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aNle A DELINQUENCIA E A JUSTICA DE MENORES NA FRANCA Marc GAUBERT Procurador da Republica do Tribunal de Grande Insténcia do Havre, Professor-Associado da Faculdade de Direito e dos Negécios Internacionais do Havre-Franca. Se a delinqiiéncia das criangas e adolescentes é, sem divida, téo antiga quanto o fenédmeno criminal, seu contetdo e as respostas que nos vieram, variaram consideravelmente no curso da Historia. Ja no Direito Penal Romano, 0 nivel de responsabilidade e de sangao segundo a idade e o discernimento do menor variavam. Mas somente no século XX, quando confrontados com uma explosio de DELINQUENCIA juvenil, foi que os paises se preocuparam em refinar a andlise de seu contetido e assim trazer respostas especificas e adaptadas. No que diz respeito 4 Franga, ¢ em 1898 que alei permitird ao juiz de instrugdo e a jurisdigdo de julgamento pronunciarem, em relagdo ao menor delingiiente, uma medida educativa preferencialmente 4 uma sangdo penal ( entrega solene do menor a seus pais ou a uma pessoa digna de confianga, a uma instituigao especializada ou 4 Assisténcia Publica). Em 1906 o legislador confirmara a necessidade de uma protecio reforgada ao menor e aumentara para dezoito anos a maioridade penal que até entdo era de dezesseis anos. Em 1912 aparecera uma jurisdi¢do especializada com a instauracdo de um Tribunal para Criangas e Adolescentes; a inimputabilidade penal do me- nor de treze anos passivel somente de medidas educativas sera proclamada, assim como a medida de liberdade vigiada. Somente coma Lei de 2 de feve- reiro de 1945, um Direito Penal Moderno dos Menores elevado a condigao de uma verdadeira politica publica aparecera, devidamente conceituado, global- mente traduzido e empregado num texto completo e coerente. Este texto, do qual se comemora 0 cingiientendrio, sofreu numero- sas modificagdes que permitiram adapta-lo 4 evolugao do fenémeno e tam- bém a evolugdo das ciéncias sociais e humanas e especialmente aos pro- gressos da sociologia, da psicologia, da psiquiatria e das técnicas 8 educativas. Ele é, desde entdo, apesar das tentativas frustradas de refor- mas profundas tendendo a despenaliza-lo e a tira-lo parcialmente da com- peténcia judiciaria, a matriz do Direito Penal da Infancia e do Adolescen- te. Este texto, com uma visdo deliberadamente moderna , é a origem das causas e dos tratamentos da delinqléncia juvenil, articulados em torno da _ trilogia: “DIREITO - JUSTICA - EDUCACAO*. Apos termos examinado o fenémeno da delinqiiéncia juvenil e iden- tificado suas causas, descreveremos 0 dispositivo e suas evolugées. I- O FENOMENO DA DELINQUENCIA JUVENIL A) O contetido Seu contetdo, assim como suas causas, sustentam-se na diversida- de e na complexidade. Se o fendmeno é quase que em toda parte marcado por uma explo- so quantitativa e por um aumento importante da gravidade dos atos co- metidos, ele nao é tao diversificado e tao diferente nos variados paises. Sem divida a Franga, como uma boa parte da Europa Comunitaria, nao conhece um sistema mafioso de DELINQUENCIA juvenil nos mol- des das organizagées criminosas que utilizam criangas e adolescentes, visto que eles se beneficiam de uma menor vigilancia por parte dos servi- gos de policia e, também, porque se beneficiam de um regime absoluto ou relativo de inimputabilidade penal (Italia, USA, paises da Asia...) Isto nado impede que a andlise criminolégica dos jovens delinqiien- tes revele uma pluralidade de tipos que vio, do ato ocasional que se ca- racteriza freqiientemente como uma brincadeira, ou de um rito de passa- gem ou de ades&o ao delinqiiente habitual, passando pelo delinqiente ir- regular, que pode somente significar, algumas vezes, um fendmeno de reiterados pedidos de socorro ou de tentativas como aquelas feitas por uma lagarta para se tornar uma borboleta. Estes tipos tao diversos atingem a complexidade quando se trata de considerar, a0 mesmo tempo, os fendmenos da DELINQUENCIA parti- cularmente precoces, que tendem a se multiplicar, e aqueles que aparecem somente perto da maioridade. Questiona-se se eles dependem sempre de um tratamento especifico. 