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Sesedo Tematica 14 Reminiscéncias e rupturas entre o batuque do Rio Grande do Sul e a religiao tradicional Yoruba Hendrix Alessandro Anzorena Silveir * Resumo Esta comunicacao ¢ embasada na monografia homénima apresen- tada a disciplina de Introdugao as Ciéncias da Religiao, ministrada pelo Prof. Dr. Oneide Bobsin, no curso de Mestrado Académico em Teologia, que cursamos, ¢ trata da religiéo tradicional Yorithd em seu locus espaco-temporal, a religiao de matriz africana estruturada no Rio Grande do Sul denominada Batugue, eas relagoes de proximidade e distanciamento entre elas. Tem como objetivos se inserever numa tentativa de levantar dados epistémicos numa comparacao entre a RTY e 0 Batuque, procurando estabelecer reminiscéncias e rupturas no que tange a varios processos. Devo salientar, também, que este tra- batho tem como finalidade um avango de ordem pessoal e que serve de primeitos passos para uma maior compreensio do fenémeno que € a transposi¢ao da RTY da Nigéria ao Rio Grande do Sul. A metodo- logia 6a comparativa entre pesquisa bibliografica ¢ nossa experiéncia vivencial como sacerdote do Batuque. Para esta comunicacao apresen- taremos elementos teoldgicos dessa tradicio e as do Batuque em com- Bolsista CAPES. Mestrando em Teclogia pelas Faculdades BST. E-mail: hendeixsil veiraayahoo.com br 1787 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil paragao, Estudando a RTY, tendo por base os fatores politicos, eco némicos, sociais, histéricos e religiosos percebidos nesta civilizagao & época pré-colonial, assim como a percepgio da reminiscéncia destes mesmos aspectos na sociedade afro-americana como um todo, pode- ‘mos concluir que, de fato, é perceptivel os aspectos que permaneceram € os que se transformaram com a diéspora, estes iltimos principal- mente pela cristianizagao, ocidentalizagao e embranquecimento dos vivenciadores. Palavras-Chave: Religiao Tradicional Yoruba. Batuque. Histéria do negro. Histéria da Africa. Histéria do Rio Grande do Sul. Introdugao Ingressamos no Mestrado em Teologia das Faculdades EST com a intengio de nos aprofundarmos nas reflexées teolégicas sobre a reli gio africana, O que nos levow a esta decisto foi a nossa propria baga- gem de conhecimentos sobre o tema, pois somos adeptos do “Batu que” ~ a religio de matriz africana estruturada no Rio Grande do Sul Este artigo se inscreve numa tentativa de levantar dados epistémi- cos numa comparagao entre a Religido Tradicional Yortibd e o Batuque do Rio Grande do Sul, procurando estabelecer reminiscéncias ruptu- ras no que tange a varios processos. Devo salientar que este trabalho tem como finalidade um avango de ordem pessoal, e que serve de primeiros passos para uma maior 1788 Sesedo Tematica 14 compreensio do fendmeno que é a transposisio da religido yoriibd' da Nigeria ao Rio Grande do Sul. ‘A questo que sempre nos inquietou é de que forma a Religiao Tra- dicional Yorithd se apresenta no Batuque? Quais ritos, mitos e compre- ensées de mundo se mantiveram e quais foram perdidas? O sentido da religigo se manteve o mesmo com a diéspora? Levantamos a hipétese de que o Batuque guardou varios elementos da Religiso Tradicional Yoritbd, mas que perdeu outros devido ao processo histérico ao qual foi submetido, como a cristianizagio, a ocidentalizagao e o embranqueci- mento dos vivenciadores. Como referencial te6rico utilizaremos os fundamentos hermenéu- ticos do que chamamos de exunéutica (SILVEIRA, 2013, no prelo), pois: ‘A exundutica é a forma filos6fica africana de interpretacio, Parte de princfpios aicersados na afroteologia, que Ihe garante ‘uma visio de mundo centrada no esforco de reflexio teolégica 1_As palavras em lingua yorths que figuram neste trabalho estdo esctitos segundo obra "Uma aboriagem modema ao yoriba” (Edigio do Autor, 2011), de linguista nigeriano Gideon Babalgls Mdw, Utilearos a ortografia moderna a fim de tornat mais compreensivel a lingua yordbé que ¢ tonal ¢ palavras idénticas porém pronun- ciadas de forma diferente se referer a coisas diferentes, Por exeroplo: ows (dite), wo (negscio), wd (endo), ows (vassoura), owd (nome de uma cidade nigeriana), O alfabeto yoriba é constituido por 25 letras: ABDEEFG GBHIJKLMNOQPRSS TUWY. Consoantes e vogais tém, em geral,o mesmo valor que em portugues, porém ‘a vogal E prontincia-se sempre fechada, como em “ema”, a é sempre aberta como em va". G tem som gutural como em "gado",e nunca como J. GR éexplosivo, H é sempre pronunciado e tem som aspirado como om “hell” (inglés). A vogal 0 é fechado, como em ‘ovo" € 0 éaberto como em “p6". Rtem um som brand como em “rest” (inglés), munca como RR. A consoante S é sibllante como em “sistema” e §¢ chiada como em “cara” ou “chimarrio’,W tem som de U eY tem som del. Nao existem as concoantes ©.Q,V,XeZ, Aindicacio do tom das silabas ¢ feita pela acentagao: grave indica tom baixo (dé), sem acento é tom médio (xé) eagudo indica