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Estudo quantitativo dos pressupostos basicos da cultura organizacional Gilberto Tadeu Shinyashiki Em novembro de 1990, o Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade (Brasil, 1991) fot lancado com o objetivo de moder- nizar e promover a qualidade e a produtividade dos bens e servicos produzidos no Brasil e, desta forma, aumentar a competitividade com os produtos importados. ara tanto, 0 governo promoveu a liberacao das importagdes e dos precos e 0 processo de desregulamentacdo e privatizacéo. As politicas industrial e de comércio exterior pretendiam realizar uma reestruturago da indistria brasileira baseada no estimulo & compe- titividade no Pafs. ‘As empresas, por sua vez, utilizaram soluc6es abrangentes para atingir esses objetivos, desde a reformulacéo das estruturas organi- zacionais, a adogao de politicas de fusdo para reducéo de custos, @ utiizago de estruturas matriciais, a reengenharia, até a adocdo de técnicas de gestao da produsao, como Circulos de Controle de Qualidade, Just-in-Time, Kanban. Isto tudo aliado as alteracses em estratégias, aos investimentos em equipamentos sofisticados as intervencdes no processo de comunicagao com o piblico interno. Para Archier & Sérieyx (1989), existem dois caminhos para uma empresa mudar, a fim de melhorar seu desempenho e adaptar-se a0 mercado: o primeiro consiste em imaginar solucdes originais experimenté-las; e, 0 segundo, em pesquisar se, no mundo industrial, outras empresas j6 nao encontraram solucdes que funcionam, para nelas se inspirar ‘Ambos os caminhos tém suas limitagées. Uma delas é a apontada por Hofstede (1987) como as dificuldades de aplicacéo, em um pals, das teorias e préticas administrativas desenvolvidas em outro, pelo fato de esses métodos refletirem a cultura da nac&o que os desenvolveu. Outra limitacdo esta relacionada @ posico defendida por Davis (1984) e Schein (1989), entre outros, que enfatizaram precisar o processo de planejamento de mudangas ser mediado pela cultura organizacional. © conceito de cultura é cada vez mais relevante para o estudo da Administrago, considerando que o conhecimento da cultura Este artigo foi desenvolido a partr de clsertago de mestrado apresentada 20 Departamento de Administacso da Faculdade de Economia, Administagdo e Contabildade a Universidade de Sd0 Paulo (FEAUSP), ‘0b a orientagdo da Professora Maria Terezi Leme Fleury. Recebido om feverero5 Giberto Tadeu Shinyashik & Professor do Departamento de Adminisrago da Faculdade ‘de Economia, Adinisragdo e Contabiidade da Universidade de S80 Paulo — Campus Ribeo Prato Fax: (061) 693-6133 Ema: gshinya@usp br o Revala de Adninicrogo, Sto Paulo v30,n.3, p 6072, juhotoionbo 1095, ESTUDO QUANTITATIVO DOS PRESSUPOSTOS BASIGOS DA CULTURA ORGANIZACIONAL essencial para viabilizar as estratégias e 0 processo de mudanga. Como afirmaram Thévenet (1989) e Da- vis (1984), 0 conceito de cultura impede que se pense ‘em solugdes étimas ou em normas ideais, pois a abor- dagem cultural enfatiza a coeréncia das decisdes to- madas e os resultados conseguidos com relacdo & cultura e a identidade da empresa. tema cultura organizacional tem ocupado cada vvez mais espaco na pesquisa e nos estudos de admi- nistracao (Alvesson & Berg, 1992), a ponto de Hofs- tede, Neuijin, Ohjaiv & Sanders (1990) afirmarem que a“... cultura deixou marcas na teoria da organi zacho, Cultura organizacional adquiriu um status si- milar a estratégia, estrutura e controle”. De forma também marcante, Prestes Motta descreveu o status do conceito de cultura ao afirmar, no prefacio do livro Cultura organizacional: formacdo, tipologia e impactos, de Freitas (1991), que “... no hé qualquer teorizacdo sobre organizagées e, portanto, n&o hé qualquer intervencao em organizagées que n&o con- tenha, explicita ou implicitamente, uma determinada concepeao de cultura”. Pelo exposto fica claro que a compreensao da cul- tura da organizagao pode dar grande contribuic&o a0 desenho e a implementagéo de programas de reno- vacéo organizacional. Entretanto, a utilizacao da cul- tura na pratica das organizagées depende da capaci dade que os profissionais ou os académicos tenham. de a desvendar. OBJETIVOS Neste trabalho, 0 primeiro objetivo € contribuir com a elabora¢ao de um instrumento que auxilie os, profissionais e ‘académicos que lidam com organiza- ges a compreenderem a cultura organizacional. Com. esse instrumento procura-se identificar 0 conjunto de Pressupostos basicos de duas empresas, nticleo da cultura de uma organizagao. Esta contribuicao dife- rencia-se das demais por utilizar um instrumento quan- titative, em vez de métodos qualitativos, mais comuns nos estudos de cultura. Nao se pretende polemizar a questo — métodos qualitativos versus quantitativos — (sobre este assun- to, ver andlise de Martin, 1992). No nosso entendi- ‘mento, a abordagem que retine a maior possibilidade de sucesso na identificago da cultura de uma orga- nizago é a triangulagdo, por combinar diversas me- todologias no estudo de um mesmo fenémeno (ick, 1979; Duncan, 1986). Esté claro, para nés, que a aplicacdo do questio- nario desenvolvido vai propiciar a0 pesquisador so- mente uma visdo do nativo — objetiva e quantitativa — e que isto é apenas parte do método de triangu- lagéo. A perspectiva qualitativa, subjetiva e externa no sera realizada, por n&o fazer parte do escopo deste trabalho. segundo objetivo € a compreensao dos fatores antecedentes aos pressupostos basicos. Certamente, ‘© administrador esta interessado em descobrir a cul- tura de sua organizagéo para conseguir reconhecer (8 fatores conseqlentes dessa cultura. Desta forma, ele poderé tomar as decis6~s adequadas sobre estra- tégias ¢ gestdo. Entretanto, os fatores antecedentes so igualmente importantes, pois permitem 0 geren- ciamento da cultura organizacional. A influéncia dos fatores antecedentes seré compreendida através do proceso de socializacao. interesse pelo proceso de socializacéo nao é somente académico, pois ja esta comprovada a preo- cupacio das empresas na socializacéo de seus mem- bros. Basta observar o empenho das organizagées em ajustar seus empregados: despendendo grandes esfor- 08 em treinamento, regulamentando sistemas de