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neo nO Te trata de temas da histéria e cultura byasileiras. Escritos por especialista, SO ccs a Rect) Te erg CeCe ea nels vite & aventura de se descobiro Brasil Po oer ea con ona eC Cone ete ee ay Cee ee et CO ee me Cn CeCe ee eet Cn Cee ac do grandes reforms soca, de im plontaio da infra-estrutura industrial PEO een Se as Pranic ee Boro carts Seen en ca OZE Jorge Zahar Editor A fsa Aum Mn Wn CME ator osezsees tM Descobrindo 0 Brasil GLC PUCRS TECA CENTRAL Dot || 316546 | 05/12/2002.) Copyright © 2000, Mata Celia DAs i ‘opyrigh ‘io Sumario “Todos os ction rserados. ‘Areprod nto attri dea publica, To soda ou em pare cal velago, ie dts autos (Le 3.610098) oe © que era novo no Estado Novo 7 Deere iia Como se montou o Estado Novo 14 rat México 31 sobeeljs : 2031-144 Ro defacto, RJ O dia do golpe 23 te 22.06 gas A repressao politica e 0 cerco a direita 25 ste wwwaahascomfn » oe Administracao versus politica 30 Cap Cael $4 ¢ Stijo Campante flower dt capar A fsenrl io Eitte Nese — Dar Propaganda, educacao civismo 34 “Arqune Gee Varga ctDocrry Vinheta da colt: fea de Debret A economia entre 0 café ea industria 40 ‘Composgio dettnice: Top Tens Edigbes Gris Lada A guerra e 0 lugar do Brasil no mundo 45 Timpresso: Cromosete Gris Editors 8 Trabalhadores, sindicatos € governo 52 CCur-Brail. Cxtalogao-na-fote Sindato Nacional des Ede de Lite, R. fim do regime: “Queremos Gerilio!” 56 “Aj, Maia Clon Sous D Herangas, continuidades, rupcuras € mitos 62 n6xe 0 ato Nove 1 Mata CxlnaD'Arsj, — Rio de az i Jano: Jonge Zar Ea, 2000 Cronologia 65 4, — WDescbsinde 0 Bra) Referencias e fontes 69 Sugestdes de leitura 70 Incl bibiografia ISBN 85-7110-542-1 1, Brasil ~ Hist ~ Exado Novo, 1937-1945. 1 ) Thal. Séie Sobre a autora 72 cop 981.081 00-0059 EDU 981183771948 Mhustragies (entre p.38-39) ¢ -2P 6ST Créditos das ilustrocées 1. Concentragio trabathista no Estédio Municipal do Pa- caembu. Fundagio Gewulio Vargas/cPDOC 2.e 3, Jovens em comemoragio civica. Foro: Peter Lange. Fundacio Getulio Varges/cpb0c 4, Discurso de Varges por ocasio da Semana da Pitta, Foto: Peter Lange. Fundacio Geculio Vargas/PDOC 5. Concentragio em comemoracio ao Dia da Raga. Foto, Pecer Lange. Fundagio Gerulio Vargas/CPD0C 6. Propaganda do DAsP. Foto: Peter Lange. Fundagdo Gewulio VargasiCPDOC 7. Aula de educacio fisica, Foto: Erich Hess. Pundagzo Getulio Vargas!CPDOC 8. Busto de Vargas. Fundagéo Getulio Vargas/CPDOG 9, Bustos de Vargas sendo retirados das cuss, Fundagio Getulio VargasicrbOc 0 que era novo no Estado Novo Seo final do século XX foi considerado um tempo de cocaso das ideologias, 0 mesmo nio sc pode dizer das décadas de 1920 e 30. Nestas, a proliferacao de rigidas crengas ideolégicas deu 20 mundo novas concepgdes sobre o que deveria ser 0 “homem novo”, o papel do Estado ¢ a boa sociedade. A { Guerra mundial (1914- 18) mostrava a fragilidade da ordem internacional, ¢a revolugao soviética de 1917 criava um novo ordena- mento politico, que aparecia como um golpe de mise- ric6rdia na sociedade liberal em crise, Reagindo 20 liberalismo ¢ também ao comunismo emergente, cres- clam as doucrinas toralieérias de direira Esquerda ¢ direita tinham em comum o mito do Estado forte ¢ 0 culto 2 personalidade, ambos tidos como farores fundamentais na formacio da coesio social ¢ da unidade nacional. © liberalismo, por stia vez, ndo ficardimune aesse apelo estatal, sendo influen- ciado pela doutrina de Keynes, que, depois da crise de 1929, “ensinava” como o Estado liberal podia e devia intervir no mercado, Mas o liberalismo seguiré obser- YUNA CELINA oARAWIO vando 0 principio das liberdades individuais ¢ da livre iniciativa, enquanto pare a esquerda ¢ para a ditcita prevaleceram os ideais do intervencionismo estatal, em termos econdmicos ¢ sociais. Predominou aqui o prin- cipio de que o Estado cinha e deveria ter qualidades superiores ’s do individuo e as da sociedade, Foi em meio a ideologias que mobilizavam multi- dées que surgi o Estado Novo no Brasil (1937-45) Estado Novo foi também o nome que receberam outtas ditaduras na mesma época: a de Franco, na Espanha, ¢ ade Salazar, em Portugal, por exemplo. O “novo” aqui representava o ideal politico de encontrar uma “via” que se afascasse tanto do capitalismo liberal quanto do comunismo, duas doutrinas politicas que, desde mea- dos do século XIX e mais intensamente a partir da revoluggo soviética, competiam entre si no sentido de oferecer uma nova alternativa politica ¢ econdmica para o mundo. Havia em ambas a ambigio de cortigit os problemas do capitalismo: desigualdade social, er- ses, inseguranga econdmica, conflico de classes e de A caitica radical 4 sociedade liberal capitalist era, assim, o cere das propostas de direita e de esquerda. Mas, se estas concordavam quanto ao diagnéstico, dlivergiam nas solugées. A doutrina do socialisimo mar- xista, seguindo as tradigies racionalistas do século x0%, identificava-se como uma corrente cientifica ¢ pregava a universalidade dos prineipios politicos. Resumida- is oesiano nove mente, pregava a revolugio proletdria como solugio géral para as sociedades capitalistas;relegando a segun- do plano as tradigées nacionais, postulava o fim da propriedade privada e impunha um modelo de estati- zagio da produgio atrayés da ditadura do proletariado, isto é a ditadura de uma classe, A proptiedade coletiva dos meios de produsio seria levada a cabo por um partido politico — partido Unico da ditadura de uma classe, a trabalhadora, que lideraria um governo volta- do, no primeiro momento, para resolver as necessida~ des fisicas ¢ materiais dos homens. © primado da jigualdade ganhava preeminéncia sobre o da liberdade. O socialismo se confundia com materialismo, mes- mo porque a teoria tida como cientifica no campo socialista era o materialismo histérico ¢ dialétice de Marx. Desde o século XIX, estabelecera-se uma dicoto- mia dentro do campo socialista, proposta pelos mar- xxistas, que separava os socialistas em “utdpicos” e“cien- xificos". Os primeiras eram apenas "poetas" e "idealis- tas", ¢ os tltimos, os marxistas. Também eram consi- deradas “cientificas” as teorias racistas, cugenistas ¢ elitistas que marcaram © pensamento social no Brasil no inicio do século XX ¢ estiveram em voga até o fim dat! Guerra Mundial. A conscitncia proletéria e o fim da propriedade privada nio eram, contudo, 0 alvo maior das preocu- pages do totalitarismo de dircita em relagio ao socia- lismo. © inaceisdvel era a falta de espiritualidade, de 98 ania cena Wakao religiosidade, de defesa dos se nacionalistas, bem como a imposicao dos interesses de uma classe sobre as outras. O “novo", para as doutrinas de direita, seria conciliar esses sentimentos com um sistema de producto que sobrepusesse os interesses da nagéo aos das classes, dos individuos ¢ dos grupos ‘econdmicos através da aco direta do Estado. A manei- ra concreta como esse “novo” apareceu foi o fascismo, na Italia; o nazismo, na Alemanha; ¢ 0 corporativismo de Estado, em outros paises europeus e também no Brasil. As origens do Estado Novo no Brasil podem ser buscadas também em pafses periféricos como Turquia, Romeénia e Pol6nias desta tiltima veio a inspiragao para a Carta de 1937. Do primeizo veio a admizacio pelo movimento dos jovens militares que, sob a lideranga de Mustafa Kemal Atatiirk, tomaram o poder em 1922, impondo & Turquia, pais de tradicéo oriental, uma tépida moderizagio pela via autoritéria. No Brasil, a forsa desse movimento ficou conhecida entre os mili tazes com a formagio de um grupo de jovens oficiais conhecido nos anos 1920¢ 1930 como “jovens turcos” — ou sea, radicai Do ponto de vista doutrinétio, a influéncia maior veio da Roménia, O grande formulador da doutrina corporativa que deu unidade tedrica ao Estado Novo foi o romeno Mihail Manoilescu, através do classico O séewlo do corporativismo, traduzido parao portugués por jentos nacionais ¢ modernizadores e autoritérios. +10. 0 stan wove Azevedo Amaral em 1938. Nessa obra 0 autor recor ‘mendava uma recuperacio do passado, particularmen- te do senso de comunidade gerado na Idade Média através das corporagées de offcio, que articulariam, no dizer do teérico, a atividade econdmica com a necessé- ria sociabilidade e espitito de comunidade que teria sido destrutdos pela frieza e impessoalidade do merca- do liberal. A seu modo de ver, o século XX reconheceria inexoravelmente essa nova mancira de ver © mundo: uma maneira mais harmOnica ¢ humana, porém sob a @ide de um Estado forte. O corporativismo de Ma- noilescu procurava associar um espitito medieval de comunidade com a idéia de Estados nacionais fortes ¢ centralizados; mais do que isso, postulava que seria através desse Estado forte que se recomporiam as estru- ruras sociais em patamares superiores aos entio exis- tentes — a organizagio social através de ramos da ptodugio, ou seja, das corporagoes. Na ctftica as instituigdes representativas da demo- cracia liberal — organizagoes populares, sufrégio am- pliado, governos representativos, competicio eleitotal, partidos politicos, encze outras—, esse modelo propu- nha que as atividades politicas fossem substituidas por trabalhos técnicos em comiss6es e conselhos de grupos profissionais ou cconémicos. Os partidos ea liberdade de organizagio politica deveriam ser substituidos por cAmaras efou setores da produgéo atganizados ¢ lide- rados por um Estado fortalecido. one MARIA CELIA WARAUO Esse tipo de proposta ¢ conhecida como corporati- vismo escatal — corporativismo imposto de cima para baixo — ¢ difere de ontras priticas cqrporativstas, especialmente as da Escandindvia, em que uma orga- nizagdo corporativa de representagio de interesses foi construida pela propria sociedade. Esse tipo de arranjo, que conciliou organizacbes sindicais, formadas em fun- sao dos ramos dz produgio, com empresirios e Estado, gerou um modelo de decisio tripartite conhecido como “corporativismo societal”. Teve base democritica € encontrou na Suécia sua principal expresso. Para virios autores, inclusive Oliveird Viana, nosso princi- pal te6rico conporativista, a Suécia era um modelo de inspiragio. $6 que, também para muitos, 0 corporati- vismo deveria scrimplementado a pattir de um Estado forte © autoritério. Esta era também a opinigo de Oliveira Viana, que a justifca alegando a "debilidade” da sociedade brasileira. A questio do Estado era central na critica que os autoritérios faziam ao liberalismo. Mas eles pregevam a necessidade de fortalecer a autoridade do Estado — © 0 cotporativismo se prestava a isso — sem cair nos postulados do socialismo, que, para levar a cabo tal forcalecimento, enfraqueceria a Nagao ¢ as nogdes de nacionalidade e nacionalismo, Um Estado-Nagio forte era caminho vislumbrado como a saida para o século XX, Isto pode ser resumidamente traduzide como au- toritarismo politico ¢ idcologia nacionalista extrema- 12+ ‘0 es1400 novo cla, Dentro dessa ética, 0 governo regularia as ativida- des do cidadio, promoveria 0 desenvolvimento (se- sgaindo metas fixadas por assessorestécricos)« fomen- tatino espitito de nacionalidade. O nacionalismo cons- truiria a Nagio. A distinggo entre Estado ¢ Naséo — govern ¢ comunidade —, ¢ a0 mesmo tempo a necessidade de fandi-los, através de um lider ou de um partido tinico, foi uma marca desses regimes, O Estado Novo no Brasil foi a expressio clara desses pressupostos, através das virias comemoragdes civicas