tom alto (mi. 1789 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil sobre a veligiio de matriz africana, Busca na afrocentrcidade, na negritude € no pan-africanismo a nogio de localizaséo das formas de ver o mundo ¢ de se ver no mundo, dando vor as formas africanas de questionamento, concepioe reflexio. Ba experiéncia africana que proporciona a exunéutica Utilizaremos muito a obra de Pierre Fatumbi Verger, fotdgrafo e etné- logo francés que viajou o mundo e se estabeleceu em Salvador, na Bahia, onde conheceu o candomblé. Depois foi a Africa para buscar estabelecer ‘um comparativo entre cé el4, Para tanto fot iniciado em ambas as tradi- ¢8es religiosas para assim poder ter acesso a informagGes restritas. Sua obra “Orixés: deuses iorubas na Africa e Novo Mundo” (Corrupio, 1997) trata deste empreendimento rico em fotos e textos de sua autoria, Outra autora muito utilizada no trabalho é Juana Elbein dos San- tos, etnéloga argentina radicada em Salvador, iniciada no candomblé Sua laureada tese de doutorado pela Sourbonne, “Os nagé e a morte padé, as@se e o culto égiin na Bahia” (Vozes, 1986) nos traz importan. tes informagées coletadas também no transito Brasil-Africa. Defende atese de que as religides afro-brasileiras mantiveram a africanidade de suas origens & despeito de todas as tentativas de sua destruig: Propomos neste trabalho estabelecermos uma relagao entre a reli gido e a cultura yoriihd nas diversas esferas em que esta se manifesta = seja no campo politico, econdmico, social e religioso ~ a partir de lei- turas de autores que pesquisaram diretamente no territ6rio dessa etnia africana, e compararemos com nossa experiéncia de vida religiosa no Batugue do Rio Grande do Sul confrontados em Norton Corréa, Para atender todos os aspectos do trabalho, propomos o desenvolvimento do tema em trés partes: na primeira trataremos de relacionar a cosmo- 1790 Sesedo Tematica 14 visio yoriibd, suas divindades e aspectos inerentes a religiosidade desse ovo; na seguinte exporemos a vida material desse povo e sua relagto com 0 sagrado; e na terceira falaremos sobre a didspora dessa religiéo e sua formagio no Rio Grande do Sul, j4 em comparagio com a africana 1 As divindades: mitologia, espiritualidade, liturgia Para os yoriibd a existéncia transcorre simultaneamente em dois planos: no Ayé e no Orun. O Ayé é 0 mundo material, palpavel, onde vivem os ara-Ayé, os seres naturais. run é 0 mundo imaterial, trans- cendente, onde vivem os Ara-Orun, os seres sobrenaturais Quanto ao Orun, Santos (1986, p. 72) é insistente © espago run compreende simultaneamente todo 0 do aiyé, terra e céu indlusos, e consequentemente todas as entidades sobrenaturais, quer elas sejam associadas ao ar, terra ou as aguas, que todas sioinvocadas surgem da terra assim que Ara-Grun sio também chamados irinmalé. E no Grun que se encontra Olédamaré (ou Qlgrun, Oba-Grun, etc), 0 Ser Supremo dos yoribd e detentor dos poderes que possibilitam ¢ regulam toda a existéncia, tanto no Grun como no Ayé, Esses poderes foram transmitidos para os Irdinmalé, de acordo com suas fungées. Os Iriinmal¢ sio divididos em dois grupos: os quatrocentos Iriinmale da direita eos duzentos Ininmalg da esquerda?. Contudo os nimeros assinala 2. sentido utilizado para “direita”e “esquerda” é muito profundo eexigeum estudo pormenorizado que nfo caberia neste trabalho, A obra jé citada de Juana Elbein dos Santos ¢ excepcional eindispensivel para essa compreensio, 1791 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil dos nio significam, para os yorihd, nimeros regulates, limitados, mas sim, que o mimero duzentos represente, simbolicamente, um niimero grande e ‘© quatrocentos um nlimero muito grande. (VERGER, 1997, p. 21) Os quatrocentos Ininmale da direita sio os Orisa, nao os Orisa como sao conhecidos no Brasil, mas sim um grupo mais restrito. Se- riam os Orisa Funfun, ou Orisa do branco, mais conhecidos no Brasil como OshAla. Na Africa sao chamados Origarilé (grande Oris2), Oba- tld (rei do pano branco), ou ainda Obarisa (rei dos Orisa). Sao divin- dades relacionadas & criagio do mundo e dos homens Segundo Verger (1997, p. 254) “os Orisa funfun seriam em nimero de cento e cinquenta e quatro”. Estes Orisa sio cultuados, cada um, em uma cidade diferente, onde ele pode ser o padroeito dessa cidade, ou sum Orisa secundétio, Entretanto, mesmo nao sendo o padroeiro da ci- dade ou comunidade, ele tem grande importancia gragas a sua relagio com a criacéo, mantendo, assim, uma posicio de destaque, possuindo ‘um ritual préprio e sacerdotes préprios também’. Desenvolveram-se rituais muito semelhantes para estes Oris nas diferentes cidades em que se apresenta, o que nos levaa crex que estes Orisa podem ser os desdobramentos de um tinico Orisa (Orisaila) cul tuados em diferentes locais, e nao divindades diferentes. Como divindades do branco, tudo o que for branco Thes pertence. $6 se vvestem com essa cor e seus pertences séo marcados com pintas brancas. Os albinos, por terem a pele branca, sao também consagrados a este Orisa Estes Origa se apresentam como sendo muito velhos, Ientos e sé bios. Sao representantes do poder fecundador masculino (SANTOS, 3. Erm todas as cidades yortbi, independentemente do Irinmal¢ padrocito,cxistem ‘templos para os Orisa Funfun e para Esi, com ritos e sacerdotes dstintos. 