re- compensas, elaborando programas de comunicaao; em suma, promovendo atividades para garantir que © ajustamento do individuo & organizago n&o seja relegado a um segundo plano. No processo de mudanca da cultura, cada vez mais © conceito de socializa¢ao torna'se itil para o adm nistrador planejar ages que podem ser efetuadas em nivel das politicas de recursos humanos para manter ou desencadear um processo de mudanca Entretanto, 0 processo de socializacdo é bastante amplo e complexo para se conseguir identificar quais (0s pressupostos basicos que sofrem influéncia da so- cializagdo ocorrida na empresa. £ necessario separar ‘5 impactos do proceso de socializagéo organiza nal — que incluem as variaveis tempo de casa, quan- tidade de promogées e érea funcional — dos impactos da socializagio produzidos por outras insttuigdes so- clais — que se referem as varidveis sexo, idade, es- colaridade, profissdo, tipo de indistria, onde o indi- viduo morou na inféncia e a quantidade de empresas nas quais trabalhou. Essa separagdo procura confirmar a afirmacao feita por Schein (1984) de que “os paradigmas culturais sho versées adaptadas de paradigmas culturais mais amplos”, 0 que vai ao encontro das conclusdes de estudo sobre cultura organizacional realizado por Hofstede, Neuijin, Ohjaiv & Sanders (1990) em 20 estabelecimentos de dez diferentes organizagées, em dois paises. Estes autores afirmaram que *... culturas organizacionais refletem a nacionalidade, caracteristi- ‘cas demograficas dos empregados e gerentes, o tipo de indiistria e mercado...” Revista de Adinistarto, S80 Paub v0, n3,p6072, uholsetembro 1655 Gilberto Tadeu Shinyashiki CONCEITO DE PRESSUPOSTOS BASICOS Uma das definigées mais conhecidas de cultura corganizacional é a desenvolvida por Schein (1984): “Cultura organizacional € o conjunto de pressupos- tos basicos [srifo nosso] que um grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender a lidar com os problemas de adaptacao externa e integracdo interna, @ que funcionaram bem o suficiente para serem con- siderados vélidos e ensinados a novos membros, como a forma correta de perceber, pensar e sentir em re- lagao a esses problemas”. No artigo Coming to a new awareness of organ- izational culture, Schein (1984) elaborou um conce- to de cultura mediante um modelo dinamico de como a cultura € aprendida, transmitida e mudada. Nesse artigo, Schein descreveu os diferentes niveis através dos quais a cultura de uma organizacao pode ser ana- lisada (ver figura a seguir). E afirmou: *Para realmente compreender uma cultura e para aprender de modo mais completo os valores e o comportamento aberto do grupo, é imperioso atuar no nivel dos pressupostos basicos, que normaimente séo inconscientes, mas que, na realidade, determinam como os membros do grupo percebem, pensam e sentem” Artofatos e Crlagées + Tecnologia « Vistveis, porém Ate rmuilas vezes + Padrées de comportamentos no-decifraveis Visiveise audlveis 4 1» Malor nivel de Valores consclentizago 4 Pressupostos Basicos Relacionamento com o ambiente | © Néo-questionados. ‘¢ Natureza da realidade, do tempo | » Invisiveis do espago Préconscientes ‘» Naturaza da natureza humana ‘» Nalureza da atividade humana ‘« Natureza das relagdes humanas Niveis de Cultura e Sua Interagéo Fonte: Scheie (1984) ORIENTAGAO DE VALOR ‘Como © proprio Schein reconheceu, o estudo de Kluckhohn, Strodtbeck et alii (1961) sobre orientagao de valor foi uma das fontes por ele utilizadas para organizar 0 conceito de pressupostos basicos que, no seu entendimento, & fundamental para compreen- der a cultura de uma organizacao. O interesse pelo processo de socializagao nao 6 somente académico, pois j4 esté comprovada @ preocupagao das empresas na socializagéo de seus membros. A expresséo orientago de valor foi cunhada por Kluckhohn, C. no livro Toward a general theory of action, de Parsons, Shils et alii (1951), conside- rado importante contribuico ao estabelecimento de uma teoria geral nas ciéncias sociais. Segundo Kluckhohn, Strodtbeck et alii (1961), orientacdes de valor "... so principios complexos ordenados (rank-ordered), resultantes da interagao de trés elementos analiticamente distintos do processo de avaliagio — os elementos cognitivos, afetivos diretivos —, que dio ordem e direco ao fluxo con- tinuo dos atos e pensamentos humanos que dizem respeito & solugo dos problemas humanos comuns” Os problemas humanos enunciados sao tidos como constantes e surgem, inevitavelmente, de situacdes humanas. As solugées encontradas so varidveis, mas nfo de maneira ilimitada. A segunda suposicao prin- cipal do esquema conceitual 6 que a variabilidade nas solucées @ a variabilidade dentro de uma ordem de solugées possiveis. Os limites da variabilidade s8o as, solugées encontradas para cada uma das orientagdes dadas no quadro 1 Rhinesmith, citado por Adler (1986), resumiu o ‘esquema conceitual em seis suposicées fundamentals: + “Hé um ntmero limitado de problemas humanos basicos, para os quais todas as pessoas, em todas as épocas e em todos os lugares, devem encontrar alguma solucéo;” + “existe um nimero limitado de alternativas para tra- tar estes problemas,” ‘+ “todas as alternativas estéo presentes em todas as, sociedades, em todos os tempos, mas algumas so preferiveis as outras;” e Revista de Adis, Sto Paulo v30, 3, 60-72, uolsetembo 1605, [ESTUDO QUANTITATIVO DOS PRESSUPOSTOS BASICOS DA CULTURA ORGANIZACIONAL Quadro 4 Orientagées de Valor e Variagées Postuladas para Cada Orientacdo Orientagao ‘Amplitude de Variagées Postuladas Ma Neutra | Mist Ma @ Boa Boa Netureza Humana tv Imutvet Mute Imutdvel Mutvel Imutavel HomemNatieza | Homem Subjugado pela Natureza | Harmonia com a Nalueza Hemem Dominando @ Natureza Tempo Passado Presente Futuro Aividade Ser Ser-em-Devir Fazer Relecional Linear Colatral Ingividualista Fonte: Kicktohn, Sodtbeck o li (1961) + “cada sociedade tem um perfil dominante de orien- tages de valor e, além disso, inimeros perfis al- ternativos e variagées;" * “tanto no perfil dominante quanto nas variagées, existe uma ordenacao de preferéncias pelas alter- nativas;” € “nas sociedades que esto mudando, a ordem de preferéncia no é clara” Dimenses Natureza Humana Na natureza humana h& quatro divisées légicas: ma, nem boa nem ma, neutra e boa. E estas parecem representar, de fato, as distingées feitas pela soc dade. A natureza humana pode ser considerada mu- tavel ou nfo, isto é, ela pode ser alterada e aperfei- ‘goada ou no. Homem-Natureza A questéo esta ligada A discusso sobre se a natureza — o ambiente total percebido — pode ser subjugada e controlada ou se o homem deve buscar a harmonia com ela ou se ele deve a ela se sub- meter. Tempo Este fator esté ligado ao foco temporal da vida humana e a como as sociedades usam 0 tempo. Todas tém alguma concepgo do passado, um presente dao alguma espécie de atengao ao futuro, No entanto, ‘as sociedades diferem quanto & énfase que dio a0 tempo, em um dado periodo. Muito pode ser dito de uma sociedade com base nessa énfase. Culturas voltadas para o passado acreditam que os planos devem ser avaliados pelos costumes e tradicdes da sociedade e que a inovagéo e a mudanga se justi- ficam somente conforme as experiéncias passadas Culturas orientadas para o futuro acreditam que os planos devem ser avaliados pelo beneficio que um projeto ou uma atividade especifica proporcionara, Pessoas orientadas para 0 futuro justificam a inovacao e 2 mudanga pelo retorno econémico e esto menos atentas aos costumes e tradigbes sociais e organiza- clonais passados. Culturas que dio importancia 20 presente prestam pouca atenc&o ao que aconteceu no pasado e encaram o futuro como um periodo vago e extremamente imprevisivel Atividade No sujeito orientado por Ser, a acio é guiada pelo desejo existente. A essencia da orientago do Ser esté na acentuada expresséo espontinea do que se define como dado na personalidade. Nesta orientagdo, nao hé idéia de desenvolvimento, mas sim restricko ao que faz parte da personalidade do sujeito. A otientagéo do Serem-Devir preocupa-se nio 86 com 0 que @ existente na personalidade do ser humano, mas também com o que o ser humano pode realizar. Esta orientag8o tem o caréter de desenvol- vimento. Hé a concepeao de que se 0 individuo con- trolar seus impulsos e desejos naturais alcancaré um estado de perfeicao. Reva de Admintacto, Sto Paulo 30, 03, p 6072 uhaselembro 165 Gilberlo Tadeu Shinyashiki A orientacao para o Fazer esté focada na tarefa, na eficiéncia e na descoberta. Sua caracteristica par- ticular é a demanda de aco, visando a realizagéo e de acordo com padrées definidos como exteriores 20 individuo que age. O autojuizo, bem como 0 juizo dos ‘outros, é feito em grande parte por meio da avaliagao da acéo. E a definigBo da relago do homem com os outros homens. Esta orientacdo tem trés subdivisbes: a indi- vidualista, a colateral e a hierdrquica ou linear. Se a orientacéo dominante € a individualista, ¢ as ‘outras duas sio interpretadas segundo ela, as metas individuais tem prioridade sobre as metas do grupo colateral ou do linear. Os individualistas usarn suas caracteristicas pessoais e realizagées para definir os objetivos e valorizam seu proprio bem-estar. Quando a relacdo colateral é dominante, as metas ou o bem-estar do grupo lateralmente prolongado tem prioridade para os individuos. Neste caso, 0 grupo considerado moderadamente independente de outros grupos assemelhados e a questi da continuidade através do tempo néo é critica. No caso de a orientagio hierérquica ou linear ser a mais acentuada, as metas do grupo sio a prioridade, voltando-se para elas a preocupacso priméria dos in- dividuos. Todavia, hé o fator adicional de que uma das metas mais importantes é a continuidade através do tempo, O linear enfatiza a hierarquia e a tradigo como base da autoridade e define-se como membro de um cls ou uma comunidade, considerando o bem- estar coletivo mais importante. Orientacao dominante e variante Até agora, a discussAo das principais orientagdes mostrou que diferentes sociedades fazem diferentes escolhas entre as possiveis solugées de problemas hu- manos comuns. Entretanto, 6 fundamental nesta abor- dagem destacar 0 fato de que todas as dimensdes de todas as orientagées estéo presentes em todas as oca- sides na estrutura-modelo de qualquer sociedade. Para Kluckhohn, Strodtbeck et alii (1961), sistema de orientagko de valor nao é concebido como sistema inico de orientacées dominantes. ‘A compreensio da dinamica de uma sociedade dé-se tanto por se saber o que € dominante quanto pelas orientagdes variantes. “Que existam individuos @ grupos inteiros de individuos que vivem de acordo com modelos que expressam orientagées variantes € no dominantemente acentuadas @, assegurase, es- sencial & manutengSo da sociedade. Os valores varian- tes s80, pols, no apenas permitidos, mas realmente cexigidos” (Kluckhohn, Strodibeck et alii, 1961) Kluckhohn, Strodibeck et alii fizeram distingo en- tre comportamento desviante, que provoca sangées de seu grupo, e comportamento baseado na orienta- sho variante, que é aceito e freqiientemente exigido alé onde interessa ao sistema social HIPOTESES DA PESQUISA Foram testadas ¢ analisadas as seguintes hipdteses: Ho,1:Néo existe regularidade nas escolhas das orien- tacdes de valor dominantes em cada empresa. Ho,2:As escolhas das orientagées de valor dominan- tes de duas empresas de setores industrials dis- tintos, situadas no interior do estado de Sio Paulo, sao comuns. Ho,3:A variével Tempo de Casa é independente das escolhas das orientacdes de valor domi- nantes. Ho,4:A variével Quantidade de Promogées é inde- pendente das escolhas das orientagées de valor dominantes. Ho,5:A variavel Escolaridade é independente das es- colhas das orientagdes de valor dominantes. INSTRUMENTO DE PESQUISA instrumento utilizado 6 uma adaptacao do ques- tlondrio criado por Kluckhchn, Strodtbeck et alii (1961). No questionério original foram descritas si- tuagdes tipicas na vida da maioria das sociedades ru- tals e propostas alternativas de solucao para os pro- bblemas apresentados. Estas alternativas derivam, teo- tleamente, da orientaggo de valor em foco. O ques- tionario original foi aplicado em forma de entrevistas pessoas. No questiondrio atual manteve-se a estrutura bé- sica do original, conservando as situacées tipicas propondo as altemnativas de solucdo a serem esco- Ihidas obrigatoriamente. Algumas situacées rurais, foram adaptadas para situacdes urbanas (quadro 2) Outras, entretanto, séo as mesmas criadas por esses autores. (O questionério sofrou duas alteragées importantes: * foi incluida a intensidade com que o respondente concorda com a alternativa escolhida, a qual devera 6 Revista de Adinisrers, S80 Paulo v30, 3, p 6072, uolstenbro 1985, ESTUDO QUANTITATIVO DOS PRESSUPOSTOS BASICOS DA CULTURA ORGANIZACIONAL Quadro 2 Questdo Numero Dois do Questionario Atual 2, Preperaglo de um Plano ‘Quando um grupo tem de preparar um plano, por exemplo, decir sobre a realzagdo| de um projlo, ha trés maneiras de decid. |A. HA grupos que acreditam que @ melhor quando alguna pessoa importante, como © chele ou 0 préprio par8o, decide os planos. Todos geraimente aceitam 0 que] ‘les dizem sem muita discuss jf que eles esto acostumados a decide séo| (0 mais experienis. 