que inventou ¢ cultivou também através do culto & personalidade do "chefe", Getilio Vargas. Aqui, na auséncia de um partido, Gertlio era 0 chefe politico que simbolizava o poder do Estado ¢ a nacionalidade. Era o chefe de Estado e da Nagio, Nas palavras de Oliveira Viana, "nosso partido ¢ o presidente". Sintomaticamente, 0 Estado Novo foi o momento de apogest de vérios pensadores autoritérios brasileiros, como Francisco Campos ¢ Aze~ vedo Amaral, além de Oliveira Viana. Na prética, os regimes baseados nesses pressupostos foram e sio diraduras, pois, a0 apregoarem o fim do conflira politica como caminho para a paz e 0 desen- volvimento, usam 0 poder do Estado para suprimir cuiras formas de poder. Calam o canflito silenciando 2 pluralidade social e negam a politica para a usarem dde mancira discricionaria. Estes governos acabam on sendo autoritiios, isco é, impéem-se pela Forga ¢ pelo ae MARIA CNA DARAWIO policialismo, ou como sistemas cotalitirias — caso em. que, além de autoritdrios, assencam-se em uma ampla politica mobilizatéria, através de um patito tinico ou de forcas paramilitares. O nazifascismo 6 uma expre séo cvidente de totalitarismo: a cbediéncia politica ce € traduzida como civismo — daf a import comemoragics civicas nesses regimes — ¢ a discordin- cia ¢ interpretada como traigio a pétria. Com graus e rnuangas particulares, foi isso 0 queaconteceu no Esta- do Novo no Brasil, em grande paste espelhando um momento das dourtinas politicas em todo o mundo. Como se montou o Estado Novo O Estado Novo foi formalmente instituido por um golpe de Estado ocorrido no dia 10 de novembro de 1937, uma quarta-feira. Um golpe anunciado, sem reagio, silencioso. A auséncia de reacéo niio quer dizer, contudo, que nfo houvesse opositores.a Vargas ¢ planos ditaroriais; havia, mas ja estavam dlevidamente impossbilitads de qualquer tipo de reagio. Explicitando o clima ideolégico que mencionamos acima, o pretexto imediato para o golpe foi a “desco- berea” de um plano comunista atribuido a um judeu, Cohen —o Plano Cohen —, que expressaria a ameaga do judaico-comunismo internacional. Nesta pega po- litica, 0 anticomunismo se juntava 20 anti-semitismo, 14s ‘osstn00 nova a tadicalizagao ideolégicase revestia de aspectos racistas alimentando 0 discurso que defendia « necessidade de tum Estado forte capaz de defender a Nagao de perigo- 0s inimigos externos. Esse Plano, contudo, examinado adiante, foi apenas o ultimo passo, 0 gesto final, de um, longo proceso visando ao endurecimento do regime. Vejamos rapidamente como se deu esse proceso que desemboca no golpe que leva Vargas a rasgar a Consti- tuigio de 1934 (aliés, a segunda Constituiggo que rasgava; a primeira fora a de 1891, rasgada em 1930, quando chegou ao poder). A escalada para golpe foi racionalmente conscrutda ¢ cuidadosamente executada, O golpe nio representou uma ruptura, uma mudanga abrupt, mas sim a.con- solidagio de um processo de fechamento € repressio que vinha sendo lentamente construfdo, com 0 apoio de intelectuais, politicos civis ¢ militares. O marco inicial decisivo para explicar os acontecimentos de 1937 € 0 Levante Comunista de novembro de 1935. © Levante ocorreu em quartéis do Exército em tres cidades simultaneamence: Rio de Janciro, Natal ¢ Re- cife—liderado por comunistas reunidos, basicamente, em torno da Alianga Nacional Libertadora, @ ANL. Criada em marco de 1935, a ANL era uma frente de esquerda comandada pelo Partido Comunista Brasile- to. Tinha como presidente de honra Luis Carlos Pres- tes, ex-militar ¢ pessoa da confianca do PC soviético no Brasil. Em julho de 1935, a ANL foi posta na ilegalida- 118+ ania cELn eanauia de, mas no interrompeu suas atividades politicas. A attagio que a ANL € 0 comunismo exerciam sobre jovens oficiais era motive de preocupagio para as ci- pulas milirares; 0 préprio Prestes reconhecia ser mais {cil organizar o Partido nos quartéis do que nas fabri- © Levante foi produto de uma avaliagio dos comu- nistas brasileiros © do Komitern, érgio central do Partido Comunista da Unio Sovitica, sobre as con- digdes de implantar no pais um “governo popular ¢ tevoluciondrio”. Como tal, foi uma ameaga teal a0 governo de Vargas, ¢ no apenas um pretexto part 0 golpe de 1937, como querem alguns. O anticomunis- mo, que ja cra uma das preocupagées centrais dos chefes inilitares © do governo, se incensificou e passou aser um dos principais alvos governamentais, Enquan- tose providenciava aprisio dos ebelados, foi dectetada a severa Lei de Seguranga Nacional (LSN), para levar a esquerda as prisdes € a0 banco dos réus. Ha varios exemplos famosos sobre 0 que foi o rigor ¢ o terror das prisdes nesse petfodo, Um dos casos mais conhecidos €0 do comunista alemo Harry Berger, um dos asses- sores internacionais do Levante, que ficou insano em fungdo da violéncia das toreuras que softcu. As instituig6es militares ainda hoje lembram o saldo de militares mortos do Levante de 1935: pes- quisas de historiadores indicam que foram 22 20 todo (4 em Natal, 1 no Recife ¢ 17 no Rio de +16. (© EsTApO Nove Janciro}, enquanto os dados oficiais do exército estabelecem 30 mortos. Porém o que mais mobili- zou os quartéis nao foi o nimero de mortes, mas a noticia de que varios militares teriam sido mortos pelos comunistas enquanto dormiam — 0 que po- deria ser rotulado como uma das formas mais per versas de covardia. Todavia, os documentos do Tri- bunal de Seguranga Nacional, que julgou os res- ponsaveis pelo levante, nfo provam que alguém tenha morrido nessas condigées: apenas um militar tetia sido morto pelos revoltosos em situagéo inde- fesa — desarmado —, mas néo dormindo. Para se ter uma idéia da importincia que esse evento reve para as Porcas Armadas, a partir de 1937, 0 Levante (que elas chamaram de Jutentona, significando intento louco, plano insensato) foi eransformedo em data oficial de celebraco militar, quando se condenava a taiggo aos colegas e se relembravam as vitimas da covardia, Apenas na década de 1990 a data deixaria de merecer cerimBnias oficiais Em decorréncia da dimensio que o Levante ¢ 0 anticomunismo ganhavam, nos dois'anos pré-golpe 0 Brasil vivewa maior parte do tempo sab estado de sitio cu de guerra, o que significa dizer que as liberdades constitucionais estavam suspensas. O pais contava ain- da com 0 jf mencionado Tribunal de Seguranga Na- ional, ctiado em secembro de 1936, uma instincia juridica excepcional concebida para julgar os crimes “Te MARIA CHINA DARALIO contra a Nagio; em nome da seguranca nacional, es- querda e oposisio muitas vezes foram englobadas em um tinico bloco e igualmente perseguidas. Oligarquias que se opunham a Vargas também foram atingidas nesta depuragio que militares eo tribunal de excegio faziam na politica brasileira, Com esses instrumentos excepcionais, Gettilio € seu grupo de apoio, civil ¢ militar, puderam interditaraqueles que se opunham a0 governo ¢ empreender um acerto de contas com os que pudessem reivindicar medidas liberalizantes ou des- centralizadoras. A partir de 1935, varios parlamentares sto exilados; politicos, jornalistas e intelectuais so presos e perse- guidos, e varios deixam o pais para escapar da prisio. “perigo comunista”, que certamente nao fora inven- tado — 0 comunismo existia de forma organizada, especialmente nos quartéis —, foi habilmente aciona- do como “inimigo ntimero 1” da Patria, contrao qual algumas medidas rigorosas precisavam ser tomadas. Esse discurso anticomunista foi fundamental para manter as Forgas Armadas unidas em torno da decisio de uma solugio de forga, ainda que liderada por um civil, Elas seriam as fiadoras de uma nova ordem, © motivo imediaro usado para consolidar os iiltimos movimentos em diregdo 20 golpe foi, como dissemos, Plano Cohen, uma pega de doutrinagio anticomunista elaborada pelo servigo secteto da Agao Integralisea Brasileira (1B), organizagio pata- se. 0 estA00 avo militar de direita criada em 1932. O Plano foi datilografidlo pelo capiao Olimpio Mourio Filho, chefe do estado-maior das milicias integralistas, nas dependéncias do Estado-Maior do Exercito, onde pode set lido ¢ visto por autoridade militares. O Plano simulava, de forma até caricatural (como convém a esse tipo de pedagogia), o que scria um projeto judaico-comunista internacional para a to- mada do governo, os propdsitos desse governo ¢ seus métodos de agio visando & desagtegacao dos valores da sociedade e & instauragio de uma nova sociedade materialista, atéia ¢ contriria 4 idéia de familia © & honra das mulheres. O documento, que deveria compor 0 Boletim de Informagdes n® 4 do setvigo secreto da AIB, nio foi aprovado pelo chefe do integralismo, Plinio Salgado, que o considerou fantasioso demais ¢ irrealista na imagem que fazia dos comunistas. Todavia, embora fosse uma peca frigil na opinizo da aiB, 0 documento foi aproptia- do por chefes militares, que, sem que o autor do Plano fosse avisado, o divulgaram para a imprensa como sendo verdadeiro. A veracidade do Plano foi logo questionada, inclu- sive dentro dos quartéis, ¢ Mourao foi formalmente acusado pelo general Géis Monteiro, homem da con- fianga de Vargas, de ter enganado seus chefes militares com um documento falso. Em decorréncia disso, so- feu sangdes em sua carrera, foi verado em promogées 19. MARU CEUNA DARA 86 cerca 20 anos mais tarde pode comprovar frente & Justica Militar que nao hudibriara as autoridades ¢ que estas € que haviam se apropriado de sey trabalho sem sua autorizacio. Embora falso como plano eassinado com um nome de um ficticio judew comunista, 0 importante é que, para os chefes milicares, 0 Plano Cohen servia para sinalizar o golpe final nas instituigdes politicas demo- créticas que ainda sobreviviam. O documento foi leva- do por Géis Monteiro a Vargas, que autorizou sua divulgacao 4 imprensa através do Departamento de Propaganda, érgio antecessor do Departamento de Imprensa ¢ Propagenda (DIP), principal instrumento de propaganda oficial e censura do Estado Novo. No dia 30 de setembro de 1937 alguns jornais davam ampla cobertura ao fato, colocando a Naséo a par do “tenebroso plano” que teria sido organizado por dit gentes comunistas cussos, no qual estavam previstos “desde depredagdes ¢ incéndios até 0 destespeito a honra ¢ aos sentimentos mais intimos da mulher bra sileica” Alguns periédicos e politicos tentaram desmascarar farsa, Por exemplo, O Estado de Sao Paso cranscreveut editorial de um jornal gaticho, A Federapo, no qual se afirmava nio ser necessiria grande perspicicia para perceber que o Plano era “apenas um pretexto imagi- nado pela maquiavélieafertlidade do Sr. Gevilio Var- {gas para novamente conseguir turvar as éguas do mo- +20 0 rstao novo mento politico” edesferir nova golpe sobre a democra- cia brasileiza, Mesmo que pouco convincente, o Plano justificou nova decretacao do estado de guerra, O pedido do rinistro da Justica, Macedo Soares, enviado 20 Con- gresso no dia 18 de outubro, lembrava qué o estado de guerra se fazia necessério em funcio da gravidade da situagio da politica nacional. Referia-se & andlise feira pelos chefes militares, que atestava estarem marchaum “novo golpe de lesa-pétria”, a excmplo do que ocorrera em 1935. Mais tarde, militares como Dutra minimizaram a importincia do Plano para o golpe, mas esta nao é uma opinito dominante. Para um regime civil fragilizado e fragmentado, a imposigio do medo, através da veicu- loco de uma ameaca iminente, forjava a unidade das