1792 Sesedo Tematica 14 1986), sendo considerados os pais da humanidade. Também sio consi derados como pais dos duzentos Ininmale da esquerda. Entao condu- mos que os Orisa Funfun sio os grandes senhores deste mundo (Avé) e do outro também (Orun). Ortinmila & outro dos Orisa funfun que tem particularidades bem diferenciadas dos demais, Possui as mais altas posicées no pan- teio yoriibd. Ea divindade da Histéria e do destino dos homens. 0 sacerdote de Oninmild é denominado Babéldwo, o pai para tudo. Ele utiliza o oréculo de If para conhecer o destino dos homens mulheres que 0 procuram. Os yorithd nao fazem viagens longas sem consultar antes 0 Babdldwo. Também o consultam para saber 0 sexo dos filhos antes de nascer, e qual 0 seu destino. Dependendo da resposta dada pelo ordculo, cle tera sua vida conduzida para se tornar um mercador, lavrador ou sacerdote, antes mesmo de seu nascimento. Ontinmild € o “simbolo coletivo dos Irunmalé” (SAN- TOS, 1986, p. 167), por apenas comunica-se com eles através de consulta em um sistema .0 nao se manifesta em seus iniciados. Ele complicado de simbolos e apetrechos. No Brasil o mais usado é 0 jogo de bitzios. (Os duzentos /runmale da esquerda so todas as outras divindades Ova, Sangé,... e Egin (ancestrais) —e sao chamados de Ebora. Os Ebora sao divindades menores, interme cultuadas pelos yoriibd ~ Ogu didrias entre Qlprun e os seres humanos. Alguns Ebpra sao objetos de culto de toda uma cidade. Quando essa cidade tem um soberano, os Ebora servern para reforcar a autoridade do lider, que pode ser um rei (ba), um rico mercador (Bale) ou um chefe de aldeia Entretanto, a grande maioria dos Ebora esta intimamente ligado nogio de familia, Para Verger (1997, p. 18) 1793 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil A familia numerosa, originéria de um mesmo antepassado, que engloba os vivos e os mortos. O Orisa (Ebpra) seria, em principio, um ancestral divinizado, que, em vida, estabelecera vinculos que Ihe garantiam um controle sobre certas forcas da natureza, como 0 trovio, o vento, as éguas doces ou salgadas, ou, entio, assegurando-Ihe a possibilidade de exercer certas atividades como a casa, o trabalho com metais ou, ainda, ad- quirindo o conhecimento das propriedades das plantas e de sua utilizagio, © poder, ase, do ancestral- Orisa teria, apés a sua morte, a faculdade de encarnar-se momentaneamente em um de seus descendentes durante um fendmeno de possessio por cle provocada. Segundo esta teoria, entao, os bora seriam seres humanos excep- cionais que nao poderiam simplesmente morrer, mas sim, transcender ‘a morte de forma que nio sobrasse nem mesmo um corpo para ser enterrado e esta seria, talvez, a diferenca entre os Ehora divindades e os Ehora ancestrais. Essa compreensao da natureza dos divindades confrontada por Santos que diz 0 que segue: Alguns autores sustentam que os driga s4o ancestrais divini- zados, chefes de linhagens ou de clas que, através de atos ex- cepcionsis durante suas vidas, transcenderam os limites de sua familia ou de sua dinastia e de ancestres familiares passaram a ser cultuados por outros clas até se tornarem entidades de calto nacional, Nao é 0 nosso propésito discutir aqui os méritos dda hipétese de uma longingua génese humana dos risa. O que ros importa, no quadro do presente trabalho, é descrever e in- texpretar os fatos e o sistema tal qual os Nagé hoje os vive € compreendem, Sob esse ponto de vista, a separasao das entida- 1794 Sesedo Tematica 14 ddes em duas categorias bem definidas é terminante: de wm lado 0s drlga, entidades divinas, e do outro, as ancestrais, espiritos de seres humanos. Abrir uma discussie sobre a origem humana das divindades seria debater a génese das teogonias, penetrar no dominio da teologia, do gnosticismo ou da psicologia e, em todo caso, abrir ‘um interrogante que atinge todas as religides. (1986, p. 102) Como estudante de Teologia que somos, acreditamos estar instru- ‘mentalizados para avaliar tanto a hipétese defendida pela maioria dos antropélogos aqui representados por Pierre Verger, que define que os Orisa sao ancestrais divinizados, quanto a defendida por esta etnéloga que acreditamos conseguiu teologizar em seu trabalho como um todo. Ficamos, entéo, muito inclinados a concordar com Santos de que os Orisa e os Ehora sio divindades criadas por Olédiimar® para exerce- rem um papel especifico na manutengéo da Criagio. Grosso modo, pode-se dividir 0 estudo dos Ebora em pequenos grupos para melhor entendimento. Essa divisao se dé pelas similarida- des de arquétipo e fungdes sociais