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PORTADORES DE DEFICIÊNCIA: A QUESTÃO DA INCLUSÃO SOCIAL

PORTADORES DE DEFICIÊNCIA
a questão da inclusão social

MARIA REGINA CAZZANIGA MACIEL


Presidente da Associação do 3º Milênio – Centro de Democratização das Ciências da Informação

Resumo: A questão da inclusão de pessoas portadoras de necessidades especiais em todos os recursos da so-
ciedade ainda é muito incipiente no Brasil. Movimentos nacionais e internacionais têm buscado um consenso
para formatar uma política de inclusão de pessoas portadoras de deficiência na escola regular.
Passos fundamentais devem ser dados para mudar o quadro de marginalização dessas pessoas, como: altera-
ção da visão social; inclusão escolar; acatamento à legislação vigente; maiores verbas para programas sociais;
uso da mídia, da cibercultura e de novas tecnologias.
Cabe a todos os integrantes da sociedade lutar para que a inclusão social dessas pessoas seja uma realidade
brasileira no próximo milênio.
Palavras-chave: deficiência e exclusão social; educação e economia; política educacional.

oje, no Brasil, milhares de pessoas com algum nacionais, em assembléia geral, na cidade de Salamanca,

H tipo de deficiência estão sendo discriminadas nas


comunidades em que vivem ou sendo excluídas
do mercado de trabalho. O processo de exclusão social
na Espanha, em junho de 1994.
Este evento teve como culminância a “Declaração de
Salamanca”, da qual transcrevem-se, a seguir, pontos
de pessoas com deficiência ou alguma necessidade espe- importantes, que devem servir de reflexão e mudanças
cial é tão antigo quanto a socialização do homem. da realidade atual, tão discriminatória.
A estrutura das sociedades, desde os seus primórdios, “Acreditamos e Proclamamos que:
sempre inabilitou os portadores de deficiência, margina- - toda criança tem direito fundamental à educação
lizando-os e privando-os de liberdade. Essas pessoas, sem e deve ser dada a oportunidade de atingir e manter
respeito, sem atendimento, sem direitos, sempre foram alvo o nível adequado de aprendizagem;
de atitudes preconceituosas e ações impiedosas. - toda criança possui características, interesses, ha-
A literatura clássica e a história do homem refletem bilidades e necessidades de aprendizagem que são
esse pensar discriminatório, pois é mais fácil prestar aten- únicas;
ção aos impedimentos e às aparências do que aos poten-
- sistemas educacionais deveriam ser designados
ciais e capacidades de tais pessoas.
e programas educacionais deveriam ser imple-
Nos últimos anos, ações isoladas de educadores e de
mentados no sentido de se levar em conta a vasta
pais têm promovido e implementado a inclusão, nas es-
diversidade de tais características e necessidades;
colas, de pessoas com algum tipo de deficiência ou ne-
cessidade especial, visando resgatar o respeito humano e - aqueles com necessidades educacionais especiais
a dignidade, no sentido de possibilitar o pleno desenvol- devem ter acesso à escola regular, que deveria
vimento e o acesso a todos os recursos da sociedade por acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na
parte desse segmento. criança, capaz de satisfazer tais necessidades;
Movimentos nacionais e internacionais têm buscado o - escolas regulares, que possuam tal orientação in-
consenso para a formatação de uma política de integra- clusiva, constituem os meios mais eficazes de com-
ção e de educação inclusiva, sendo que o seu ápice foi a bater atitudes discriminatórias, criando-se comu-
Conferência Mundial de Educação Especial, que contou nidades acolhedoras, construindo uma sociedade
com a participação de 88 países e 25 organizações inter- inclusiva e alcançando educação para todos; além