9 No plano essencialmente quantitativo, uma apreciagdo mais preci- sa se mostra dificil, em razdo da enorme diferenga dos meios estatisticos devido a diversidade das politicas criminais dos paises neste campo, a influéncia dos fendmenos demograficos e a enorme diversidade dos atos e da idade dos seus autores. Isto néo impede que uma apreciagao macroscépica conduza a evi- déncia de um aumento deste tipo de DELINQUENCIA, particularmente na segunda metade do século XX e sobretudo, nos vinte ultimos anos. Além disso, 0 aumento quantitativo dos atos delingiientes cometidos por menores se acompanha de um aumento da intensificagdo dos mesmos; 0 roubo, a extorsdo, o estupro e mesmo o homicidio, que eram infragdes muito raramente cometidas por menores nos anos 1980, sdo atualmente mais frequentes. Constata-se atualmente uma singular aceleragao do pro- cesso. Os fenémenos de toxicomania, aos quais estado as vezes ligados aqueles da prostituic&o e da aids, e acrescidos de um longo periodo de desemprego, conduzem a exclus&o social, provocando assim uma verda- deira economia paralela com o comércio de drogas, que acaba por se con- centrar em certos iméveis ou bairros das cidades. Sabe-se bem que esses toxicémanos sao fontes de marginalidades, de desvios, e de modificagdes de comportamentos que alimentam o fend- meno criminal, como também o fazem as exigéncias do seu financiamen- to, de tal sorte que se pode falar de um verdadeiro fenémeno criminal em reflexo, onde as causas e 0 fenémeno realimentam reciprocamente um ao outro, até a hipertrofia. B) As causas Se, apés termos avaliado a amplitude e a diversidade do fenémeno, quisermos nos debrucar sobre as causas, pode-se dizer logo que existem algumas que sao coletivas e institucionais e outras individuais. Esta claro que tanto na sua amplitude quanto no seu sustenta- culo, a DELINQUENCIA juvenil, ainda mais que a DELINQUEN- CIA dos adultos, se desenvolve mais freqiientemente, 4 medida que cresce a riqueza de um pais. A Franga nao escapa a essa regra. Ela se alimenta muitas vezes de fenédmenos da moda. Assim os furtos so muito numerosos quando se trata de automéveis, de motocicletas, de aparelhos de som e video e de algumas marcas de roupas ou acessori- os (motos japonesas, tenis NIKE ou REEBOK, de jeans LEVIS, de blusdes CHEVIGNON, etc...). 10 Além disso o éxodo rural, a concentrac4o urbana, a imigracdo em mas- sa, Sdo também fatores de perda de valores, de anonimato e de solidariedade nos guetos que desembocam em “ninhos de DELINQUENCIA “. Alguns nao hesitam em afirmar que, em raz&o de um territério insuficiente ao desenvolvi- mento pessoal, nesses “ninhos” a agressividade se intensifica e se exprime pela violéncia de comportamentos. Esses fenémenos se agravam devido a con- centracao num mesmo lugar, os subirbios das grandes cidades, as desvanta- gens culturais, pessoais e sociais, aos fracassos dos sistemas escolares e de integragao. Todas essas causas se alimentam freqiientemente umas das ou- tras, numa espécie de infernal rodizio que se assemelha a um verdadeiro fe- ndémeno de concentracao bioldgica. O resultado é cada vez mais uma DELINQUENCIA coletiva de protes- to que pretende interpelar a sociedade e se exprime por violéncias coletivas e urbanas puramente destrutivas, sem visar lucros. Trata-se de incéndios de car- ros, da destruigao de Hipermercados e de violéncias contra os bens e a policia. Sempre no plano da analise global, nao se pode deixar de notar um singular paradoxo que faz com que a DELINQUENCIA juvenil encontre al- gumas vezes sua causa na super socializa¢ao, ao menos parcial, ou numa to- mada de consciéncia levada ao extremo, dos valores sociais dominantes, como 0 sucesso e seus indicios maiores que sao 0 dinheiro e os sinais exteriores do sucesso que permitem demonstrar seu