elites civis e militares em rorno da defesa da Patria. O comunismo tornava-se 0 simbolo imediato ¢ maior do inimigo que deveria ser evitado, do mal “ultrajante” que teria de ser combatido “sem eréguas”, © plano Cohen simboliza, enfim, o clima de radicalizagio ideo ligica da época, a falta de eseripulos quando se busca 0 poder pela forga e, assim como ocorreria em 1964, 0 ‘empenho dos militares no sentido de gerar um Estado forte que garantisse a seguranga nacional ¢ a unidade ddas Forgas Armadas. Quando do golpe de 1937, a esquerda estava ” presa ou exilada, ¢ os opositores liberais nao tinham 221 ania ceua Bao inserumentos de ago, em Fungo da situagio ex- cepcional que o pais vivia do ponto de vista insti- tucional — estado de sitio e de guerra, Os mais cxaltados ja haviam abandonado as trincheiras ou sido presos, Dentro do servigo ptiblico, foram efe- tuadas demissées; entre os militares, a “limpeza” foi feita através da cassagio de patentes. Até ex-aliados gatichos que relutavam em accitar os planos golpi tas jd estavam a caminho do exilio, Desde outubro as tropas estaduais haviam sido federalizadas ¢ a imprensa vivia sob rigorosa censura. Assim, quando © golpe ocorreu nao havia mais forcas disponiveis para reagir apés dois anos de intensa repressio: 0 siléncio j4 estava imposto. Além disso, nesses dois anos, Geniilio, em alianga com os setores militares dominantes, liderados pelos generais Géis Monteiro ¢ Eurico Gaspar Dutra, prepa- rara a prorogacao de seu mandato, previsto para ter- minar em meados de 1938 (uma vez que Geuiilio fora eleito pelo Congresso Nacional, em 1934, para um mandato de quatro anos), Um calendério eleitoral fora formalmente mantido’e trés candidatos chegaram a fazet campanha para a sucessio presidencial: Plinio Salgado, integralistas José Américo, a principio o can- didato situacionista; e Armando de Salles Oliveira, da oposigio liberal. Mas Geuilio jamais chegou a se pro- nunciar sobre o pleito e, enquinco as campanhas se desenrolavam pelo pais, ele preparava uma nova Cons- 122. siaD0 nove tituigao. Hl registro em seu Diéria de que em abril de 1937 a Carta jé estava pronta. Getilio tinka um plano de governo a ser posto em ptitica — desenvolvimento econémico, intervencio- hnismo ¢ industtializaggo —; tinha um plano politico —a ditadura, entendida como trégua social para pos- sibilicar a expansio do pals —; e tinha um inimigo objetivo 2 quem atribuir a responsabilidade pelas me- didas excepcionais que propunha — 0 comunismo. Tinha, além do mais, aliados 4vidos por experiments dicaroriais. 0 dia do golpe O diz do golpe foi aparentemente tanqiiilo, O Con- sesso amanheceu cercado por tropas do Exército ¢, 3 noite, na Hora do Brasil, o presidente fez um discurso i nagio através dos microfones da Departamento de Propaganda. No discurso dizia que o golpe eta inexo- ravel, que o pais nio contava com “meios defensivos cficazes dentro dos quadros legais? para solucionat a crise nacional. Defendia sua iniciativa afirmando que “tanto os velhos partidos, como os novos em que os velhos se transformaram sob novos sétulos, nada expr iam ideologicamente, mantendo-se 3 sombra de am- bigdes pessoais ou de predominios localistas” com interesses “subalcernos”. De forma resumida, explicava “2A Manis CELINA DARA ue “para reajuscar 0 organismo politico as necessida- des econdmicas do pais, nao se oferecia outra alterna- tivaalém da que foi tomada, instaurando-se um regime forte, de paz, de justia ¢ de trabalho”. Do ponto de vista do formato legal do pais, declarava que a “ong- nizagio constitucional de 1934, vazada nos moldes clatos do liberalismo ¢ do sistema representative, evi- denciara falhas lamentdveis” e “estava evidentemente antedatada em relagéo ao espitita do tempo. Destina- vva-se a uma realidade que deixara de exist” Termina- do 0 discurso, Geuilio deixou 0 escritério do Departa- mento de Propaganda e, com a fumilia, comouo rumo da embaixada da Argentina, onde tinha um jantar previamente agendado. O golpe no alterou sua agen~ da social Por estar datada c ultrapassada, era subsitufda por uma nova Carta, outorgada, previamente assinada por todo 0 ministério & excegio do ministro Odilon Braga. Essa Constituigio ficou popularmente conhecida como "Polaca", dada sua inspiragZo nitidamente cor- porativa e fascista, apoiada no exemplo da Polénia No decorrer do die do golpe, um grupo de 80 parlamencares, cerca 1/4 dos membros do Congresso, visitou Geuilio, solidarizando-se pela iniciativa do gol- pee pelo fechamente do Congresso. Os jornais anun- ciaram que as bandeiras dos estados seriam abolidas; O Globo expressava essa iniciativa, com a seguinte man- chete: “Nem bandeiras nem emblemas. $6 o pavilhao 224 18 EsTAoa Novo nacional podesd ser desfialdado em todo o pais." Na mesma ocasiio foi declarada a moratéria, sinal de independéncia econémica. Dias depois seguiu-se a ceriménia de queima das bbandeiras dos estados, simbolizando a centralizacio do poder, a afirmasio da autoridade do chefe central, 0 fim dos regionalismos e da federagio. O Brasil seriaum Estado nacional unitétio, obedecendo 2 um tinico senhoz. Esta centralizagao eo reforgo da figura do lider dariam, segundo varios analistas, maior coesio e uni- dade ao pais ¢ melhores resultados nas ages adminis- trativas do governo. O golpe tinha respaldo social principalmence por- gue era veiculado como uma medida saneadora da politica, visando 20 bom desempenho da administra- fo piiblica, Gettlio foi feito ditador com apoio civil e militar. Nos Estados Unidos, 0 embaixador Oswaldo Arana, ainda que contratiado, incumbiu-se de expli- cara Roosevelt as razbes do Estado Novo. Eo fez com sucesso. A repressao politica e 0 cerco a direita Com a decretagio do estado de guerra em outubro de 1937, foi criada a Comissto Executora do Estado de Guerra, composta pelo ministro da Justiga, um general 225+ Manis cua DARALIO € um almirante, Essa comissio é importante para ilus- trar 0 nivel de radicalizacéo a que o pais chegara as vésperas do golpe ¢ a orientacio policial que se tentava adorar. No dia 14 de outubro de 1937 a Comissio finalizou seu plano de agio, a ser apresentado ao pre- sidente da Republica —o que, embora nio fosse aceito ‘como politica oficial do governo, dé ume idéia precisa da disposigéo dos agentes responsiveis pela lei e pela segurang2 no sentido de eliminar as oposigées. As resolugdés da Comissio previam medidas imediatas, como a prisio de “todos os suspeitos de atividades comunistas, com devassa sobre sua vida passada ¢ presente”, € medidas de caréter preventivo, tais como colOnias agricolas de reeducacio de comunistas nio- petigosos, campos de concentracéo militares para ree- ducacio de simpatizantes do comunismo, pris6es es- peciais para receber chefes ¢ ideres marxistas, campos de concentracio em moldes escotistas pata receber os filhos de comunistas ¢ comissdes de ensino para com- bater o comunismo nas escolas. Entre as medidas de carter permanente, propunha-se um arcabougo jurt= dico que permitisse julgamentos sumdtios ea priszo de codos os comunistas, bem como a ctiagio da Poltcia Federal para combater 0 comunismo em qualquer parte do pais. (Os campos de concentragio nao foram ctiados, para adultos ou criangas, masa politica implementada pelo Estado Novo nio ficou muito distance dessas drettizes. + 26+ estaba wovo Em um primeiro momento, 0 comunismo seria 0 inimigo principal a combater. O que nao estava previs- to € que esse arcabougo repressivo muico cedo passasse a aruar também contra a direita, articulada em torno da AIB. A AIB seria em principio a grande beneficiéria, em termes doutrinsrios e politicos, do golpe de 19375 © apoio dos integralistas 20 Estado Novo fora explicito, ¢ Plinio Salgado chegou a reticar sua candidatura & presidéncia em solidariedade a Genilio Vargas. A AIB interessava um governo que permitisse socializar os brasileitos, principalmente a juventude, em moldes totalicétios e paramilitares; ¢ em troca do apoio a0 golpe, a associacao barganhou 0 Ministério da Educa- io para o chefe, Plinio Salgado. As coisas, no entanto, nao se passaram bem assim. Em dezembro de 1937 Gentilio decretou o fim dos partidos, medida que atin- giu inclusive 2 AIB, que se transformou em centro cultural. Além disso, os integralistas foram proibidos de usar armas Sem partido, sem armas ¢ sem cargos no governo, ZAIB partiu para o confronto. © dpice dessa postura foi uma tentativa de golpe em maio de 1938 — 0 “putsch integralista®, como ficou conhecido. O pussch foi um atentado contra a residéncia presi- dencial, 0 Palécio Guanabara, no bairro de Laran- jeiras, Rio de Janeito, liderado pelos integralistas mas que recebeu apoio de opositores de outras tendéncias politicas, como o general de peril liberal 27+ MAA CELINA DARAUIO Buclides Figueiredo, pai do futuro presidente Joao Baptista Figueiredo. Depois de algumas horas tensas vividas pela farnilia Vargas dentro do Palicio, sitiado por rebeldes ¢ sem protecdo policial ou militar, 0 putich foi vencido com a intervencio do. da Guerra, general Eurico Gaspar Dutra. Nesse momento duas importantes decisoes foram tomadas. Uma foi a criagao de uma guarda pessoal para © presidente. Para isso foi chamado um grupo de gatichos leais a Vargas, sob a dirccio de Gregorio Fortunato, Amplamente conhecido na hist6ria do pafs como 0 anjo negro de Gettlio, Fortunato seria pega central na crise que levou ao suicfdio de Vargas: foi ele ‘0 mandante do atentado a Carlos Lacerda, que deu cotigem As dentincias contra 0 governo Vargas em agos- tode 1954. Com essa guarda, Gertlio criava uma esfera pessoal de protegao sem precisar depender do Exército ou da Policia —o que era muito importante, tendo em vista a independéncia que pretendia construir frente as iscro instituigées A segunda medida foi a perseguisio sistemtica aos integralistas, que passaram a ser submetidos aos rigores Ga LSN. Apés o ataque 20 Palicio Guanabasa, cerca de 1,500 “camisas verdes” (como eram chamados 0s inte- gralistas, devido a0 seu uniforme) foram presos, € destes cerca de 200 foram posteriormente condenados pelo TSN a penas que variaram de dois a oito anos. Plinio Salgado acabou no exilio ém Portugal, mesmo +28. stan nova pais onde estava o liberal paulista Armando de Salles Oliveira, ~ Porém, 0 lado mais conhecido da repressio diz respeito ao tratamento dado aos comunistas ou 20s acusados de o serem. Retrato dramético desse drama esta no cléssica da liveratura brasileiza Memdriar do cévcere, de Graciliano Ramos, peca literétia que virou filme sob a direcdo de Nelson Pereira dos Santos Graciliano foi considerado simpatizante comunista quando dirigia uma secretaria de gaverno em Alagoas Outro episédio sempre lembrado € a prisio de Olgt Benicio, alema comunista que viera parao Brasil como guarda-costas daquele que viria a ser seu marido, Luis Carlos Presces, principal lider do PCB e a essa altura também 0 principal aliado do Kemitern no Brasil Olga foi entregue a um campo de concentragao nazista quando estava grivida de poucos meses. A filha do casal, Anita Leocédia, foi resgatada por parentes brasi- Iciros, mas Olga, a exemplo de milhées de outros judeus alemaes, foi asassinada, em Ravensbruck. Quando foi extinto, 20 fim de Estado Novo, 0 TSN havia condenado 4.099 pessoas em varios estados do pais. Os estados com maior niimera de condenagées foram aqueles em que houve o Levante de 1935: Rio de Janeiro, com 1.458, Rio Grande do Norte, com 