dessas divindades. Acreditamos que podemos agrupar alguns Ehora como “divinda des civilizatorias”, pois seus cultos sao indispenséveis para 0 bom andamento da vida cotidiana das pessoas, Assim temos Oké como © Fbora que propicia a agricultura, o crescimento dos vegetais e a protecao da plantaao; Ogin é o Ebora relacionado a metalurgia, a0 trabalho com o ferro, a forja e aos instrumentos que proporcionam um bom desempenho no trabalho no campo (enxada, ancinho, etc.) na vida doméstica (facas e facées), religiosas (facas sagradas para rituais imolatérios) e também armas como o facio de guerra (id4) ea 1795 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil langa (oko), sendo um dos pouquissimos Ebgra cultuados por quase todo 0 territério yoribd. Ode é a divindade dos cagadores yoribé: Pede-se sua protecio quando o cagador se embrenha na floresta em busca do alimento. Também percebemos dois Ebora que estao inti- mamente vinculados a satide e, subsequentemente, a manutencio da vida: Osdnyin é a divindade das plantas medicinais e litargicas; Sanpdnnd & o Ebora da doenca, das pestes, das doencas de pele, da variola por extensio de todas as doencas infectocontagiosas. cultuado para que sua ira nunca se abata sobre 0 povo mantendo, assim, as doengas longe. Outro grupo seria o das divindades dos rios e lagos, divindades fe- mininas vinculadas a fertilidade da terra, da agua, dos animais ¢ dos préprios seres humanos: Qya é a divindade do rio Niger e tem o ape- mée / mesdn = nove) em alusio, talvez, aos nove lido de Yansan (ly bracos do delta desse rio; bd é a divindade do rio de mesmo nome, assim como Osun que ainda carrega predicados de beleza, riqueza ea protecao das criangas desde o ventre até a idade de 7 anos; Yemojd 6a divindade do vio Ogun (nao 0 Ebora); divindade dos pantanos, Nand Buruku est de certa forma vinculada a questao da bioética e da esca tologia. Alguns Fbora, por serem ligados a uma cidade ou a0 coletivo, rece bem tratamento especial, tendo sacerdotes e rituais especificos. Des ses podemos destacar Bsit, que pertence tanto aos Irunmalls da diveita quanto aos da esquerda, pois serve de veiculagao da forga imaterial divina, o Ase, entre os Orisa e os Ebora, sistema” (SANTOS, 1986, p. 75). Por isso ele é sempre o primeiro a ser cultuado nos rituais. E também temos Sangd, o ancestral mitico dos reis da cidade de Gyo, mas como Ebora da justiga, do trovao e do raio, ‘intercomunicando todo 1796 Sesedo Tematica 14 castigador de mentirosos, infratores e ladroes, acaba sendo represen. tado também com outros nomes em outras cidades Entre os Ebora estio, também, os Egtin, os ancestrais que, assim como os Irunmale, sao divididos em dois grupos; os da direita, mascu- ba ou lya- linos, os Babd-égtin e os da esquerda, femininos, as ly4- mi Osdrdnga. “Enquanto os irtinmale-entidades-divinas, os drisa, estdo associa~ dos a origem da criagio e sua prépria formagio e seu ase foram emana- s6es diretas de Olorun, os ininmale-ancestres, os égtin, esto associa- dos a histéria dos seres humanos” (SANTOS, 1986, p.102) Os gin masculinos sio cultuados pela sociedade Egiingtin, onde ‘tém seus assentamentos coletivos, ou seja, que os representa a todos, ¢ os assentamentos particulares, que representam pessoas falecidas. Quando da materializacao desses espiritos, recebem roupagens e no- ‘mes diferentes que os particularizam. 0 sacerdote chefe dessa socieda- de é 0 Babaojé ow Alapini, que regula as acées dos figin materializados ‘mediante 0 uso do atori, uma vara fina e longa que bate constante mente nos Egtin. Na sociedade Geledé sao cultuados os ancestrais feminino: spo derosas ly4-mi Oséréngd. A organizacio dessa sociedade é desconhe- cida, no entanto se sabe que os assentamentos das iyé-mf Osdrdnga sao sempre coletivos, e quando da sua manifestagao representam a coletividade Segundo Verger (1997, p. 88), a semana yoriibd tem quatro dias, sendo que um deles é chamado (se. Ele traduz Os¢ definindo-o como o dia consagrado ao Or gos (Ose kékeré) onde sao renovadas as oferendas incruentas e os grandes domingos (Ose sild). Neste iltimo sao realizadas procissées como domingo a. Ha os pequenos domin 1797 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil onde o assentamento do Origa é lavado com agua da nascente de um rio; e sactificios de animais acompanhados de grandes festas coletivas, muitas vezes patrocinados pelo rei do local ou dono de mercado, onde os Orisa podem se manifestar em seus neéfitos, dancar entre seus des- cendentes e abencoar todas as pessoas que estiverem presentes. Existem varios tipos de oferendas destinadas as divindades e aos antepassados. Os yorttbd eram agricultores ou pastores, por isso as oferendas se constituirem da mesma forma. Quando os yortibd faziam a colheita, o primeiro prato era para a divindade da familia ou da ci- dade ou comunidade. Da mesma forma quando pretendiam fazer, por exemplo, uma comida a base de galinhas. Antes de comer 