poder. Efetivamente a DELINQUEN- CIA proporciona os meios de iludir nesse campo e de se aproximar do mode- lo. A isso pode-se acrescentar, particularmente na Franca, um desencanto social que sensibiliza e altera todas as intervengdes e referéncias tradicionais que sao, a familia, a escolae os sistemas de crenga que estruturariam solida- mente as pessoas ¢ as ajudariam a estabelecer um cédigo de valores calcado num modelo dominante, especialmente duradouro, e entdo, integrado cultu- ralmente. Enfim, a propagac4o intensa pela midia, de imagens em ruptura com um esquema moral tradicional, que influencia também o mundo adulto, e a banalizagao da violéncia e de suas express6es mais extremas e triviais, nao so precisamente de natureza a facilitar a compreensdo do fenémeno e a controla-lo. Mas, além dessas causas coletivas, ha outras que se acrescentam e que sao individuais, talvez porque freqiientemente 0 ato criminoso consti- tua a resposta de uma personalidade a uma situa¢ao. ut Além dessas hipéteses deixadas de lado ou reservadas, que tradu- zem 0 ardor do debate sobre 0 cromossoma suplementar ou sobre a here- ditariedade, sabe-se que a limitag4o do discernimento, as perturbagdes de personalidade, mas também os exemplos perniciosos de condutas de des- vio ou de grosserias reiteradas e de violéncia familiar sAo poderosos fato- res de criminalidade ja que colocam o menor no centro de um conflito entre os valores que seu meio desenvolve e aqueles que a sociedade e sobretudo o Direito Penal, que é nesse sentido particularmente normativo, fixam. Preocupando-se em se adaptar a sua familia, a crianga estara inadaptada a sociedade, a no ser que ela tenha forcas suficientes para vencer 0 conflito ou para vivé-lo sem resolvé-lo de imediato. Enfim, elementos préprios a uma ou a outra crianga ou adolescente podem ser determinantes da passagem ao ato . Ou se tratara de uma difi- culdade ligada 4 maturidade psicolégica (puberdade, acne grave, incon- tinéncia urindria persistente...) ; ou a um desvio psicolégico, como um egocentrismo excessivo ou uma acumulagdo de tragos de personalidade negativos, que conduzem sistematicamente a atitudes de oposic4o ou de recusa, ou ainda a uma fragilidade psiquica particular que provocaré uma percepc4o desmedida de certas situagdes e uma resposta excessiva, po- dendo tomar caminhos da transgresso social e da DELINQUENCIA. Eis entéo, sumariamente apresentadas, as formas e as causas da DELINQUENCIA juvenil como também suas evolugdes modernas, parti- cularmente na Franga. Seria importante examinar agora as solugdes que foram elaboradas para traté-la e reduzi-la, para depois concluir,fazendo uma apreciac¢ao critica do sistema em forma de previsao. I I - AS SOLUCOES PARA O PROBLEMA DA DELINQUENCIA JUVENIL Elas se articulam naturalmente em torno de medidas de preven¢g4o geral, que emanam da politica dos paises, sobretudo em matéria criminal. Trata-se ent&o de lutar contra a desagrega¢ao familiar e o fracasso esco- lar, mas também de colocar em agao verdadeiras politicas publicas de pre- ven¢ao. Na Franga, isso foi feito especialmente, no plano do que chama- mos hoje de “A Politica da Cidade”. e que conheceu nesses ultimos anos uma transferéncia parcial de competéncias do Estado para as Coletivida- des Locais. Ent&o, nao se trata mais e somente de organizar lazeres para os jovens mais problematicos por meio de equipes de prevengao, mas de ter 12 uma visdo global da DELINQUENCIA e de suas zonas de elaboracdo e de expressdo a fim de permitir um tratamento preparado, conceitualizado e assim globalizado. Desta maneira levou-se em con- ta os problemas de moradia e de qualidade dos estabelecimentos es- colares, organizaram-se operagées de prevengées especificas, duran- te o periodo de férias escolares, criaram-se Conselhos Comunais de Prevengao da Delingiiéncia, reunindo sob a autoridade dos Presiden- tes das Cémaras Municipais todos os profissionais e voluntarios inte- ressados, foram desenvolvidas medidas