318, ¢ Pernambuco, com 264. Para os envolvidos no Levante também foram reservadas penas maiores que as atribuidas aos integralistas +29. amin ceuna DARAYIO istraco versus politica O Estado Novo foi anunciado como um momento inovador do ponto de vista da racionalidade adminis- trativa. Mas, embora virias medidas fossem tomadas nesse sentido, uma boa dose de clientclismo continuo orientando a administracio estatal. Mais do que isso, a0 fim do periodo ditatorial uma nova oligarquia havin sido produzida e consolidada — a que conseguiu lide- rar a Repiblica liberal de 1946. Se houve na pritica um equilibrio entre mudanga ¢ continuidade, a propa- ganda do governo, no entanto, sempre enfatizou o lado inovador e revoluciondtio do Estado Novo no tocante & modernizacao. Embora nao se possa endossar 0 peso que Ihe era atribufdo pelas auroridades da época, hé que se mencionar algumas dessas inovagées para que se tenha uma idéia mais precisa do desenho institucio- nal levado a cabo pelo novo regime. O processo de modernizacio administrativaentabu- lado pelo Estado Novo foi, como nao poderia deixar de ser, de cunho autoritério; um exemplo bem acabado do que se chama "modernizagio pelo alto”. Essa mo- demizagio teve como um de seus destaques a elabora- 20 de uma politica de pessoal para os funcionérios piiblicos que estabelecia o concusso, a estabilidade no ‘emprego ¢ o mérito, Para fazer cumprir esses objetivos, «em 1938 foi criado o Departamento Administrative de Servigo Piblico (DASP), que, mesmo sofrendo virias +30 ( esta00 Novo reformulagoes, sobreviveu até os anos 1990. Em com- plementasio 30 DASP foi criado, no ano seguinte, 0 Estatuto do Funcionério Piiblico. Essa preocupacao com a racionalidade era apontada como uma resposta a experiencia oligérquica, 2os critérios personalistas € particularistas e & instabilidade administeativa da Re- puiblica Velha, Entendia-se que um quadro de funcio- naios permanentes e bem treinados tomaria a méqui- na publica imune as presses nepotistas ¢ clientelistas. Na auséncia de um Poder Legislative, 0 DASP cuidava dos orcamentos da Unio ¢ dos estados ¢, no plano estadual, funcionava como um érgio assessor para os interventores (os governadores dos estados, nomeados por Vargas). Estado Novo enalreceu a técnica em contraposi- fo politica, veiculada como o lado suo dos “interes- ses privados”, O conhecimento téenico € cientifico aplicado & administragio seria um patamar superior na forma de lidar com os inceresses nacionais. Na prética isto significow a cencralizagio politica e administrativa; © fortalecimenta do Poder Executivo em niveis até entio desconhecidos; 2 subordinagso dos estados a0 governo central; o fim das consultas populares através de eleigdes; ¢ a proscrigio do Legislative. Em suma, a autonomia do Estado em relagio as forges da socieda- de, Mas, apesar do discurso que privlegiava a moder- nizagao racional-legal, o Estado Novo conviveu sempre com formas clicntclistas ¢ personalistas, particular 31s Jonas CELINA DARA mente quando se tratava de nomeagdes para cargos de confianca. Um legado visivel do Estado Novo foi a prolife- tagio de aparelhos estatais com grande autonomia de agdo —.que, apesar de serem considerados érgios ndo-clientelistas, serviram para fazer a “politica do presidente” ¢ para consolidar 2 centralizagao de um Estado gestor ¢ intervencionista. No plano da agri- cultura, foram criados a Carreira de Crédito Agel- cola ¢ Industrial do Banco do Brasil, em 1937; 0 Instituto do Mate, em 1938; ¢ 0 do Pinho, em 1941, Todavia, seguindo a tendéncia de anos ante- riores, as novidades administrativas ocorreram com maior vigor nas instancias voltadas para as politicas industriais, a diversificagio ¢ 0 planejamento da economia. Nessa direcio jt havia sido ctiado, em 1934, 0 Conselho Federal de Comércio Exterior, primeiro érgio brasileiro voltado para o plancja- mento econdmico, ¢ que, na falta de um Congresto, foi o espaco onde os interesses industriais se fizeram representar. Da ampla rede gestada pelo governo, mencionaremos alguns organismos cuja denomina- fo indica 0s setores a que se destinavam: Conselho Técnico de Economia ¢ Finangas do Ministério da Fazenda (1937); Conselho Nacional do Petréleo (1938); Conselho de Agua e Energia (1939); Co- missio Executiva do Plano.de Siderurgia Nacional (1940); Comissio de Combustiveis ¢ Lubrificantes +32 es1400 Novo (1941); Conselho Nacional de Ferrovias (1941); Comissio do Vale do Rio Doce (1942); ¢ Superin- tendéncia da Moeda e do Crédito, a SUMOC, criada em 1945 e transformada no Banco Central nos anos 1960, No setorde planejamento, remos, no inicio dos anos 1940, além do Conselho Federal de Comércio Exte- tior, a Coordenagio de Mobilizagao Econémica, 0 ‘Conselho Nacional de Politica Industrial e Comercial, a Comissio de Planejamento Econémico, 0 Conselho Nacional de Economia ¢ 2 Comissio de Defesa da Economia Nacional, Com tal estrutura,o que até entio cra gerenciado em termos de politicas setoriaise regio- nais passou a ter uma dimensio nacional. Conselhos, comissées, autarquias, instirutos passa- tam a ser os canais de participagio de que os setores industriais, agricolas ¢ financeitos dispunham para expor pontos de vista e defender interesses. Aos craba- Ihadores, por sua vez, foram reservados os sindicatos, na verdade Srgaos auxiliares do Ministério do Traba- IbgilaldieaeComide Nesse proceso crescente de centralizagdo admi- niscrativa ¢ de intervengio do Estado no planeja- mento ¢ ns prods, © Extado Novo ao fol uma completa inovacao, mas sim o 4pice dessa pol © Extado brasileiro se irmava, atavés ava como formulador ¢ antecipador dos interesses da sociedade, . cee saa. MARIA CELINA DARAIO Propaganda, educacao e civismo Do ponto de vista da intelectalidade, o lado mais ambjguo do Estado Novo tem a ver com a politica cultural ¢ a educagio. Nesse campo, varios projeros desenvolvidos pela esquerda e por progressista brasi- Ieiros foram concemplados, e varios intelectuais foram convidados a participar do governo — sem que possa- mos dizer que com isso tenham se tornado fascists. Entte intelectuais de renome que atuaram como fun- cionérios ow assistentes de politicas empreendidas pelo Estado Novo temos Mario de Andrade, Gustavo Ca- panema, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Villa-Lobos e muitos outros. A busca de um projeto culcural auténomo, de uma identidade nacio- nal, era tema que animava poetas, pintores, roman tas, arquitetos ¢ educadores desde a Semana de Arte Moderna de 1922. Aautonomia adquirida pelo Estado brasileiro a par- tit de 1930 permitiu que vérios projetos econdmicos ¢ cculturais fossem testados em nome de sua ata qualida- de técnica e da grandiosidade das intengGes. A essas ambigdes juntaram-se interesses militares e civis preo- cupados ei socializar ajuventude em termos civicos € em depurar costumes sociais que pudessem ferira cons- trugio de uma nova identidade nacional, Nesse senti- do, joven: principais das campanhas “educadoras’ do Estado Novo. igrantes €0s trabalhadores foram osalvos 34. A edlucagao dos jovens esteve associads ao clvismo e a preacupagzo de “imunizé-los” contra influéncias “exdgenas”, Um primeiro passo importante nesse ca- minho foi a nacionalizagao do ensino empreendida nos anos 1938 e 1939. Com essa medida, ficava proibido fo ensino em linguas estrangeiras — posteriormente, numa extensio desse principio, apenas brasileiros po- deriam ser propriesitios de escolas —¢ o portugués se rornava lingua oficial de todas as ceriménias puiblicas, ainds que nio oficiais. Tais medidas visavam particu- larmente a atingir as comunidades estrangsiras, espe- ialmente as mais organizadas (a alema, a japonesa ea italiana), ainda mais porque podiam representar, nesse momento, a expressio da vontade de seus paises de origem no territério nacional. Uma medida de segu- tanga se juntava a um ideal de nacionalidade, Ainda em relagio aos jovens, foram ctiadas varias formas de organizar sua pasticipagio civica, A que mais chamou a atengio foi a Organizagio da Juventude Brasileira, forjada nos moldes da Mocidade Portuguesa de Oliveira Salazar e que nio foi implementada nas dimensGes projeradas devido & disputa entee os minis- cérias da Guerra ¢ da Educagio pela lideranga do movimento, Apesar de nao haver oficialmente uma organizagao paramilitar de jovens, eles foram presenga uniformiza- da constante nas varias manifestagées civicas que a 2355 MARIA CENA taRUO maquina de propaganda do Estado Novo inventou (catre elas o Dia da Raga, 0 Dia da Patria, o Dia da Juventude, a Semana da Independéncia, 0 Dia do Trabalho ¢ outros). Essas manifestagdes, em que se ‘exibiam retratos de Genilio Vargas e que ocorriam normalmente em campos de futebol, transformaram- seem momentos miticos e quase religiosos de louvacio a0 pals ¢ a seu “chefe”. Uma intensa bibliografia foi produzida pela impren- sa ficial para culeuar a personalidade de Vargas. Vérias “historias de Vargas para criangas” chegaram as biblio- tecas, demonstrando como desde 0 nascimento Geri lio estaria fadado a liderar seu povo em um grande projeto. Ensinavam rambém que Vargas, desde muito cedo, tivera a antevisio de que a politica, partidos parlamentos cram elementos esptirios, perniciosos & sociedade. A histéria de Getilio era construida de maneica hagiogestica, ou seja, como sealguém estivesse contando z historia de um grande lider espiritual, de uum anjo, de um santo, Vargas seia veiculado junto aos jovens e As criangas como um ser superior —estratégia usada pelas politicas de culto & personalidade. Por isso mesmo, foi durante 0 Estado Novo que se construiu: definitivamente © mito Vargas, feuto do carisma do presidente, mas também da eficiente maquina de pro- paganda entio existence, Paralelamente o governo cuidava de politica migra- r6ria, através de um sistema de cotas que atingiu espe- -36- RR ee © ESTADO NOVO cialmente japoneses judeus. Esse sistema, politica adotada em todo'o mundo, antes ¢ depois da guerra, impediu que milhares de imigrantes que tentaram escapar da fome, da repressio ou de campos de con- centragio em seus paises fossem accitos no Brasil — motivo pelo qual é recorrentemente lembrada como uma das paginas negras de nossa politica externa, A politica migratéria traduaia preconceitos em relacio a certas etnias mais estigmatizadas mas, do ponto de vista interno, os alemaes também provocavam preocupa- ses. Embora houvesse afinidades ideolégicas enzre varios componentes de nossa clite militar ¢ civil ¢ 0 nazismo, era sempre lembrado que os imigrantes ale- nies jé residentes no pais podiam vira represenar um poder paralelo em eritério nacional, o que era um dos grandes cemores das Forgas Armadas. Com a guerra, reve inicio uma intensa opera¢éo policial visando & prisfo € a0 desmantelamento de grupos politicos na- tistas ¢ fascistas organizados dentro do Brasil, muitas vvezes com o apoio oficial dos paises de origem de seus membros. A exemplo do que se dava em relagio a0 comu 1, a presenga desses imigrantes era também a combinagio providencial de uma ameaga quie néo era inventada — embora pudesse ser supetdimensionada — com 05 projetos centralizadores do governo. ‘Annacionalizagio da educagio implicaré um profun- do controle de todos os cuztfculos, de todas as ativida- des de todas as escolas nos recantos mais remotos do a7 MARIA CoUNA DARALIO pais. A escola nacionalizada e monitorada pelo governo seria a porta de entrada para a nacionalidade, para a homogeneidade nacional ¢ o controle de tendéncias exégenas que pudessem advir da multiculturalidade. Essas preocupagdes nao eram novas, mas encontraram zo Estado Novo 0 campo fértil para prosperarem se tornarem realidade. Ainda no campo educacional, 0 reforgo dado as aulas de educagio fisica nio s6 servia 20 propésito de direcionar os jovens, como também represcntaria um aprimoramento estético do brasileiro. esse periodo, como parte da propaganda de massa, © pais também adotou padres arquitetnicos ¢ estéti- cos que se inspiravam no neoclassicismo nazifascista, incentivando ainda a preservaco do pattiménio cul- tural. Um cxemplo dessas iniciativas é a construgio. do prédio do Ministério da Fazenda, no Rio de Jancito. ‘A propaganda de massa era efetuada pelo DIP (chefiado por Lourival Fontes), érgio que também efetuava a Ccensura a todos os veiculos da imprensa, nessa época restrita a jormais, revistas ¢ rédio. A imprensa deveria tera fungio piiblica de apoiar 0 governo ¢ auxiliar no projero nacional, e quem assim nio agisse podria ser punido inclusive com a desapropriagio de seus bens. Foi o que aconteceu aos proprietirios de O Estado de Séo Paulo, que na época jé era um dos mais importantes periédicos do pais. A censura foi uma importante facera do regime. O DIP nao sé preparava o material de propaganda do governo como controlava com censores +38. 