0 animal, de- via-se sacrificé-lo aos Orisa, para, dai sim, poder consumir sua carne. Para os yorithd todo ser vivo foi criado por Osidlé, portanto sua vida devia ser respeitada. Para poder se alimentar, 0 yoriibd deve primeiro devolver aos Orisa o Ase, a energia vital divina, assim ao consumir a carne do animal, seja uma galinha ou um carneiro, ele estaria em comunhéo com a prépria divindade. Da mesma forma ocorre com os vegetais. A terra, da qual se planta e se colhe; da qual se extai o ali- mento; é sagrada, pois foi Oditdiiwa quem criou. Os homens podiam uusé-la, mas nunca possutla AAs grandes festas piblicas sao patrocinadas pelos reis, como devo lugao dos tributos pagos pelo povo. Nas festividades, sio homenage ados os Origa patronos da cidade. Nesta ocasiao, vem autoridades de cidades vizinhas congratular 0 rei e seu povo. Os sacerdotes fazem dos sacrificios um grande banquete péblico, acompanhado de muitos pratos “verdes” (legumes, verduras e frutas), onde o povo se farta em agradecimento as béngios das divindade e de seu descendente vivo, o rei 1798 Sesedo Tematica 14 Os préprios Origa se apresentam na festa: primeiro Egit se mani: festa no olupondn, seu sacerdote; depois ver os outros Orisa, Ogun, Sangé, Ova e, por fim, Os&éla. Todos se curvam para receber as benes- ses dos que vieram do Orun especialmente para o festejo. Existem dois grupos bem definidos durante os festejos. Os sacerdo- tes, Alase, sto saudados kabiesi, a mesma saudagio aos reis, o que nos ‘mostra a importancia desse cargo. Depois temos os lyawérisa , as “es- posas” do Origa. Apesar desse nome, os lyawériga ou lyaw6, podem ser tanto homens como mulheres. Isto porque o neéfito est sujeito ao Orisa do qual é consagrado, nao tendo nenhuma outra conotasio. Os lyawé séo em grande niimero e foram todos iniciados por um Altse. Em alguns casos, 0 Orisa pode se manifestar em varios lyaw6 ‘a0 mesmo tempo; em outros lugares, apesar de todos serem susceti- veis a manifestacdo do Orisa, ele manifestara apenas em um. 2 Sistema sécio-politico A regido dominada pelos yortibé vai do oeste do rio Niger (sudoeste da Nigéria) até o sul e regiao central do Benin. Essa regio tem uma geografia bastante singular, com as encostas banhadas pelo Oceano Aulantico. Na parte nigeriana observamos trés regides: um cinturdo costeiro, de manguezais e areas pantanosas; para alm das terras baixas da cos, ta, surge o vale do rio Niger; a regiao seguinte é a savana, que aleanga a area semidesértica do Sahel3, no extremo norte. A costa de Benin é uma barra arenosa e regular, batida por fortes ondas e sem portos naturais. Atrés da barra, ha uma série de lagoas de 1799 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil pouca profundidade nas quais desguam 0s rios. Em direrao ao norte, estende-se uma regio de terras baixas bastante férteis, Ao longo da costa o clima é equatorial, com fortes precipitasdes. Até o norte, a massa de ar continental tropical leva ventos secos e car- regados de poeira; a temperatura e as precipitacdes, que sio muito me- nores que no sul, variam com a estacéo. O sul esta coberto pelos restos de uma densa selva tropical. Na montanha e na savana predomina uma pradaria de drvores re- sistentes como o baoba e o tamarindo; no noroeste do Sahel prevalece uma vegetacio semidesértica, Nas regides pantanosas e de selva po- dem se encontrar crocodilos e serpentes. Os grandes mamiferos africa- nos desapareceram. Restam alguns antilopes, camelos e hienas. Como vimos na parte anterior, os yortibd nao tinham a nogdo de propriedade do solo por que ele era obra das divindades, portanto nao pertencia a ninguém e seu uso era coletivo. De fato Giordani (1993. - 36) diz que é “desta pouca valorizacao do solo [que] deflui uma im- portante consequéncia de ordem econémica, social e politica: 0 maior valor atribuido ao trabalho humano, 4 m: que trabalham é mais importante que possuir terras”. Entretanto, a y-de-obra. Possuir homens eseravidio nunca foi um modo de produsio na Africa pré-colonial. 0 escravizado era entendido como mais uma pessoa para trabalhar a ter 1a, De fato, 0 escravizado trabalhava lado a lado com seu senhor, que nao se percebia como seu dono. Aos poucos os povos que vivam na regiao dos yoritbd, foram aban donando a caca e a coleta, para se dedicarem ao pastoreio e ao cultivo, principalmente, de tubérculos. Todos sabemos que 0 trabalho com a terra 6 arduo, sacrificante, e muitas vezes improdutivo, quando de ma- nifestacdes violentas da natureza, Por isso os chefes de familia possui- 1800 Sesedo Tematica 14 ‘am muitas mulheres, para, assim, terem muitos filhos para trabalhar & terra, As vezes os filhos nao eram suficientes, entao se faziam guerras para trazer um espélio de cativos para aumentar a producio, Mas sempre frisamos que, nessa época, nao houve um modo de produgao escravista, mas sim uma relagao escravista de producio, muito semelhante a escravidao patriarcal dos gregos. Aagricultura