Você está na página 1de 19
As teorias criticas ‘Século XIX Oséculo XIX tem uma especial importancia, pois é quando nascem as principais idéias e ciéncias que vao, formar 0 século XX. No século XIX aparecem Hegel ¢ ‘Marx, 0 positivismo e o evolucionismo. A razfo, a ra- cionalidade desta época atinge o méximo de seu apo- -geu com o capitalismo europeu. Chama-se racionalidade a descoberta das leis ob- Jetivas. A partir daquela época, 0 sujeito se faz as cus- ‘tas do objeto. O conhecimento do objeto deu poder ao sujeito. A liberdade se edificou em cima da domina- ¢¢40, da manipulago do objeto. Entre os dois se estabe- Ieceu uma relagio de senhor ¢ escravo. De um lado 0 ‘mandar, do outro o obedecer. O senhor era livre, podia defender a liberdade, a democracia; 0 escravo nao. ‘Sujeito € 0 ser que dispbe de um objeto como dado seu conhecimento. O sujeito do século passado era constituido pela burguesia, 0 objeto se constitufa na classe operéria, a servigo da burguesia, “empregada” or ela. A gloria do século foi a diviséo de classes e a domi- nagio de uma classe por outra de modo eficaz, de modo econdmico, a mais-valia. A partir da separagao entre su- 61 Jjeito e objeto, entre capital e fora de trabalho, a vitdria Go sujeito foi o sucesso do capitalismo burgués, que 36 foi acabar em 1914, no desastre da Primeira Guerra, ‘quando aquele velho tipo de sociedade acabou e as no- ‘vas formas sociais dos novos tempos se fundam. O ‘mundo moderno passa a ser o que se chama de socieda- de da cultura da globalizacdo. O século XIX assiste ao nascimento de um conflito teérico-pritico até agora néo superado, e modificou 0 ‘velho mundo: as idéias liberais e neoliberais democra- ticas da burguesia ocidental predominaram. Correntes filoséficas fundamentavam dois tipos de teoria literdria, dois modos de ler o texto, um tradicio- nal e outro prospectivo, que tinha os olhos no futuro, nas transformagées sociais. No inicio do século XIX, em pleno romantismo, 0 cexitico francés Sainte-Beuve (1804-1868) fez da critica biografica um estudo dos tipos psicolégicos ou, como ele chamava, de familias mentais do conjunto dos es- critores. Através da biografia, elaborou o estudo do estilo e das técnicas poéticas utilizadas. Naquele século houve uma mudanca teérica. Do: ‘idealismo (que acreditava na verdade das idéias) para ‘o materialismo empirico (que s6 acreditava na “verda- de” da experiéncia), 0 método cientifico positivo, ex: perimental, utilizado pelo critico francés Hippolyte ‘Taine (1828-1893). 0 evolucionismo equivale a doutrina filoséfica e cientifica que colocava a evolucéo como lei geral da matéria, da vida e das sociedades. Influenciou a teoria literdria de Ferdinand Brunetiere (1849-1906) ¢ de Emile Zola (1840-1902), e influenciou muitos outros autores, Essa metodologia se fundava na causalidade deter- ‘minista, na evolugao biol6gica, se fundamentava no a objeto. Outra, baseada no sujeito, aperfeigoa o impres- sionismo critica, eriado exercido por Anatole France (844-1924) e por Jules Lemaitre (1853-1914), impressio- nistno.andrquico, anti-racional, sem método definido de fazer a leitura da obra, século XX nascet dessa fenda do século XIX. Nela a contradicao posterior se formou. A dialética hegeliana A Fenomenotogia do espirito de Hegel é um texto ‘que s6 deve ser compreendido na integralidade de seu meétodo (0 sistema é um todo, ou “o verdadeiro é 0 todo”, dizia ele), em que um fato gerador é racional- mente verificado como matriz de uma determinada forma de pensar o mundo, e qualquer parte se tarna obscura se néo for vista como parte dele, O sistema da cineia como Hegel denominaria a atividade filos6fi- ca~tem unidade interna que tudo sistematiza e quem se propée a pensar sem sistema néo faz eiéncia, ape- nas emite opinides e conviecées, como na cultura de ‘massa, opiniées que s6 se justificariam dentro de um. contetido sistematico que tem um principio, ou seja, aquilo que determina tudo o mais na construgéo da grade logica. O sistema hegeliano, tal como se apre- sentana Fenomenologia, é um circulo que se fecha so- bre uma totalidade, mas se abre A contingéncia, a0 ndo-necessério; e também se abre a liberdade, & revo- lugdo, pois €filho da Revolucao Francesa, e Hegel foi o primeiroa submeter a dialética da filosofia A Histéria, Além disso, liberdade em Hegel significa poder ser, ¢ tal sistema deve conter em si uma capacidade, na me- ida em que nele sejamos conduzidos a ver que nés 4. HEGEL Fenomenologia do esptrito. Petrépolis: Vozes, p. 31 (Tradugio de Paulo Meneses. 