1. *Concentragdo trabalhista" em homenagem a Vargas no estidio do Pacaembu, Sdo Paulo. 2 3 Jovens participam de uma comemoragio civica oficial, Séa Paulo. 4, Vargas diseursa ao lado de autoridales no encerramento das | 6. Foto de propaganda apresentando a organizagio de concursos comemoragies da Semana da Patria, no campo do Vasco da Gama, | pdblicos pelo DASP. Rio de Janeiro, 1941, f 5, Concentragao no estado do Vasco da Gama, em comemaragao 1. Foto de propaganda do governo, mostranda aula de esducagéo fisica 120 Dia da Rega, Um exempla do culto aa corpo promovido pelo Estado Novo. 8.0 escultor Ja Davidson faz 0 busto de Vargas, a pedo do presidente Roosevelt, 1941 9, Bustos de Getulio Vargas sendo retcados das rues, apds 8 queda do Estado Novo, Rio de Janeiro, outubro de 1946 1 EtABO Novo todas as marérias da imprensa escrita ¢ falada. As concessdes de'rédio eram rigorosamente controladas por esse drgio, ¢ 60% das macérias dos noticiérios eram fornecidos pela Agencia Nacional. Paradoxalmente, foi também durante 0 Estado Novo que o Brasil entrou definitivamente na érbita cultural dos Estados Unidos; foi nessa ocasiio que 0 personagem de quadrinhos Zé Carioca foi criado pelos Estidios Disney € que Carmen Miranda foi igada a simbolo da boa vizinhanca entreos BUA o Brasil. Uma das mais populares e carisméticas artistas no Brasil, Carmen chegou a ser associada a uma artista da Amé- rica Latina, ¢ como tal cantou para os esttidios de Hollywood —além de sambas chorinhos —rumbas, tangos ¢ boleros. Acabou sendo o simbolo maior da cooperagio cultural no continente americano, 0 que Ihe custou a mgoa e o desprezo dos brasileiros que, acusando-a de americanizar-se, sé voltaram a louva-la depois de suamorte, em 1954. ‘Aatengio queo Brasil ganhou em Hollywood atraiu ainda a atengo de Orson Welles, um dos maiores cineastas do século XX, que fai convidado para filmar co carnaval no Rio. Mas sua opgao estética nao agradou 0s esttidios norte-americanos: Welles filmou pessoas comuns, negros, homens do povo se divertindo nas ruas — 0 que retirava da festa seu apelo turfstico € comercial. O filme foi arquivado. Destino idéntico encontrou 0 outro filme de Welles sobre o Brasil 239. ania ceuna ranauD segundo as autoridades da indistria cinemarogréfica, a reprodugio de uma saga veridica de jangadeiros do Nordeste, que navegaram do Ceari atéo Rie de Janeiro para reivindicar junco a Vargas protegio através da legislagdo social, continha apelos comunistas. Somente ‘muitos anos mais tarde esse filme foi recuperado, che- gando 20 Brasil sob o titulo Thats All True (E tudo verdade]. Nesse periodo, o cinema e a méisica faze dos EUA uuma presenga constante no cotidiano dos brasieitos. (O Brasil se americanizava nos costumes, no comporta- mento, no vestuirio, no intercimbio de estudantes — mas, do ponto de vista econémico, tornava-se ideolo- gicamente nacionalista e avesso a abertura de seus metcados, No tocante politica cultural oficial, propa- gavam-se a brasilidade e uma identidade nacional au- téntica e auténoma. A economia entre o café ea industria Pelo resultado positivo da industrializagao, a primeira gestio de Vargas (1930-45) ¢ freqiientemente mencio- nada como um marco da modernizacéo do pais — c, nesses quinze anos, 0 Estado Novo é tido como 0 apogeu da madernizagao, Nesse periodo o Brasil teria deixado de ser um pais eminentemente agricola, de- pendente exclusivamence do café, para entrar na rota 40+ 0 EstA00 Novo do mundo industrial ¢ moderno, Esse marco nao é infundado, se lembrarmos que em 1930 cerea de 30% da populacio brasileira moravam nas cidades que nos anos 1970 essa proporcio havia se invertido. Todavia esse processo certamente nao pode ser cre- ditado apenas a0 “genio” de Vargas; contou a seu favor ‘uma conjuntura internacional que impés uma marcha forcada para o desenvolvimento interno, em fun de duas grandes crises internacionais: o exack na Bolsa de Nova York, em 1929, ¢ a t Guerra Mundial, iniciada ‘em 1939, Tal conjuntura obrigouo Brasil a desenvolver uma indsistria para suprir suas necessidades, através de tum processo conhecido como “industrializa¢do por substituicao de importagées” — iniciado, alls, ainda durante a1 Guerza Mundial. Mas, assim como o Estado Novo nao iniciou a repressio politica, também nao inventou a industriali- zaco. Se comparado com o desempenho da agricultu- ra, vemos (tabela & p.42) que 0 Estado Novo cons dou © papel da indistria como base da economia nacional, uma mudanga que jé vinha de antes. Veros também que o crescimento industrial declinou nos anos de guerra, embora nesse"mesmo perfodo estives- sem sendo gestados os instrumentos que permitiriam levara cabo, nas décadas seguintes, 0 modelo de desen- volvimento da era Vargas, apoiado em us pilares bésicos: investimentos estatais nacionais, investimen- tos privados nacionais e capital estrangeiro, publico ou privado. ate fannie CELINA DARAWIO Taxes anuais de crescimento Agricultura Tndiisla Torl 1921 4196 2.8% 3.9% 1938.39 1.7% 11.2% 4.9% 1939-45. 1.7% 5.4% 3.2% Fonte: A Vilela ¢ Werner Baer, Crescimenco industial e indus trializagio. Dados, n.9, 1972 Outto dado importante & que, em 1940, 70% dos estabelecimentos industrials brasileiros haviam sido ctiados a partir de 1930 — evidenciando assim a importancia dos arranjos econdmicos feitos no pais para vencer os eftitos da crise de 1929. E relevante ainda que a agricultura, que vai perdendo seu papel hegeménico na economia do Brasil, também comeca a softer transformagbes: © café delxa de ser 0 Unico ptoduto expressive de nossa pauta de exportagdes, passando a dividir esse espago com © cacau e com 0 algodao, especialmente. © café, que em 1933 repre- sentava 72% das exportagoes brasileiras, nao ultrapas- saré a marca de 39% em 1939. No plano geral do pais, vemos que, na década de 1930, enquanto a producio agricola tem um volume de crescimento na ordem de 20%, a producao industrial cresce 125%. Associando crescimento & defesa nacional, durante a guerra foram criadas varias empresas estatais de trans- portes e navegacio em diversas regibes do pais, como 42s ESIANO NOVO © Amazonas, a Bacia do Prata e outras. Isso forvalecia uma politica de seguranca, bem como empreendimen- ros voltados para a producio de energia, a exemplo da Companhia Hidrelétrica do Sto Francisco, fundada em 1945, No ambiro da induistria de ponta, entrando dirctamente na esfera da produgio, foi criada, em 1941, a Companhia Siderirgica Nacional, ¢, dois anos mais tarde, a Companhia Nacional de Alealis © a Fibrica Nacional, codas as trés no estado do Riv. Ao fim do Estado Novo o pafs havia consolidado sua segunda revolugao industrial: deixava a fase de produ- fo de bens manufaturados de curta duragio para entrar na indiisteia que produzia méquinas. Nesse as- pecto, a ditadura do Estado Novo acabou ganhando a simpatia dos desenvolvimentistas e até da esquerda, preocupada com a emancipacio econémica do pais. Outro componente importante desse modelo de desenvolvimento industrial foi o nacionalismo. Em 1938 0 governo declarou pertencerem & Unio todas as jazidas de pettéleo encontradas no territério nacio- nal e nacionalizou a industria de refinamento do pe- tréleo, Paralelamente, o Cédigo de Minas, de 1940, proibia aos estrangeiros a minercao, a metalurgia ea exploragio das riquezas do subsolo brasileiro, Esse toque nacionalista foi, aliés, um dos mais importantes ingredientes idealégicos do Estado Novo. O governa se preparou para atuar em dreasde ponta a exemplo do aco, transportes, enexgia, pesqui 243 as TNaRIA CA DaRAUIO comunicagdes —, enquanto deixava para a iniciativa privada, nacional ¢ estrangeira, as atividades econdmi- cas relativas aos bens de consumo nao-duraveis. Essa concentragio de poder de decisfo na érea econdmica é uma das marcas mais fortes ¢ duradouras do Estado Novo e deirou profiundas raizes no pats, especialmente no que toca a um modelo econdmico orientado pelo Estado. As discussdes e polémicas dos anos 1990 sobre as privatizacdes e a necessidade de manter ou nio a estatizagio em algumas arcas econémicas tidas como cestratégicas, tais como petrdleo € minérios, sao evidén- cias do enraizamento desse modelo na sociedade bra- sileira Visando a uma politica econémica nacional assen- tada em uma agenda tinica € em um centro forte de decisio, o Estado Novo promoveu também a aboligao dos impostos entre os estados brasileiros. Ao formular esse modelo de Estado, Vargas adorava uma postura antiliberal, mas nao xenéfeba. Em sua concepcio, 0 Estado deveria se antecipar aos tempos, abrir o cami- ho para moderna industrializagio e para aassisténcia social, recorrer ao capital internacional, se necessério, ¢ pautar-se pelo protecionismo. Ou seja, nfo bastava um Estado intervencionista: era preciso uma interven fo feita em nome de um nacionalismo que procurava evitar 0 predominio do capital estrangeiro em setores de ponta da induscrializagao.,Era preciso, principal- mente, equipar 0 Estado com os instrumentos neces- a4 © sia now sirios a essas agGes. E isso seria conseguido através da ampla rede de agéncias que 0 Estado Novo montou. A guerra € 0 lugar do Brasil no mundo Apolitica externa do Estado Novo nio pode ser disso ciada da 11 Guerra, Nos anos anteriores, expressivas alteragSes ovorreram no plano das relagdes internacio- nais, particularmente no tocante 4 emergéncia de no- vos sistemas de poder — como Japio, Alemanha Iedlia, pafses que se transformaram em poténcias inter- nacionais, ameagando a tradicional hegemonia da Franga e da Inglaterra, na Europa, e dos EUA, no continente americano, Acé 1940 o Brasil tesistiu a uma aproximagio mais cerrada com os Estados Unidos, embora estivesse em marcha um alinhamento lento ¢ gradual com Washington, O jogo sé se definiu ap6s virias negociagdes mulci ou bilacerais ¢ de conferéncias como a de Havana, em 1940, e a do Rio de Janeiro, em 1942, F rese corrente que durante os anos 1930, gragas ao “genio maquiavélico” de Vargas, o Brasil teria mantido 4 posigio de exploraras possibilidédes que cada potén- cia