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disso, tais escolas provêem uma educação efetiva - as Nações Unidas e suas agências especializadas,
à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em particular a ILO, WHO, Unesco e Unicef;
em última instância, o custo da eficácia de todo o - a reforçar seus estímulos de cooperação técnica,
sistema educacional. bem como reforçar suas cooperações e redes de
Nós congregamos todos os governos e deman- trabalho para um apoio mais eficaz à já expandida
damos que eles: e integrada provisão em educação especial;
- atribuam a mais alta prioridade política e finan- - a reforçar sua colaboração com as entidades ofi-
ceira ao aprimoramento de seus sistemas educacio- ciais nacionais e intensificar o envolvimento cres-
nais no sentido de se tornarem aptos a incluírem cente delas no planejamento, implementação e
todas as crianças, independentemente de suas di- avaliação de provisão em educação especial que
ferenças ou dificuldades individuais; seja inclusiva;
- adotem o princípio de educação inclusiva em for- - Unesco, enquanto a agência educacional das Na-
ma de lei ou de política, matriculando todas as ções Unidas;
crianças em escolas regulares, a menos que exis- - a assegurar que educação especial faça parte de
tam fortes razões para agir de outra forma; toda discussão que lide com educação para todos
- desenvolvam projetos de demonstração e enco- em vários foros;
rajem intercâmbios em países que possuam expe- - a mobilizar o apoio de organizações dos profis-
riências de escolarização inclusiva; sionais de ensino em questões relativas ao aprimo-
- estabeleçam mecanismos participatórios e descen- ramento do treinamento de professores no que diz
tralizados para planejamento, revisão e avaliação respeito a necessidades educacionais especiais;
de provisão educacional para crianças e adultos - a estimular a comunidade acadêmica no sentido
com necessidades educacionais especiais; de fortalecer pesquisa, redes de trabalho e o esta-
- encorajem e facilitem a participação de pais, co- belecimento de centros regionais de informação e
munidades e organizações de pessoas portadoras documentação e, da mesma forma, a servir de
de deficiências nos processos de planejamento e exemplo em tais atividades e na disseminação dos
resultados específicos e dos progressos alcançados
tomada de decisão concernentes à provisão de ser-
em cada país no sentido de realizar o que almeja a
viços para necessidades educacionais especiais;
presente Declaração;
- invistam maiores esforços em estratégias de iden-
- a mobilizar Fundos através da criação (dentro de
tificação e intervenção precoces, bem como nos
seu próximo Planejamento a Médio Prazo 1996-2000)
aspectos vocacionais da educação inclusiva;
de um programa extensivo de escolas inclusivas e pro-
- garantam que, no contexto de uma mudança gramas de apoio comunitário, que permitiriam o lan-
sistêmica, programas de treinamento de professo- çamento de projetos-piloto que demonstrassem no-
res, tanto em serviço como durante a formação, vas formas de disseminação e o desenvolvimento de
incluam a provisão de educação especial dentro das indicadores de necessidade e de provisão de edu-
escolas inclusivas. cação especial”.
Nós também congregamos a comunidade inter- A inclusão escolar, fortalecida pela Declaração de
nacional; em particular, nós congregamos gover- Salamanca, no entanto, não resolve todos os problemas
nos com programas de cooperação internacional, de marginalização dessas pessoas, pois o processo de ex-
agências financiadoras internacionais, especial- clusão é anterior ao período de escolarização, iniciando-
mente as responsáveis pela Conferência Mundial se no nascimento ou exatamente no momento em aparece
em Educação para Todos, Unesco, Unicef, UNDP algum tipo de deficiência física ou mental, adquirida ou
e o Banco Mundial: hereditária, em algum membro da família. Isso ocorre em
- a endossar a perspectiva de escolarização inclu- qualquer tipo de constituição familiar, sejam as tradicio-
siva e apoiar o desenvolvimento da educação es- nalmente estruturadas, sejam as produções independen-
pecial como parte integrante de todos os progra- tes e congêneres e em todas as classes sociais, com um
mas educacionais; agravante para as menos favorecidas.

