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A Caridade como Dever

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Ser caritativo quando se pode s-lo um dever, e h alm disso


muitas almas de disposio to compassiva que, mesmo sem nenhum
outro motivo de vaidade ou interesse, acham ntimo prazer em
espalhar alegria sua volta e se podem alegrar com o contentamento
dos outros, enquanto este obra sua.

Eu afirmo, porm, que neste caso uma tal ao, por conforme ao
dever, por amvel que ela seja, no tem contudo nenhum verdadeiro
valor moral, mas vai emparelhar com outras inclinaes, por exemplo
o amor das honras que, quando por feliz acaso topa aquilo que
efetivamente de interesse geral e conforme ao dever,
consequentemente honroso e merece louvor e estmulo, mas no
estima; pois sua mxima falta o contedo moral que manda que
tais aes se pratiquem, no por inclinao, mas por dever.

Admitindo pois que o nimo desse filantropo estivesse velado pelo


desgosto pessoal que apaga toda a compaixo pela sorte alheia, e
que ele continuasse a ter a possibilidade de fazer bem aos
desgraados, mas que a desgraa alheia o no tocava porque estava
bastante ocupado com a sua prpria; se agora, que nenhuma
inclinao o estimula j, ele se arrancasse a esta mortal
insensibilidade e praticasse a ao sem qualquer inclinao,
simplesmente por dever, s ento que ela teria o seu autntico
valor moral. Mais ainda: - Se a natureza tivesse posto no corao
deste ou daquele homem pouca simpatia, se ele (homem honrado de

resto) fosse por temperamento frio e indiferente s dores dos outros


por ser ele mesmo dotado especialmente de pacincia e capacidade
de resistncia s suas prprias dores e por isso pressupor e exigir as
mesmas qualidades dos outros; se a natureza no tivesse feito de um
tal homem (que em boa verdade no seria o seu pior produto)
propriamente um filantropo, - no poderia ele encontrar ainda dentro
de si um manancial que lhe pudesse dar um valor muito mais elevado
do que o dum temperamento bondoso? Sem dvida! - e exatamente
a que comea o valor do carter, que moralmente sem qualquer
comparao o mais alto, e que consiste em fazer o bem, no por
inclinao, mas por dever.
Emmanuel Kant, in ' Fundamentao da Metafsica dos Costumes'

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