3 ou, dito de outromodo,na media aro rescubrento que a rulidade 6 peoduziga por Side nesmos, como na Democraeia Representativa Paris pose apmesentr un sistema es coda porte queso se reveladepls danse praca win, mas onset penenr a era ines trem, importante para os estsdos da tora literdria, nate eta wt om onradiges) € posse dizer que ele 260 fodo se presenta, de tal modo que quem vé a pee eg influéncia de Hegel enorme, o seu valor hoje, de- Pot indo mara sic, seemed un ce hee ee Confuencin de quase tod a tern terra © pensar es eee smn tie gee pn oiloas ei, soe - nd gina tin a ee eee ieee sujeito, ou seja: aufheben. seni REI Hi re rie oe eat train cree gainer ate ‘tar a manifestacao do seu préprio ser. A “experién- Aciéneia a filosoin én citncin da experincin da chi nr bate Sonn Gaede ae or Scie set 45, Hegel, 1902, p67 6. Hegel, 1992, p. 100, Como tudo esta compactado neste sistema mével, a sistematizagao se supera no método. Ou seja, na dialé, tica, B a dialética quem faz a logiticagio do conereto, a ascensdo ao concreto, na ultrapassagem da fase andr, guica para a conceituagio l6gica final’. Logica que nao do pensamento, mas légica do movimento da realida, de, Esta “ascenséo” do abstrato a0 conereto fax um mo, vimento que atua no conceito da logificacao da realide. de, progredindo do entendimento a razéo, ¢ da rari que observa para a razdo que opera e unifica Problema que desde logo se ressalta é que nfo se Pode “pensar” a dialética (apresenté-la), s6 se pode pensar dialeticamente. E o pensamento da maior par. tedas pessoas ndo € dialético, mas supostamente “me. tafisico”. Néo entenderemos um sistema dialético sem oS aplicarmos a ele dialeticamente, Aprimeira vista se vé nests flosofia a importancia do sujeito como verdade ~o ponto essencial de produ, iro verdadeiro nao como substancia, mas como sujei. ‘0, ou seja, fazer falar o sujeito da objetividade ou da realidade objetiva. O sujeito é o objeto imediato do sa. ber, a sua realidade viva. Ba vida do saber, aliberdade do sujeito em consonancia com o movimento de Por-se a si mesmo como ser, ou seia, o ser do sujeito @std na sua mediacdo entre seu proprio tornar-se outro de si mesmo. E nesta negatividade de si, a0 tornar-se outro por essa mediagéo de si mesmo no “mundo da realidade", que o sujeito se cinde em duas partes eon. fraditérias, se desdobra e se nega e assim progride »uuma superacdo de si para se tornar o devir de si mes. 1, HYPPOLITE, J. 0 todo éanterior is partes. In: ntrodugo< fit ‘fla da historia de Hegel. Lishoa:baigoes 10,1960, 2 65 mmo, o cfrculo que s6 ¢ efetivo em sua atualidade eseu Than, num processo de revolugao permanente de si. F, ‘em Hegel, ndo existem duas categorias bipolares anta- tgonicas que néo se estejam superando numa unidade ee razao, Uma passa pela outra e volta a si mesma {ransformada (suprassumida como ele dizia), o que fundamenta a sua superaco. Por exemplo, oque ¢ Po- sitivo vai caducando e se transformando em negativi- dade no devir do tempo, Eo que é negativo vai-se mo- Udificando ese tornando positive. Eeste omotor da his t6ria e da revolugio. ‘Nesta filosofia, papel relevante é exercido pelo ne- gativo. O sujeito, tendo de negar-se para ser € para sa- ber, se exterioriza numa praxis (ou alienacdo, como Giz Hegel), no automovimento para ultrapassagem. nesta manifestagio experimental no “outro” objetivo. Esta dialética do sujeito, na sua natureza, no