de controle judiciario e de mediag&o social, foi suscitado 0 surgimento de Associagdes Novas movidas por conceitos novos como a identificagdo e a valoriza¢o dos lideres positivos, agindo na base de conceitos como “a exploragao do inverso”, “a profissionalizagao dos comportamentos individuais “ , “a procura de um interesse comum”. Nesse sentido, a Associagado TRACO DE UNIAO do HAVRE aparece como pioneira e modelo de sucesso. A especializacdo das missdes de policia através da criagao de uma brigada de protegdio aos menores, composta de policiais tendo recebido uma forma¢ao adaptada, completou o dispositivo que se aperfeicoa todos os dias, principalmente considerando, cada vez mais, a pratica de medidas especificas para com os descendentes de imigrantes, para Ihes assegurar uma igualdade de chances e de tratamentos, como também um acesso fa- cilitado a escola e A formagao profissional. Além de todas essas medidas absolutamente indispensdveis, as so- lugdes que a Franca forneceu a Delingiiéncia Juvenil vieram da Lei de 2 de fevereiro de 1945 que constitui a Carta Penal Moderna da infancia de- lingiiente. O impacto desse texto e de seus efeitos seria tal que ele inspira- ria diretamente a Lei de 1958 que consagraria o que se chamaria hoje de um verdadeiro “direito de intervengao educativa” da Autoridade Judicia- ria, cada vez que se constatar a exposi¢ao de qualquer crianga a perigo material, moral, psicolégico ou afetivo . Partindo do principio de que nenhum pais é, assim como a Fran- ¢a, suficientemente rico em criangas para ter o direito de negligencia- las, qualquer coisa que se possa fazer nesse sentido, para se ter seres sdos e equilibrados, o legislador toma a decisao inflexivel e delibera- da de educar as criangas da justiga e preconiza “a obstinaga4o educativa” que consiste em reeducar, custe 0 que custar, 0 menor que se comportou mal ou nao, antes de recorrer em desespero de causa, a san¢do tradicional que é a pena. 13 Com essa finalidade, ele organiza o Direito Penal, mas sua pratica se apoiaré em métodos sistematicos da especializagao juridica e institucional e da especificagao educativa. A) O Direito Penal dos Menores Primeiramente anuncia o postulado da presungao irrecusavel de inimputabilidade penal do menor de treze anos contra quem s6 se pode decre- tar medidas de protego, de assisténcia ou de educac&o quando comparece diante da jurisdi¢ao de julgamento e com a condigao que seja estabelecido e constatado que ele compreendeu e desejou seu ato. Em seguida estabelece uma presuncdo simples de inimputabilidade para os menores de treze a dezesseis anos. O artigo 2 da Lei afirma também que eles devem ser passiveis de medidas de assisténcia, de vigilancia, de proteg3o e de educagao, mas, se excepcionalmente, as circunstancias e sua personalida- de o exigem, eles poderao sofrer sangdes penais eventualmente cumuladas com uma medida de liberdade vigiada. Uma tal decisao supde que seja reco- nhecida criminologicamente a capacidade penal do menor, isto quer dizer sua capacidade de tirar proveito da sangao. Enfim, ele organiza a atenuacao da imputabilidade penal do menor de treze a dezoito anos instituindo uma atenuante de menoridade obrigatoria para o menor de treze a dezesseis anos e que pode ser elevada por motivagao espe- cial do Tribunal para o menor de dezesseis a dezoito anos. Esta atenuante tem. como conseqiiéncia reduzir pela metade 0 maximo da pena pela qual a lei sanciona a infraco. Atualmente se chocam duas concepgées que visam de um lado a supri- mir a inimputabilidade penal dos menores, julgada como infantilizante e inadaptada ao aparecimento de novos delinqiientes definidos como “predado- res violentos”, freqtientemente organizados em bando e autores de violéncias urbanas, e por outro lado, ao contrario, a despenalizar parcialmente 0 direito penal dos menores para afirmar mais e melhor o preceito da educabilidade. Os primeiros preconizam o estado de direito e a evocagdo a suas exi- géncias como