mundial pudesse ofetecer, evitando firmar aliangas rigidas com qualquer dos nascences sistemas de poder Fugindo a essa simplificagao, o perfodo aqui examina- do pode ser marcado por uma especial modalidade de 245. Mania CELINA DARAWO convivéncia diplomética denominada “eqiiidistincia pragmaécica”, que se transformaré em alinhamento in- condicional aos BUA. Dentro desta perspectiva, 0 Bra~ sil, ainda que numa posigio assimétrica de forga, soube tirar proveito das ambigées ¢ necessidades dos dois blocos de poder representados por Estados Unidos ¢ ‘Alemanha. A partir de 1941, no entanto, com 0 tom- pimento das relagdes com 0 Eixo, o Brasil aliou-se € alinhou-se com a politica norte-americana, ¢ de ma- neita inreversivel O conflito internacional colocara para Vargas @ necessidade de ages que refletssem claramente, no plano internacional, sua preferéncia entre as democra- cias liberais eos regimes totalitirios. No plano politico, Vargas ndo deixou diividas sobre suas simpatias pelos regimes fortes. E o que se pode observar no pronun- ciamento que fez em junho de 1940 para uma platéia de militares 2 bordo do navio Minas Gerais, quando criticou a politica liberal e afirmou: * férmulas antiquadas entram em declinio ... o Estado tem a obrigagio de assumir as forgas produtoras.” Numa alusio direta 4 Alemanha e & Itilia, elogiava “as nagées fortes que se impoem pela organizagéo bascada no sentimento da Pétria e pela conviccio da propria superioridade". ( discurso foi interprétado pelos norte-americanos como uma evidente declaragio de simpatia a0 Eixo, ¢ propiciou uma répida mobilizagio dos Estados Unidos felhos sistemas € +46 es ( «s1.00 novo no sentido de esclareceras posigées brasileiras, Iniciou- se entio unt delicado momento na politica externa brasileira, amenizado com decisio norte-americana de financiar a indiistria do ago no Brasil. Daram dess’ época os empréstimos para a construgio da usina side- nirgica de Volta Redonda, no Rio de Janeiro — obra que, no imagindrio popular, ficou por décadas associa~ da A soberania nacional ¢ 4 capacidade do pais no sentido de enfrentar seus desafios. Além do mais, do ponto de vista militar, a Companhia Siderdirgica Ne- cional permitiriz 20 pais produzir nio apenas maqui- nério pesado para a indiistria, mas também armamen- tos. Outro capitulo de destaque na aproximagio forgada com os Estados Unidas foi a geopolitica da il Guerra, ou mais especificamente a importancia estratégica que 0 Nordeste brasileiro teria em caso de um prolonga- mento da guerra, Essa regiio do Brasil era, paraa época, a alcernativa mais vidvel para os norte-americanos che- garem & Furapa — através do Norte da Affica—, caso fosse inviabilizada a travessia do Atlantica Norte. Desde que comesara a guerra, Getilio recusava-se a se pronunciar a favor ou contra qualquer das partes envolvidas, embora seu Ditrio reflita uma aposta na superioridade militar do Bixo. Além disso, recorria a0 pan-americanismo para explicar sua neutralidade ¢ temia os prejufzos que qualquer posisio politica pu- desse trazer ao comércio internacional do Brasil. Vargas sare Wana CELA DaRAMO angumentava que a guetra era um assunto curopeu € nao das Américas ¢ que se devia evitar que o Brasil fosse alvo de retaliagées, como as que viriam a ocorrer mais, tarde com o afundamento de navios brasilciros pelos alemaes. Nos priméitos anos da guerra, seguindo os prinei- pios dos tratados entre paises americanos, Getilio alegava que uma posigio oficial do Brasil em relagio ao conflito na Europa nfo faria sentido, uma ver que nenhum pais do continente havia sido atingido. Esse argumento perdeuo valor em dezembro de 1940, com © arentado japonés as bases americanas de Pearl Har- bor, no Hava. Os documentos deixados por Vargas em seu arquivo pessoal, bem como os papéis de virios de seus auxiliares mais diretos, mostram com detalhes como se det, a partir de entdo, 0 alinhamento do Brasil com os Esta- dos Unidos, Em seu Didria, por exemplo, Vargas ex- pressa sua preocupagio, pessoal e privada, com as mudangas que se operavam no mundo em guerra c os reflexos que poderiam ter sobre o Brasil, Ao conteétio do que usualmente se supde, © apoio aos EUA nao é interpretado por ele como uma “jogada de mestre” que permitin o financiamento a siderurgia: Volta Redonda foi algo como um prémio de consolacio & imposicio de que 0 Brasil autorizasse a consteugio de bases mili {ares norte-americanas no Nordeste. = 48 estav0 nove Os tegisttos do Didrio moscram que, para Getilio, do ponto de vista da posigio do Brasil e da América Latina, a permissio para a instalagio de bases militares norte-americanas no Nordeste (1940), 0 rompimentd de relagées com 0 Eixo (1941) ea declaragio de guerra (1942) podiam ser considerados sinais de perda de soberania. Apesar dos esforcos que fazia para que o pafs se equiparasse a uma nagio forte ¢ aurénoma, Getto conchiia que pouco sobrara fora das dirertizes norte- arericanas, Com visivel tristeza, admitia falta de alter- nativas para o pais a nao ser, segundo ele, fazet conces- s6es 205 norte-americanos. A concessio das bases do Nordeste foi por cle per- cebida como uma imposi¢éo: ou o Brasil cedia parte de seu tettitério ou seria considerado inimigo dos Aliados. © pais eta, segundo Vargas, jogado om uma “aventura” que nao escolhera ¢ que nio controlaria Mais do que isso, a pressio norte-americana demons- tava que 0 pan-americanismo seria um norteador de politicas para © Continente, desde que houvesse con- cordincia dos BUA, O pan-americanismo parecia, para ‘Vargas, uma espécie de letra morta: os estados ameri- canos nao cram efetivamente pares. Com as conces- 86es,ficava claro, pelas notas do Didrio, que a soberania nacional, um dos temas favoritos de Vargas, estava arranhada Seu sentido de autoridade perante os stiditos, mas principalmente frente 3s nagbes estrangeiras — um dos +49 - Van ceuna oaRAo pontos fortes da imagem que Vargas procurou cons- truir —, serviu para retardar e complicar o processo de alinhamento incondicional aos BUA, mas nio foi suli- ciente para conté-lo, Segundo suas palavras, a pressio norte-americana fora esmagadora. £ 0 que se pode ver ein seu Diario, no dia 16 de janeiro de 1942, quando afirma que “a maioria dos paises americanos que ado- tou essas solugdes de declarar guerra ou romper rela- 96cs nao o fez espontaneamence. Foram coagidos pela pressio americana” Em meio ao novo pacto de alinhamento, 0 Brasil assinatia com 0s EUA acordos comerciais visando 4 aquisigio de material bélico para 2 modemizaczo do Exército brasileiro, velha demanda dos militares. Em 1941 um acordo com os EUA estabeleceu a venda de iminerais estratégicos em troca de equipamento. No que toca ao envio de armamentos, esses entendimentos, tinham uma finalidade mais simbélica do que efetiva Na tealidade, os militares norte-americanos relucaram praticamenteaté o fim da guerra em mandararmamen- tos para o Brasil. As auroridades norte-americanas no confiavam nos chefes militares brasileivos, Dutra ¢ Géis Monteiro, considerados — nfo sem razio — getmandfilos A eclosio da guerra cornacia mais clara para os dirigentes norte-ameticarios a necessidade de concen- «rar esforgos na América Lating, visando ao fortaleci- mento de suas bases ne novo cendtio internacional +50 6 Est400 Kova) Buscava-se fundamentalmente impedir a expansio na regio da influéncia ideolégica ¢ econdmica do nazis- ‘mo, que vinha sendo alimentada pela agio de imigran- tes, pela presenca de facgdes politico-partidérias e pela forte atuagio de embaixadas e delegacées diplométicas ¢ comerciais. Terminada a guerra, contudo, comegatia 0 combate ao comunismo. Essas alteragdes e imposigécs da ordem internacio- nal fazem o nacionalismo de Vargas ganhar novo tom. Sea posteriori toda essa trama péde ser lida como uma contraditéria defesa dos interesses nacionais, com ga- nhos substantivos para o pais, na opiniéo de Vargas, nas anotagoes fragmentadas do moment, a vantagem mais ambicionada nao fora alcangada: a construgéo de uma nagio soberana, respeitada, que pudesse conviver em pé de igualdade com seus pares continentais, E, apesar da cooperagio, em 1945 Gentlio seria um pe dedor frente as grandes poréncias e as elites nacionais. Do ponto de vista interno, a iniciativa mais lembra- da da guerra foi a eriagio da Forsa Expedicionéria Brasileira, a FEB, em 1943, Contrariando aqueles que diciam ser mais ficil “uma cobra fumar” do que a FEB ‘embarcar para o campo de guerra, em de julho de 1944 5 “pracinhas” iniciaram o embarque para a [cdlia, sob © comando do general Joao Batista Mascarenhas de Moraes. Na Ieilia a F&B acabou tendo atuagio expres- siva nas batalhas de Monte Castello, Moncese e Forno- vo — para surpresa dos norte-americanos, que haviam oe Man CELI ARADO tentado conter 0 embarque das topas; eles nio confia~ vam no preparo do soldado brasileiro ¢ julgavam que esse apoio no seria mais necessario, pois a guerra, a ssa altura, j4 estava sendo definida a favor dos Aliados, Para os chefes militares brasileiros, no entanto, a pre- senga no campo de operagdes se tornou ponto de hhonra, Ao fim da guerra, o Brasil havia perdido 433, brasileiros, ¢ a FEB se cornava 0 simbolo da luta do Brasil em prol das democracias. Foi sob grande ovayao popular que os “pracinhas” voltaram ao Brasil e desfi- laram pela cidade do Rio de Janeiro, onde foram recebidos por Vargas, também aplaudido. Trabalhadores, sindicatos e governo Deseartando a oposicao politica no plano das elites, 0 Estado Novo nao descuidou de cultivar um setor estra- tégico: os trabalhadores urbanos. © governo tinha consciéncia de que a questio do conflito trabalhista cemergitia nos setores urbanas—e nio nos rurais,ainda adormecidos por prévicas clientelistas de dominasio, como © apadrinhamento ¢ 0 compadrio. Também sabia que o pais eta eminentemente agrério © que precisava enveredar por um caminho de maior inde- pendéncia ¢ diversidade econdmica. Para tanto eta necessério 0 apoio a indiistria, mas também uma mio- de-obra domesticada que evitasse 0s conflicos de classe 52+ 0 es1a00 novo do fiegiientes nos meios urbanos em varias partes da Enropa e dos BUA. A politica social do Estado Novo é, na verdade, a continuaggo de um projeto de intervensio social qule seiniciara em 1930, quando o Departamento Nacional do Trabalho, criado em 1926, foi transformad no Ministério da Indkistria e do Comércio. A propaganda oficial do regime privilegiou essa pritica e eficazmente produziu a visio de que antes de Geuilio nso havia direitos sociais no Brasil. De fato, 0 que € novo na politica social de Vargas nio é atencio ao trabalhador, mas a forma ca intensidade com que isso foi feito, ou seja, através do controle direto e do enquacramento dos sindicatos pelo governo. Algumas iniciativas da época na drea trabalhista tiveram longevidade impar na hist6ria recente do pais. A primeira foi a legislacio sindical de 1939, que reafir- mava ade 1931 no sentido de impor o sindicato tinico por categoria profissional, O sindicato tinico, demanda também das forcas de esquerda, foi concebido como entidade ndo-obrigatéria (isto é 2 fillagio nao era compulséria) mas representativa de todos os trabalha- da de interesse piblico — era, na realidade, um érgio do dores da categoria, e também como uma figura governo. As eleigdes, as contas e a vida do sindicato, tudo seria fiscalizado pelo Ministério, eos sindicalisras que concorressem a cargos de diresio tinham que apresentar atestado de idealogia, fornecido pela Poli- +83 MARIA CIMA DARA cia, provando que nao professavam ideologias contré- rias a0 regime. Além disso, em 1949, foi criado o imposto sin- dical, um dispositive através do qual o poder pii- blico promovia o financiamento da ampla rede sin- dical recém-consteuid2. Com ela, embora a filiagio a0 sindicato nio fosse obrigat6ria, o financiamento 1a obrigacio de todos. A partir de entfo 0 governo passou a descontar um dia de saldtio de todos os ttabalhadores empregados no mercado formal. Esse dinheiro revertia para sindicatos, federagdes ¢ con- federagbes ¢ financiava a assisténcia que o sindicato oferecia aos filiados. Ou seja, todos pagavam, mas somente poucos se beneficiavam. Essa estrutura sindical corporativa, que enquadrava os crabalhadores em entidades fechadas conforme os ramos da produgao, também estendida aos empresérios — que a acataram com resisténeia —, era considerada pelos arquitetos do regime uma forma superior de organizacio social: promoveria o intercimbio pacifico dos interesses do trabalho ¢ do capital através de uma rede organizacional concrolada pelo préprio Estado, A Idgica da conciliagao ganhou contorno final com a ctiagio da Justiga do Trabalho no dia 1° de maio de 1941. Criado como um érgio do Ministerio do'Traba- Iho, Indiistria e Comércio, essa agéncia de Justica ceri como fincio exclusiva conciliar ¢administrar conflicos de interesses entre trabalhadores e patrées. O Estado +84. 