8. Hé outros grupos em que a malor parte das pessoas partipa da elaboragdo dos planos, Muitas pessoas tém opinido formada e dscutem durante muito tempo, ‘mas nada ¢felto antes que a maioria chegue a um acordo sabre 0 que & melhor fazer CC. Ha alguns grupos que acrectam que é melhor cada pessoa tr sus propria opinito ¢ sustentar. O assunto & decidido pelo volo O grupo faz o que a malora que, ‘mesmo que ainda existam pessoas que scordem @ se oponham ao projet AMOSTRA. Para a aplicagao do instrumento de pesquisa, foram selecionadas duas em- presas situadas no interior do estado de So Paulo, com atividades bastante dis tintas. Uma delas é uma agroindistria de ‘capital nacional familiar e a outra uma indistria nacional de bens de capital Foram distribuidos 150 questioné- rios na empresa agroindustrial, que chamaremos de AGRO, e 400 na in- diistria nacional de bens de capital, aqui denominada de IND. Houve uma res- tricdo quanto a escolaridade dos parti- cipantes, pois, como o questionério de- veria ser preenchido pelo respondente, era necesséria escolaridade minima Esta exigéncia afetou mais a AGRO, cujos empregados tinham baixa ou ne- 4 - Qual a manera que ihe parece melhor? Qa ae ac 2.2 - A resposta anterior coresponde Exatamente 20 que penso (ZG) GG @ Distant do que eu penso| 23 - Qual das outras duas maneiras Ihe parece melhor? Qa as ac 24 - Qual manetra voot acredita que a maioria das pessoas daqui escolheria com] a melhor? Ga ae Qe nhuma escolaridade, do que a IND, que tinha quadro de pessoal alfabetizado. As diversas areas das empresas fo- ram convidadas a participar da pesquisa pelo setor de Recursos Humanos. Cada departamento (na IND — producéo, en- genharia e administracao; na AGRO — producdo, administracao e agricola) en- viou um representante para tomar par- te de reuniéo em que foram apresen- tados 0 objetivo e o material de pes- quisa. Apés 0 preenchimento, que era voluntario, os questiondrios foram de- ser utilizada como critério para o desempate entre alternativas; ‘+ foram incluidos quatro itens para a orientagao Na- tureza Humana. Por outro lado, foram reduzidos alguns itens do questionério original: um da orien- tacdo Homem-Natureza, um da de Tempo e trés da Relacional. As variaveis de controle — sexo, idade, rea fun- cional da empresa, cargo, tempo de casa, quantidade de promogées, némero de empresas em que traba- thou, onde morou na infancia e escolaridade — fize- ram parte da folha de rosto do questionario. ‘© questionério foi testado em um estudo (Shinya- shiki & Siqueira, 1993) realizado junto a 156 estu- dantes de quatro faculdades da Universidade de S80 Paulo, campus de S80 Paulo, no qual foi possivel verificar a validade e a fidedignidade do instrumento, volvidos & area de Recursos Humanos. ANALISE DESCRITIVA Caracteristicas das empresas A AGRO 6 uma agroindiistria que tem fluxo de produce continuo e sazonal, ao passo que a IND é uma indéstria de bens de capital que trabalha sob encomenda. Uma utiliza tecnologia simples e madura a outra tecnologia mais complexa e menos madura. Em uma os produtos tém baixa diferenciacao, ciclo de vida longo e marketing mix pobre; na outra, os pro- dutos s8o diferenciados, com marketing mix mais rico ciclo de vida mais curto, No referente ao mercado, uma atua no nacional, com precos estéveis determina- dos pelo governo, e a outra tem mercado intemacional e precos mais competitivos. Em ambas as empresas ha grande interferéncia do Estado, considerando-se o fato de uma ser privada e a outra estatal Reva de Admins, Sto Paulo v30, 1.3, 60-72, uatetmvo 1995 Gilberto Tadeu Shinyashini Caracteristicas da amostra Foram devolvidos 255 questionérios da indastria (IND) e 82 da agroindiistria (AGRO). A maioria dos ‘empregados das empresas era do sexo masculino. Os funcionarios da IND eram quase todos alfabetizados, ‘a0 passo que os da AGRO, pela prépria caracteristica de seu negécio, possulam escolaridade bastante baixa ‘A maioria dos respondentes passou a infancia no in- terior de Sao Paulo. O sistema de orientagdes de valor de um grupo nao deve ser encarado como um sistema unitério de valores dominantes. A idade média dos participantes da pesquisa era de 34,4 anos. © tempo de casa era alto, em média 9,8 anos. Os respondentes haviam tido poucos em- pregos antes do atual (média de 1,8) ¢ alguma pos sibilidade de carreira dentro da empresa (média de promogio de 1,5). Na AGRO, a idade media era menor, 28 anos, assim como o tempo de casa mé- dio, 6,5 anos. Na IND, a idade média era de 34,8, anos € 0 tempo de casa médio de 10,5 anos. As pessoas da IND tinham experimentado trés vezes mais promogées do que as da AGRO. As pessoas da AGRO haviam tido menos empregos anteriores (1,3 contra 2), Na AGRO, a maior participacao foi de respondentes com cargos menos qualificados, enquanto na IND a participagéo de engenheiros e chefias chegou a 43%. Teste das hipéteses Ho,1:Nao existe regularidade nas escolhas das orien- tagées de valor dominantes em cada empresa. Apés identificar a preferéncia dos individuos para ‘cada dimensio das orientacées de valor, foi montada ‘a tabela 1 agrupando as escolhas por orientacao de valor e por empresa, Apesar de as preferéncias pelas diversas variéveis, parecerem ser bem marcantes, foi utilizada a técnica do quiquadrado para testar a hipétese de nulidade. Os testes feitos com os dados da AGRO mostraram haver preferéncia pelas escolhas e que elas nfo ocor- reram por acaso, exceto para a