base incontornavel da socializacdo e ressocializagao e acham que em qualquer caso a norma penal e a hipoteca da sangao fixam os riscos e sao referéncias estruturantes para o menor. Os outros, sem totalmente renegar esta concep¢do, preferem trans- gredir o campo do juridico para situar decididamente 0 risco no plano 14 educativo. Eles estimulam a multiplicagao de medidas de mediagao e re- paracdo que recriam o vinculo social e restituem a vitéria. Eles se inclinam igualmente a ordens de convocagao 4 lei ou a im- posic¢ado de penas de trabalho de interesse geral, que consistem numa prestagao de um maximo de 240 horas efetuadas ao servigo de uma cole- tividade, ou de uma associag4o habilitada. Neste caso também a natureza da atividade € propria a recriar 0 vinculo social. O Novo Cédigo Penal em vigor desde 01 de margo de 1994, consa- gra esses principios no seu artigo 122-8. Ele nao retoma as disposicdes relativas a atenuante de minoridade evocada acima e afirma neste sentido pura e simplesmente que nao se pode pronunciar contra o menor de treze a dezoito anos uma pena de multa superior a cingiienta mil francos, nem uma pena privativa de liberdade superior 4 metade da pena incorrida. Ele proibe até de pronunciar contra os menores certas penas como, por exem- plo, os dias-multa. Mas além do Direito Penal, é sobretudo sua pratica que se torna muito especial quando se trata de aplicd-lo aos menores delinqiientes. B) A pratica do Direito Penal dos Menores Ela se faz essencialmente dentro de uma especializag4o de regras e de instituigdes. 1) As regras do procedimento: Elas nao podem ser todas citadas sem risco de omissao, mas as mais significativas sao incontestavelmente as que dizem respeito a: - detencao para averiguacao, que nao pode ultrapassar a 24 horas para o menor de 13 a 16 anos, e que ndo pode ser renovada para 0 menor de 16 a 18 anos a nao ser que ele comparega diante do Procurador da Republica. Para o primeiro, os pais ou o civilmente responsavel serao imediatamente advertidos pelos servigos de policia sobre a medida toma- da. Ele se beneficiaré da visita de um advogado e sera submetido a um exame médico obrigatério: - detengao proviséria. Qualquer pedido nesse sentido do Procurador da Republica devera ser precedido de uma investigacdo rapida sobre a perso- nalidade e 0 meio do menor. Uma medida alternativa devera ser proposta a 15 detengao proviséria. O Juiz ficara livre na sua decisAo mas nao podera en- carcerar se a investigagao nao estiver nos autos. Em qualquer hipotese, a deten- ¢4o provisoria é impossivel para os menores de 13 a 16 anos, salvo se eles tive- rem cometido uma infrag4o qualificada como crime e entao limitada a um ano. Para os menores de 16 a 18 anos, ela é renovavel de um més, desde que 0 delito seja grave e de quatro meses renovaveis duas vezes se 0 delito for muito grave (pena incorrida igual ou superior a sete anos). Em caso de crime ela é de um ano renovavel, uma vez. Para cada decisdo de detencdo provisoria ou de renovacio é organizado um debate contraditério entre o Ministério Pi- blico e o Advogado de Defesa e so apés o Juiz tomara a sua decisao. O PROCEDIMENTO DE INSTRUCAO Os crimes sdo obrigatoriamente instruidos por um Juiz de Instrugao especializado e os delitos por um Juiz de Criangas. Tanto um quanto outro tem a obrigagado de mandar fazer uma investigag4o de personalidade e social, um exame médico-psicoldgico e neuro-psiquiatrico. O PROCEDIMENTO DE JULGAMENTO O julgamento ocorre diante do Tribunal de Criangas ou do Juiz de Cri- angas e tudo se passa sem publicidade. O menor é obrigatoriamente assistido por um advogado, se possivel especializado neste tipo de defesa, que se esfor- gara para evitar uma sangdo e propora uma solugdo educativa e em seguida tentara adaptar o menor a sentenga pronunciada. A EXECUCAO DA PENA E 0 Juiz das Criangas com a assisténcia do servigo educativo ligado a ele que aplicara a pena e no o Juiz de Aplicagao de Penas. Se o menor tiver que ser encarcerado, ele o sera num estabelecimento especialmente previsto para esse fim, dotado de um tratamento educativo e médico adequado. Enfim as penas de prisdo que nao ultrapassem dois meses néo aparece- rdo no seu registro criminal apés sua maioridade. 