0 estA00 nove assumia formalmente seu papel de intermediscio entre as classes, conforme mandavaa doutrina estadonovisca. Sindicaco tinico, imposto (ou contribuigio) sindical « Jastiga do Trabalho sobreviveram intactos 3 Repabli- ca liberal de 1946 © a0 regime militar (1964-85) ¢ foram mantidos na Constituigio de 1988. A longevi- dade dessas leis mostsa que elas tiveram ampla base social e, principalmente, que a estrutura montada a partir do Estado Novo nio seria facilmente desmonta- da. Coroando esse processo regulador do mercado de trabalho industrial, em 1943 foi criada a Ct, Conso- lidacao da Leis do Trabalho, uma espécie de eddigo que reunia toda a legislagao trabalhista existente no pats. Foi também durante 0 Estado Novo que seriou a carteira de trabalho, que passou a ser considerada 0 ‘mais importante documento de identificagio do traba- Ihador brasileiro. Uma intensa campanha do governo associou cidadania a carteira profissional, braslidade a trabalhador com carteira assinada ¢ promoveu a valo- rizagzo do trabalho como instrument de nacionalida- de. Foi em meio a essa politica de requalificagio do srabalhador que Gecslio passou a iniciar seus discursos com a frase célebre que imortalizaria sua politica trax blhista: “Trabalhadores do Brasil.” Os trabalhadores, foram eleitos os interlocurores preferenciais do presi- dente, do chefe, ¢ nio € 4 toa que seus discurs0s do periodo fossem reunidos sob o titulo A politica trabar Wista 255+ AAI CELINA DARALID Mas 0 trabalhismo getulista do Estado Novo nao se fez apenas com leis e discursos. Intensas mobilizagoes de trabalhadores eram programadas pelo Ministétio do ‘Trabalho, assim como varias solenidades. Nesse senti- do, algumas, datas passaram a set referencias para a celebragio do encontro do presidente com os “traba- Ihadores do Brasil”, através de manifestagdcs ¢ paradas normalmente qualificadas pelo regime como “espon- taneas”, A mais importante dessas datas era 0 Dia do Trabalho (1* de maio), mas havia outros momentos para selar esse “encontro”, Por exemplo, 19 de abril, aniversirio de Getiilio Vargas; 10 de novembro, data da instauragio do Estado Novo; 7 de setembro, Dia da Independéncia; entre outros. Além disso, concursos culturais ¢ efvicos, bem como a escolha de funcioné- rios-padrdo, marcavam a preocupagio em firmar wma cultura do crabalhismo, uma das realizagdes mais bem- sucedidas do Estado Novo. 0 fim do regime: "Queremos Getiilio!" Um ponto sempre questionado ¢ de que forma 0 resultado da guierra determinou o fim do Estado Novo. Para muitos, uma ditadura que apoiava democracias estaria fadada a acabar — afinal, o ditador e 0 pafs ‘haviam se empenhado no conflito em nome da demo- cracia, Mas os farores externos nao explicam tudo, +56) 0 EsIAnO novo Internamente comecavaa surgir um movimento pouco ruidoso mas eficaz no sentido de questionar as bases do regime, inicialmente entie as elites econdmicas e pen- santes. O marco mais importante foi o Manifesto dos Mineitos, de 1942, que pedia a liberalizagao do regime. As coisas, contudo, se tornam mais contundentes em 1945, com movimentos de estudances e manifestagies na imprensa a favor da redemocratizagio. Prevendo pressio pela retirada de Gettilio, no come- go de 1945 0 presidente e seus auxiliares iniciaram um amplo processo de aprovacio de medidas liberalizan- tes, Assim como aconteceria com os arquiteros da abercura politica durante 0 regime militas, também aqui houve a preocupacZo em estruturara mudanca de forma que nfo se dessem rupturas fundamentais com © momento auroritério ow um antagonismo entre as clites. Este esforgo foi bem-sucedido. A medida mais importante nesse sentido foi a reorganieagio partidé- tia, Ou seja, enquanto suspendia a censura & imprensa ¢ promovia a anistia aos presos ¢ exilados, o Estado Novo administrava a montagem de uma nova ordem politica em quesua influéncia pudesse ficar nitidamen- te assegurada, Aqui certamente teve peso 0 talento de Gettlio para controlar ¢ manipular 6 podes, mas tam- bém o interesse de varios de seus seguidores, ¢ especial- mente dos que fizeram carreira nas méquinas burocr&- ticas montadas pelo Estado Novo. Afinal, uma mudan- «a radical na ordem acarreraria a petda de posigdes ¢ “57 = Man CELA ARAL mando. O pacto da redemocratizagao seria uma mu- danga com o minimo de custos de uma ruptura. Assim, os interventores entenderam a politica de descompressio do presidente ¢ partiram para formar seu proprio partido, o Partido Social Democritico. O PSD reunia as méquinas dos interventores e dos "das- pinhos" estaduais e garantia a continuidade de um grupo politico que crescera e prosperara sob 0 Estado Novo. Ao lado desse “partido da ordem” surgiu, por fora das estruturas governamencais, uma frente de opo- sig&es que se reuniu na Uniio Democritica Nacional, 2UDN. A clite politica estava amplamente represeatada nessas das correntes, embora outros partidos tenham sido criados nessa ocasio. Dois deles merecem ainda mengio especial. O primeiro é o PCB, que apoiara a politica de redemocratizagdo de Vargas ¢ que, mesmo na clandestinidade, sustentara o ditador quando da aproximagzo com os Aliados. Apesar de os comunistas terem sido as principais vitimas da ditadura, seguindo 2orientagao internacional do Komitern, os comunistas brasileiros abragaram a tese de que todos os governos que combatessem 0 nazifascismo ceriam © apoio dos partidos comunistas nacionais. Por isso mesmo, Luis Carlos Prestess que tivera sua mulher morta em um campo de concentragao em decorréncia da decisio de Genilio de entregé-la as autoridades nazistas, declarow seu apoio a Vargas 2o sair da prigio. Mais do que isso, os comunistas defendero a tese de que Vargas s6 = 58 CO ESIAnO Hav Geveria deixar © poder depois que o pats tivesse uma nova Constitiigio. Essa posigao foi marcada pelo mo- vimento Constiswinte com Gettili, que comesava a inquietar até mesmos aliados de Vargas que haviant apostado na mudanga de comando do governo. A redemacratizacio de 1945 foi um momento de noto- riedade para o PCB, que em 1947 entraria na ilegalida- de, posicio em que permaneceria até 1985. Outro partido importante desse momento Pr, Partido Trabalhista Brasileiro. Veiculado como uma organizagio de recorte trabalhista a exemplo do Labor Party britinico, 0 PTB foi organizado pelas prd- prias agéncias do Estado vinculadas ao Ministétio do Trabalho ¢ contou com a adesio passiva de vitios dicigentes sindicais. Apesar de sua otigem pouca heréi- cam 1945, o PTB associado a Geuilio teve nos anos seguintes uma posicio central na politica brasilcira ¢ estaria no centro do poder quando do golpe de 1964, sendo extinto em 1965. O PTB ficou associado a sindicatos, a politica social ea direitos rrabalhistas, mas © carisma de Vargas foi o seu principal capital, ‘Em torno destes trés partidos — PSD, UDN e PTB — girou a politica brasileira da Reptlica liberal de 1946, encerrada em 1964, Sintomaticamente, eram partidos que traziam como marca de origem estarem referenciados a Vargas, quer contra, quer a favor Os dias finais do regime foram de intensa mobiliza- 20 popular. Enquanto a Ici cleitoral e o alistamento 59. Mam CELA CABALIO iam sendo providenciados, comesava nas ruas um mo- vimento, incentivado pela burocracia getulista, que pedia a continuidade de Genslio no poder. Esse movi- mento ficou conhecido como 0 Queremas Getto, ou Queremismo, ¢ foi amplamente apoiado pela maquina de propaganda ¢ de mobilizagio do Estado Novo. Alguns comicios queremisras foram realizados na cida- de sem que Gentil os desautorizasse. Tudo indicava que estava em marcha um plano continuista, desta feita nfo com 0 apoio dos militares, como em 1937, mas com o apoio das massas, Esse sentimento foi partilhado pelo embaixador americano no Rio de Jancito, Adolfo Berle, que também condenou os planos continufstas de Vargas. Em 3 de outubro, data do inicio da Revolugio de 1930, realizou-se mais um comicio queremista, em meio aos rumores de golpe que citculavam por toda a cidade. Nessa ocasido Genilio discussou criticando Berle pela intromissao na politica interna; afirmou nio ser candidato ¢ estar disposto a cumprir 0 calendério legal da redemocratizagao que previa eleigdes gerais para Executive © Legislative ea inscalagao de uma Assembléia Constituinte, Mas terminou admitindo que hi “forgas reaciondrias poderosas e ocultas” que desafiam a vontade popular e que, ciente disso, ficatia 20 lado do povo: “o povo pode contar comigo.” ‘Nesse momento parece claro que um golpe esti em marcha e se arma o contragolpe. Na sequiéncia cemos +60 0 sstAo0 novo duas medidas de Gevilio Vargas que selam seu destino. A primeira foi’a alteragio do calendario eleitoral, sim- bolo maior do projero de redemocratizacaoy a segunda foi a nomeagio de um amigo pessoal, Joo Alberto,” para a prefeirura do Rio, ¢ de seu irméo, Benjamim Vargas, paca a chefia de policia do Distrito Federal, 0 iis importante drgio de seguranga do pais, também no Rio de Janciro. Com esas duas nomeagées, Geniilio ficaria com 0 controle da capital e da repressio; as massas poderiam ser convocadas a seu favor e protegi- das pelo poder piblico. Entéo entram em cena os militares, os avalistas do Estado Novo, que se tornam agora os algozes do regime. Géis Monteiro tomou a lideranga do movimento € no dia 29 de outubro de 1945 despa- chou Dutra ao Palécio para propor a Getiélio uma retirada pacifica. Enquanto esta conversa era efetua- da, © ministro da Justica de Gectilio, Agamenon Magalhaes, permaneceu refém dos militares no Mi- nistério da Guerra, Geutilio aceita sair do poder, negociando, no entan- £0, para quea presidéncia fosse exercida pelo Judicistio acé que as cleigées se realizassem. Com isso evitava, ainda que provisoriamente, que um ex-aliado ocupasse seu lugar — 0 que de qualquer modo ocorre depois do pleito: o vencedor das eleigaes presidenciais foi sew ex-ministro da Guerra, Eusice Gaspar Dutta. Do lado da UN, o candidato era também outro militar