orientacao de valor Tabela 1 Distribuic&o das Preferéncias pelas Dimensées das Orientagées por Empresa Empresa Orientaga pene ND ‘AGRO y]* |" ]% ‘ividede Fazer 15 | 40 | 50 | oto Ser we | 40 | 2 | x9 Indeinida w~ | no | 6 | at Home Ntureza Submissto s | 20] 9 | to Domingo so | we | a | 29 Hamenia ve | oo | 33 | asa Indore mw | oo | om | we Natureza Humana stv so | a1 |] w | a6 Mutivl ws | ns | st | oz Indetinida ce Natureza Hurana Ms a | as | 4 | 49 Boa ae | at | a | set Mitra | 4a fon | ta Indeinida 2 | 90 | a | ase Relacional Hiecirauica we | no | m | a Calter wm | sos | 3 | ae Indvial ms | 308 | 1 | a2 India w | 2 | 3 | ar Tempo Passado Gale aac lea Presente oe | sea | a | 00 Futuro ro | aa | om | 358 Indefida a | a2 | 6 | ts relacional; neste caso, a hipétese de nulidade nao péde ser rejeitada, calculo do teste qui-quadrado também foi feito com os dados da IND. Constatou-se, igualmente, que as escolhas nao ocorreram ao acaso e que em todas as orientagdes houve preferéncia por uma alternativa, Concluindo, pode-se afirmar que a hipétese de nao existir regularidade nas escolhas das orientagées de valor foi rejeitada, pois foi possivel identificar um pa- drao de escolha em cada empresa (tabela 2). 65 Revista de Administer, Sto Paulo v30, 3, 0-72, ubeletambro 1955 [ESTUDO QUANTITATIVO DOS PRESSUPOSTOS BASICOS DA CULTURA ORGANIZACIONAL Tabela 2 Ordenagao das Orientagdes de Valor por Empresa Orientagao IND ‘AGRO vided Fazer 490% | Fazer 61.0% Homem Natureza Harmonia 69,0% |Harmonia 48.3% Nabireza Humana | Mutivel76,5%| Mutivel 62.2% Natwreze Humana | Boa==«83,1% [Boa 56.1% Relacional Colatera! 565% | Nao howe Tempo Futuo 47.1% Presente 39.0% Ho,2:As escolhas das orientagdes de valor dominan- tes de duas empresas de setores industriais dis- tintos, situadas no interior do estado de Sio Paulo, s80 comuns. © método para comparar as empresas consistit em calcular as médias de cada uma delas, para cada dimenséo (tabela 3), e verificar se as orientagdes de valor eram significativamente diferentes. Tabela 3 Valores Médios de Preferéncia das Orientagées de Valor por Empresa Valor medio | Orientagio IND. | AGRo | Preferénela Abide ~ Fazer 30s | ase | 300 Natreza Humana - Muti! | 240 | 201 | 150 Natreza Humana Boa | t7 | 135 | 100 Homemtiatieza ~Harmonia| 2.42 | 1.88 | 199 Relaconal~ Colter! seo | 152 | 133 Temp ~ Futuro zor | ast | 139 Aparentemente, os valores médios das dimensbes ficaram acima das médias sem preferéncia. Para ve~ rificar se as diferencas entre as médias eram signifi- cativas, calculou-se o teste U, de Mann Whitney, Observou-se nao poder rejeitar a Ho para as orien- tages Atividade ~ Fazer e Natureza Humana ~ Boa, logo as duas populacées eram idénticas. Entretanto, rejeitou-se Ho e aceitou-se que a distribuigso das duas populacdes eram diferentes para as orlentacdes Na- tureza Humana - Mutdvel, Homem-Natureza ~ Har~ ‘monia, Relacional - Colateral e Tempo ~ Futuro. Estas hipéteses rejeitadas significam que as médias foram diferentes para as duas empresas. Notou-se que a diferenca entre a AGRO e a IND ‘estava na orientago de valor Tempo. A IND orien: ta-se para o Futuro e a AGRO para o Presente; po- rém, ressalta-se existir 18,3% de respostas indefinidas na AGRO, o que sinaliza a possibilidade de um pro- cesso de mudanca. Em ambas as empresas, na orientacao Natureza Humana, a escolha da alterativa Mutivel foi mar- cante ¢ os indices de indefinigao despreziveis. Prova velmente o fato de as pessoas poderem se adaptar a novas situagées justifique 0 alto valor de Tempo de Casa constatado. ‘Alinda sobre a orientacao Natureza Humana, & pos- sivel que 0s resultados obtidos possam ser generali- zados para além da amostra, tal foi a preferéncia que (08 grupos mostraram. O Homem @ mutével e bom ou, pelo menos, néo & mau. ‘Outro ponto que chamou nossa atencao foi a di- ferenga de énfase na escolha das alternativas das orientagdes de valor dominantes. Na orientacao de valor Atividade, 61% dos pesquisados da AGRO es colheram a alternativa Fazer, enquanto os da IND foram somente 49%. Quanto @ otientagao de valor Homem-Natureza, a alternativa Harmonia foi escolhi da por 46,3% na AGRO e 69% na IND. Essas dife- rengas mostram que as outras alternativas estao pre- sentes, com alguma intensidade, dentro de cada gru po, Na orientacdo de valor Homem-Natureza, a al- ternativa Dominag&o apareceu como mais forte na AGRO (29,3%) do que na IND (19,6%). No referente a orientaco de valor Relacional, a segunda alternativa mais escolhida na AGRO foi a Hierarquica (29,3%); ja na IND, foi a Individual (30,6%). Quanto & orien- tagao de valor Natureza Humana - Boa ou Ma, 0 niimero de indefinidos na AGRO (25,6%) chamou a atengéo, pois contrasta com a enfase apresentada na IND, em que 83,1% escolheram a altemativa Boa. Ho,3:A varidvel Tempo de Casa é independente das escolhas das orientacdes de valor dominantes. Para testar esta hip6tese, calculou-se 0 qui-quadra- do da variével Tempo de Casa, cruzando-a com as escolhas das orientacées de valor dominantes. Em fungao das limitacdes da estatistica do qui-quadrado para o teste de independéncia, foram calculadas duas medidas de associagao: o coeficiente de contingéncia @ 0 lambda de Goodman & Kruskal (Norusis, 1988). Revista. de Adminstap, So Paul v30, n3, p60-72, ualsetonbo 1995 a Gilberto Tadev Shinyashiki A hipétese fot rejeitada por existir alguma asso- clagéo entre tempo de casa e orientagéo de valor. Em dois dos seis testes realizados os resultados foram significativos. A variével Tempo de Casa associou-se as orientagdes de valor Natureza Humana - Boa e Relacional ~ Colateral. As associagées foram signifi- cativas, porém baixas. Ho,4:A variavel Quantidade de Promocées @ inde- pendente das escolhas das orientacées de valor dominantes. Utlizou-se © mesmo eritério do item anterior. Esta hipdtese foi rejeitada por existir alguma associacao entre promogao e orientacao de valor. Em trés dos sels testes realizados os resultados foram significati- vos. A variével Quantidade de PromogSes mostrou-se associada as orientacées de valor Natureza Humana = Mutavel, Natureza Humana - Boa e Relacional - Colateral Ho,5:A varidvel Escolaridade é independente das es- colhas das orientagées de valor dominantes. Esta hipétese