era a base econémica das comunidades, quase toda de tubérculos tais como: inhame, taro® e mais tarde a mandioca; também cultivavam o sorgo’, varios tipos de arroz, bananas ¢ feijao; a explora- ¢a0 da noz de cola, do amendoim e do dendezeiro era para a fabricasao de éleos (que mais tarde lubrificariam os maquinérios britanicos), as- sim como a palmeira O surgimento da agricultura, todavia, nao extinguiu outras formas de subsisténcia. O cacador ocupa um lugar de prestigio na sociedade e, frequentemente, os reis se legitimam como descendentes de gran- des cagadores. A pesca, obviamente, também fazia parte do cotidiano yorithd. Bxistem muitos rios ¢ lagos na regiao, além do mar que pro porcionava grandes quantidades de pescado. A coleta também resistiu, contudo, se referia nao s6 a vegetais, mas também a de origem animal ‘Lagartas, formigas, gafanhotos e tartarugas, bem como mel, nenhum deles desprezado na luta diaria pela subsisténcia” (PARKINGTON apud GIORDANT, 1993, p. 140) Todos esses artigos tinham relagdes com as divindades, de forma que a produgio era autorregulada para nao desagradé-los. Os produtos eram oferecidos em um mercado cuja importancia grande entre os 4 Espécedeinhame branco. 5. Espécie de milho pequeno, milhete 1801 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil yoruba, tendo o seu dono um titulo comparavel ao de um soberano. Verger nos da a seguinte explicagao: © mereado, ma regio yorabi, tem a mesma fensto do Agora dos greges oxo Fortin dos romanos: um higar deren, onda todos os acontecimentos da vida pablica e privada sto mostra- dos ¢ comentados. Nio hé nascimento, casamento, enter, festa organizada por grupos restritas ou numerosos iniciagao ou ceriménia para os Origa, que nao passem pelo mercado. (WERGER, 1997, p.141) Contudo a relaao mercadolégica nao é de compra e venda, mas sim de troca, permuta, escambo. Desde 0 ano 1000 ja se contam diversos reinos yortthd. Cada um centrava-se numa cidade-Estado onde familias de agricultores, sacer dotes, comerciantes e artifices viviam sob a soberania de reis locais, que acreditavam ser descendentes de Odiidiiwa. Os yonthd possufam uma organizagao politica semelhante as cida~ des-Estado gregas, como assinala Mario Maesti (1988, p. 54). £ im portante entendermos que nunca houve uma unidade politica bem definida, e a designasao de Império yonibd & equivoca. Os yoritbd constituiam, verdadeiramente, uma unidade cultural e tinham liga s8es religiosas, persistentes ainda hoje. Basil Davidson (1981, p. 126) afirma que: A cidade de tf cebidas todas as outras cidades yoraba. Cada uma destas cida rnou-se o modelo segundo o qual foram con des era dividida em bairros governados por um chefe seccional, Cada uma das cidades possutia os seus nichos sagrados, 0 seu ppalicio real, as suas pragas de mercado, os seus lugares de reu- 1802 Sesedo Tematica 14 rio, onde o governo da cidade podia tratar dos seus assuntos € © povo discutir as novidades do dia. Cada uma delas tornou-se famosa pelos seus artifices, que trabalhavam em diversos off cios. Uns especializavam-se na tecelagem e tintura do algodao, outros na metalurgia ou no comércio longinquo. Desta maneita os muitos reinos dos yordbé estavam unidos por uma rede de crengas e interesses comuns, As cidades-Estado eram governadas pelos reis que organizavam, principalmente, as relagdes entre as pessoas. Para isso, ele possula ‘uma série de dignatarios que formavam sua corte. Os reise as sacerdo- tes vivem dos tributos cobrados 20 povo. Esses tributos sio modera- dos, pois nao havia um poder coercitivo forte. As pessoas acreditavam gue o rei era o descendente vivo da divindade patrona da cidade, dai os tributos serem pagos de maneira espontanea. Essa crenga é embasada no mito sobre a origem dos yoribd*. Entretanto, por trés desse mito, existe uma historia que alguns autores defendem ser verdadeira. Se gundo Verger (1997, p. 253): (Qbatala teria sido o rei dos igbds, uma populagdo instalada perto do lugar que se tornou mais tarde a cidade de If. (..) Durante seu reinado, ele foi vencido por Odadiiwa, que enca becava um exército, fazendo-se acompanhar de dezesseis per sonagens, cujos nomes variam segundo os autores. Estes sio conhecidos pelo nome de awon agbagba, “os antigos". Odiidiowé, apés ter se instalado como rei de /fé, mandou seus filhos conquistarem outras regides, criando varios reinos ligados a Ifé. Apés ‘a sua morte, a figura de Odiidiawa se confundiu com a de Osadld e aca- 5 Conforme descrito na parte anterior. 