2) As Instituigdes que as praticam: A originalidade da Lei de 1945 € possuir para cada hipdtese uma juris- digao especializada para os menores delinqlientes. 16 Para apreciar a DELINQUENCIA do menor e dos menores existe ao lado do Procurador da Republica, um Magistrado especializado “O Substitu- to dos Menores”, que é especialmente designado para esse fim pelo Procura- dor Geral do Tribunal de Recursos. Esse Magistrado dirige a brigada dos menores da Policia Nacional e da Policia Administrativa para a manutengao da ordem, orienta os procedimentos e faz 0 confronto entre as autoridades administrativas de prevengdo e o Juiz das Criangas. Os grandes tribunais pos- suem um verdadeiro “Ministério Publico dos Menores”. Se o menor cometeu um crime, a via de instrugo é obrigatoria. Existe um juiz de instrugao especializado em assuntos de menores. Esta especializa- g4o se encontra também na composigao da Camara de Acusagdo que € 0 or- gio de segundo grau de jurisdig&o que controla o Juiz de Instrugao e julga os recursos formados contra suas decisées. Quando esta CAmara evoca um as- sunto de menores ela é composta especialmente pelo Conselheiro do Tribunal de Recursos, especialmente delegado a infancia e seus problemas. Este mes- mo magistrado preside a formagdo do Tribunal de Recursos que julga as deci- sdes do Juiz das Criangas e do Tribunal para Criangas. Enfim, se trata de um menor de 16 anos, ele sera julgado pelo Tribunal para Criangas mesmo se ele cometeu um crime e, se tratar de um menor de 16 a 18 anos, ele seré julgado pelo seu crime pelo Tribunal Criminal de Menores, composto de trés magistrados, entre os quais figurarao dois juizes de criangas e nove jurados. Para os delitos e as contravengdes graves, todos os menores s4o julgados seja pelo Juiz das Criangas, seja pelo Tribunal para criangas. Para as infragdes pouco graves, o menor ser julgado sem formalida- des particulares pelo Juiz das Criangas no seu gabinete. Trata-se de uma Audi- éncia de Gabinete. Para garantir a coeréncia do diagnéstico e do tratamento penal do menor, este Magistrado tem o poder excepcional e unico de instruir 0 caso, de revé-lo, de julga-lo e de zelar pela execugdo da sangao. Nenhuma sangdo penal ou reeducativa muito constrangedora pode entdo ser pronunciada. Para os delitos graves ou os crimes cometidos por menores de 13 a 16 anos, 0 Juiz das Criangas envia o caso para o Tribunal para Criangas que ele preside, assisti- do de dois assessores nao magistrados, escolhidos pelo interesse que eles dedi- cam ao problema da infancia e nomeados para esse fim pelo Ministro da Justi¢a. Uma vez pronunciada a sangao ela é praticada pelo pessoal educativo e social da Proteg&o Judiciaria da Juventude que constitui uma direg&o auténo- ma e 4 parte do Ministério da Justiga e que é a herdeira da Diretoria de Educa- gdo Vigiada criada pela Lei de 2 de fevereiro de 1945. 17 Em cada Tribunal de Grande Instancia, esta administragao possui um Servigo Educativo ao lado do Tribunal para Criangas que é 0 auxiliar de jus- tiga especial do Juiz das Criangas. Antigamente ligada 4 Administragdo Penitenciaria, esta Administra- ¢4o Central do Ministério da Justiga possui numerosos servigos descentrali- zados a nivel regional ( 11 ), departamental ( 92 ), e local ( um servigo por Tribunal para Criangas ) e possui mais de 5.500 educadores, professores- técnicos, assistentes sociais, psicdlogos... Estes servic¢os descentralizados sao completados localmente por uma importante rede associativa ( 450 Associa- gdes empregando 25.000 pessoas). Tudo o que diz respeito 4 protecdo da infancia e aos menores delingiientes lhe diz respeito e ela, para fazer face as suas missdes, criou “Esquemas Departamentais de Prote¢o Judicidria