movie ‘mento de sua formagéo, ha atualizagao de sua essén- cia, Em Hegel, 0 que nao se movimenta, 0 que néo se transforma, morte. E no se pode fixar nada ali, nem: mesmo o sentido de uma categoria, as categorias si0 Geslizantes, méveis, o positive vai-se querendo negatic vo, e o negative vai-se mostrando positive, Conhecer ‘certas categorias é acompanhar o mével do seu desli- zar e no mudar-se no sentido contrério. ‘A dialética de Hegel se faz sistema do devir e da me- Giagao, isto 6, da exposi¢do. 6 0 modo como o objeto, su ficientemente apreendido e analisado, se desdobra em: suas articulagdes e de como o pensamento se desenvol- ‘ve em suas determinagées conceituais organizando um. discurso metédico. Em Hegel néo existe propriamente “método dialético”, mas exposi¢do, dialética da realida- de, movimento do mundo material (Hegel pode ser considerado materialista), de modo que este se de ‘monstre idealmente no método (este é o sentido do ide- co alismo de Hegel). 0 “earogo racional” do métodohege- liano esté assim posto (pois nao trataremos do seu en- voltério mistico). Como nfo 6m mtd fera do objeto, negelana sda parti gcse ca realiate de seu processo, dos procedimentos da producao de seu sa- ber Este mélod, em O copia de ars, se exrce com quatro earacerstens: expos, procediments progressivo-regressivo, contradicgao e critica. E pos: Welfare uma dstingio ene daca bien eda Ss fenornnoldelen Apimeima far a expesigo do at tomovimento do conceit (Cnc da pia) apare cecexerelda em O capital de Mare A segunda sparece na Fenomenologia do espfrito, mas também se exerce no capitulo primeiro do Livro 1 de O capital, ou seja, ‘a tora do valor de Mars, ond forma do valor edo pond pata da mercdora,consderada como um inedatofenomenlfgie A primeira proposi¢do que se faga para exprimir algo jé vai conter um ser-outro. Até o Absoluto nao é, ali, considerado na sua eternidade, mas na sua eterna mobilidade, na sua eterna autotransformagio. O abso- luto se torna outro pela mediagao, pela transformagéo de si em si-mesmo-outro!. A mediagio € igualdade consigo-mesmo-feito-outro em movimento, reflexio sobre o “eu” que 6 simples devir, como quem foi crian- ‘ca, jovem, adultoe velho foi outro eo mesmo de si. Por {Reap xpi dentate en ‘eS tels ieatlircenceoamna aa act ent fH. Cenc elton egy ‘Se dn ets Ae Sree rp 8 tebe enti engor smo” HEGEL, 1976, p. 741. % mite ‘ — {sto, todo o sistema filos6fico hegeliano se move. Seut seegsma tem uma dialética interna, ou seja: um siste- Sistejue € verdadeiro ja falso, seu desenvolvimento Tonitivo se comporta negativamente em relagio as Pomrogo e refula, a seu modo, seu préprio fundamento (que néo passa de um simples comeco),O que se move (ito: o método da exposigdo (da dialética), que € 0 de- senvolvimento (fenomenolégico) da ciéneia do saber. Par exemplo, O capital comeca com aandlise do valor Gamereadoria, que 6a unidade de todas as determina (Goes da sociedade capitalista, efaza exposicdo damer- Segovia, no desdobramento de suas determinagées (ou snelhor, para Hegel, determinidades), ou seja, a passa~ {Yom do abstrato da mereadoria para 0 conereto da Ta. ero como operagao, a mercadoria feita pensamento. 0 saber que se sabe desenvolvido como tal, que se move, ‘opera e supera (suprassume), construindo assim 0 seu, Chieto efetivo como sujeito em seu devir (ele éo que se transforma, o que se demonstra na exposigéo). Assim { que o puro saber sai de si mesmo para ser-outro, isto ‘que a base da ciéncia, que se atinge na transforma (Go do seu devir, seu processo 60 progresso de sta ex posigéo. A eiéncia conclama a consciéneia de st a as- Conder até a realidade para transformar-se nela. ‘Anecessidade de uma via.de acesso a esse saber fa.com que o que é em si deva exteriorizar-se e tomarse ‘para si, Ea fenomenologia, tal como a exerceu Hegel, Guem faz esta saida, esta propedéutica @ Filosofia, mostrando como elevar 0 conhecimento a ciéncia. Set: primeiro passo é 0 da consciéncia, que ¢ 0 ser