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O nascimento de um bebê com deficiência ou o apare- fesos, sem direitos, sempre deixados para o segundo lu-
cimento de qualquer necessidade especial em algum mem- gar na ordem das coisas. É necessário muito esforço para
bro da família altera consideravelmente a rotina no lar. superar este estigma.
Os pais logo se perguntam: por quê? De quem é a culpa? Essa situação se intensifica junto aos mais carentes, pois
Como agirei daqui para frente? Como será o futuro de a falta de recursos econômicos diminui as chances de um
meu filho? atendimento de qualidade. Tem-se aí um agravante: o po-
O imaginário, então, toma conta das atitudes desses pais tencial e as habilidades dessas pessoas são pouco valoriza-
ou responsáveis e a dinâmica familiar fica fragilizada. dos nas suas comunidades de origem, que, obviamente, pos-
Imediatamente instalam-se a insegurança, o complexo de suem pouco esclarecimento a respeito das deficiências. Onde
culpa, o medo do futuro, a rejeição e a revolta, uma vez estão as causas da exclusão dessas pessoas no Brasil?
que esses pais percebem que, a partir da deficiência ins- No plano de governo, o que se vê são programas, pro-
talada, terão um longo e tortuoso caminho de combate à postas, projetos, leis e decretos com lindas e sonoras si-
discriminação e ao isolamento. glas, que ficam, na maioria das vezes, só no papel. Pro-
O quadro fica mais sério, tendo em vista que a tendên- gramas similares e simultâneos são lançados em duas ou
cia dos profissionais da saúde é sempre ressaltar, no diag- três pastas, sem que haja integração de objetivos e metas
nóstico, os aspectos limitantes da deficiência, pois inva- entre eles.
riavelmente são eles que primeiro são chamados para dar Muitas vezes acontecem ações paralelas entre o gover-
o diagnóstico conclusivo. Os médicos raramente esclare- no e a iniciativa privada, que ficam desintegradas, super-
cem ou informam, aos familiares de portadores de defi- postas, sem consistência e dirigidas a pequenos grupos,
ciência, as possibilidades de desenvolvimento, as formas gastando verbas sem mudar o quadro de exclusão exis-
de superação das dificuldades, os locais de orientação tente.
familiar, os recursos de estimulação precoce, os centros Essas ações não são permanentes, pois a cada mudan-
de educação e de terapia. ça de governo são interrompidas, esvaziadas, perdendo a
A esses familiares pede-se que aceitem uma realidade continuidade e a abrangência, sendo que outras aparecem
que não desejam e que não é prevista, uma realidade em em seus lugares para “fixar” a plataforma de quem está
que os meios sociais e a mídia pouco abordam e, quando no poder.
o fazem, é de maneira superficial, às vezes preconceituosa Nos estados e municípios, não existe uma política efe-
e sem apresentar os caminhos para a inclusão social. tiva de inclusão que viabilize planos integrados de urba-
Os pais ou responsáveis por portadores de deficiência, nização, de acessibilidade, de saúde, educação, esporte,
por sua vez, também se tornam pessoas com necessida- cultura, com metas e ações convergindo para a obtenção
des especiais: eles precisam de orientação e principalmente de um mesmo objetivo: resguardar o direito dos portado-
do acesso a grupos de apoio. Na verdade, são eles que res de deficiência.
intermediarão a integração ou inclusão de seus filhos junto As dificuldades são imensas para sensibilizar executi-
à comunidade. vos de empresas privadas, técnicos de órgãos públicos e
Cada deficiência acaba acarretando um tipo de com- educadores sobre essa questão. Um sentimento de omis-
portamento e suscitando diferentes formas de reações, são aparece, consciente ou inconscientemente, em técni-
preconceitos e inquietações. As deficiências físicas, tais cos, executivos e burocratas, quando necessitam decidir
como paralisias, ausência de visão ou de membros, cau- sobre o atendimento às necessidades dos portadores de
sam imediatamente apreensão mais intensa por terem deficiência.
maior visibilidade. Já a deficiência mental e a auditiva, Essas reações preconceituosas, de omissão e descaso,
por sua vez, são pouco percebidas inicialmente pelas pes- já podem ser classificadas:
soas, mas causam mais estresse, à medida que se toma - nos órgãos públicos, as solicitações e reivindicações de
consciência da realidade das mesmas. pessoas portadoras de deficiência logo se transformam nos
A falta de conhecimento da sociedade, em geral, faz famosos processos “Ao-Ao”, em que cotas endereçadas
com que a deficiência seja considerada uma doença crô- “Ao” Dr. Fulano, “Ao” departamento tal e “Ao” setor de
nica, um peso ou um problema. O estigma da deficiência Sicrano só criam volume, burocracia e não apontam para
é grave, transformando as pessoas cegas, surdas e com soluções, pois todos transferem o “problema” para ter-
deficiências mentais ou físicas em seres incapazes, inde- ceiros, eximindo-se, assim, da necessidade de propor al-