foi testada e rejeitada por existit alguma assoclacéo entre escolaridade e orientacao de valor. Em trés dos seis testes realizados os resultados foram significativos. A variavel Escolaridade apresen- tou-se também associada as orientacées de valor Na- tureza Humana - Mutével, Natureza Humana - Boa e Relacional ~ Colateral Teste CHAID Analisar cada vartével, isoladamente, permite uma compreenséo limitada da forca de cada uma delas. Visando compreender a associagao de todas as varié- veis de socializagao (variéveis independentes) com as orientacées de valor (varigveis dependentes), foi rea- lizado 0 teste CHAID (Magdison, 1993). O teste fot para cada orientagao de valor, considerando as variaveis independentes empresa, sexo, idade, cargo ccupado, tempo de casa, quantidade de promogées, quantidade de empregos anteriores, local onde passou a infancia e escolaridade. ‘A escolaridade funcionou como prognosticador de quatro das seis orientacdes de valor, ao passo que a empresa, de somente duas. A influéncia da area fun- cional contribuiu para a previsio de duas das orien- tacdes. Pode-se identificar duas fontes de socializacao. Uma delas @ a organizacéo, que atuaria através das varidveis promogo e empresa, ¢ a outra a sociedade, através das variaveis escolaridade, infancia, area fun- clonal, ter trabalhado em outras empresas, cargo ¢ dade. A primeira influenciou trés vezes na escolha das orientacdes de valor, enquanto a segunda teve articipago maior nas predig6es, nove vezes, como consta no quadro 3. Quadro 3 Distribuicdo das Variaveis de Controle como Fatores de Previsdo das Orientacées de Valor ‘Apurados Através do CHAID Orientagao de Valor Variaveis = gl) 3 3 g/2)./E/8/ B/E & i a) 2/s/8/é Promogio . 1 Cage : 1 Eacapdo +i. eiliars era inti * 1 Tabanan Q Empresa + - 2 ‘ea tional : [2 Wace [4 Frege | 1] +] 2[ 2] 3] 3| 2 coNncLusdEs Os resultados das andlises permitem algumas con- clusbes sobre 0 conceito de pressupostes basicos e sobre 0 processo de socializacao. ‘A primeira hipétese baseia-se na existéncia de uma cordenacéo das orientagées de valor dominantes, pré- pria de cada empresa, ou um conjunto de pressu- postos basicos. E possivel concluir que surge, dentro de cada empresa, uma ordenagao das diversas dimen- s6es das orientacdes de valor, criando paradigmas culturais préprios a cada uma delas. Hé diferenga entre a ordenacao de uma empresa a da outra. Os grupos apresentam diferencas quanto a orientacdes de Tempo (Futuro na IND e Presente na AGRO) e Relacional, nao escolhida pelos respon- dentes da AGRO. Entretanto, o mais marcante é que algumas orientac6es de valor dominantes sao comuns Revista de Admnsrerto, Sdo Pau v30, 3, p 60.72, uolstenbro 1955, ESTUDO QUANTITATIVO DOS PRESSUPOSTOS BASICOS DA CULTURA ORGANZACIONAL a ambas, existindo variagao apenas na intensidade de referencia Em duas das orientagées de valor constata-se pe~ quena diferenca entre suas duas dimensoes mais es- colhidas, Na IND, no referente a orientagéo Atividade, Fazer apresenta valor médio de 3,05 e Ser de 2,87; na AGRO, quanto a orientacdo Tempo, Futuro apre- senta valor médio de 1,87 e Presente de 1,67. Con- tudo, estes dados nao chegam a afetar os resultados. Conforme a teoria de orientago de valor de Kluck- hon, Strodtbeck et alii (1961) e a dos pressupostos basicos de Schein (1984), existe similaridade na or- denacéo das alternativas das orientagdes de valor e, também, variabilidade entre empresas e orientagoes, A descoberta de um padrao de pressupostos de um grupo e a formacao de um paradigma, pelo qual seus membros percebem, pensam, sentem e julgam situa- {es ¢ relaclonamentos, crjam condig6es para a com- preenséo da cultura de um grupo. Todavia, segundo Kluckhohn, Strodtbeck et ail, 0 mais importante da teoria € compreender a variagéo nas orientagées de valor de uma cultura como uma rede de orientagdes de valor dominantes (mais preferidas) ¢ orientagées de valor variantes, permitidas e até exigidas, Isto significa que o sistema de orientacées de valor de lum grupo nao deve ser encarado como um sistema Uunitério de valores dominantes. Coexistem valores va- riantes permitidos ¢ necessérios, diferentes dos domi- nantes, apesar de influenciados pelos dominantes. Por sua vez, Schein nao afirmou que o sistema & de pressupostos dominantes, mas nao enfatizou a va- rlagéo existente junto com o sistema de orientagdes dominantes. A consisténcia do sistema social nao é apenas uma questo de valores dominantes, mas tam- bém a influencia corrente de determinado tipo de ordenagéo sobre as ordenagées variantes. (© resultado € uma concepeso mais dinamica da so- ciedade, na qual o afastamento dos valores dominantes pode ser compreendido pela ordenagdo dos valores va- riantes, Desta forma, a compreensao da cultura de um ‘grupo precisa ser mediada pela andlise da diferenca existente entre a intensidade da escolha da orfentagéo dominante e a da escolha da orientacéo variante. Nesse ponto observase que as perspectivas des- critas por Martin (1992) podem auxiliar na compreer- so dos resultados. Mais do que procurar uma mant festagio cultural consistente e compartihada por to- dos de uma empresa, o pesquisador depara-se com varias subculturas que, freqiientemente, esto em con- flito umas com as outras, sendo 0 consenso somente encontrado dentro das fronteiras de cada subcultura. Na segunda hipétese, existiria uma ordenacéo das orientagées de valor comum as duas empresas situadas no interior do estado de S80 Paulo. Quando foram analisadas as preferéncias dos empregados de cada ‘empresa, observou-se que as orientacdes dominantes referentes a Atividade, Homem-Natureza e Natureza ‘Humana sé comuns a ambas as empresas e se apre- sentam com intensidades diferentes. As diferencas es- tio na orientacio Tempo — a IND para o Futuro a AGRO para 0 Presente — e na falta de preferencia tna AGRO quanto & orientacéo Relacional. As conclu: sbes de Schein (1984), de que “paradigmas culturais sho verses adaptadas de paradigmas culturais mais amplos”, e de Hofstede, Neuijin, Ohjaiv & Sanders (1990), de que “culturas organizacionais refletem a nacionalidade, caracteristicas demogréficas dos em- pregados e gerentes, o tipo de indtstria e mercado”, encontram apoio neste estudo, O teste de Mann