imediato se toma entendimentoe, por um processo plex, sed como razio. Maso que leva aciencia aor fanizarse 5 proprio movimento interno dentodo movers de undo cored taining sia soconstante, Os concetos mesmos sem vem, € significam variadas nogées ao longo do: texto" a na medida em que seus termos tém significagées dife- a eccege apenas as enias ea encontrar al em higardaidentidade mor irae ra dont iy ep con Nec vida os elemento 4s formasinsepardves om c0 Contetidos ea vida de um povo. Epelalinguagem queo Bente ‘se objetiva, a linguagem é seu modelo de reali- eal Epintosgno sia Des como muitos créem, mas a) o que se opée 4 naturez: 1 selativiizagio") aqulo que independe desta ope Sioa superego desta contradigio' © que Hegel Chama de losia do spits aprox do gue ie nds entendemos por Antropalogia Cultural Hegel parte da intuico para elevarprogresiva: pene aherpara trad consi do ai or si mesmo através da sepresentagGo da lingua tei Ato dew nome hs cosa, iso ame dcto ‘oberania a primeira pose da maturea ede sua igi pel xi, O mand um mevinento de es B asim que alinguagem eat na frontend Ho espirito constituido pelo saber seguido da objetivie Gade (negativa em relagio ao saber). A Fenomenologia Ga ciéncia dessa caminhada, a ciéncia da experiénci {que faz a consciéncia, esta que € dada pela experiencia: evita percepcdo. A seguir, pela classificagao que faz W.KOYRE, 4 ides disor de I pense pilsophiae. Pe 1M KOYRE, A, 1871 p. 185. 68 pave um oi sane Espirito, © Nietzsche e a eritiea dos valores eee alm ogo de var qe impli wine oc iene caer tS apne sae oars cae ee se Se ae nos criados), Estas avaliagOes nao so valores, er oe bauetiraam artim rate eta tie ine construidos os valores (a democracia, 0 ‘socialismo). ss rast doe me cis ie te Tae net ae deren pon a ein cr 8 va bemoan i inn ae ea gr assem siesta re no 12, DELEUZE, Giles, Nieteghe eta pilosophie. Pari: PUF, 196% 2a. 0 rivar de simples fatos utilitaristas (valores que valem para todos). A filosofia critica de Nietzsche é simultaneamente contra: a idéia de um fundamento (“elevado”) que res- peite os valores sem investigar a sua origem e a idéia de uma simples derivacdo causal (como isto deriva da- quilo) ou de um simples comeco (um prinefpio) que postule uma origem sem preocupagio com valores. © método geneal6gico de Nietzsche significa o ele- mento diferencial do préprio valor dos valores de onde ‘emana seu prdprio valor e se op6e a um valor absoluto e ‘a.um valor utilitario. Significa também o elemento dife- rrencial, ou seja, significa: espaco no tempo pasado: no- bbreza e baixeza; diferenca no espaco: nobreza e vileza; distancia na origem temporal: nobreza e decadéncia, ‘Nietzsche constr6i uma critica positiva que estabe- lece um diferencial. Este elemento diferencial néo critica do valor dos valores sem ser também o elenco positivo de uma “criacdo” de valores. Por isso a critica ndo é uma reacdo (vinganea, rancor, ressentimento), ‘mas uma agdo. O ataque eritico opera o elemento dife- rencial criadoramente (endo 6 estéril vinganga) e busca © sentido das coisas. Sentido significa diregao. A per- cepgio das coisas implica um problema légico de como penséi-las (de que modo, de que lugar légico as pensa- ‘mos, sob qual perspectiva as vemos). Nietzsche desen- volve entio a sua teoria de “forca’ (que jé se encontra ‘em Hegel). “Nao encontraremos nunca o sentido de qualquer coisa (fendmeno humano, biolégico ou mes- mo fisieo) se ndo conhecemos qual é a forga que se propria da coisa, que a explora, ou que nela se expri- me". Um fendmeno é um sintoma (um signo), e seu sentido se encontra numa forca atual. A filosofia é vista ‘como uma serniologia. A forca revela o interesse, a von- ‘ade. Deste modo, a histéria aparece como 0 modo de n como as frgus se apoderaram da natureza, $6 uma (etnspretagdo a interpretagdo de uma dominagio. Os Feet penos suo multiplos (de onde deriva sualiberda- Soe tem miltiplossentidos, Tem tanto mais sentido

Você também pode gostar