorémico DOZE PESSOAS VEEM 0 SECULO XX Isaiah Berlin (filésofo, Gra-Bretanha): “Vivi a maior parte do século xx, devo acrescentar que no softi provagdes pessoais. Lembro-o apenas como 0 séeulo mais terrivel da historia” Julio Caro Baroja (antropélogo, Espanha): “Ha uma contradigao patente centre a experiéneia de nossa prépria vida — infancia, juventude e velhice pas sadas trangdilamente e sem maiores aventuras — e 0s fatos do século XX... 08 lerriveis acontecimentos por que passou a humanidade” Primo Levi (esctitor, lilia): “Nos, que sobrevivemos 30s Campos, ni somos verdadeiras testemunhas. Esta é uma idéia ineGmoda que passe’ aos pou: 08 a aceitar, a0 ler 0 que outros sobreviventes escreveram — inclusive ev, ‘mesmo, quando releio meus textos apds alguns anos, Nos, sobreviventes, somos, ‘uma minoria ndo s6 mindscula, como também andmala. Somos aqueles que, por prevaricagio, habilidade ou sorte, jamais tocaram © fundo. Os que tocaram, ¢ {que viram 2 face das Gérgonas, nio voltaram, ou voltaram sem palavras” René Dumont (agrdnomo, ecologista, Franga): “Vejo-0 apenas como um século de massacres e guerras” Rita Levi Monsalcini (Prémio Nobel, ciéncia, Itélia): “Apesar de tudo, neste século houve revolugées para melhor [...] 0 surgimento do Quarto Estado a emergéncia da mulher, apés séculos de repressii William Golding (Prémio Nobel, escritor, Gra-Bretanha): “No posso deixar de pensar que este foi o século mais violento da histéria humana’ Emst Gombrich (historiador da arte, Gri-Bretanha): “A prineipal carac- uw teristica do século xx é terrvel multiplicagdo da populago do mundo. & uma catistrofe, uma tragédia, Nio sabemos o que fazer a respeito” Yehudi Menuhin (mésico, Gri-Bretanha): “Se eu tivesse de resumir 0 ‘culo XX, diria que despertou as maiores esperangas ji concebidas pela hurma- nidade e destruiu todas as ilusdes e ideais Severo Ochoa (Prémio Nobel, ciéncia, Espanha): “O mais fundamental & ‘© progresso da cigncia, que tem sido realmente extraordinéro [...] Eis 0 que caracteriza nosso Raymond Firth (antrop6logo, Gra-Bretanha): “Tecnologicamente, coloco © desenvolvimento da eletrOnica entre os fatos mais significativos do século XX; em termos de idéias, destaco a passagem de uma visio relativamente racional e cientifica das coisas para outra nfo racional e menos cientifica”. Leo Valiani (historiador, Wiélia): “Nosso século demonstra que a vitéria dos ideais de justiga e igualdade & sempre ef8mera, mas também que, se con- seguiimos manter a liberdade, sempre possivel recomegar [..] Nao hi por que desesperar, mesmo nas situagses mais desesperadas’ Franco Venturini (bistoriador, Willa): “Os historiadores no tm como responder a essa pergunta, Para mim, o século xx € apenas o esforgo sempre renovado de entendé-lo”, (Agosti & Borgese, 1992, pp. 42, 210, 154, 76,4, 8, 204, 2, 62, 80, 140.€ 160) Em 28 de junho de 1992 o presidente Mitterrand, da Franga, apareceu de forma sibita, no anunciada e inesperada em Sarajevo. que jé era 0 centro de ‘uma guerra balednica que iria custar cerca de 150 mil vidas no decorrer daqu te ano. Seu objetivo era lembrar & opiniao pablica mundial a gravidade da crise ésnia. E, de fato, foi muito observada e admirada a presenga do conheeido estadista — idoso e visivelmente frigil sob 0 fogo das armas portiteis e da antiharia. Um aspecto da visita de Mitterrand, contudo, embora claramente fundamental, passou despercebido: a data. Por que o presidente da Franca escolhera aquele dia especitico para ir a Sarajevo? Porque 28 de junho era 0 aniversério do assassinato, em Sarajevo, em 1914, do arquiduque Francisco Eetdinando da Austria-Hungria, ato que em poucas semanas levou a eclosio da Primeira Guerra Mundial. Para qualquer europeu culto da geragio de R Mitterrand, saltava aos olhos a ligagio entre data ¢ lugar € a evocagdo de uma ceatéstrofe hist6rica precipitada por um erro politico e de eéiculo. Que methor ‘maneira de dramatizar as implicagdes potenciais da crise bésnia que escolhen do uma data assim tao simbéliea? Mas quase ninguém captou a alusio, exce- to uns poucos historiadores profissionais e cidadiios muito idosos. A meméria hist6rica jé no estava viva A destruigo do passado — ou methor, dos mecanismos sociais que vin- cculam nossa experiéncia pessoal & das geragdes passadas — ¢ um dos fenome- nos mais caracteristicas e Migubres do final do século xx. Quase todos os {ovens de hoje crescem numa espécie de presente continuo, sem qualquer rela- ‘so orgdinica com 0 passado pablico da época em que vivem. Por isso 0s his: toriadores, cujo oficio é lembrar 0 que outros esquecem, tornam-se mais importantes que nunca no fim do segundo milénio, Por esse mesmo motivo, porém, eles tém de ser mais que simples cronistas, memorialistas e compila dores. Fm 1989 todos os governos do mundo, ¢ particularmente todos os mi- nistérios do Exterior do mundo, ter-se-iam beneficiado de um semingrio sobre ‘os acordas de paz firmados apés as duas guerras mundiais, que a maioria deles ‘aparentemente havia esquecido, Contudo, niio € propésito deste livro contar a histéria da época de que trata, o Breve Século Xx entre 1914 e 1991, embora todo aquele que ja tenha ‘ouvido um estudante americano inteligente perguntar-Ihe se o fato de falar em ‘Segunda Guerra Mundial” significa que houve uma “Primeira Guerra Mun- dial” saiba muito bem que nem sequer o conhecimento de fatos basicos do séeulo pode ser dado por certo. Meu objetivo é compreendere explicar por que as coisas deram no que deram ¢ como elas se relucionam entre si. Para qual- quer pessoa de minha idade que tenha vivido todo 0 Breve Século xx ou a maior parte dele, isso é também, inevitavelmente, uma empresa autobiogriti- cca, Trata-se de comentar, ampliar (e corrigit) nossas proprias: memérias. E falamos como homens e mulheres de determinado tempo ¢ lugar, envolvidos 4e diversas maneiras em sua hist6ria como atores de seus dramas — por m: insignificantes que sejam nossos papSis —, como observadores de nossa época €, igualmente, como pessoas cujas opinides sobre 0 século foram formadas pelo que viemos a considerar acontecimentos cruciais, Somos parte deste séeulo, Ele € parte de nds. Que niio o esquegam os leitores que pertencem ultra era, por exemplo os estudantes que estio ingressando na universidade no ‘momento em que escrevo e para quem até a Guerra do Vietnd é pré-histéri. Para os historiadores de minha gerago ¢ origem o passado € indestrutt vel, no apenas porque pertencemos & geragdo em que ruas € logradouros: pablicos ainda tinham nomes de homens ¢ acontecimentos puiblicos (a estaca0 Wilson na Praga de antes da guerra, a estagao de metr6 Stalingrado em Patis), tem que os tratados de paz ainda eram assinados e portanto tinham de ser iden- tificados (Tratado de Versalhes) e os memoriais de guerra lembravam aconte- 13

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