expres- 61 Maas CEUNA BARAULO sivor 0 brigadeiro Eduardo Gomes. Os militares agora entravam na politica pela via das eleigoes, mas sem nunca abandonar o cacoete golpista — até serem bem- sucedidos, em 1964. No dia 30 de outubro, a imprensa festejava a queda da ditadura, e Gentlio, sob boatos de que seria preso e deportado, seguia nova etapa de sua carreira politica, Sua popularidade ao deixar o poder ficaria expressa na voraglo que recebeu para cargos legislativos em dezem- bro desse mesmo ano de 1945: foi eleito deputado federal em sete estados e senador em dois. Vargas optou pela senatoria gaticha, ficou mais perto de suas fazendas © pouco freqiientou o Congreso. De la sai para fazer a desforra do 29 de outubro: em 1951 voltou a0 go- verno, no Palicio do Catete, agora “nos bragos do povo”, isto é, pelo voto popular. E de Ié sé saiu morto. Herangas, continuidades, rupturas, mitos Ser ditador ¢ popular nao foi uma caracteristica vinica de Gentlio. Na América Latina ¢ na Europa, ditadores foram adorados ¢ venerados; na Argentina, tivemos Perén com trajetdria parecida. © que fez de Genilio um homem amado, apesar de temida, tem a ver em grande parte com 2 época, mas rambém por ele ter ficado associado a um amplo conjunto de mudangas 62+ O EsABO NOVO modernizadoras do Brasil. Para grande parte da popu- lagio o “salto para o futuro” s6 existiu porque Getilio liderou 0 pais, nao se colocando jamais a hipétese de que grande parte das mudangas na economia poderia tet advindo da pressio das crises internacionais ¢ da vitalidade da economia brasilcira, independente de qualidades excepcionais de um presidente, Essa grande massa pouco questionou o legado ncgativo do Estado Novo, ou seja, 0 retrocesso democritico. O Estado Novo acentuou as estruturas de privilégios 0 corporativismo; fortalecew o intetvencionismo mi- licat, a gestdo autoritéria e a tecnocracia socialmente descomprometida; desconsiderou o Legislativo e o Ju- diciério, Mas também deu apoio a iniciativas naciona- listas 140 20 gosto dos intelectuais brasileiros e da vanguarda modernista, a quem entregou cargos impor tantes, ¢clevou a auco-estima do brasileiro, particular- mente ado trabalhador industsial urbano, que se reco- heceu como cidadao na carteira de trabalho — e no no titulo de eleitor Por tudo que foi visto neste livro, 0 mito Vargas no surgi no vazio. Como a maior parte dos mitos, foi construido em um momento de crise ¢ de grandes mudangas, povoou o imagindrio popular e ajudou 2 formar identidades. Gerou também uma profunda divisio na politica do pais, que nos acompanharia durante décadas: getulismo e antigetulismo passaram a ser duas referéncias politicas para os brasleiros, es- +63 aan cEUNA DARA tando na raiz das principais crises que o Brasil enfren- cou a partir dai, inclusive a de 1964 Estado Novo associou Getilio Vargas 8 ditadura, mas também A politica social e a0 nacionalismo. E essa plasticidade ideolégica que gera uma curiosidade sem- pre renovada pelo Estado Novo! Visité-lo € conhecer parte das razses de nossa grandeza econdmica, de nossas fraquezas politicas ¢ de nossas profundas desi- gualdades sociais ¢ regionais. +64 Cronologia 1935 27 nov “Intentona Comunisea”. Iniia-se um perio- do de fanea perseguigao politica 1937 TDnov Apés federalizar as milfcias estaduais, Vargas 44 um golpe de Estado, dissolvendo © Congresso e outor- gando nova Constieuigio 2dez Decretada oficialmente a dssolugio dos parci- dos politicos 1938 V1 mai Incegralistas atacam © Palicio Guanabara Dois dias depois, Vargas declarava que 0 pur havia rece bido auxllio da Alemanha 1939 Smai Lei de sindicalizagao criao sindicaro tinico por «categoria profissional 2 dee Criado o Deparcamento de Lmprensa e Pro- paganda (DIP), porta-voz autorizado da ditadura, encarte- gado da censura, da organizagio de homenagens ao presi- dence, de manifescagdes cvicas e da radiodifusto oficial 1940 Temai_Anunciado o estabelecimento da Lei do Salé- rio Minimo, para trabalhadores urbanos. Depois de nego- ania CELINA OARALO ciagies com a Alemanha ¢ com os Estados Unidos, o Brasil conseguiu um empréstimo alongo prazo de US$20 milhoes, concedido pelo Eximbank, destinado & construgio da Com- panhia Siderirgica Nacional (CSN). © governo brasileiro concede permissio para que as forgas aéreas norte-ameti- canas pousassem regularmente em territéria nacional ¢ proi- biu as operagécs das companhias aéreas alemd e italiana, Condor e Lati, que tinham linhas no Brasil 1942 (© Brasil adere aos Aliados (EUA, Inglaterra € URS} € rompe telagGes diplomiticas com Alemanha, Itiia ¢ Japio. © rompimento com as forgas do Eixo trouxe conseqiiéncias imediacas: cerca de 19 navios mercantes brasileiros foram bbombardeados pela macinba ale, entre Fevereiro de 1942 ce margo de 1943, © Brasil faz declaracao de guerra contraa Alemanha ¢ a leila 1943 ‘mai Editadaa Consolidagio das Leis do Trabalho (CLT), compilacéo do conjunto de normaslegais que regiam as relagies entre empregados e empregadores 9 set Criacio da Fora Expedicionéria Brasileira (GE), divisio militar que participou da II Guersa, na Iedlia 1944 © Brasil assina os acordos de Bretton Woods, que otiginaram 0 Fundo Monetirio Incernacional (FMI) € 6 Banco Inter americano de Reconstrugio ¢ Desenvolvimen- 10 (BIRD) +66 ‘0 esTAD0 nova 1945 28 fev A Lei Constitucional n.9, conhecida como Ato Adicional, eseabelece eleigbes para a presidéncia da Repiiblica, a Camara dos Deputados, o Senado Federal e as assembléias legislativas. ManifestagGes populares defendem a permanéncia de Vargas no poder, através do slogan “Que- zremos Getilio". © movimento ficou conhecido como Que- 10 out Promulgado decreto-lei antecipando para 0 dia 2 de dezembro as eleigGes estaduais marcadas para maio de 1946 29 out Opasicionistas,liderados pelos generais do Exército Burico Gaspar Dutra e Géis Monteiro, cercam 0 Palécio Guanabara,residéncia do presidente. Vargas assinow sua reniincia formal declarando: “A Histéria ¢ 0 rempo falarSo por mim.” ‘2dez Vargas & eleito deputado federal em sete estar dos « senador, em dois. Optou pelo cargo de senador pelo Rio Grande do Sul 1946 30jan Posse de Eurico Gaspar Dutra na Presidéncia da Repiiblica Zfev Instalados os rabalhios da Assembléia Nacional Consticuinte +97 Referéncias e fontes (Os dados sobre condenagées pelo Tribunal de Seguran- ga Nacional durante o Estado Novo foram retirados de Represito judical no Estado Novo: exquerda e diveita no banco dos réis, de Reynaldo Pompeu de Campos, (Rio de Janeiro, Achiamé, 1982). Para os dados sobre economia, a fonte foi o artigo de Maria Antonieta Leopoldi “Estratégias de agdo em- presarial em conjunturas de mudanga politica”, em Repensannde 0 Estado Novo, organizado por Dulce Pan- dolfie publicado pela Editora da FGV em 1999. Os dados sobre o niimero de mortos da FEB estio em O Exéreito na bistéria do Bras volt (Rio de Janciro/Salvador, Bibliex/Odebrecht, 1998). = 88 Sugestées de leitura © Sobre o Levante de 1935, uma obra de referéncia éa de Paulo Sérgio Pinheico, Euratégia de iluito: a revolu- go mundial e 0 Brasil, 1922-1935 (Sao Paulo, Com- panhia da Letras, 1999). * InformagGes sobre o golpe de 1937 podem ser obti- das, especialmente, em Aspisia Camargo ecalli, O galpe silencioso Rio de Janeiro, Rio Fundo, 1989) eem Helio Silva, O Plano Cohen (Porto Alegre, L&PM, 1980). + Para. politica de realinhamento com os EUA podem ser consultados 0s livros de Gerson Moura, Tio Sam chega ao Brasil (Sao Paulo, Brasiliense, 1987) ¢ Autono- mia da dependéncia (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1980). ‘# Sobre a atuagZo do Tribunal de Seguranga Nacional, a obra mais completa é de Reynaldo Pompeu de Cam- pos, Repressao judicial no Estado Novo: esquerda e direita no banco dos réus (Rio de Janciro, Achiamé, 1982). * Diitrio de Gevilio Vargas (Rio de Janeiro, Ed. da FGV, 1995) é uma boa forite para o dia-a-dia da guerra Para uma visio geral sobre o perfodo, ver Dulce Pan- +69 MAR CELINA DARAUIO dolfi (org.), Repensando o Estado Novo (Rio de Janciro, Ed. da FGv, 1999). © Uma série de obras tratando do integralismo, de sindicatos, industrializaggo, guerra, politica externa, educagio, autoritarismo, anti-semitismo ctc, ence ou- tros temas, também acaba dando contzibuigdes impor- tantes sobre o Estado Novo. Existe ainda um vasto acervo documental sobre o perfodo, especialmente nos arquivos do Centro de Pesquisa e Documentacto de Histéria Contemporinea do Brasil da Fundacio Getu- lio Vargas (CPDOC/EGV), no Rio de Janeiro, onde estao guardados os arquivos de Vargas e de seus principais assessores -10- Sobre a autora Maria Celina D'Araujo € portuguesa de nascimento € brasileira de adogio. Nasceu na Ilha da Madeira, em. 1950, de onde saiu com 13 anos acompanhando a mae € as irmas, que emigraram para o Brasil em 1963. Comesou a estudar ciéncias sociais na USP, em 1971, auge da dicadura militar. No ano seguinte mudou-se para o Rio e concluiu 0 curso na UFK, Fez mestrado € doutorado em ciéncia politica no Instituto Université rio de Pesquisas do Estado do Rio de Janeiro (luper), € pés-doutorado nos Estados Unidos Ainda estudante, comegou a estagiar no CPDOC! FGV, no Rio de Janeiro, instituigao onde ainda traba- Jha; ali foi desperrada para a pesquisa histérica e para as questdes centrais da politica brasileira. O passo seguinte foi o magistério, atividade que iniciou em 1978 na UFF, onde ainds leciona ciéncia politica Maria Celina tem se dedicado ao estudo da histbria politica do Brasil contemporineo ¢ publicou varias obras nesse campo, entre elas O segundo governo Vargas (Rio de Janeiro, Zahas, 1982, l*ed. / Sao Paulo, Anica, 1994, 2ed.), Sindicatos, carisma e poder: 0 P78 de 1945 14 1965 (Rio de Janeiro, Ed. da FGV, 1996), A Era Vargas ms ania CRUINA DaRAUIO (Sto Paulo, Moderna, 1997) e Ernesto Geisel, depoi- mento, em co-autotia com Celso Castro (Rio de Janei- ro, Ed. da FGY, 1997). Tem participado de estudos sobre as ditaduras militares no Brasil e no Cone Sul e co-organizado varios livtos sobre esta tematica, E casada ¢ tem dois filhos, Luana e Caetano. “2 Colegio Descobrindo o Brasil direcao: Celso Casiro ‘VOLUMES PUBLICADOS: Os intelectusis da educagio Helera Bomeny 0 Estado Novo Mara Celina OAraujo Partdos politicos no Brasil, 1945-2000 litoral brasileiro Madu Gaspar 0s indios antes do Brasil Carlos Fausto Rogerio Sch 0 Brasil no Império portugus Da Bossa Nova & Tropcdla Jalna Rredoe ie Carloetiguciredo Santuza Cambrai Naves Basil de todos os santos Ditadura militar, esquerdas Ronald Vainfas esocedade ‘lana Beatriz be Soura Daniel Aardo Reis 'Andependncia do Brasil No pals do futebol lara Us © Souza Lai Hentque de Tledo 0 Impétio em procissto 0s evangéics Lia Morte Seiarez Cara Malia Escravido e cidadania no 0 Brasil da Nove Era Brasil monérquico José Gutlherme Magnani Hebe Maria Mattos Proclamasio de Replica fase res VOLUMES A ele épaque amardnica ae ; inturas upestres no Brasil ‘na Mari Daou tebe Cdige Civil ¢ eidadania Kila Grinberg Fotografia e sociedade no Impér Pedro Vasques 0 Brasil dos imigrantes Lede chin Pen Tuc ip Ove Appt do Cig Fea 0 movimento operirio na : ss Primeira Replica ects sects me Bel Claudio Batatha 0 pensamento nacionaliste 0 mundo psi no Brasil autoritério Jane Russo Boris Fausto Os falares do Brasil Modernismo e misiea Yonne Leite e Dinah Cllou brasileira Os indios e 0 Estado Elizabeth Travassos Roque de Barros Laraia

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