da Juventude”. A importancia de seu dispositivo e de seus meios tem como fina- lidade a decis&o inflexivel da educabilidade das criangas da Justi¢a. A pertinéncia da andlise do contetido do problema da DELINQUEN- CIA dos menores e da identificagao de suas principais causas permitiu a criagao de um dispositivo juridico institucional e educativo que permite, ao menos, conter o fendmeno, insistindo também em reduzi-lo, seguindo a tra- digo dos grandes principios que fazem da Franga a Patria dos Direitos do Homem. Essa andlise permitiu a tomada de consciéncia da realidade da menori- dade em todas as suas dimensGes e 0 fato que ela é na realidade um percurso em diregao a idade adulta. Para cumpri-lo, o menor deve sempre se orientar melhor no espago e no tempo para avaliar, cada vez que for necessario, 0 caminho que ele cumpriu e aquele que lhe resta percorrer. A falta de orienta- do nesse campo est quase sempre presente nos menores delingilentes. A Justiga dos Menores nado tem outra saida que nao seja a tomada de consciéncia das realidades econémicas e sociais, mas também deve ser normativa, afirmando valores estruturantes de referéncias. Por seu intermé- dio, o mundo dos adultos vai-se auto- avaliar através dos valores que ele é capaz de proclamar e praticar. Desde entéo uma verdadeira Justiga penal dos Menores deverd, sem renunciar aos imperativos legitimos da repressao, proclamar que existe um tempo protegido que é o da infancia e do adoles- cente; que se trata de um tempo necessdrio de aprendizagem de tudo que leva a idade adulta e sem 0 qual nao ha acesso possivel. Por essa razao é também, especialmente, o tempo do erro na procura de si mesmo e de seu relacionamento com os outros e o mundo. 18 Nesse sentido os psicanalistas evocaram 0 complexo da lagosta que tendo perdido sua velha carapaga, fica fragil e sem defesas durante todo o tempo que lhe resta por desenvolver uma outra nova. Que o Homem nio tera futuro se ele nao tiver filhos e que ele orga- nizara assim um suicidio césmico; que colocando-os no mundo e educan- do-os, ele pratica sua obra civilizadora e luta contra sua prépria morte, criando um futuro que o manteré vertical, garantindo sua dignidade. Para contribuir o Estado e seus Juizes devem permanentemente se manifestar ao lado dos menores, também pela sangdo se ela se fizer neces- sdria. Que a Sociedade dos Homens tem um projeto para a geragao vin- doura e que esse projeto se exprime em termos de direitos e de deveres concretos. Que a conseqiiéncia mais destrutiva da DELINQUENCIA, particu- larmente entre os jovens, é a ruptura do “vinculo social”, e isso quer dizer a aceitaco dos valores que fundamentam o sentimento nacional e que é a ferramenta de base de toda civilizagao. A Justiga deve ent&o incessantemente criar novas ferramentas que restaurem 0 vinculo e ela o faz especialmente com a mediagao, a repara- ¢0 e o Trabalho de Interesse Geral que vem engrandecer o arsenal das medidas educativas. Que, enfim, esta claro que a afirmagao desses valores e sobretudo a sua pratica tem um custo e que hd nesse sentido muito a fazer para cada Estado. Uma decisdo de uma dimens4o verdadeiramente politica que nado é necessariamente facil e popular no momento. Somente nessas condi¢des, sera verdadeiramente afirmada a con- vicgo da educabilidade dos menores, que confirma que somente a paixdo de educar constitui uma protecdo eficaz contra a selvageria que espreita toda sociedade a qual preferiria se tranqililizar guardando facilmente suas criangas em vez de se esforgar para transforma-las em cidadaos e homens livres. Nao ha evidentemente nenhum futuro em que se possa confiar, sistematicamente e sem discernimento, aum Juiz apenas repressivo. Na verdade, nds sabemos desde os primérdios que é a Juventude que mantém o mundo na sua temperatura normal e que quando a Juventu- de perde o entusiasmo o mundo o faz também. Esta ai o dever imperioso de cada gerac4o adulta.

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