Whit ney — U — nao rejeita a igualdade das duas popu- lagdes para as orientagées Atividade - Fazer e Natu- reza Humana - Boa. Considerado-se as diferencas corganizacionais © as distancias regionais, foram en- contrados indicios de que existe uma ordenaco co- mum de algumas orientacées de valor. ‘Uma provavel explicagao para a diferenca consta: tada na orientagéo Tempo pode ser o fato de os grupos pertencerem a tipos diferentes de industria, A IND atua em ambiente mais competitivo que exige processo de desenvolvimento de produto e de inova- ao tecnolégica que, por sua vez, implica em vis&o de tempo muito mais longa do que a do grupo da AGRO, como assinalaram Lawrence & Lorsch (1973) sobre os diferentes ciclos de tempo, no estudo com parativo de organizagées. Esses resultados sao tam- ‘bem coerentes com os encontrados por Chatman & Jehn (1994) que constataram similaridades entre cul turas de firmas de uma mesma indistria ¢ relagdo entre cultura e tecnologia, ‘A falta de preferéncia, na AGRO, quanto a orien tagao de valor Relacional, pode ser compreendida pelas alteragées ocorridas nas relagdes de trabalho ppelo esforco que a empresa tem feito para sua moder- nizagéo organizacional, como programas de comunt- cago, qualidade e treinamento gerencial 'Na terceira hipétese observou-se que somente duas orientacdes de valor esto associadas a tempo de casa, Este resultado ¢ interessante porque em estudo ante- rior, realizado em quatro faculdades da Universidade de Sao Paulo, péde ser constatada diferenca maior entre calouros e alunos do iltimo ano. Comparando os dois estudos, tem-se a impresséo de que quatro ou cinco anos de faculdade s4o mais marcantes na vida de uma pessoa do que dez anos de empresa. Esse resultado chama a atencéo para. os estudos sobre comprometimento, Segundo Steers (1977), Revista de Adminisalo, So Paulo 30, n3, 26072, uhasetenbeo 1995 @ Gilberto Tadeu Shinyashiki “comprometimento organizacional pode ser definido como a forca relativa da identificagao e envolvimento do individuo com uma determinada orgenizacéo. E pode ser caracterizado por trés fatores: a) forte crenca @ aceitacao dos objetivos ¢ valores organizacionais; ) 0 desejo de dedicar uma energia considerdvel em favor da organizagio; e c) um forte desejo de manter sua afiliagdo organizacao”. Analisando a definicao de Steers, nota-se que o item € criou a ilusdo, na gestéo de recursos humanos, de que o tempo de casa estava associado ao comprometimento. Por isso, compreen- dese todo o empenho na implementacéo da politica de oferecimento de beneficios, a fim de amarrar o ‘empregado & empresa. Entretanto, essa ilusdo acabou quando ficou clara a diferenciago entre comprometi- ‘mento afetivo e de continuidade* e quando as empresas perceberam que apenas o fato do empregado perma- necer nao significa que ele esté disposto 2 dar algum adicional de energia para a realizacao dos objetivos, ‘além do minimo necessério para ficar na empresa Van Maanen & Schein (1979) desenvolveram um modelo de teoria de socializacao na qual afirmaram que esta é mais forte quando o individuo atravessa frontelras, que esto relacionadas a trés dimensdes organizacionais: + funcional — refere-se as varias tarefas desempe- nhadas pelos membros da organizag&o: « hierarquica— refere-se & distribuigdo das posicdes dentro da organizacéo; & + incluso — refere-se & incluso do individuo dentro da organizacao. Esperava-se que 0 tempo de casa implicasse em maior incluso do individuo na organizac8o. Entretan- to, néo foi encontrado suporte para essa expectativa O 'fato de o individuo permanecer no grupo nao esté necessariamente ligado a sua maior ades8o aos valores do grupo. Além do fator quantitativo (tempo de casa), devem existir outros fatores qualitativos que, associa- dos ao tempo de casa, podem proporcionar maior Inclusio do individuo no grupo. Quanto & hipétese quatro, observou-se que as pro- mogSes se associam a trés orientacées de valor. Neste caso, foi encontrado suporte para a importancia dos comprometment afeivo & estar ainado cam os cbjebves da empresa © depoto 2 dar um adcional de ene para sconces desses objets, CConpremetmeno de coninadade & coninuar cra inha de apd eral. rene, eere-se a qualquer cota de valor ave 0 indvcuo lene mvesigo tempo, esos, dara ete. — e que pode ser peri ou trnada sem ‘alr, com caro custo percaide pelo indiduo se ele dexar a empresa, Esses investimenos podem inelitcanbugtes para fndo de prevasnea vada, desenvolvimento de habilidades espectcas, enpcéstines com tas Fedundas (Meyer & Alen, 1984, aspectos hierérquico ou funcional, considerando que a instrugdo para o preenchimento do itern do ques- tionario referente ao ntimero de promogées abrangia promogées verticals e horizontals. E possivel com- preender, agora, porque Van Maanen & Schein (1979) véem a carreira de um individuo como maior fator de socializacao do adulto na organizacao. Na quinta hipétese a escolaridade mostrou-se re- lacionada a trés orientacdes de valor. Esta associagao é coerente com a expectativa de modernidade. Inkeles & Smith (1981) afirmaram que escolaridade, trabalho em fébrica e meios de comunicacao contribuem para a modernidade do individuo. Os resultados obtidos neste estudo parecem estar préximos desta afirmacdo Os resultados permitem compreender que algumas orientacdes de valor esto mais associadas a variaveis de socializagao primaria, coerentes com a expectativa de que 0s paradigmas culturais de uma organizagio sao adaptagées de paradigmas culturais mais amplos (Schein, 1984) ou mesmo com as conclusées de Hofs- tede, Neuijin, Ohjaiv & Sanders (1990), de que as culturas organizacionais refletem a nacionalidade, as caracteristicas demograficas dos empregados e geren- tes, 0 tipo de indistria e o mercado. Cabe aqui um comentario sobre as politicas de recursos humanos, pois durante muito tempo esta area esteve voltada para os sistemas de treinamento e desenvolvimento. Observourse que algumas orien- tagdes de valor esto relacionadas a variaveis de so- cializagSo primaria, sugerindo que se deve prestar atencao, também, aos sistemas de recrutamento, se- lecho e avaliagao. E & bastante forte a associacao das promogées com as escolhas de orientacées de valor, © que indica a necessidade de