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ternativas de atendimento. Nesses processos, quase todos Em nome da igualdade de atendimentos, muitos teóri-
se omitem de tomar decisões em benefício dos portado- cos radicais defendem a inclusão escolar de forma sim-
res de deficiência; plista: é só colocar esse aluno na classe comum e tudo se
- na área de atendimento e serviços à população, a res- resolve. Entretanto, suas teses não refletem a realidade
posta mais freqüente é a “NTV” – “não temos vaga”; de que as pessoas com deficiência possuem necessidades
educativas especiais e, assim, pouca contribuição têm tra-
- há, também, a adoção, tão popular para as pessoas de
zido para todos os envolvidos na questão. Também em
baixa renda, do sistema “ENFE” de atendimento, ou seja,
nome da igualdade de atendimentos, muitos deles negam
“entre na fila de espera”.
veementemente as experiências positivas de escolas e de
Por outro lado, a idéia de modelos únicos para todos, classes especiais, que souberam desenvolver o potencial
preestabelecidos, tem excluído pessoas com necessidades
de seus alunos e, dessa forma, contribuíram para a sua
especiais dos recursos da sociedade, como comprovam
inclusão junto à sociedade. Negar os trabalhos positivos
as barreiras arquitetônicas, sociais e educacionais. No do passado é esquecer que a construção do conhecimento
plano dos atendimentos específicos, a realidade é a se-
está baseada no acúmulo de experiência adquirida.
guinte:
Deve-se lembrar, sempre, que o princípio fundamen-
- saúde: os locais de atendimentos na área de saúde são
tal da sociedade inclusiva é o de que todas as pessoas
pequenos, superlotados e sem infra-estrutura. As políti-
portadoras de deficiência devem ter suas necessidades
cas de prevenção, às vezes, ficam restritas a algumas cam-
especiais atendidas. É no atendimento das diversidades
panhas de vacinação e os programas de diagnóstico pre-
que se encontra a democracia. O que fazer diante deste
coce são insuficientes. Os testes com aparelhos de última
quadro? O primeiro passo é conseguir a alteração da vi-
geração são destinados a poucos; as de terapias e fisiote-
são social através:
rapias oferecem poucas vagas em relação à demanda; a
- de um trabalho de sensibilização contínuo e permanen-
obtenção de próteses e órteses é difícil e as filas de espe-
te por parte de grupos e instituições que já atingiram um
ra são enormes para quem não tem poder aquisitivo;
grau efetivo de compromisso com a inclusão de portado-
- área social: os programas para as pessoas com alguma res de necessidades especiais junto à sociedade;
deficiência são, em geral, os que possuem as menores
- da capacitação de profissionais de todas as áreas para o
verbas, não existe trabalho efetivo junto às comunidades
atendimento das pessoas com algum tipo de deficiência;
mais carentes e os grupos de orientação e atendimento
estão sempre superlotados; - da elaboração de projetos que ampliem e inovem o aten-
dimento dessa clientela;
- mercado de trabalho: poucos são os empregadores que
se dispõem a absorver esse segmento. O portador de de- - da divulgação da Declaração de Salamanca e outros do-
ficiência é o último a ser contratado e o primeiro a ser cumentos congêneres, da legislação, de informações e
demitido, sendo que sua faixa salarial é, em média, me- necessidades dos portadores de deficiência e da impor-
nor que a de seus colegas de profissão; tância de sua participação em todos os setores da socie-
dade.
- nas áreas de lazer, esportes, cultura e transportes não
existem projetos abrangentes que atendam a todos os ti- A reestruturação das instituições não deve ser apenas
pos de deficiência e, nas áreas de comércio, indústria e uma tarefa técnica, pois depende, acima de tudo, de mu-
serviços, a acessibilidade inexiste ou é inconsistente; danças de atitudes, de compromisso e disposição dos in-
- na educação também não é diferente, pois só as grandes divíduos. O segundo passo no processo de inclusão so-
cidades possuem algum tipo de atendimento. A realidade cial é o da inclusão escolar.
tem mostrado que os ciclos do ensino fundamental, com Ao entrarem para a escola, as crianças que possuem
sua passagem automática de ano, e a falta de formação de alguma necessidade educativa especial terão que se inte-
professores, de recursos técnico-pedagógicos, de estímu- grar e participar obrigatoriamente de três estruturas dis-
lo suplementar, de acompanhamento de equipe multidis- tintas da dinâmica escolar: o ambiente de aprendizagem;
ciplinar – fonoaudiólogos, assistentes sociais, psicólogos, a integração professor-aluno; e a interação aluno-aluno.
terapeutas ocupacionais –, de salas e de professores de A partir da análise e adequação destas estruturas e do
apoio deixam a questão da inclusão escolar sem estrutura levantamento de alternativas que favoreçam o desenvol-
eficiente, bonita apenas na teoria. vimento dos alunos, em geral, e dos portadores de neces-