1803 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil bou sendo cultuado como um Orisa, assim como seus fillos, reis em outros locais, deixando seus filhos como reis que se sucedem, geracio apés geragao, até hoje. A religiao yortbd era uma espécie de politica pratica. Da mesma forma que outorga o poder aos reis, também regula a sua administra ¢40, O rei que for entendido como mau, ot. seja, que permitiu que sen timentos mundanos influissemn no seu governo deixando o bem estar de seus siiditos em segundo plano, seri, de acordo com as normas es tabelecidas pelos ancestrais, destituldo de seu cargo pelo proprio povo. Ifé, ao sul de Oyo, é a cidade sagrada, sede do Oni, rei do local e chefe religioso dos yoriibd. A soberania politica pertencia a0 Alafin que residia em Oyo, mas seu poder podia ser extinto pelo ogboni, espécie de senado de notaveis. No final do século XVII, Oye havia agregado ao seu reino, grande parte da regio oeste do rio Niger, o norte da floresta e os bosques es- parsos do Daomé. Esse reino, convencionalmente chamado de Império de Oyo, duro mais de cem anos Embora os yoriihd fossem predominantemente agricultores, eles ‘nao moravam na ro¢a. Moravam nas cidades e iam, todos os dias, tra- balhar nas lavouras que ficavam a alguns quilémetros da cidade. Anoi- te voltavam para seus lares. Suas vidas eram ditadas pela religiao. Nao havia ambigées politicas ou mesmo comerciais. Verger diz que: Jno momento do nascimento de uma crianga, os pais pedem a babalaé para indicar a que odu’ a crianga ests ligada. O odu 7 Signos de Tf, 0 orsculo sagrado. Sio historias clasifcadas nos 256 odus, exo conjunto forma uma espécie de enciclopédia oral dos conhecimentos tradcionais de povo iorubs. 1804 Sesedo Tematica 14 a a conhecer a identidade profunda de cada pessoa, serve-lhe de guia na vida, revela-the o Origa particular, ao qual ela deve eventualmente ser dedicada, além do da familia, edé-Ihe outras indicagbes que a ajudardo a comportar-se com seguranga e su cesso na vida. (VERGER, 1997, p. 126) © Babéléwo afirmava o que a crianga se tornaria, Um artifice, mercador, sacerdote ou agricultor. De certa forma 0 Bahdldwo, mais importante do que adivinhar o destino dos homens, organizava a so- ciedade de forma a manter a coesio social e politica das comunidades. Dai o cargo de Babdldwo ser tao importante quanto o do préprio rei. Os povos da Africa ocidental, no geral, sdo muito hospitaleiros, alogres e festeiros. aspectos que, com certeza, trouxeram consigo da Africa para as Américas e principalmente para o Brasil, onde criaram razes formando a caracteristica alegria do povo brasileiro, 3 A didspora: o Batuque do Rio Grande do Sul Religido afro-brasileira é 0 termo utilizado como designativo das cul- turas religiosas africanas no Brasil. A religido yortibé fora da Africa teve que se adequar nova situagao geogrética e social, o que fez. surgir em cada regiao do Brasil uma forma estrutural diferente , embora se man- tenha a esséncia dos cultos. Assim surge na Bahia o Candomblé, o Tam- bor-de-Mina no Maranhao, o Xangé em Pernambuco, a Macumba® no Rio de Janeiro, e, finalmente, no Rio Grande do Sul, temos o Batuque. 8 Macamba €o nomede um instrumento de percussio originério de uma etnia ban ‘tu e que identficou a religito dessa origem no estado do Rio de Janeiro, Posterior ‘mente, devido a demonizasio do termo pela Igreja Catslica, passaramaadotar onome Candomblé de Angola, por julgarem que é mai respeitado pela sciedade brasileira 1805 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil A palavra “batuque” tem origem provavel no termo kubat ‘ku que significa “nesta casa aqui’, na lingua kimbundo de Angola. Com a per- ‘manéncia da palavra em canticos populares acompanhados de tambo- res, logo foi aportuguesado assimilando-se pelo verbo “bater”, Contu- do quem chamava as cerimonias afro de “Batuques” era a sociedade branca devido ao barulho provocado pelos tambores. Os praticantes ‘também chamam de Nagao como forma mais respeitosa, pois, geral- mente, 0 termo Batuque é utilizado pejorativamente, com intengées ofensivas. Antropélogos como Norton Corréa e Ari Pedro Oro acreditam que foi trazido pelos negros escravizados oriundos do nordeste que vie- vam trabalhar nas charqueadas em Pelotas ow no cais de Rio Grande, jé que nos portos do estado nunca ancoraram navios negreiros. Dai vem ara Porto Alegre, no inicio do século XIX. Da capital irradiou-se para al, © Batuque se propagou em diversas denominagées chamadas “lados” outros estados e também para a Argentina e o Uruguai.’ Na ca ou “nagdes", que sao: Cabinda, Oi6, Jeje, Nagé e Ijexs. E também pela mescla de dois lados: Jeje-Nago, Jeje-Tjexs, Oyé-Jeje, ete © Batuque, assim como as outras tradicées de matriz africana, ado tou o sistema de centralizacao de todos os cultos ~ que em Africa sio separados cada qual com seus sacerdotes especificos - sob 0 controle de um tinico sacerdote que se fosse homem carregaria o titulo de “Ba balau” e se mulher “Babaloa”. Mas devido a expansio da notoriedade do Candomblé por todo o Brasil, estes termos foram aos poucos sendo substituidos pelos atuais Babalorixé e Ialorixa. Assim o sacerdote de 9° A respeito disso ver ORO, Ari Pedro. Axé Mercosul: As veligiSes afro-brasileras nos paises do Prata. Petrépolis: Vozes, 1999. 