considerar os processos de carreiras € promogées, Finalmente, cabe ressaltar que a proposta de trian- gulagdo de Duncan (1986) é positiva para identificar com maior preciso a cultura organizacional. A abor- dagem quantitativa @ bastante poderosa para definir as caracteristicas da populacao apontar as regula ridades que poderdo, posteriormente, ser explicadas por uma abordagem qualitativa. Além disso, @ pes- quisa qualitativa seré beneficiada por passar a ter um. foco mais preciso, exigindo menores tempo e recur- sos. Estas vantagens nao séo despreziveis, conside- rando-se que as organizades procuram racionalizar ¢ otimizar seus recursos, tornando-os menos dispont- veis para estudos mais longos. Outro fator que merece destaque é a contribuicao que os estudos quantitativos podem propiciar as politicas de recursos humanos, ois, descobrindo algumas regularidades e associa- es, podem ser identificados fatores que informam com maior exatidéo alguns resultados desojados. Revista de Adina, So Paulo v30, 3, p.80-72. uote 1805, ESTUDO QUANTITATIVO DOS PRESSUPOSTOS BASICOS DA CULTURA ORGANIZACIONAL DIRECIONAMENTO PARA NOVAS PESQUISAS ‘A teflexio mais intrigante seria identificar 0 que efetivamente é socializado durante @ permanéncia do individuo dentro da organizaao. A valorizagao do pro~ cesso de socializagao organizacional precisa ser melhor entendida e, com certeza, 0 processo mais complexo do que simplesmente permanecer em contato com 0 grupo — as promogées explicam melhor algumas orien- tacdes de valor. O fundamental € compreender qual é © produto da socializacdo; os estudos mostram mais as influencias nos comportamentos ¢ atitudes, mas prova- velmente nao com relagio aos valores. Estes resistem ‘mais as mudangas e sko mais estaveis, porque séo mais centrais e muitas crencas dependem deles. E reconhecido que a socializagao acontece na idade adulta (Inkeles & Smith, 1981), mas a experiencia na empresa precisa ser melhor compreendida. Em um primeiro momento, parece que essa experiencia pouco potente para provocar mudangas de valores, ‘0 que vai de encontro a Hofstede, Neuijin, Ohjaiv & Sanders (1990), que afirmaram abranger 0 proceso de socializagao somente normas e praticas das em- presas e nao seus valores, e a Etzioni (1974), que salientou ocorrer a socializagéo expressiva na familia ena escola e no na organizacio. Assim, certamente é fora da empresa que serdo encontrados os agentes socializadores mals poderosos para a alteracao de va~ lores. Outra direcdo é analisar a pressdo socializadora exercida pela empresa, que também & um fator va- riavel (Pascale, 1985) A literatura sobre socializagao infantil é rica e tem longa histéria, enquanto a socializagéo do adulto ape- nas comeca a receber a atencdo dos pesquisadores. Existe pouca comprovacao empirica de némero cres cente de modelos conceituais e a linguagem é, ainda, pouco precisa. ‘A socializacao ocupacional, que responde por trés prognosticadores de orientacao de valor, precisa ser melhor compreendida no processo de socializacéo. Salienta-se que na maioria das vezes a socializagéo ‘ocupacional nao ocorre dentro da empresa. Um estudo longitudinal &, com certeza, necessario para a melhor compreensao do proceso de sociall- zagao organizacional. Mesmo nos estudos com amos tras ndo-relacionadas tem-se dificuldade para contro- lar e medir os atributos pessoais que sofreram mu: dangas no proceso de socializagao. Nossa experiéncia no estudo com estudantes, calouros e veteranos, mos- trou isso, # RESUMO © conceito de cultura organizacional tornou-se cada vez mais relevante para o estudo da Administracao. Neste trabalho objetiva-se contribuir com 0 desenvolvimento de um instrumento quantitative para o estudo da cultura organizacional. O instrumento baseia-se no estudo de orientacdo de valor realizado por Kluckhohn, Strodtbeck et alii (1961), que serviu de base para o conceito de pressupostos basicos desenvolvido por Schein (1984). Para este autor, os pressupostos bésicos (orientagdes de valor) constituem niicleo da cultura de uma organizacao. O instrumento foi aplicado fem duas empresas situadas no interior do estado de Sao Paulo. Paralelamente 20 trabalho de \dentificagao das orientagées de valor, foram controlados alguns antecedentes (sexo, idade, area funcional, cargo, tempo de casa, quantidade de promogées, nimero de empresas em que trabalhou, onde morou na infancia e escolaridade}, que estéo relacionados ao processo de socializagio do individuo, e procurowse analisar a associagSo desses fatores com as escolhas das orlentagées de valor. Palavras-chave: cultura organizacional, pressupostos basicos, orientagées de valor, proceso de ABSTRACT socializacdo organizacional. ‘The concept of organizational culture became steadily more important for Business Administration studies. This paper aims at contributing to the development of a quantitative tool for studying the organizational culture. The tool is based on the value orientation study, carried out by Kluckhohn, Strodtbeck and all (1961), which in turn served as basis for the basic assumptions concept proposed by Schein (1984), For the author, basic assumptions (value orientations) form the cultural core of an organization. The tool was applied in two companies located at the State of Sdo Paulo, Parallel to the job of identifying value orientations, some further data related to the subject's socialization process was controlled (sex, age, functional sector, job, time in the company, number of promotions, number of companies where the subject has worked, where he lived during childhood and education level). The author tried to analyze the correlation of those factors with the choice of value orientations Uniterms: organizational culture, basic assumptions, value orientations, organizational socialization process. Revista de Adriistago, So Paulo V90,n3, p 6072, jubalelembro 1995 " Gilbero Tadeu Shinyashiki iS REFERENCIAS BIBLIOGRAFICA: ‘ADLER, Nancy J. international dimensions of organiza- tional behavior. Kent Publishing Company, 1986. ALVESSON, M. & BERG, P.O. Corporate culture and or- ganizational symbolism, Berlin, Walter de Gruyter, 1992. ARCHIER, G. & SERIEYX, H. A empresa do 3° tipo. 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