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sidades educativas especiais, em particular, é que a in- questão da deficiência e as formas de convivência que
clusão escolar deve ter início. Assim, é necessário anali- respeitem as diferenças, o que não é tarefa fácil, mas pos-
sar se o ambiente de aprendizagem é favorecedor, se existe sível de ser realizada. Levar os alunos de classes regula-
oferta de recursos audiovisuais, se ocorreu a eliminação res a aceitarem e respeitarem os portadores de deficiên-
de barreiras arquitetônicas, sonoras e visuais de todo o cia é um ato de cidadania.
próprio escolar, se existem salas de apoio pedagógico para Cabe a todos profissionais de escolas especiais, de clas-
estimulação e acompanhamento suplementar, se os currí- ses especiais, de salas de apoio a portadores de necessi-
culos e estratégias de ensino estão adequados à realidade dades especiais, aos teóricos da educação inclusiva, aos
dos alunos e se todos os que compõem a comunidade es- profissionais das escolas regulares e às equipes multi-
colar estão sensibilizados para atender o portador de de- disciplinares e de saúde a função primordial da integra-
ficiência com respeito e consideração. ção de ações, da otimização dos recursos e dos atendi-
Para que haja a verdadeira integração professor-alu- mentos, da criação de canais de comunicação que
no, é necessário que o professor da sala regular e os espe- considerem a questão da inclusão social como prioritária
cialistas de educação das escolas tenham conhecimento e anterior à inclusão escolar.
sobre o que é deficiência, quais são seus principais tipos, O futuro é outra dimensão que também não pode ser
causas, características e as necessidades educativas de cada esquecida, pois é preciso estar preparado para a rápida
deficiência. O professor precisa, antes de tudo, ter ampla evolução tecnológica destes novos tempos, que influen-
visão desta área, que deve ser proveniente de sua forma- cia e modifica o processo educativo e a nossa relação com
ção acadêmica. Hoje, poucas escolas e universidades, que a construção do conhecimento.
formam professores, abordam adequadamente a questão Para a estimulação da pessoa com deficiência, a
da deficiência em seus currículos. Urge mudar essa reali- tecnologia da informação é fundamental, pois a veloci-
dade. A atualização periódica também é indispensável, dade da renovação do saber e as formas interativas da
devendo ocorrer por meio de cursos, seminários e forma- cibercultura trazem uma nova expectativa de educação
ção em serviço. para essa clientela. É necessário, portanto, criar serviços
É importante que os professores tomem ciência do diag- e propostas educativas abertas e flexíveis que atendam às
nóstico e do prognóstico do aluno com necessidades edu- necessidades de mudanças.
cativas especiais, entrevistem pais ou responsáveis para A cibercultura não só demonstra que a maior parte dos
conhecer todo o histórico de vida desse aluno, a fim de conhecimentos adquiridos por uma pessoa no início de
traçar estratégias conjuntas de estimulação família-esco- sua vida educacional estará ultrapassada ao final de um
la, peçam orientações e procurem profissionais – como certo tempo, como também aponta novas formas de habi-
psicólogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos – que estejam litação e reabilitação de pessoas com necessidades edu-
atendendo ou que já atenderam esses alunos, solicitando cativas especiais. Esse fenômeno de captação de trans-
relatórios e avaliações, e pesquisem várias técnicas, mé- formações constantes deve ser posto ao alcance das
todos e estratégias de ensino, em que variáveis como o pessoas com necessidades especiais.
desenvolvimento da linguagem, o desenvolvimento físi- O terceiro passo para a inclusão social de portadores
co e sobretudo as experiências sociais estejam presentes. de deficiência é a instituição de mecanismos fortalecedores
A integração professor-aluno só ocorre quando há uma desses direitos, tais como destinação de maiores verbas
visão despida de preconceito, cabendo ao professor fa- públicas para os projetos que atendam esse segmento e
vorecer o contínuo desenvolvimento dos alunos com ne- participação de entidades de defesa de deficientes e para
cessidades educativas especiais. Não é tarefa fácil, mas é deficientes nos processos decisórios de todas as áreas di-
possível. Quando ocorre, torna-se uma experiência ines- retamente envolvidas no atendimento dessa população.
quecível para ambos. A mídia não pode ser esquecida, pois possui um papel
A interação aluno-aluno traz à tona as diferenças fundamental na promoção de atitudes positivas no senti-
interpessoais, as realidades e experiências distintas que do da inclusão de pessoas portadoras de deficiência na
os mesmos trazem do ambiente familiar, a forma como sociedade. A criação de equipes de mediação de sistemas
eles lidam com o diferente, os preconceitos e a falta de e a presença de ombudsmen junto aos conselhos de defe-
paciência em aceitar o outro como ele é. Todos os alunos sa da pessoa deficiente, que mostrem ao governo, à so-
das classes regulares devem receber orientações sobre a ciedade e à mídia os acertos e desacertos da inclusão so-

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cial e escolar e seus prognósticos para curto, médio e longo deficiência e outras minorias tornam-se cidadãos produ-
prazos, devem ser consideradas. tivos, participantes, conscientes de seus direitos e deve-
A prática da desmarginalização de portadores de defi- res, diminuindo, assim, os custos sociais. Dessa forma,
ciência deve ser parte integrante de planos nacionais de lutar a favor da inclusão social deve ser responsabilidade
educação, que objetivem atingir educação para todos. A de cada um e de todos coletivamente.
inclusão social traz no seu bojo a equiparação de oportu-
nidades, a mútua interação de pessoas com e sem defi-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ciência e o pleno acesso aos recursos da sociedade. Cabe
lembrar que uma sociedade inclusiva tem o compromis- BURKE, C. A special kind of hero. Nova York, Barron’s, 1993.
so com as minorias e não apenas com as pessoas portado- BUSCAGLIA, L. Os deficientes e seus pais. Rio de Janeiro, Record, 1993.
ras de deficiência. A inclusão social é, na verdade, uma PERKE, R. New life in the Neighborhood. United States, Paternon, 1980.
medida de ordem econômica, uma vez que o portador de UNICEF, OMS, UNESCO. Medidas vitais. Brasília, Seguradoras, s/d.

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