172 p 1806 Sesedo Tematica 14 um terreiro gaticho, além de responsével pelo templo, também tem a fungao de sacrificador, de iniciador, de oraculista e de conselheito. Um sacerdote inicia uma pessoa que, eventualmente, pode se tor- nar também um sacerdote e fundar seu proprio templo. Dai 0 gran- de nimero de casas de religiio na capital e na regio metropolitana. Quando do falecimento do sacerdote, via de regra, 0 terreito é extinto ~ salvo rarissimas excegées. Diferente do que acontece em Africa, o termo Os¢ designa, no Ba- tuque, todos os Jrunmale. Sao cultuados treze Orisa distintos: Bard (B30), Ogum, lansa (ya), Xang6, Odé, Otin, Ossanha Osdnyin), Xa- pana (Sanpénnd), Obé, Ibeji, Oxum, Iemanjé e Oxalé, ‘As festas para as divindades acontecem, geralmente, uma vez 20 ano, onde sio servides pratos dos mais variados tipos pertencentes a gastro- nomia yortibé, bantu e também o que era comido pelos escravizados. Esses banquetes sio obrigatérios ¢ abertos a t dos que quiserem comer, de fato chega-se a distribuir bandejinhas aos participantes que esto indo embora, no final da festa, para que nao sobre nada. Este ato se chama “mercado”, 0 que nos lembra o conceito yorthd de mercado ea forma de devolugéo dos tributos cobrados pelo rei, nos banque tes cerimoniais coletivos. As festas sio antecedidas por um ritual que acontece uma vez por ano em meados de dezembro: o Ose. Neste rito é feito uma limpeza dos altares e assentamentos dos Orisa preparando: -08 para as imolagdes que poderéo acontecer ao longo do préximo ano. Um fator importante que assinalamos é que para prepararem seus pratos tipicos no Brasil, foram necessérias adaptacoes 20 novo meio, aproveitando os ingredientes que estavam disponiveis nas regides em que estavam locados, Dat a diferenga entre a culinaria afto-brasileira de Salvador, por exemplo, e a de Porto Alegre 1807 IV Congresso da ANPTECRE - O Futuro das Religides no Brasil Outro fator interessante so as vestimentas cerimoniais (axd). En quanto que os baianos buscaram suas raizes nas vestimentas de sinha- zinhas do século XIX, a mulher gaticha preferiu vestimentas estiliza- das de escravizados, assim como o homem usava bombachas e camisa de estilo gauchesco, Somente no final do século XX e inicio do XXI, mediante um processo denominado reafricanizacao, e que ainda est em andamento, é que houve uma reformulagao do axd masculino, com a intengao de se aproximar mais do tradicional abada africano, Conclusao Analisando tudo o que jé foi exposto logo percebemos que muito da religiao Tradicional Yorithd se manteve nos terreiros gatichos. O culto aos Orisa e sua ritualistica bem como a complexidade hierarquica se manteve no Batuque ainda que adaptado ao contexto das novas terras, Relativo a comprovagio da hipétese, podemos dizer que o trabalho foi bem sucedido. Estudando a religiao Yorithd, tendo por base os fa tores politicos, econdmicos, sociais, histéricos e religiosos percebidos nesta civilizasao a época pré-colonial, assim como percep¢ao da remi niscéncia destes mesmos aspectos na sociedade afro-americana como ‘um todo, podemos concluir que, de fato, ¢ perceptivel os aspectos que permaneceram ¢ os que se transformaram com a diaspora, estes ulti mos principalmente pela cristianizagao, ocidentalizagao e embranque- cimento dos vivenciadores. Por outro lado, este trabalho esta longe de ser conclusivo e se faz necessario um aprofundamento para a compreensio de todas as ins tancias das relagdes humanas no que permeia a superestrutura e a in- fraestrutura no espaco dos terreiros de Batuque no Rio Grande do Sul, 1808 Sesedo Tematica 14 para de fato propormos questdes mais teolégicas, 0 que vai ao encon tro de nosso projeto de dissertagao. Ainda ha muito que pesquisar e estudar. O povo negro, escravizado por 400 anos, merece ter sua cultura e sua histéria recuperadas. Sobre este aspecto, as politicas atuais esto no caminho certo. O negro, como parte integrante da cultura e da etnia formadora da sociedade brasi- leira, tem que ser valorizado, restituido e defendido por todos nés. Eo nosso dever de cidadao. Referéncias CORREA, Norton E. O batuque do Rio Grande do Sul: antropologia de ‘uma religido afro-rio-grandense. Porto Alegre: Editora da Universi- dade ~ UFRGS, 1992. DAVIDSON, Basil. Adescoberta do passado de Africa. Lisboa: Sé da Cos- ta, 1981. GIORDANI, Mario Curtis. Histéria da Africa: anterior aos descobri ‘mentos, Petrépolis: Vozes, 1993 IDOWY, Gideon Babalold. Uma abordagem moderna.ao yori (nag6): gra initica, exerciios, minidicionério. 2 ed, Porto Alegre: do Autor, 2011 MAESTRI, Mario. Histéria da Africa negra pré-colonial. Porto Alegre Mercado Aberto, 1988, SANTOS, Juana Elbein dos. Os nagé e a morte: padé, asds¢ e o culto égin na Bahia, Petrépolis: Vozes, 1986. SILVEIRA, Hendrix. Exunéutica: consteuindo paradigmas para uma in- terpretasio afro-religiosa, Porto Alegre: no prelo, 2013. VERGER, Pierre Fatumbi. Orixés: deuses iorubas na Africa e Novo Mundo. Salvador: Comupio, 1997, 1809

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